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Keywords: Binding precedents – Legal thesis – Mass litigation – Civil Procedural Code from
2015
Para citar este artigo: Bortoluci, Lygia Helena Fonseca; Gahyva, Saulo Rondon. As teses jurídicas e
o sistema de precedentes obrigatórios: estabelecendo critérios à sua formação. Revista de Processo.
vol. 343. ano 48. p. 349-368. São Paulo: Ed. RT, setembro 2023. Disponível em:
http://revistadostribunais.com.br/maf/app/document?stid=st-rql&marg=DTR-2023-9289. Acesso em:
DD.MM.AAAA.
Sumário:
1. Introdução
A observância das decisões proferidas em momento anterior e a sua vinculação aos julgamentos
futuros é usual nos países de common law, nos quais a cultura dos precedentes, além de ser mais
enraizada na sociedade, influenciou fortemente o sistema de precedentes que tem sido
implementado no Brasil.
Embora o common law e o civil law tenham uma preocupação com a justiça e o tratamento
isonômico, com o objetivo de conferir previsibilidade, igualdade, confiança do jurisdicionado,
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Deste modo, este trabalho se divide em duas etapas. De início, dedica-se ao estudo da tese jurídica
a partir de um contexto de enfrentamento de demandas de litigiosidade de massa.
Em seguida, anota-se que a tese jurídica, embora tenha sido concebida como instrumento destinado
à automatização do raciocínio e julgamento diante de casos idênticos e repetitivos, tem tido sua
função alargada com vistas a servir de parâmetro decisório à casos análogos – mas não
idênticos – de maior complexidade.
Nesse contexto, por meio de exemplos práticos, pretende-se analisar a utilidade do uso das teses
jurídicas para o sistema de precedentes obrigatórios na justiça brasileira, notadamente sob a
perspectiva da formação e aplicação das teses jurídicas para casos análogos.
O elevado número de demandas em curso perante a justiça brasileira é certamente um dos maiores
desafios enfrentados pelo Poder Judiciário. O acúmulo de litígios massificados envolvendo
demandas idênticas sempre se mostrou um óbice à entrega de uma tutela jurisdicional qualificada
pela eficiência e efetividade, notadamente no âmbito dos Tribunais Superiores1.
O sistema de precedentes judiciais estabelecido pelo CPC/2015 (LGL\2015\1656) nos artigos 926 e
927 é voltado à garantia de uma prestação jurisdicional igualitária àqueles sujeitos que possuem
relações jurídicas de direito material ou processual idênticas3.
Embora tenha sido fortemente influenciado pelo common law, o sistema de precedentes brasileiro se
distancia daquele já conhecido em países como Estados Unidos e Inglaterra5.
Tradicionalmente, os precedentes no common law são construídos com o passar do tempo, isto é,
por meio de um processo interpretativo e reconstrutivo pelo julgador do futuro que, diante da mesma
situação fático-jurídica a do caso paradigma, aplica idêntica solução ao caso concreto.
Logo, toda decisão no sistema da common law tem a predisposição – em tese – de se tornar um
precedente, cuja identificação se dará de forma retrospectiva, operando-se o raciocínio indutivo em
um momento futuro6-7.
No Brasil, por sua vez, a vinculação aos precedentes é fruto de uma escolha político-legislativa,
sendo de observância obrigatória aquelas decisões contidas no rol do artigo 927 do CPC/2015
(LGL\2015\1656). São decisões que já nascem precedentes com uma certidão de nascimento bem
delimitada pelo legislador. Ou seja, são decisões dotadas de credibilidade diferenciada, “com data e
hora, tendo legislador adotado a técnica de enunciar julgamentos dotados de vinculação, atribuindo
respectivos graus de vinculatividade a esses julgamentos”8-9.
Nesse sentido, Eduardo Talamini afirma que a função reservada ao precedente no ordenamento
jurídico brasileiro é servir de “subsídio relevante ou decisivo para a resolução de novos casos, em
que a mesma ou análoga questão se ponha”10 .
No entanto, o principal ponto de distinção reside no fato de que, no Brasil, o sistema de precedentes
foi pensado especialmente para resolver questões envolvendo litígios massificados, casos
absolutamente iguais, cuja vinculação às decisões do artigo 927 do CPC/2015 (LGL\2015\1656) se
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dá por meio da figura da tese jurídica11 . Há aplicação de um raciocínio dedutivo, silogístico, tal como
se opera com a lei.
Assim, é importante que se identifique o que tornam os casos iguais. Existem dois critérios pelos
quais se pode entender que dois casos são iguais: dois casos são juridicamente iguais quando são
idênticos, ou, embora não idênticos do ponto de vista fático, devam ser decididos segundo a mesma
razão de decidir (ratio decidendi), o que torna esses fatos iguais para efeito de aplicação de
precedente.
