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13 SEP 2023

Provas e
Arbitragem -
Ed. 2023
REVISTA DOS TRIBUNAIS

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I.Produção antecipada de provas e seu tratamento no CPC/2015, p.RB-8.1

II.Os efeitos da Convenção de Arbitragem, p.RB-8.2

III.Sobre a produção antecipada de provas em situações abrangidas por


Convenção de Arbitragem, p.RB-8.3

IV. Conclusões, p.RB-8.4


13 SEP 2023 PAGE RB-8.1

Provas e Arbitragem - Ed. 2023


I. ARBITRAGEM: PROVA E PROCESSO
8. A produção antecipada de provas em situações não urgentes, o poder judiciário e a
convenção de arbitragem
I.Produção antecipada de provas e seu tratamento no CPC/2015

João Luiz Lessa Neto

I.PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS E SEU TRATAMENTO NO CPC/2015

O CPC/2015 estabeleceu um procedimento especial para a produção antecipada de


provas, regulando o exercício de uma pretensão material de acesso à informação, com a
constituição de um meio de prova, que pode ser exercida de maneira autônoma – e não apenas
em caráter incidental para permitir a instrução de um processo pendente.

A produção antecipada de provas põe, como objeto do processo, em evidência o direito à


prova1. É a análise do direito material que indicará se um determinado pedido de produção
probatória exercido autonomamente deve, ou não, ser acolhido. Em princípio, todos os meios
de prova (oral, documental e técnica) podem ser constituídos e documentados no âmbito da
ação de produção antecipada de provas2.

O CPC/2015, em seu art. 381, evidencia três situações autorizadoras para a produção
antecipada de provas, permitindo o acolhimento da demanda quando: a) houver fundado
receio de que a produção de provas venha a tornar-se impossível ou muito difícil na
pendência da ação; b) a prova possa viabilizar uma solução autocompositiva ou outro meio de
solução de conflito; e c) o conhecimento e esclarecimento prévio dos fatos puder justificar ou
evitar o ajuizamento de ação. Também ficam consignadas as medidas probatórias de
jurisdição voluntária do arrolamento, quando realizado para simples documentação e
inventário da existência de bens, sem a necessidade de prática de atos de apreensão, e a
justificação não contenciosa de determinado fato ou relação jurídica.

A produção antecipada de prova pode ser um procedimento de jurisdição contenciosa ou


de jurisdição voluntária, conforme pretensão deduzida e hipótese legal. O sistema brasileiro,
alinhado com sua tradição, mantém a possibilidade de justificação não contenciosa de fato ou
relação jurídica, com a finalidade exclusiva de sua documentação e perpetuação ou registro
de seu conteúdo.

É possível, no âmbito contencioso, a produção antecipada de prova urgente. Trata-se de


verdadeira tutela da urgência probatória. Quando o meio de prova correr o risco de perecer
ou quando a verificação do fato, no futuro, for difícil ou impossível, é possível o ajuizamento
de produção antecipada de provas. A urgência, nessa hipótese, não diz respeito a um direito
decorrente do fato objeto da prova, mas é o próprio meio de prova que pode vir a se perder ou
não poder ser constituído no futuro. Por isso, mesmo que o fato integre o suporte de um
direito pendente de condição suspensiva ou termo, não sendo ainda exigível, é possível a
antecipação da prova, afinal ela é que precisa ser urgentemente produzida, não o direito
relacionado ao fato objeto do meio de prova. Há, nessas situações, uma pretensão
alegadamente urgente de exercício do direito à prova.

Nos métodos consensuais de resolução de disputas é evidente que o recurso pontual ao


Poder Judiciário para a produção de provas pode vir a se mostrar necessário, de maneira a
auxiliar o desenvolvimento do esforço para solução consensual. Pela própria maneira de
atuação desses mecanismos, há situações em que a possibilidade de produção de uma prova
sob supervisão judicial pode se mostrar adequada, complementando as possibilidades de
atuação de mediadores e conciliadores e auxiliando as partes na compreensão dos fatos.

A questão delicada se coloca em uma situação anterior a procedimento arbitral na qual


exista uma (alegada) pretensão probatória não urgente. Isso porque a arbitragem é atividade
eminentemente jurisdicional e a escolha pela utilização da arbitragem tem por efeito impedir
o válido e regular desenvolvimento de processo judicial para as matérias arbitráveis e
abarcadas pela convenção de arbitragem. O Poder Judiciário pode determinar a produção
antecipada (ou autônoma) de uma prova em matéria que as partes convencionaram que seria
submetida à arbitragem, por meio de convenção?

FOOTNOTES

.O tema aqui tratado, inclusive suas interações com a arbitragem, foi desenvolvido anteriormente
no meu livro: LESSA NETO, João Luiz. Produção Autônoma de Provas e Direito Comparado:
Brasil, Estados Unidos e Inglaterra. Londrina: Thoth, 2021.

