Você está na página 1de 37

INSTITUIÇÃO TOLEDO DE ENSINO

CURSO DE DIREITO

LUIS RAMON MARTIN GAMEIRO

PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS NO BRASIL

BOTUCATU
2023

LUIS RAMON MARTIN GAMEIRO


PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS NO BRASIL

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado à Banca


Examinadora do Curso de Direito, Faculdade Iteana de Botucatu, mantido
pela Instituição Toledo de Ensino, para a obtenção do grau de bacharel em
Direito, sob a orientação da Prof. Tatiana Stroppa).

BANCA EXAMINADORA

________________________________________
Prof. (Tatiana Stroppa)
Afiliações

________________________________________
Prof. (Nome do professor avaliador)
Afiliações

________________________________________
Prof. (Nome do professor avaliador)
Afiliações

________________________________________
Prof. (Nome do professor avaliador)
Afiliações

01/12/2023

RESUMO
O presente trabalho busca apresentar a eficácia, ineficácia e a adequação
das medidas de prisão civil como meio coercitivo para o cumprimento das
obrigações de alimentar, considerando as implicações legais e os impactos sociais
desta abordagem, sendo levantado a discussão sobre outros métodos de coerção
da falta de pagamento de alimentos devidos. Foram utilizadas decisões judiciais e
doutrinais para abordar o tema e explicar suas origens jurídicas e como isso reflete
na dignidade humana. Desta forma, o trabalho passa pelas características da
obrigação de alimentar, classificação dos alimentos, a ineficácia da prisão civil e
outros métodos alternativos e por fim a prisão civil durante a pandemia da COVID-
19.

Palavras-chave: Alimentos; Dignidade humana; Prisão Civil

ABSTRACT

The present work seeks to present the effectiveness, ineffectiveness and


adequacy of civil prison measures as a coercive means for fulfilling food obligations,
considering the legal implications and social impacts of this approach, demonstrating
that food is a benefit to satisfy needs. that ensure the individual's subsistence.
Discussion is being raised about other methods of coercing non-payment of owed
alimony. Finally, jurisprudential and doctrinal aspects were used to address the topic
and explain its legais origins and how it reflects on human dignity. In this way, the
work goes through the characteristics of the obligation to feed, food classification, the
ineffectiveness of civil imprisonment and other alternative methods and finally civil
imprisonment during the COVID-19 pandemic.

Keywords: Foods; Human dignity; Civil arrest


SUMÁRIO

1.INTRODUÇÃO................................................................................................................. 5

2. ALIMENTOS E A OBRIGAÇÃO DE ALIMENTAR...............................................6


2.1 CONCEITO DE ALIMENTOS................................................................................... 6
2.1.2 CARACTERISTICAS DA OBRIGAÇÃO DE ALIMENTAR............................9
2.1.3 FUNDAMENTOS E NATUREZA JURIDICA................................................... 12
2.1.4 CLASSIFICAÇÃO DOS ALIMENTOS............................................................... 15
2.1.5 EXECUÇÃO DE ALIMENTOS............................................................................ 16
2.1.6 FIM DO DIREITO.................................................................................................... 19

3. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS .............................................. 21


3.1 NASCIMENTO DAS PRISÕES.............................................................................. 21
3.1.2 CONCEITO E NATUREZA JURIDICA DA PRISÃO CIVIL.........................23
3.1.3 INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL......................................................................... 24
3.1.4 ALTERNATIVAS A PRISÃO CIVIL.................................................................... 27
3.1.5 PRISÃO CIVIL NA PANDEMIA COVID-19...................................................... 29

4. CONCLUSÂO................................................................................................................ 30

5. REFERÊNCIAS............................................................................................................. 32
5