A tese jurídica, por sua vez, consiste no extrato da decisão12 , em uma delimitação fática do caso,
que tem por objetivo conferir uma solução pronta e acabada para esses conflitos idênticos e
massificados, delimitando zona de certeza da aplicação do precedente13 , cujas características fáticas
são praticamente iguais.
Na forma como concebida, a tese jurídica é produto dos julgamentos de casos repetitivos. Logo, o
sistema brasileiro foi especialmente planejado para o enfrentamento de questões binárias (v.g.,
questões bancárias, serviços prestados por empresa de telefonia, demandas previdenciárias etc.).
Nesse sentido, Teresa Arruda Alvim e Rodrigo Barioni afirmam que a tese jurídica é um enunciado
normativo destinado a solucionar casos que envolvam a mesma questão jurídica:
Os autores afirmam que a tese jurídica pode ser qualificada como uma proposta de ratio decidendi
elaborada pelo tribunal, para o fim de replicar a solução aos casos idênticos. Disso resulta a
conclusão de que a tese jurídica representa uma hipótese de incidência da ratio decidendi do
precedente15 .
Embora se mostre como instrumento adequado para conferir maior segurança jurídica no tratamento
de casos repetitivos, as teses jurídicas não devem ser adotadas como normas abstratas
desvinculadas dos fundamentos fáticos e jurídicos determinantes adotados pelo tribunal. Ela deve
refletir ao máximo o que o tribunal decidiu diante do contexto fático apresentado, tal como a redação
das súmulas, que igualmente não devem ser usadas sem a análise do caso paradigma que resultou
na sua edição. A esse respeito, Daniel Mitidiero destaca que:
“Quando as súmulas eram vistas apenas como um método de trabalho capaz de ordenar e facilitar a
tarefa dos juízes – note-se que aí os destinatários das súmulas eram apenas e tão somente os
próprios órgãos judiciais que compunham os tribunais que as emanavam – bastava redigi-las de
forma abstrata, sem qualquer alusão aos casos concretos aos quais ligadas. Ao reconhecer as
súmulas como guias para a interpretação do direito para o sistema de administração da Justiça Civil
como um todo e para a sociedade civil em geral (art. 927, II e IV), previu-se o dever de identificação
e de congruência das súmulas com as circunstâncias fáticas dos casos que motivaram suas criações
(art. 926, § 2º).”16
Naturalmente, como elemento de sintetização que é, a tese jurídica não é capaz de traduzir a ratio
decidendi. Eis que ela opera um recorte de tudo aquilo que tem uma maior escala de replicabilidade,
facilitando o gerenciamento desses litígios seriados, em que há menor variabilidade fática, como
aqueles envolvendo comissão de corretagem (Tema 938 do Superior Tribunal de Justiça).
Percebe-se, por sua vez, que na prática forense tem-se ampliado o campo de incidência das teses
jurídicas, em uma tentativa de solucionar, com celeridade, casos de maior complexidade e que não
possuem – objetivamente – os mesmos fatos relevantes, o que não é adequado à luz do modelo
de precedentes do CPC/2015 (LGL\2015\1656). Esses casos devem ser solucionados por meio da
ratio decidendi e não propriamente por meio das teses jurídicas.
Isso porque, nesses casos em que há maior variabilidade fática, a aplicação da tese jurídica somente
será possível mediante a identificação e exame da ratio decidendi, o que se dá por meio de um
processo comparativo e argumentativo entre o caso paradigma e o caso em julgamento17 . Para isso,
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“[...] será necessário percorrer um raciocínio indutivo, partindo-se da comparação entre as situações
que originaram o conflito, o que conduzirá à conclusão no mesmo sentido do precedente como
provável (não necessário e certa), diante da veracidade das premissas.”18
Portanto, deve-se ter em mente que a tese jurídica é o instrumento adequado para os casos de
litigância repetitiva, nos quais há replicabilidade da mesma questão fático-jurídica discutida. A
aplicação da tese jurídica deve ser tal como um “cara-crachá”, permitindo uma solução automatizada
para os casos binários.
Deste modo, a projeção dos efeitos do precedente construído a partir dos casos repetitivos, tais
como Incidentes de Resolução de Demandas Repetitivas, Recurso Especial e Extraordinário
Repetitivo, e dos casos que, embora não repetitivos, geram precedentes, Incidente de Assunção de
Competência e Recurso Extraordinário com Repercussão Geral, além de Embargos de Divergência,
dependerá da identidade dos casos. Já para aqueles que não são absolutamente idênticos, será
necessária a identificação da ratio decidendi para utilização correta do precedente.
Em outras palavras: nos casos nos quais não for possível a aplicação automática da tese jurídica, o
exame da ratio decidendi é imprescindível, o que se dá por meio da análise dos fundamentos
determinantes do acórdão, que contenha os fundamentos necessários e suficientes àquela decisão.
No entanto, isso não significa que não seja desejável que o enunciado da tese jurídica contemple,
em alguma medida, uma parcela da ratio decicendi, a fim de auxiliar o juízo de identificação,
comparação e aproximação entre os fatos e questões do precedent case e do instant case.