.O Superior Tribunal de Justiça afirmou que: “... atualmente se reconhece a existência de um


direito autônomo à prova, assentado na possibilidade de a pessoa requerer o esclarecimento sobre
fatos que a ela digam respeito independentemente da existência de um litígio potencial ou
iminente.” BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1.632.750 SP 2016/0193441-0, Terceira
Turma, Rel. Min. Moura Ribeiro, j. 24/10/2017, DJe 13/11/2017.
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Provas e Arbitragem - Ed. 2023


I. ARBITRAGEM: PROVA E PROCESSO
8. A produção antecipada de provas em situações não urgentes, o poder judiciário e a
convenção de arbitragem
II.Os efeitos da Convenção de Arbitragem

II.OS EFEITOS DA CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM

O árbitro desenvolve uma atividade jurisdicional, a convenção de arbitragem cria uma


jurisdição e define competência potencial. A aceitação do encargo de julgar pelo árbitro
(receptum) fixa essa competência e permite o exercício da jurisdição. A convenção de
arbitragem, negócio jurídico processual, atribui os poderes para o desenvolvimento regular
dar arbitragem. Como acontece em qualquer negócio jurídico, é indispensável a existência de
válida e eficaz manifestação volitiva. Não se deve confundir os planos da existência, validade
e eficácia. Como negócio jurídico que é, a análise da higidez da convenção de arbitragem
pressupõe a correta compreensão desses três níveis3. Para uma efetiva submissão das partes
à arbitragem é preciso que a convenção existavalidamente e produza efeitos. A celebração do
negócio jurídico “convenção de arbitragem” dá-se, justamente, pelo desejo das partes de
produção de seus efeitos, submetendo determinada controvérsia, presente ou potencial, à
jurisdição privada, obstando o desenvolvimento da jurisdição estatal,

Dois são os efeitos principais decorrentes da convenção de arbitragem: um chama-se


efeito negativo e o outro positivo.

O efeito positivo da convenção de arbitragem volta-se para os contratantes. Pelo efeito


positivo os contratantes estão obrigados a recorrer ao processo arbitral para o julgamento de
seu conflito. Isso decorre diretamente do pacta sunt servanda. Como o contrato de
arbitragem é bilateral, as partes reciprocamente aceitam e têm de se submeter à arbitragem.
Do efeito positivo decorre, também, o poder de uma parte compelir a outra à solução arbitral,
como expresso no art. 7º da Lei de Arbitragem4. Ou seja, as partes estão obrigadas à
utilização da arbitragem. Firmado o contrato, não é possível sua resilição ou inadimplemento
unilateral.

Esse efeito é chamado de positivo por efetivamente agir sobre os pactuantes, compelindo-
os à adoção do processo arbitral para dirimir seus conflitos, conforme tinham anteriormente
pactuado. Logicamente, o efeito positivo só se dá nos limites e na extensão da convenção de
arbitragem. Apenas as matérias e os sujeitos abarcados pela convenção, em uma
interpretação de seu conteúdo, é que estarão vinculados à convenção.

O efeito negativo da convenção de arbitragem impede que o Judiciário conheça das


matérias submetidas à arbitragem. Existindo a convenção arbitral, as partes têm de se
submeter a essa via de solução de conflitos5. Quer isso dizer que o efeito negativo é o que
justifica a exceção de arbitragem. O Judiciário não poderá julgar a causa, observados os
limites do que foi contratado. Assim, proposta uma ação judicial em desrespeito à convenção
de arbitragem, poderá ser apresentada pelo réu uma exceção de arbitragem e deverá o juiz
extinguir sem resolução de mérito o processo judicial proposto (arts. 485, VII, e 337, X,
CPC/2015). O efeito negativo, em verdade, prestigia o instituto da arbitragem, garantindo
sua atuação útil, pois se as partes pudessem, paralelamente, recorrer ao Judiciário, caso esse
fosse competente para conhecer da matéria, o próprio instituto não teria razão de existir6.

Isso significa que a convenção de arbitragem tem o efeito de determinar a utilização da


arbitragem, impedindo que a matéria seja apreciada pelo Poder Judiciário, nos limites das
matérias arbitráveis e para as pessoas por ela abrangida. Assim, não é possível levar
questões que estejam no âmbito de convenção de arbitragem à apreciação do Poder
Judiciário, excetuadas as situações de urgência pré-arbitral.

FOOTNOTES

.PONTES DE MIRANDA. Tratado de direito privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1954, t. 1. MELLO,
Marcos Bernardes de. Teoria do fato jurídico: plano da existência. 13. ed. Saraiva: 2007, p. 98-
105.

.“O efeito positivo da convenção de arbitragem determina que as partes estarão obrigadas a
solucionar eventual litígio, no caso da cláusula compromissória, ou litígio determinado, no caso do
compromisso arbitral, da relação jurídica entre elas existente pela via arbitral.” GUERRERO, Luis
Fernando. Convenção de arbitragem e processo arbitral. São Paulo: Atlas, 2009, p. 121.

.Veja-se trecho da posição adotada pelo Superior Tribunal de Justiça ao julgar o Mandado de
Segurança MS 11.308/DF – Mandado de Segurança: 2005/0212763-0: “Destarte, uma vez
convencionado pelas partes cláusula arbitral, o árbitro vira juiz de fato e de direito da causa, e a
decisão que então proferir não ficará sujeita a recurso ou à homologação judicial, segundo dispõe o
artigo 18 da Lei 9.307/96, o que significa categorizá-lo como equivalente jurisdicional, porquanto
terá os mesmos poderes do juiz togado, não sofrendo restrições na sua competência.” BRASIL,
Superior Tribunal de Justiça. Mandado de Segurança n. MS 11.308/DF. Relator: Min. Luiz Fux. j.
em: 09/04/2008.