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho propõe-se a uma análise meticulosa das bases legais que
fundamentaml a prisão civil por inadimplência alimentar, explorando suas
implicações sociais e as nuances que permeiam sua aplicação prática.
Essa modalidade de sanção revela-se como complexa, com grande
relevância social e revela-se não apenas como um instrumento jurídico, mas sim
como uma peça crucial na engrenagem que busca conciliar a tutela da dignidade
humana, expressa no direito à alimentação, e a guarda dos princípios fundamentais
da liberdade individual onde existe um país marcado pela diversidade dos arranjos
familiares e pela dinâmica das relações interpessoais e afetivas.
A proteção do ser humano se desdobra em várias atuações e preocupações
cabendo considerar a ação de alimentos via garantidora da dignidade da pessoa
humana. A existência de normas tem o condão de enunciar e declarar direitos e
deveres, entretanto, a garantia, e efetiva aplicação destes demonstra complexidade
jurídica, posto que, mesmo existindo leis que asseguram o direito a alimentos como
direito humano, demonstra realidade diversa com inúmeras situações em que a lei
não é capaz de atender as necessidades vitais do alimentando. A proteção de
mandamentos normativos em determinadas situações exige atuação contundente
do Estado. Deste modo, a prisão civil apresenta-se como medida coercitiva
necessária que se justifica pelo caráter ímpar da obrigação alimentar, visando
proteger e assegurar a dignidade e o direito à vida do alimentado.
Almeja-se explorar esta temática, estabelecendo um percurso argumentativo
entre a restrição da liberdade individual e a potencial violação dos direitos e
garantias fundamentais que são inerentes ao cidadão. Além disso, pretende-se
6

investigar se existem abordagens mais eficazes para abordar esse dilema social, o
que, reflete uma possível ineficácia da prisão civil do devedor de alimentos.
A prisão civil é uma medida excepcional em nosso sistema jurídico, pois a
Constituição Federal geralmente proíbe sua aplicação com base em dívidas
contraídas. No entanto, sua utilização é justificada pela ponderação de princípios
que visam proteger os interesses do alimentante, assegurando que ele não fique
desamparado. Essa medida busca, principalmente, dar efetividade ao preceito
normativo em situações de gravidade considerável. O Estado deve buscar a
efetivação dos direitos e deveres previstos na Constituição, recorrendo a
mecanismos, inclusive coercitivos, para garantir a observância dos fundamentos. A
obrigação alimentar, que transforma o dever moral de assistência em uma
obrigação jurídica de alimentos, pode ser sujeita a medidas coercitivas para
assegurar o cumprimento adequado e efetivo do mandamento legal, permitindo o
uso rigoroso e a força do estado quando necessário.
Apesar de as disposições do Código Civil de 2015, nos artigos 528 ao 533,
não apresentaram inovações significativas sobre o assunto, a intenção é
proporcionar uma perspectiva renovada a este objeto de estudo, cuja origem
remonta a instituição da obrigação alimentar e culmina na imposição da prisão civil
por dívida.
O presente trabalho visa contribuir para um entendimento mais profundo e
abrangente sobre a prisão civil do devedor de alimentos, e alternativas, além de
apresentar o conceito de alimentos, classificação de alimentos e prisão civil durante
a pandemia da COVID-19 alinhando-se a busca por uma sociedade justa, solidária e
igualitária.
7

2. ALIMENTOS E A OBRIGAÇÃO DE ALIMENTAR

2.1 CONCEITO DE ALIMENTOS

Os alimentos correspondem a uma prestação destinada ao alimentante,


sendo indispensável para sua subsistência e para manutenção de sua condição
social. Portanto são as prestações devidas para a satisfação das necessidades
pessoais daquele que não pode provê-las sozinho.
Por sua vez, o conceito de alimentos é definido como:

Tudo o que é necessário para satisfazer aos reclamos da vida; são as


prestações com as quais podem ser satisfeitas as necessidades vitais de quem
não pode provê-las por si; mais amplamente, é a contribuição periódica
assegurada a alguém, por um título de direito, para exigi-la de outrem, como
necessária à sua manutenção (CAHALI 2017, p. 15).

Por outro lado, conceito de alimentos, pode ser entendido de forma extensiva:

Os alimentos, em direito, denominam-se a prestação fornecida a uma


pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades
da vida. A palavra tem conotação mais ampla do que na linguagem vulgar, em
que significa o necessário para o sustento. Aqui trata-se não só do sustento,
como também do vestuário, habitação, assistência médica em caso de
doenças. (RODRIGUES, 2008, p. 374)

Trata-se da manutenção da integridade de uma pessoa em diversos aspectos


e perspectivas. Portanto traz à luz a dignidade humana que está prevista como
sendo um princípio constitucional. A dignidade humana se revela fundamento da
República (art. 1º, III), constituindo, pois, o valor constitucional supremo em torno do
qual gravitam os demais direitos fundamentais que se tornarão garantidores das
mínimas condições de respeito e sobrevivência do indivíduo, no âmbito das relações
sociais. (BRASIL, 1998).
A fixação dos alimentos é baseada em uma regra de equidade, o trinômio,
necessidade, possibilidade e razoabilidade conforme disposto no artigo (1694) do
Código Civil de 2002.
8

Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns


aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com
a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua
educação.
§ 1o Os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades
do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada.