A partir da fixação da premissa de que as teses jurídicas foram originalmente concebidas em nosso
sistema de precedentes sob um ideal de enfrentamento de demandas de litigiosidade de massa (nas
quais não existe variação fática), e que hoje vêm sendo utilizadas à exaustão pelos tribunais e juízes
também para casos análogos (mas não idênticos), indaga-se se esta amplificação da tese é correta
e, em caso afirmativo, de que forma ela pode ser útil nessas demandas em que há uma maior
amplitude dos fatos.
Ao nosso sentir, a resposta a ambos os questionamentos é positiva, sendo possível reconhecer que
a tese, quando bem construída, funciona como importante instrumento catalisador do sistema de
precedentes, sendo capaz de ampliar a abrangência e a potencial de solução de casos futuros, ainda
que os fatos não sejam absolutamente idênticos.
É o que defende Frederick Schauer, ao afirmar que “ for a decision to be precedent for another
decision does not require that the facts of the earlier and the later cases be absolutely identical”19 .
Nessa perspectiva, não concordamos com a crítica de Luiz Guilherme Marinoni, segundo o qual “a
ideia de tese é inconcebível na perspectiva da teoria dos precedentes e jamais poderá render algo
de frutífero para uma Corte suprema ou constitucional” 20 . A tese jurídica pode sim ser um elemento
de valorização do sistema de precedentes, tanto para os casos binários, quanto para o casos
não-binários, bastando para tanto que ela seja objeto de um cuidadoso processo de elaboração e
aplicação.
Não se deve negligenciar a utilização da tese jurídica diante de casos não idênticos, mormente
porque não se pode reduzir a tarefa do intérprete na análise e na aplicação do precedente à busca
das “razões pelas quais se decidiu de certa maneira ou nas razões que levaram a fixação do
dispositivo”21 .
Tomemos como exemplo o Tema 485 do Supremo Tribunal Federal, relativo à possibilidade de o
Poder Judiciário rever os critérios da banca examinadora em concurso público, quando as respostas
tidas como corretas divergem da bibliografia contida no edital.
Porém, a tese jurídica fixada deixou de indicar, com precisão, qual à exceção à regra fixada foi
admitida pelo Supremo Tribunal Federal. Veja-se: “Não compete ao Poder Judiciário substituir a
banca examinadora para reexaminar o conteúdo das questões e os critérios de correção utilizados,
salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade.”
A redação da tese jurídica poderia ter sido aprimorada mediante a inclusão, ao final, da expressão:
“salvo ocorrência de ilegalidade ou de inconstitucionalidade, consubstanciadas na exigência de
questões referentes a matérias não previstas no edital”.
Conforme se pretende demonstrar, a adequada utilização das teses jurídicas pode contribuir ao
aprimoramento do sistema de precedentes brasileiros, funcionando como elemento facilitador a ser
agregado neste processo analítico de compatibilidade do precedente ao caso concreto a ser feito
pelo intérprete. Basta, para tanto, que as teses jurídicas sejam redigidas segundo determinados
parâmetros, em especial, que contenham indicativos da ratio decidendi, sem obviamente pretender
exaurir o trabalho do juiz na análise da parcela vinculante.
Assim, entende-se que um processo estruturado de formação e aplicação da tese jurídica permitirá
que estas funcionem como importante mecanismos de aplicação dos precedentes obrigatórios.
Outrossim, é relevante consignar que não se pretende amalgamar os conceitos de ratio decidendi e
tese jurídica, que não devem ser confundidos. Busca-se demonstrar que é possível a utilização das
teses jurídicas de uma maneira mais eficiente à construção da ratio decidendi, por meio do processo
de sua elaboração, que, certamente, impulsionará o sistema de precedentes obrigatórios.
Porém, tal estrutura converge das previsões do CPC/2015 (LGL\2015\1656), que disciplinam e
mencionam a figura da tese jurídica nos artigos 927, 985, 987, § 2º, e 1.040, incisos III e IV, ao
mesmo tempo em que estabelecem regras de valorização da ratio decidendi a partir do dever de
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análise do acórdão (artigo 927), a necessidade de identificação dos fundamentos relevantes da tese
jurídica discutida (artigo 1.038, § 3º) e a exigência de que sentença, ao invocar precedente, deverá
identificar seus fundamentos determinantes e demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta
àqueles fundamentos (artigo 489, § 1º, V).
A análise das primeiras teses aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal demonstra a larga utilização
desses enunciados com a finalidade exclusiva de indicar o juízo positivo ou negativo de
constitucionalidade de determinados atos normativos, sem qualquer indicação das razões
determinantes desta constitucionalidade ou inconstitucionalidade:
“É inconstitucional a parte do art. 7º, I, da Lei 10.865/2004 (LGL\2004\2668) que acresce à base de
cálculo da denominada PIS/COFINS-Importação o valor do ICMS incidente no desembaraço
aduaneiro e o valor das próprias contribuições.”