.“A eficácia negativa da convenção de arbitragem retira do Judiciário o poder jurisdicional para
conhecer as questões que estejam nos limites da convenção da arbitragem celebrada pelas partes.
O poder jurisdicional é transferido do juiz para o árbitro por previsão legal amparada pela
manifestação da vontade expressa e escrita das partes, ficando estas impedidas de utilizarem o
judiciário de modo unilateral.” GUERRERO, Luis Fernando. Convenção de arbitragem e
processo arbitral. São Paulo: Atlas, 2009, p. 125.
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Provas e Arbitragem - Ed. 2023


I. ARBITRAGEM: PROVA E PROCESSO
8. A produção antecipada de provas em situações não urgentes, o poder judiciário e a
convenção de arbitragem
III.Sobre a produção antecipada de provas em situações abrangidas por Convenção de
Arbitragem

III.SOBRE A PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS EM SITUAÇÕES ABRANGIDAS POR CONVENÇÃO DE


ARBITRAGEM

A arbitragem é, como afirmado, o exercício de uma jurisdição privada. Os árbitros são


juízes de fato e de direito da demanda que lhes é posta, detendo poderes para conduzir o
procedimento arbitral, nomeadamente conhecer das provas que lhes sejam apresentadas. No
curso da arbitragem, incidem os ônus probatórios, já que cada parte deve demonstrar a
veracidade de suas alegações. Cabe aos árbitros, no curso do procedimento, admitir as
provas úteis ao julgamento do caso, bem como efetuar sua valoração, inclusive com a
aplicação de eventuais inferências. Instalada a jurisdição arbitral, os árbitros devem
gerenciar e conduzir a instrução probatória, em uma atividade cooperativa com as partes. A
questão central é compatibilizar uma convivência cooperativa entre a arbitragem e o Poder
Judiciário, mas que preserve o âmbito de competência do árbitro, permitindo o adequado
desenvolvimento da jurisdição privada7.

Não há dúvidas de que existindo uma situação urgente, com o risco de perecimento de
uma prova antes da instalação da arbitragem, é possível a propositura de ação judicial para a
tutela da urgência, ressalvada a existência de regra sobre atuação de árbitro provisório ou de
urgência8-9-10. Nessa situação, a produção antecipada da prova observará a regra prevista no
art. 22-A da Lei de Arbitragem, pois compete ao Poder Judiciário conhecer das medidas de
urgentes prévias e até a constituição da arbitragem11. O fato de a medida de urgência
necessária ter um caráter probatório não afasta a possibilidade de atuação do Poder
Judiciário, para preservar a evidência que pode vir a se perder. Contudo, com a instauração
da arbitragem competirá aos árbitros decidir sobre as situações de urgência, consoante regra
do art. 22-B da Lei de Arbitragem, inclusive sobre a urgência probatória. Além disso, a efetiva
admissão e análise da prova produzida antecipadamente em virtude da urgência cabe apenas
aos árbitros, valendo a regra geral de que o juízo da produção antecipada de prova (urgente
ou não) não valora seu conteúdo e que nada reputa como provado ou demonstrado12.

As situações urgentes pré-arbitrais devem ser submetidas ao Poder Judiciário, ressalvada


a incidência de regra sobre a atuação de árbitro provisório ou de emergência, conforme o
caso. Não há razão para se supor que quando houver risco de perda de elementos materiais
de prova e houver a necessidade de imediata asseguração ou perpetuação de seu conteúdo
não seria possível a utilização da via judicial. A tutela da urgência possui regras próprias, a
indicar o recorte e a repartição de atividades e competências entre juízes e árbitros.

A questão mais complexa, entretanto, diz respeito à competência para a produção


antecipada de provas não urgentes em um caso relacionado a uma convenção de arbitragem.
É possível a produção autônoma de uma prova em um contexto relacionado ao âmbito de
abrangência de uma convenção de arbitragem? Em sendo possível, essa prova deverá ser
produzida judicialmente ou deveria ser objeto de uma arbitragem com este fim específico?

A resposta para questão depende, evidentemente, da análise do direito positivo.

Adrian Zuckerman, considerando o Direito da Inglaterra e do País de Gales, entende pela


incompetência do Poder Judiciário para conhecer da produção antecipada da prova em
situações não urgentes.13 Isso porque cabe aos árbitros determinar a produção de provas,
não sendo possível que a parte que optou pela utilização de arbitragem mova uma demanda
judicial, ainda que com o escopo de produzir uma prova.

Nos Estados Unidos existe uma caudalosa discussão sobre a aplicação da Section 1782 do
US Code às arbitragens, mas alguns circuitos aceitavam a produção autônoma de prova em
apoio a uma arbitragem internacional. A Suprema Corte dos Estados Unidos, contudo, no
julgamento conjunto dos casos ZF Automotive US, Inc. v. Luxshare, Ltd. e AlixPartners, LLP
v. Fund for Protection of Investors’ Rights in Foreign States, em junho de 2022, entendeu que
apenas é possível o Discovery prévio, com o apoio do judiciário americano, em casos
relacionados a ações e processos estatais ou intergovernamentais, o que exclui a arbitragem
comercial. Por isso, nos Estados Unidos ficou limitada a possibilidade de utilização do
discovery em apoio a arbitragens internacionais.