Sendo assim, o alimento pode estar além da necessidade básica de


alimentar, mas como maneira efetiva para o desenvolvimento da criança, tendo em
vista a saúde, educação e outras necessidades básicas apresentadas, como
descrito por Destefani (2006), compreende-se que os alimentos são intrínsecos ao
ser humano e possuem o escopo de suprir as necessidades imprescindíveis de
vida, cruzando uma obrigação jurídica com preceitos de ordem moral e afetiva.
Assim, os alimentos visam proteger a vida e a dignidade humana.
Segundo Destefani (2006), é necessário ressaltar que a obrigação alimentar
tem caráter personalíssimo, isto é, não se transmite, quando do falecimento, aos
herdeiros do prestador de alimentos, salvo se houver dívidas alimentares vencidas
até o falecimento do alimentante.
É fundamental expor que, portanto, não é a obrigação alimentar que se
transmite, portanto está se extingue com o falecimento do devedor. O que se
entende por transmissível, por conseguinte, é dívida já constituída, ou seja, as
prestações porventura em atraso quando da morte do alimentante, pela
declaraçãoexegese que se extrai da redação do artigo 1.694 do vigente Código
Civil.
A jurisprudência No recurso especial do Superior Tribunal de Justiça tal .....,
por conseguinte, tem esta mesma visão como podemos ver:

Alimentos. Ação julgada procedente. Morte do alimentante. I - A obrigação de


prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor, respondendo a
herança pelo pagamento das dívidas do falecido. Lei nº 6. 515, de 1977, art. 23,
e Código Civil, art. 1796. Aplicação. II - A condição de alimentante é
personalíssima e não se transmite aos herdeiros; todavia, isso não afasta a
responsabilidade dos herdeiros pelo pagamento dos débitos alimentares
verificados até a data do óbito." (REsp 64112-SC, Rel. Min. Antônio de Pádua
Ribeiro, 3ª. Turma, julg. 16.05.2002, pub. DJU 17.06.2002).
9

Segundo Dias (2020), O o mais proeminente adjetivo que os alimentos


recebem é de serem um direito personalíssimo. Pois, servem para garantir a
sobrevivência de quem não tem condições de contribuir por si mesmo.
Assim, descreve “Como o direito a alimentos é personalíssimo, com a morte
do credor extingue-se a obrigação, mas não o débito alimentar, cujo pagamento se
transforma em encargo do espólio” (DIAS, 2020, p.29)
Existem duas características do direito de alimentos que decorrem de sua
natureza personalíssima: é indisponível e incompensável. Trata-se de direito
subjetivo, que, em regra não pode ser objeto de qualquer espécie de negócio
jurídico destinado a cedê-lo. É creditada, no entanto, a cessão de créditos
alimentares em atraso, o que diferencia da cessão do direito a alimentos.
O Código Civil de 2015, complementa em seu artigo 1700, também a
transmissibilidade da obrigação alimentar em dispositivo legal, sendo totalmente
transmissível aos herdeiros do devedor.
A alienabilidade dos alimentos, ao lado da incindibilidade, impenhorabilidade
e incompreensibilidade, decorrem do caráter personalíssimo dos alimentos, que
compõe sua característica de indisponibilidade.
A irrenunciabilidade do direito a alimentos, também expressa no Código Civil,
sendo que o crédito alimentar não pode ser objeto de cessão, compensação ou
penhora. Há somente a possibilidade de o credor não exercer o direito. Pode ser
citado o fundamento do (art.11) do Código Civil, cujo, salvo as exceções previstas
em lei, os direitos da personalidade são intransmissíveis e irrenunciáveis, não
podendo seu exercício sofrer limitações que não sejam involuntárias.