(ii) Tema 3. Leading case RE 559943. Tese fixada: “São inconstitucionais o parágrafo único do
artigo 5º do Decreto-lei 1.569/1977 (LGL\1977\119) e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/1991
(LGL\1991\40), que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”.
(iii) Tema 21. Leading case RE 562.045. Tese fixada: “É constitucional a fixação de alíquota
progressiva para o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação – ITCD”.
A utilização de teses como soluções abstratas foi objeto de preocupação de Taís Schilling Ferraz.
Em sua visão, o primeiro problema consiste na equiparação da “tese jurídica, tal como vem sendo
enunciada, a uma edição de norma, porém pelo Poder Judiciário”, o que conduziria na limitação do
“potencial de construção do direito pela via dos precedentes”, isto é, função criativa do judiciário26 -27 ,
na medida em que atividade dos tribunais locais, após a aprovação da tese, vem a ser
“[...] tornar a norma e nela subsumir todos os casos sobrestados ou que venham a ser ajuizados,
havendo pouco espaço para a individualização de questões, e paradoxalmente sua aplicabilidade
resulta restrita aos casos que sejam iguais.”28
A elaboração de teses com menor grau de abstração permite uma melhor identificação dos
contornos do caso que formou o precedente, ampliando a possibilidade de percepção da
compatibilidade entre o caso a ser julgado no presente (e no futuro) e o caso originou o precedente.
Vejamos os exemplos em que o Supremo Tribunal Federal aprovou enunciado de tese não limitado a
enunciar o juízo de constitucionalidade acerca da norma, avançando para acrescentar elementos
essenciais da ratio decidendi:
“É inconstitucional o uso de meio indireto coercitivo para pagamento de tributo – ‘sanção política’ –,
tal qual ocorre com a exigência, pela Administração Tributária, de fiança, garantia real ou fidejussória
como condição para impressão de notas fiscais de contribuintes com débitos tributários.”
(iii) Tema 46. Leading case RE 576.189. Tese fixada: “É constitucional a cobrança dos encargos
instituídos pela Lei 10.438/2002 (LGL\2002\602), os quais não possuem natureza tributária, mas de
tarifa ou preço público”.
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Ao passo que a ratio decidendi incorpora, em certa medida, os fatos do caso paradigma em seu
núcleo normativo, formando sua hipótese fática para os próximos julgamentos, bem como
considerando que há uma maior maleabilidade desta hipótese fática, segundo as interpretações,
distinções e aproximações que são realizadas pelos julgadores à construção da tese jurídica,
deve-se permitir, desde logo, a identificação dos fatos centrais em torno dos quais o precedente
firmado.
O raciocínio comparativo é inerente à lógica dos precedentes, pois é justamente a análise das
semelhanças do contexto fático que permite a conclusão pela aplicação ou não do precedente.
A esse respeito, Michelle Taruffo já dizia que o raciocínio fundamental que sustenta a aplicação do
precedente ao caso subsequente está sedimentado na análise dos fatos e, portanto, das categorias
assimiláveis29 .
Os fatos do caso são fundamentais para trabalhar com precedentes, pois caberá ao intérprete
identificar o contexto em que precedente está inserido e quais as semelhanças e distinções com o
caso paradigma. Verifica-se se a distinção material entre o caso precedente e o caso em julgamento
é apta a desautorizar a importação da norma do precedente anteriormente construída, admitindo-se,
dessa forma, tratamento diferenciado pelo judiciário. Ou ainda, se as semelhanças são tantas que se
pode importar a mesma razão de decidir do precedente ao caso concreto.
A Súmula 299 (MIX\2010\1549) do Superior Tribunal de Justiça diz que: “É admissível a ação
monitória fundada em cheque prescrito”. Pela análise do acórdão, verifica-se que o caso paradigma
trata da suficiência do cheque prescrito como elemento de prova para fins da ação monitória. Assim,
é possível estender o raciocínio a outros casos, como nota promissória, duplicata mercantil, entre
outros. Em suma: títulos de créditos, ainda que prescritos, podem servir de prova documental para
ação monitória, de acordo com as razões universalizantes que decorrem dos acórdãos que
ensejaram a súmula.
É igualmente desejável que se estabeleça, desde já, casos análogos em que a tese jurídica não
servirá para construção da solução judicial automatizada30 . Isto é, hipóteses em que a tese não será
capaz ser aplicada automaticamente. O que não exclui, por óbvio, a aplicação da ratio decidendi.