Loïc Cadiet e Emmanuel Jeuland14, na França, indicam que a existência de uma convenção
de arbitragem não é obstáculo à utilização do art. 145 do Códe de Procedure Civile antes da
instauração da arbitragem. No mesmo sentido, à luz do direito francês, Anne-Marie Batut
sustenta que o juiz do référé pode decidir tanto sobre medidas de conservação de provas
quanto sobre sua produção autônoma15. O entendimento decorre do julgamento do caso
Societé Eurodisney, de 1995, pela Corte de Cassação francesa. Naquele caso ficou
estabelecido que a atuação do juiz não serviria apenas para a concessão de medidas
probatórias urgentes, mas que o teor do art. 145 do Code de Procédure Civile permitiria a
produção imediata da prova, já que o conteúdo do art. 1458 do Code de Procédure Civile, que
dispõe sobre a incompetência do juiz estatal para julgar o fundo de uma controvérsia
abrangida por convenção de arbitragem, não restringiria a medida de instrução in futurum16.

José Zakia e Gabriel Visconti sustentam que, no direito brasileiro, a ação de produção
antecipada de provas poderia ser proposta perante o Poder Judiciário, mas os autores fazem
essa afirmação a partir da premissa de que a produção antecipada de provas não seria uma
atividade jurisdicional17. Evidentemente, não se concorda com a afirmação e,
particularmente, com a premissa adotada, já que é certo que a produção antecipada de
provas é hipótese de claro exercício da jurisdição, com a análise de uma pretensão à
produção de prova, como exposto neste trabalho.

Arthur Arsuffi entende que a jurisdição arbitral é excepcional e que apenas a partir de uma
previsão específica da convenção de arbitragem seria possível uma interpretação que exclua
a atuação do Poder Judiciário. Isso significa dizer que, ausente regra específica, a produção
autônoma de provas não se enquadraria na jurisdição do árbitro. A distinção entre direito de
provar e direito à prova seria, na visão do autor, particularmente relevante, sendo certo que
as partes de uma arbitragem ou de um conflito abrangido pela convenção de arbitragem
possuem direito de provar suas alegações, participando do processo arbitral e ali produzindo
prova. O direito de provar guarda estreita relação com o processo cujo objetivo principal é o
acertamento do direito, a declaração do direito material. Isso, contudo, não afasta o direito à
prova, sem que se requeira qualquer declaração sobre o direito material subjacente18,
justamente por a ação que objetiva a produção autônoma da prova ter objeto litigioso
próprio19. Por isso, a ação probatória autônoma não estaria abrangida pela convenção de
arbitragem, distinguindo-se da produção urgente da prova.

A questão recai, realmente, sobre a análise de convenção de arbitragem e da causa de


pedir que venha a ser deduzida para justificar o pedido de produção autônoma de prova. Em
outras palavras, considerando que a produção autônoma de provas veicula uma pretensão
própria, correlata ao direito à prova20, é preciso saber se o exercício processual desse direito
está ou não abrangido pelo âmbito da convenção de arbitragem. Mas, afirmar que é a partir
da verificação da abrangência da convenção que se saberá a quem compete decidir a questão
não é o mesmo que estabelecer a necessidade de previsão contratual específica para que se
reconheça a competência do árbitro.

Naturalmente, a arbitragem se justifica e se legitima pelo consenso, pela vontade das


partes em ter sua desavença dirimida arbitralmente. Nesse sentido, ela representa a
possibilidade de derrogação convencional da tutela pela jurisdição estatal, em prol de uma
jurisdição privada. Mas, se as partes desejaram ter um conflito ou os conflitos derivados de
determinada relação jurídica resolvidos por arbitragem, é preciso se entender que todas as
pretensões de direito relacionadas àquele conflito estão, em princípio, no âmbito de
abrangência da convenção de arbitragem, inclusive as pretensões de cunho probatório.
Nesse ponto, a produção de prova por antecipação, para utilização em um contencioso futuro,
está no âmbito da convenção de arbitragem21. Por exemplo, em uma disputa societária,
existindo cláusula de arbitragem nos instrumentos sociais e parassociais próprios, a
pretensão para prestação de contas ou a exibição de documentos não cautelar22 estão, em
princípio, no âmbito de abrangência da convenção de arbitragem. Ora, se o objetivo das
partes era o de que os litígios societários seriam resolvidos arbitralmente, não há razão para
distinguir o exercício do direito à prova neste contexto (litigioso) do exercício de qualquer
outro direito relacionado à relação jurídico-societária abrangida pela convenção. Não é
ocioso lembrar que as situações de urgência já encontram adequado tratamento, seja pela
utilização de cautelar pré-arbitral ou, mesmo, pela atuação do árbitro provisório. Vale, para a
conservação da prova que corre o risco de perecer, a regra do art. 22-A da Lei de Arbitragem,
sendo certa a possibilidade de propositura de ação cautelar nessa hipótese.