2.1.2 CARACTERISTICAS DA OBRIGAÇÃO DE ALIMENTAR

Desde o momento da concepção os seres humanos são dependentes. Em


outras palavras, todos necessitam de alguém que assuma a responsabilidade por
seu sustento durante um período determinado. Nessa perspectiva, descreve Cahali
(2009):
10

A doutrina, de maneira uniforme, inclusive com respaldo na lei,


identifica duas ordens de obrigações alimentares, distintas, dos pais para com
os filhos: uma resultante do pátrio poder, consubstanciada na obrigação de
sustento da prole durante a menoridade (CC, art. 231, IV); e outra, mais ampla,
de caráter geral, fora do pátrio poder e vinculada à relação de parentesco em
linha reta (CAHALI, 2009, p.450).

O artigo (1.724) do Código Civil, traz um rol sobre os deveres nas relações:
“Art. 1.724. As relações pessoais entre os companheiros obedecerão aos deveres
de lealdade, respeito e assistência, e de guarda, sustento e educação dos filhos”
(BRASIL, 2002).
A respeito do comprometimento ao vínculo de alimentar, é descrito por Dias
(2006, p.34): “Assim, quem ama, seja quem for, assume deveres, encargos e
obrigações. Quem é amado tem direitos. Como o afeto gera ônus e bônus, aí situa-
se a natureza da obrigação alimentar”.
Assim complementa o autor, a respeito do subsídio necessário fornecido a
criança;
O alimento, em Direito, denomina-se a prestação fornecida a uma
pessoa, em dinheiro ou em espécie, para que possa atender às necessidades
da vida. A palavra tem conotação muito mais ampla do que na linguagem
vulgar, em que significa o necessário para o sustento. Aqui se trata não só do
sustento, como também do vestuário, habitação, assistência médica em caso
de doença, enfim de todo o necessário para atender às necessidades da vida;
e, em se tratando de criança, abrange o que for preciso para sua instrução
(RODRIGUES, 2004, p.374).

A compreensão das diferentes facetas dessa obrigação, desde as bases


legais e princípios que a orientam até as implicações sociais e abrangência
ampliada proposta por Rodrigues (2004), revela a intrincada rede de
responsabilidades que se estabelece nas relações familiares. Assim, esse
panorama enriquece a compreensão do papel fundamental da obrigação alimentar
no contexto jurídico brasileiro, evidenciando sua natureza multifacetada e sua
importância na promoção do bem-estar e da justiça nas relações familiares.
A obrigação e o direito a alimentos não alcançam todos os parentes. Com
efeito, o Código Civil Brasileiro de 2002 em seu artigo (1.696) e (697), normatiza
que a obrigação e direito dos alimentos cabem inicialmente aos ascendentes e
11

descendentes (parentesco em linha reta) sem limite de graus, recaindo a obrigação


nos mais próximos em grau, uns em falta de outros. Caso falte parentes em linha
reta, a obrigação caberá aos irmãos, sejam germanos ou unilaterais.
O limite de responsabilidade estipulado pela lei não implica um isolamento
individual dos parentes em relação à obrigação ou ao direito aos alimentos. O artigo
1698(1.698) do Código Civil Brasileiro aborda essa questão, estabelecendo uma
forma de solidariedade entre todas as partes envolvidas.
Em outras palavras, a legislação reconhece que a obrigação alimentar não
recai exclusivamente sobre um único parente, mas, sim, solidariamente sobre todos
aqueles que possuem o dever de prestar alimentos. Essa abordagem reflete a
compreensão de que a responsabilidade alimentar é compartilhada entre os
familiares, assegurando uma distribuição equitativa da obrigação e respeitando as
peculiaridades de cada situação. O Código Civil Brasileiro de 2002 em seu artigo
(1.698) estabelece uma forma de solidariedade entre todos os envolvidos, descrito
da seguinte forma;

Artigo 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não


estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a
concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar
alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e,
intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a
lide

Além do natural vínculo de parentesco, a Lei Civil criou outra espécie de


vínculo entre cônjuges e companheiros denominado “afinidade”. Nesse sentido, o
art. (1.595) do Código Civil declara que “cada cônjuge ou companheiro é aliado aos
parentes do outro pelo vínculo da afinidade. § 1º O parentesco por afinidade limita-
se aos ascendentes, aos descendentes e aos irmãos do cônjuge ou companheiro. §
2º Na linha reta, a afinidade não se extingue com a dissolução do casamento ou da
união estável”. Esse “vínculo” também tem o efeito de criar a obrigação e/ou o
direito a alimentos. No caso dos cônjuges, basta a juntada da certidão de
casamento; já no caso dos companheiros, será necessária previamente a prova de
12

que o relacionamento existente entre eles caracteriza realmente “união estável”