Neste caso, o trabalho do juiz deverá se dar a partir de uma fundamentação reforçada.
c)Não deve ser genérica, isto é, deve conter ao menos uma das hipóteses de incidência da
ratio decidendi
Uma redação aberta implica em afronta à segurança jurídica e aos próprios propósitos do sistema de
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precedentes, pois amplia indistintamente as situações nas quais ela poderá ser invocada de maneira
automatizada para dar conta de situações não abarcadas inicialmente pela análise do colegiado,
justamente porque estão fora do objeto de julgamento. A esse respeito, Rodrigo Barioni foi preciso:
“Quanto maior a generalidade fática, maior o risco de se incluírem na intepretação da ratio decidendi
hipóteses não rigorosamente análogas, porque compostas de especificidades incompatíveis com o
caso analisado na formação do precedente.”31
Por isso, é extremamente recomendável que a tese jurídica evite a utilização de generalizações ou
conceitos vagos e indeterminados para tratar de casos idênticos e que se multiplicam no judiciário.
É o que ocorreu, por exemplo, com a fixação da tese no Tema 988 do Superior Tribunal de Justiça:
“O rol do art. 1.015 do CPC (LGL\2015\1656) é de taxatividade mitigada, por isso admite a
interposição de agravo de instrumento quando verificada a urgência decorrente da inutilidade do
julgamento da questão no recurso de apelação”.
A despeito das opiniões doutrinárias sobre do (des)acerto da tese, fato é que em sua redação há, ao
menos, dois conceitos vagos, quais sejam, “urgência” e “inutilidade do recurso de apelação”,32 -33 que
impedem a adequada compreensão do campo de incidência da tese jurídica fixada no Tema 988.
Afinal, cabe ou não cabe agravo de instrumento? Essa é uma pergunta sem resposta e que
dependerá, novamente, do casuísmo do caso concreto para que seja identificável a hipótese de
cabimento do recurso.
Vê-se, facilmente, que a utilização destas expressões não contribuiu para a solução do problema
prático acerca do rol do art. 1.015, na exata medida em que não se consegue antever as suas
hipóteses de cabimento.
A tecitura aberta da tese implica na análise subjetiva a ser feita por de cada julgador casuisticamente
sobre o que seria “urgência” e “inutilidade do recurso de apelação”, o que não dialoga com a função
paradigmática da tese jurídica formada no âmbito destes processos repetitivos e idênticos,
justamente porque o objetivo é conferir segurança e previsibilidade aos jurisdicionados. No caso, a
segurança dependeria da constatação, prima facie, do cabimento ou não do recurso à luz da tese
jurídica. O que não se verifica e depende, essencialmente, da análise da ratio decidendi para que se
consiga construir uma diretriz segura ao cabimento do Agravo de Instrumento.
Nesse contexto, a redação do Tema 988 do Superior Tribunal de Justiça trouxe insegurança jurídica,
impondo um ônus argumentativo maior aos litigantes, para que seja possível a demonstração do
cabimento do recurso. Afinal, todo advogado que se depare com uma situação atípica de cabimento
do agravo de instrumento terá que lançar mão de uma argumentação mais robusta para justificar seu
cabimento e, por conseguinte, sua admissibilidade, notadamente à luz do risco de preclusão
temporal.
d)Deve julgar dentro dos limites da lide: a importância da decisão de afetação na construção
da tese jurídica
Em fevereiro de 2021, o Supremo Tribunal Federal fixou a seguinte tese: “O fato gerador do imposto
sobre transmissão inter vivos de bens imóveis (ITBI) somente ocorre com a efetiva transferência da
propriedade imobiliária, que se dá mediante o registro” (Tema 1.124).
Na ocasião, a discussão se deu acerca da exigência de ITBI sobre a cessão de direitos relativos a
bens imóveis, nos termos do art. 156, II, parte final, da Constituição Federal, considerando que o
ITBI não tem por fato gerador apenas a transferência da propriedade imobiliária, mas também de
direitos reais imobiliários ou a cessão de direitos relativos a tais transmissões.
Contudo, o caso subjacente era absolutamente diferente ao da tese que foi fixada: versava sobre
incidência do ITBI sobre compromisso de compra e venda. Inclusive depois de um ano e meio, o
Supremo reafetou o tema para rever o posicionamento, que ainda está pendente de julgamento34 .
O caso serve para demonstrar que essa circunstância de descolamento da tese jurídica do caso em
julgamento prejudica a formação adequada do contraditório comparticipativo e da pluralidade do
debate, que são elementos essenciais à formação de um precedente qualificado35 .
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A construção da tese jurídica deve ser pautada à luz da questão jurídica afetada para julgamento,
dentro dos limites da lide, porque decorre do princípio da adstrição, nos termos do art. 141 do
CPC/2015 (LGL\2015\1656).
Assim, a decisão que afeta a questão controvertida e repetitiva é de grande importância para que
todo o ambiente plural e democrático que se prestigia com o sistema de precedentes seja precedido
do enfrentamento da matéria que corretamente integra o objeto de julgamento. Dessa forma, será
assegurada a formação do precedente obrigatório legítimo.
Ao passo que a pretensão do precedente é permitir a futura solução de casos similares, cujos fatos
revelem a compatibilidade com aqueles existentes quando da formação do precedente, a redação da
tese deve permitir (ou ao menos facilitar) a realização desse juízo comparativo, de modo que os
elementos essenciais apresentados na tese não podem ser excessivamente particulares, sob pena
de inviabilizar a futura generalização.