O simples fato de se cuidar de um direito à prova não ilide a vontade de se submeter à


arbitragem, caso a prova seja produzida tendo em vista o contencioso. Nesse caso, é possível
cogitar de uma arbitragem exclusivamente probatória23. Essa opção pode ser
pragmaticamente inconveniente, considerando os custos envolvidos em um processo arbitral,
mas decorre da força vinculante da convenção de arbitragem. O argumento de conveniência,
relacionado aos custos da arbitragem, é utilizado por autores que pretendem afastar a ação
probatória autônoma do âmbito da arbitragem24. Entretanto, ele não é suficiente para afastar
a convenção de arbitragem e, muito menos, a competência-competência dos árbitros para
decidir a questão. O tema deve ser analisado arbitralmente. As partes, ao negociarem e
optarem pela arbitragem, devem considerar as vantagens e desvantagens do instituto para o
seu caso, não podendo validamente se construir um raciocínio sobre a vinculabilidade da
convenção de arbitragem a partir de um juízo de “conveniência”. As partes optam pela
arbitragem e convivem com o instituto com suas vantagens e eventuais desvantagens. Não é
possível sustentar que o custo da arbitragem ou a dificuldade para a formação do tribunal
arbitral seria um fator para, dogmaticamente, se afastar a abrangência e a vinculabilidade da
convenção de arbitragem, em um contexto no qual não há urgência probatória.

Eduardo Talamini propõe uma solução intermediária. Para ele, em regra, a competência
seria dos árbitros, mas, excepcionalmente, seria possível afastar essa competência, em duas
situações. A primeira seria quando a própria produção da prova permitir definir os contornos
da pretensão do requerente, para saber se está abrangida pela convenção arbitral, e a
segunda seria quando se tiver indicativos de que não haverá colaboração ou haverá
resistência à produção da prova, pois seria necessário o poder de império do juiz estatal25.
Contudo, parece que os dois argumentos devem ser rejeitados. O primeiro por se tratar de
uma questão de abrangência da convenção de arbitragem. Ora, se não há clareza se uma
situação está ou não abrangida por convenção de arbitragem, a questão, em sendo levada ao
Judiciário, deverá ser dirimida na forma da exceção de arbitragem e, conforme o caso, com
extinção do processo sem resolução de mérito. O juiz, nesse contexto, detém poderes para
analisar o escopo da convenção de arbitragem. Mas isso em nada tem relação com responder
concretamente se a produção autônoma da prova pode ser feita fora da arbitragem ou não.
Sempre é preciso analisar a própria convenção (interpretação contratual). O segundo
argumento também não se sustenta; ou se teria que admitir que todas as pretensões de
obrigação de fazer ou de cunho mandamental e executivo (carga preponderante do
provimento) estariam excluídas de antemão da arbitragem, pelo simples fato de
eventualmente ser necessário o concurso de atos coercitivos judiciais. Não é isso o que
ocorre, evidentemente. O árbitro decide a questão e, cooperativamente, o juiz dará efeito à
medida, mas isso não significa que caiba ao juiz apreciar o mérito da pretensão. Na verdade,
a solução mais escorreita é na linha preconizada pelo § 2º do art. 22 da Lei de Arbitragem, que
estabelece que o árbitro poderá requerer cooperação do Poder Judiciário para a condução da
testemunha renitente. Por isso, a questão é analisada e decidida pelo árbitro, caso seja
necessária a prática de ato de império, então, será requisitada a cooperação jurisdicional.

Saber se uma pretensão probatória apresentada autonomamente – e sem o requisito da


urgência – poderá ser processada perante o Poder Judiciário depende da análise do objeto
litigioso deduzido na ação probatória em confronto com o âmbito de abrangência da
convenção de arbitragem. Por outro lado, se o pedido de produção de prova se dá para a
simples documentação de fato, sem caráter contencioso, âmbito clássico da ação de
justificação, parece mais difícil enquadrar essa hipótese no âmbito de abrangência de uma
determinada convenção de arbitragem. De qualquer maneira, em regra, devidamente
considerada a abrangência da convenção de arbitragem, a produção de prova por
antecipação, para utilização em processo contencioso que deverá se desenvolver
arbitralmente, não pode ser feita perante o Poder Judiciário, salvo se presente o risco de
perecimento da prova (urgência).

A questão tem sido apresentada para discussão dos tribunais brasileiros, particularmente
no Tribunal de Justiça de São Paulo, e, pelo grande número de casos relacionados à
arbitragem que julga e a existência de varas especializadas, é possível observar um
movimento de consolidação de entendimento sobre a matéria.

O Tribunal de Justiça de São Paulo, inicialmente, teve decisão admitindo a produção


antecipada da prova “proposta com a finalidade de estabelecer um ambiente adequado para a
instauração de um juízo arbitral”, mesmo ausente qualquer elemento de urgência. Foi
indicado que o processo teria a finalidade “de apoio” à arbitragem e, por isso, seria possível,
“mesmo sem uma urgência premente, o deferimento da tutela discutida, desde que
demonstrada a potencial utilidade dos elementos fáticos a serem colhidos e conservados”26.

Em casos posteriores, o Tribunal de Justiça de São Paulo tem admitido a produção


antecipada de provas relacionadas à arbitragem futura em situações de urgência27,
rejeitando sua produção na ausência de periculum in mora28-29. No entendimento que se
firmou no Tribunal de Justiça de São Paulo, cabe ao árbitro decidir as pretensões probatórias
de caráter não urgente, que estejam abrangidas por convenção de arbitragem30. A conclusão
tem sido pela extinção das ações sem resolução de mérito e sem incursão sobre a questão
probatória pretendida, que deverá ser requerida e discutida arbitralmente.