A esse respeito, Michelle Taruffo anota que o precedente possui a aptidão de fornecer uma regra
universalizável que poderá ser aplicada como solução ao caso presente em função da identidade
ou – como acontece em regra – da analogia entre os fatos do primeiro caso e os fatos do segundo
caso.
f)Embora incapaz de traduzir a ratio decidendi, deve, em alguma medida, conter elementos
dela
Como visto, as teses jurídicas são um importante elemento integrante do sistema de precedentes
destinado a orientar comportamentos e estabelecer paradigmas de decisões judiciais.
Em se tratando de casos análogos, imprescindível se fará o exame das razões de decidir. A ratio
decidendi, enquanto norma jurídica, não deve ser analisada de forma isolada. Deve-se interpretá-la
de acordo com a questão fático-jurídica por ela solucionada, justamente em razão da sua aptidão de
universalização37 .
A busca pelo elemento vinculante pode ser facilitada por meio de uma tese jurídica bem construída,
que abarque o conteúdo essencial da ratio, o “que tornaria mais clara esta vinculação da tese
extraída do precedente aos seus fundamentos determinantes, seria construir a tese de forma a trazer
conjuntamente sua motivação essencial”38 .
Muito embora esse debate tenha se dado apenas no âmbito dos compromissos de compra e venda,
entendemos ser possível aplicá-la a outras relações contratuais paritárias, v.g., contratos
empresariais, de franquia, de transporte, telefonia, pois a ratio decidendi do precedente consiste
justamente na manutenção do equilíbrio contratual entre os contratantes.
Deste modo, a tese jurídica poderia abranger os fundamentos determinantes considerados pelo
tribunal, sendo assim redigida:
Desse modo, vê-se que, embora a identificação e interpretação da ratio decidendi não possa se ater
apenas à leitura da tese jurídica, é desejável para o desenvolvimento do sistema de precedentes que
ela contenha elementos essenciais das razões de decidir, sem que se desconsidere a importante
atividade do intérprete na reconstrução do núcleo do precedente por meio de uma atividade dialética
e fundamentada.
4. Conclusão
Este trabalho teve por objetivo analisar as teses jurídicas estabelecidas pelo CPC/2015
(LGL\2015\1656) à luz do sistema de precedentes obrigatórios.
De início, verificou-se que no Brasil as teses jurídicas são importantes ferramentas para gestão de
conflitos repetitivos, os quais assoberbam o judiciário e que possuem como característica central a
identidade da questão fático-jurídica discutida.
Nesse sentido, a adoção das teses jurídicas para casos não idênticos, embora seja possível, deverá
ser precedida da prévia análise do intérprete na construção da norma jurídica que será espelhada no
caso em julgamento.
A tese jurídica bem elaborada reflete elementos essenciais do sistema de precedentes e, assim,
valoriza e dinamiza a sua aplicação.
Por fim, demonstrou-se que a tentativa de inserção da ratiodecidendi na tese jurídica pode ser útil à
identificação das hipóteses de distinção do precedente, assim como aos casos que devem seguir a
orientação fixada. Logo, ajuda na compreensão da zona de incidência do precedente, que é uma das
hipóteses de incidência da ratio decidendi, mas não esgota suas possibilidades.
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OBRIGATÓRIOS: ESTABELECENDO CRITÉRIOS À SUA
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Tribunais, 2016.
MARINONI, Luiz Guilherme. O problema do significado dos precedentes constitucionais. In: CLÈVE,
Clèmerson. Direito Constitucional Brasileiro: Teoria da Constituição e Direitos Fundamentais. São
Paulo (SP): Editora Revista dos Tribunais, 2022. Disponível em:
[thomsonreuters.jusbrasil.com.br/doutrina/secao/1440746818/39-o-problema-do-significado-dos-precedentes-constituc
Acesso em: 09.11.2022.
MELLO, Patrícia Perrone Campos. O Supremo e os precedentes constitucionais: como fica a sua
eficácia após o Novo Código de Processo Civil. In: Universitas JUS, v. 26, n. 2, p. 41-53, 2015.
MIRANDA, Victor Vasconcelos. Precedentes judiciais: construção e aplicação da ratio decidendi. São
Paulo: Revista dos Tribunais, 2022.
MIRANDA, Victor Vasconcelos. Notas sobre o modelo de votação nos casos dirigidos à formação de
precedentes obrigatórios. In: NERY JUNIOR; Nelson; e ARRUDA ALVIM, Teresa (Coord.). Aspectos
polêmicos dos recursos cíveis e assunto afins, v. 15, São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020.
1 .Os principais assuntos julgados em 2021 pela 2ª Seção e 3ª e 4ª Turmas do Superior Tribunal de
Justiça foram: promessa de compra e venda, contratos bancários, recuperação judicial e falência,
previdência privada, prestação de serviços, plano de saúde, indenização por dano moral, seguro.