O entendimento da jurisprudência, no âmbito do Tribunal de Justiça de São Paulo, tem


sido no sentido de não ser possível a produção antecipada de prova, ausente situação de
urgência probatória, para as matérias abrangidas por convenção de arbitragem.
FOOTNOTES

.LESSA NETO, João Luiz. Arbitragem e Poder Judiciário: a definição da competência do


árbitro. Salvador: Juspodivm, 2016, p. 43-45.

.Sobre a tutela de urgência judicial pré-arbitral: MANGE, Flavia Fóz. Medidas de Urgência nos
Litígios Comerciais Internacionais. Rio de Janeiro: Renovar, 2012, p. 137-138.

.CARMONA, Carlos Alberto. Arbitragem e processo: um comentário à Lei nº 9.307/1996.


3. ed. São Paulo: Atlas, 2009.

10

.Heitor Sica pondera a efetividade do árbitro de emergência para efetivamente produzir uma prova
urgente em comparação com o procedimento relativamente singelo da produção autônoma de
prova judicial. SICA, Heitor. Direito à prova e efetiva participação no processo. In: VALENÇA
FILHO, Clávio; VISCONTE, Debora, LESSA NETO, João Luiz; PERETTI, Luís (orgs.). Debates de
Arbitragem e Processo Ano II – Direito Probatório entre a Arbitragem e o Processo Civil.
São Paulo: CIESP, 2017, p. 50.

11

.Esta já era a solução antes mesmo da reforma da Lei de Arbitragem e do advento do CPC/2015,
vide: YARSHELL, Flávio Luiz. Brevíssimas notas a respeito da produção antecipada da prova na
arbitragem. In: Revista de Arbitragem e Mediação. São Paulo: RT, 2007, v. 14.

12

.Antes da reforma da Lei de Arbitragem, em 2015, já existiam precedentes reconhecendo a


produção antecipada à arbitragem de prova urgente: MEDIDA CAUTELAR DE PRODUÇÃO DE
PROVAS ANTERIOR À CONSTITUIÇÃO DO TRIBUNAL ARBITRAL. Acolhimento do pedido de
perícia, em razão do evidente periculum in mora. Após a conclusão dos trabalhos do expert, o
laudo deverá ser remetido aos interessados ou entregue aos árbitros. […]

Verifica-se que a convenção de arbitragem representa uma hipótese de cláusula compromissória


cheia, porque estão definidos os critérios para nomeação dos árbitros. Portanto não há necessidade
de ajuizar a ação do art. 7º da Lei nº 9.307/1996, o que não impede de afirmar que existe um vácuo
temporal até que se instale o juízo arbitral, criando um espaço para de risco para situações que
reclamem soluções urgentes. Exatamente para eliminar os problemas dessa lacuna, a doutrina,
com inegável bom-senso, admite que a parte recorra Judiciários, nos termos do art. 800 do CPC.
BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. MC 494.408-4/6. Rel. Des. Enio Santarelli Zuliani, j.
28/06/2007.

13

.“However, disclosure will not be ordered where the dispute comes within the terms of an
arbitration agreement as the proceedings would be referred to arbitration rather than tried in
court”. ZUCKERMAN, Adrian A. Zuckermann on Civil Procedure. 3a ed. Londres: Sweet&Maxwell,
2013, p. 4.

14

.“... la demande doit être formée avant tout procès, ce qui s’entend ‘avant saisine de la juridiction
compétente’, qui peut être une juridiction étatique ou une juridiction arbitrale dès lors, bien sûr,
que le Judge du fond est appelé à être saisi du même litige”. CADIET, Loïc; JEULAND, Emmanuel.
Droit Judiciaire Privé. 9. ed. Paris: LexisNexis, 2016, p. 511. Vide, particularmente, a nota de
rodapé nº 188 na mesma página.

15

.O refinamento que requeria distinção entre a produção de provas conservativa e sem urgência não
foi acolhido pela jurisprudência francesa: “Ces pouvoirs que le juge des référés peut exercer en
amont de la saisine de l’arbitre ont d’ailleurs été admis depuis longtemps par la Cour de cassation,
avant même que les textes qui ont fondé le nouveau Code de procédure civile aient accru les
pouvoirs de ce juge (Civ. 2, 4 décembre 1953, D.S. 1954, p. 108). Il en est donc logiquement ainsi
pour l’application de l’article 145 (Civ. 3, 20 décembre 1982, Bull. n° 260 ; Civ. 2, 11 octobre 1995,
Bull. n° 235) “L’existence d’une convention d’arbitrage ne fait pas obstacle au pouvoir du juge des
référés d’ordonner, sur le fondement de l’article 145 du nouveau Code de procédure civile, et avant
saisine de la juridiction compétente, toutes les mesures d’instruction légalement admissibles, qui
ne se limitent pas aux constatations”. Cette dernière précision est importante, car elle met un
terme à un raisonnement - tenu notamment par le demandeur au pourvoi dans l’affaire ayant
donné lieu à l’arrêt de 1995 - selon lequel le recours au juge étatique, avant saisine de la
juridiction arbitrale, serait limité aux simples mesures conservatoires, ce qui ne permettrait
d’obtenir que des constats qui empêchent le dépérissement des preuves. En revanche, prescrire
une expertise qui, à la différence de la mesure de constatation, implique qu’un avis soit demandé
au technicien, empiéterait sur les pouvoirs de l’arbitre. En réalité, dès lors que le juge des référés
peut appliquer l’article 145, il n’y a aucune raison de limiter ses pouvoirs à la prescription des
seules constatations et en tout état de cause, la désignation d’un expert au titre de ce texte reste
une mesure provisoire, dépourvue au principal de l’autorité de la chose jugée, les conclusions de
l’expert ne liant pas le juge du fond (arbitral ou étatique). Et par ailleurs l’étendue de la mission
confiée à l’expert relève du pouvoir souverain du juge qui prescrit la mesure, dès lors, du moins,
qu’il ne lui demande pas de se prononcer sur des questions juridiques.” BATUT, Anne-Marie. Les
mesures d’instruction “in futurum”. In: Rapport de la Court de Cassation 2000. Paris: La
Documentation Française, 2001.