Disponível em: [www.stj.jus.br/docs_internet/processo/boletim/2021/Relatorio2021.pdf]. Acesso em:
23.11.2022.
3 .“[...] aquele que se coloca em condições similares as do caso já julgado possui legítima
expectativa de não ser surpreendido por decisão diversa. Ademais, os sujeitos a qualquer tipo de
poder, ainda que privado, possuem o direito de crer na racionalidade e na estabilidade das decisões.
Têm, em outras palavras, legítima expectativa de que os julgamentos que podem atingi-los não
variarão sem justificativa plausível e que, assim, podem dirigir as suas atividades de acordo com as
diretrizes já fixadas. [...] Tratar da mesma forma casos similares é algo fundamental para a afirmação
do poder e para a manutenção da segurança necessária ao desenvolvimento das relações sociais”
(MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 5. ed. São Paulo: Editora Revista dos
Tribunais, 2016. p. 87-88).
4 .Sobre o tema, ver, com proveito: BURIL, Lucas de Macêdo. Interesse recursal na formação do
precedente. In: Aspectos Polêmicos dos Recursos Cíveis e Assuntos Afins – Edição 2017.
5 .“Existe uma recíproca aproximação entre as tradições de civil law e de common law no mundo
contemporâneo. De um lado, a tradição do common law cada vez mais trabalha com o direito
legislado, fenômeno que já levou a doutrina a identificar a statutorification do common law e se
perguntar a respeito de qual o lugar do common law em uma época em que cada vez mais vige o
statutory law. De outro, a tradição de civil law cada vez mais se preocupa em assegurar a vigência
do princípio da liberdade e da igualdade de todos perante o direito trabalhando com uma noção
dinâmica do princípio da segurança jurídica, o que postula a necessidade de acompanharmos não só
o trabalho do legislador, mas também as decisões dos tribunais, em especial das Cortes Supremas,
como expressão do direito vigente” (MITIDIERO, Daniel. Precedentes, jurisprudência e súmulas no
novo Código de Processo Civil Brasileiro. Revista dos Tribunais, v. 245, jul. 2015. p. 1).
7 .Em sentido idêntico: FUGA, Bruno Augusto Sampaio. Superação de precedente: da necessária via
processual e o uso da reclamação para superar e interpretar precedentes. Londrina, PR: Thoth,
2020. p. 339.
8 .CÂMARA, Alexandre Freitas. O novo processo civil brasileiro. 7. ed. São Paulo: Atlas, 2021.
p. 439.
9 .No mesmo sentido: ABBOUD, Georges; STRECK, Lenio Luiz. O que é isto – o precedente
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AS TESES JURÍDICAS E O SISTEMA DE PRECEDENTES
OBRIGATÓRIOS: ESTABELECENDO CRITÉRIOS À SUA
FORMAÇÃO
judicial e as súmulas vinculantes? 3. ed. rev. atual. de acordo com o novo CPC. Porto Alegre:
Livraria do Advogado Editora, 2015. p. 111-116.
10 .TALAMINI, Eduardo. O que são “precedentes vinculantes” no CPC 15. Disponível em:
[www.migalhas.com.br/depeso/236392/o-que-sao-os--precedentes-vinculantes--no-cpc-15]. Acesso
em: 23.11.2022.
11 .“É importante observar, ainda, que o sistema brasileiro de precedentes judiciais carrega consigo
uma preocupação para que estes pronunciamentos judiciais ganhem relevo e sejam internalizados
pelos julgadores subsequentes. Como facilitadores à aplicação dos precedentes judiciais – e de
algum modo da identificação da ratio decidendi – foram estabelecidas pelo legislador as teses
jurídicas. A tese jurídica é o extrato da decisão que – na perspectiva do órgão formador do
precedente – fixa um posicionamento que servirá de orientação aos casos futuros com idêntica
questão de direito” (MIRANDA, Victor Vasconcelos. Notas sobre o modelo de votação nos casos
dirigidos à formação de precedentes obrigatórios. In: NERY JUNIOR; Nelson; e ARRUDA ALVIM,
Teresa (Coord.). Aspectos polêmicos dos recursos cíveis e assunto afins, v. 15, São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2020. p. 5).
12 .FERRAZ, Taís Schilling. Ratio decidendi x tese jurídica. A busca pelo elemento vinculante do
precedente brasileiro. Revista de Processo, v. 265, mar. 2017. p. 1.
13 .ARRUDA ALVIM, Teresa; BARIONI, Rodrigo. Recursos repetitivos: tese jurídica e ratio decidendi.
Revista de Processo, v. 296, uut. 2019. p. 11.
17 .“[...] é preciso saber quando um precedente é aplicável para solução de uma questão e quando
não o é. Se a questão que deve ser resolvida já conta com um precedente – se é a mesma questão
ou se é semelhante, o precedente aplica-se ao caso. O raciocínio é eminentemente analógico.