16

.Eis a ementa do julgado: “ARBITRAGE - Clause compromissoire - Portée - Référé - Mesure


d’instruction - Pouvoir de l’ordonner avant la saisine de la juridiction compétente. L’existence d’une
convention d’arbitrage ne fait pas obstacle au pouvoir du juge des référés d’ordonner, sur le
fondement de l’article 145 du nouveau Code de procédure civile, et avant saisine de la juridiction
compétente, toutes les mesures d’instruction légalement admissibles, qui ne se limitent pas aux
constatations.” FRANÇA. Cour de Cassation. N° de pourvoi: 92-20496. 2e Chambre Civile. Rel.
M. Buffet. j. 11 out. 1995.

17

.“Não havendo prestação jurisdicional, também não há necessidade de que a produção autônoma
de provas seja requerida em arbitragem – mesmo caso haja convenção de arbitragem. A
arbitragem, enquanto método jurisdicional, não se presta a outra função que não pacificar e
solucionar litígios por meio da aplicação do direito ao caso concreto através de procedimento,
respeitando as garantias processuais. Requerer dos árbitros que simplesmente determinem a
produção de certa prova, por meio desse procedimento suis generis, parece-nos desvirtuar o
próprio instituto da arbitragem.” ZAKIA, José Victor Palazzi; VISCONTI, Gabriel Caetano. Produção
antecipada de provas em arbitragem e jurisdição. In: Revista de Arbitragem e Mediação. São
Paulo: RT, 2018, v. 59.

18

.O autor segue a distinção proposta por Yarshell, para justificar a sua conclusão. Sobre direito à
prova e direito de provar, vide: YARSHELL, Flávio Luiz. Antecipação da Prova sem o Requisito
da Urgência. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 312-313.

19

.“Ou seja, a ação de produção antecipada da prova sem o requisito da urgência tem como objeto
uma relação jurídica diversa daquela que envolve a declaração do direito material em determinado
caso concreto. Trata-se de uma segunda relação jurídica, onde a obtenção autônoma da prova é
protagonista. O que as partes pretendem com o ajuizamento dessa ação não é a declaração do
direito material, mas apenas e tão somente a i) declaração de que existe o direito a obtenção
daquela determinada prova; ii) a obtenção da prova.” ARSUFFI, Arthur Ferrari. Produção
Antecipada da Prova: Eficiência e Organização do Processo. 2018. Dissertação (Mestrado em
Direito) – Faculdade de Direito da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo.

20

.DIDIER JUNIOR, Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de Direito Processual
Civil. Salvador: Juspodivm, 2015, v. 2, p. 42.

21

.“Em princípio, as ações probatórias autônomas relativas a determinado litígio estão abrangidas
pela convenção arbitral para ele estipulada. Então, não havendo urgência que impedisse aguardar-
se o início da arbitragem, a produção antecipada da prova para fins não cautelares normalmente
deveria ser feita em processo arbitral específico para tal fim.” TALAMINI, Eduardo. Produção
antecipada de prova no Código de Processo Civil de 2015. In: Revista de Processo. São Paulo: RT,
2016, v. 260.

22

.“Se o sócio quer se inteirar do conteúdo de algum documento, conforme direito emergente da
relação jurídica societária, pode se valer da ação exibitória independentemente de outra ação
principal futura. Esse pedido não terá finalidade probatória, constituindo tão-somente exercício de
direito sobre o conteúdo do documento e isto porque a relação de direito material estabelece uma
obrigação de comunicação do documento, a que corresponde a pretensão de exibição. A demanda
exibitória, nessa hipótese, nada compreenderá de cautelar e muito menos antecederá a outra: a
exibição do documento desde logo satisfará o direito do sócio.” LACERDA, Galeno. Comentários
ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 1988, v. VIII, p. 302.

23

.SICA, Heitor. Direito à prova e efetiva participação no processo. In: VALENÇA FILHO, Clávio;
VISCONTE, Debora; LESSA NETO, João Luiz; PERETTI, Luís (orgs.). Debates de Arbitragem e
Processo Ano II – Direito Probatório entre a Arbitragem e o Processo Civil. São Paulo:
CIESP, 2017, p. 56-57.

24

.MAZZOLA, Marcelo. Temas contemporâneos na arbitragem: do clássico ao circuito alternativo e


alguns “curtas-metragens”. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, 2019, v. 291.

25

.“Mas podem existir fatores que concretamente justifiquem a antecipação probatória perante a
autoridade judiciária. É o que se dá, entre outros casos, quando apenas a própria produção da
prova permitirá ao requerente definir os exatos contornos de sua pretensão, inclusive para saber
se ela está efetivamente abrangida pela convenção arbitral. Outro exemplo tem-se em casos em
que, diante de indicativos concretos, sabe-se de antemão que haverá negativa de colaboração ou
resistência à produção probatória, de modo a exigirem-se medidas coercitivas que apenas
poderiam ser determinadas, em qualquer caso, pelo juiz estatal (Lei 9.307/1996, art. 22, §§ 2.º e
4.º). Nessa hipótese, parece razoável que a medida de produção antecipada seja desde logo
requerida judicialmente. Além disso, pode haver situações em que a produção probatória que se
pretende antecipar é extremamente singela e de curta duração (por exemplo, ouvida de uma única
testemunha), de modo que seria desproporcional, por sua extrema onerosidade, complexidade e
demora, constituir um tribunal arbitral apenas para isso. Também em tais casos justifica-se a
competência judiciária.” TALAMINI, Eduardo. Produção antecipada de prova no Código de
Processo Civil de 2015. In: Revista de Processo. São Paulo: RT, 2016, v. 260.

26

.BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo. AC 1093560-14.2016.8.26.0100, 1ª Câmara


Reservada de Direito Empresarial, Rel. Des. Fortes Barbosa, J.20/04/2017, DJe 20/04/2017.
27

.“PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVAS – Exibição de documentos - Extinção sem julgamento de


mérito afastada – Cláusula compromissória que autoriza a adoção de medidas urgentes e
preparatórias à instituição do procedimento arbitral – Inteligência do art. 22-A da Lei 9.307/96 –
Presentes os requisitos de aparência de bom direito e perigo na demora, ressalvado futuro exame
exauriente pelo Juiz natural, o Tribunal arbitral – Recurso provido.” BRASIL. Tribunal de Justiça de
São Paulo, AC 1005869-83.2021.8.26.0100, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Rel.
Des.: J. B. Franco de Godoi, J. 11/05/2022, DJe 20/05/2022.

28

.“PRODUÇÃO ANTECIPADA DE PROVA – CONTRATO FIRMADO ENTRE AS PARTES QUE PRÊVE


CLÁUSULA DE CONVENÇÃO DE ARBITRAGEM - EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM JULGAMENTO
DO MÉRITO - ARTS. 485, VII, CPC - Antes de instituída a arbitragem, cabe ao Poder Judiciário
analisar os pedidos de medida cautelar ou de urgência – Art. 22-A da Lei nº 9.307/96 – No caso em
apreço, não se vislumbra situação de urgência, o que afasta a possibilidade de apreciação do litígio
pelo Poder Judiciário – Atendimento dos requisitos da Lei nº 9.307/96 – Extinção do processo, sem
julgamento do mérito, que fica mantida – RECURSO DESPROVIDO.” BRASIL. Tribunal de Justiça de
São Paulo, AC 1016776-28.2018.8.26.0002, 2ª Câmara Reservada de Direito Privado, Rel. Des.
Sérgio Shimura, j. 06/10/2020, DJe 07/10/2020.

29

.BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo, AC 1008523-70.2020.8.26.0361, 2ª Câmara


Reservada de Direito Privado, Rel. Des. Sérgio Shimura, j. 11/08/2022, DJe 11/08/2022.

30

.Neste sentido, trecho do voto condutor da Apelação Cível nº 125900-40.2018.8.26.0100: “o Poder


Judiciário não apresenta a competência para julgar a matéria aventada, pois as alegações da
apelante não estão ungidas pelo risco iminente de dano irreparável ou de difícil reparação, de
modo que não é possível excluir da arbitragem, a pretensão de exibição de documentos, como
exercício do direito à prova... Cabe ao juízo arbitral resolver as controvérsias existentes entre as
partes, quanto ao direito à prova.” BRASIL. Tribunal de Justiça de São Paulo, AC 1125900-
40.2018.8.26.0100, 1ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Rel. Des. Alexandre Lazzarini,
J. 21/08/2019, DJe 06/09/2019.
13 SEP 2023 PAGE RB-8.4

Provas e Arbitragem - Ed. 2023


I. ARBITRAGEM: PROVA E PROCESSO
8. A produção antecipada de provas em situações não urgentes, o poder judiciário e a
convenção de arbitragem
IV. Conclusões

IV. CONCLUSÕES

A produção antecipada de provas, em situação relacionada à convenção de arbitragem,


dependerá da análise tanto do objeto (pretensão material) deduzido na ação judicial quanto
do conteúdo material da convenção de arbitragem, para que se considere sua abrangência.

As situações de urgência probatória pré-arbitral devem seguir a solução estabelecida nos


arts. 22-A e 22-B da Lei de Arbitragem, admitindo-se a intervenção judicial, para preservar a
prova para instrução de futura arbitragem (ad perpetuam rei memoria). Adicionalmente, se o
pedido de produção de prova se dá para a simples documentação de fato, sem caráter
contencioso, âmbito clássico da ação de justificação, é possível a documentação judicial do
fato, pela ausência de elemento contencioso.

Em regra, devidamente considerada a abrangência da convenção de arbitragem, a


produção de prova por antecipação, para utilização em processo arbitral, deverá ser levada à
apreciação do próprio árbitro, não pode ser feita perante o Poder Judiciário, como
consequência dos efeitos negativo e positivo da convenção de arbitragem. Inexistem razões
para o direito à prova ter tratamento distinto de qualquer outra situação, considerando que
ele é, em si, arbitrável.

© desta edição [2023]

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