Todavia, se a questão não for idêntica ou não for semelhante, isto é, se existirem particularidades
fático-jurídicas não presentes – e por isso não consideradas – no precedente, então é caso de
distinguir o caso do precedente, recusando-lhe aplicação. É o caso de realizar uma distinção (
distinguishing)” (MITIDIERO, Daniel. Precedentes, jurisprudência e súmulas no Novo Código de
Processo Civil Brasileiro. Revista de Processo, v. 245, jul. 2015. p. 7).
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AS TESES JURÍDICAS E O SISTEMA DE PRECEDENTES
OBRIGATÓRIOS: ESTABELECENDO CRITÉRIOS À SUA
FORMAÇÃO
21 .MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 6. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2019. p. 162.
22 .“A ratio decidendi corresponderá apenas ao entendimento ou aos argumentos acolhidos pela
maioria dos juízes do tribunal e imprescindíveis para justificar o desfecho do caso. [...] Corresponde,
portanto, à regra de direito utilizada pelo tribunal como uma premissa necessária à solução do caso,
à luz das razões adotadas pela maioria de seus membros” (MELLO, Patrícia Perrone Campos. O
Supremo e os precedentes constitucionais: como fica a sua eficácia após o Novo Código de
Processo Civil. In: Universitas JUS, v. 26, n. 2, 2015. p. 46).
23 .“Assim como a lei, o precedente é texto e carece de interpretação. A maior proximidade que o
precedente possui com os fatos, certamente, torna-o mais seguro e lhe dá a função de delimitação
da norma legal, mas isso não autoriza a noção de que o precedente é unívoco” (BURIL, Lucas de
Macêdo. Contributo para a definição de ratio decidendi na teoria brasileira dos precedentes judiciais.
Revista de Processo, v. 234, ago. 2014. p. 5).
24 .MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 6. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Thomson Reuters Brasil, 2019. p. 159.
25 .“A expressão foi cunhada pelo legislador, que, embora bem intencionado na pretensão de criar
no Brasil um sistema de respeito aos precedentes, acabou por permitir a interpretação, inclusive nos
tribunais superiores, de que todo o resultado de um julgamento com repercussão geral ou repetitivo
resulta em uma norma geral e abstrata” (FERRAZ, Taís Schilling. Op. cit., p. 6).
27 .“O poder de julgar se restringia a declarar a lei no caso concreto, nada mais do que isso. O juiz
deveria ser a boca da lei e de modo nenhum poderia criar o direito, que cabia somente ao Poder
Legislativo” (CRAMER, Ronaldo. Precedentes judiciais. Teoria e dinâmica. Rio de Janeiro: Forense,
2016. p. 27).
30 .De acordo com Victor Vasconcelos Miranda, a indicação da ratio decidendi pelo órgão julgador,
especialmente os fundamentos determinantes e convergentes do colegiado, é tarefa desejável, pois
contribui com “a facilitação do trabalho dos julgadores subsequentes e a fim de projetar maior
calculabilidade dos jurisdicionados quanto às suas pautas de conduta” (MIRANDA, Victor
Vasconcelos. Precedentes judiciais: construção e aplicação da ratio decidendi. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022. p. 193).
32 .De acordo com Cassio Scarpinella Bueno, o rol do art. 1.015 do CPC/2015 é taxativo, não
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AS TESES JURÍDICAS E O SISTEMA DE PRECEDENTES
OBRIGATÓRIOS: ESTABELECENDO CRITÉRIOS À SUA
FORMAÇÃO
obstante reconhecer ser viável dar o máximo de rendimento às hipóteses do art. 1.015. Como as
decisões interlocutórias não agraváveis de instrumento são recorríveis via Apelação, não haveria, no
seu entender, qualquer crítica a ser feita, dessa perspectiva, à escolha do CPC/2015. O problema
seria quanto ao termo inicial do prazo preclusivo da decisão interlocutória, caso o recorrente somente
venha a interpor apelação e o tribunal entenda que era caso de agravo de instrumento (BUENO,
Cassio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. 9. ed. São Paulo: Saraiva
Educação, 2020. v. 2. p. 621-625).
33 .William Santos Ferreira, por sua vez, defende que existe uma taxatividade fraca do rol do
art. 1.015 do CPC/2015. Em sua visão, há uma contradição lógica com o sistema no sentido de que
a recorribilidade diferida represente inutilidade e perda do interesse (FERREIRA, William Santos.
Antes e depois do paradigmático julgamento acerca do cabimento do Agravo de Instrumento (Tema
988) – Tradição, prática, gestão de processos, taxatividade interpretação, preclusão, “fatispécies”
determinadas e determináveis e força dos precedentes. In: ARRUDA ALVIM, Teresa (Coord.). O
CPC de 2015 visto pelo STJ. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021. p. 967-997).
34 .Disponível em:
[portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=6031137&numeroProcesso=12949
Acesso em: 21.04.2023.
35 .Tratando sobre o processo de formação da ratio decidendi, cf.: MIRANDA, Victor Vasconcelos.
Op. cit.
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