(vejam-se os requisitos no Capítulo 6 – Da União Estável e do Concubinato).
O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e filhos, e extensivo
a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais próximos em grau, uns em
falta de outros. Segundo o artigo (1.696) do atual Código Civil de 2002:

Art. 1.696. O direito à prestação de alimentos é recíproco entre pais e


filhos, e extensivo a todos os ascendentes, recaindo a obrigação nos mais
próximos em grau, uns em falta de outros.

Por outro lado, o Estatuto do Idoso assegura alimentos às pessoas idosas,


fazendo referência à legislação civil. Essa legislação atribui a responsabilidade
alimentar aos parentes, cônjuges e companheiros. Entretanto, ao impor ao próprio
Estado o dever de prestar assistência aos idosos, este Estatuto vai além da
obrigação que decorre da solidariedade familiar.
Portanto, na falta de parentes em condições econômicas suficientes de
prover o sustento de quem tiver mais de 60 anos, o encargo passa a ser do Poder
Público, no âmbito da assistência social. A partir dos 65 anos de idade, quem não
tiver como garantir a própria subsistência, e nem parentes que garantam seu
provimento existencial, tem direto a um benefício mensal no valor de um salário-
mínimo (Estatuto do Idoso, art.14).
Além disso, o Estatuto da Criança e do Adolescente, caracteriza criança
como a pessoa de até 12 anos incompletos, e como adolescente, quem tem menos
de 18 anos.
Não possuindo os pais meios de atender ao dever de sustento decorrente do
poder familiar e nem os demais parentes que tem obrigação alimentar, dispostos no
Código Civil, necessita reconhecer a obrigação do Estado de também assegurar a
manutenção de jovens carente no âmbito da assistência social.

2.1.3 FUNDAMENTOS E NATUREZA JURIDICA


13

Os alimentos no contexto jurídico, referem-se as prestações necessárias para


atender as necessidades vitais de uma pessoa. Essa obrigação pode surgir por
vínculos familiares, conjugais ou até mesmo por determinação legal.
Os alimentos são em sua essência fundamentados em princípios
constitucionais, como o direito à vida, dignidade da pessoa humana e solidariedade
familiar. A natureza jurídica legal dos alimentos vem ao encontro das necessidades
da sociedade. O Estado busca regular o bem-estar dos cidadãos, através dos meios
jurídicos legítimos outorgados por lei decorrente do vínculo de parentesco.
A essência jurídica que deu origem ao princípio do jus sanguinis permanece
inalterada; no entanto, o que necessita de ajustes são as demandas inerentes à
contemporaneidade. Em outras palavras, a natureza fundamental desse princípio
permanece constante, mas as adaptações requeridas se referem à adequação às
necessidades da sociedade moderna.
Para o autor, Cahali (2017) a respeito das normas em relação as obrigações
gerais;

Por essa razão, orienta-se a doutrina no sentido de reconhecer o


caráter de ordem pública das normas disciplinadoras da obrigação legal de
alimentos, no pressuposto de que elas concernem não apenas aos
interesses privados do credor, mas igualmente ao interesse geral; assim,
sem prejuízo de seu acentuado conteúdo moral, a dívida alimentar
veramente interest reu publicae, embora sendo o crédito alimentar ligado à
pessoa do beneficiário, as regras que o governam são , como todas
aquelas relativas à integridade da pessoa, sua conservação e
sobrevivência, como direitos inerentes à personalidade, normas de ordem
pública, ainda que impostas por motivo de humanidade, de piedade ou
solidariedade, pois resultam do vínculo de família, que o legislador
considera essencial preservar. (CAHALI, 2017, p 357.)

O doutrinador Gomes (1999) propõe uma abordagem tripartida na definição e


classificação do direito aos alimentos, distinguindo entre aqueles que o consideram
um direito pessoal extrapatrimonial, os que o classificam como um direito
patrimonial, e os que o veem como um direito de natureza mista, combinando
elementos patrimoniais e finalidade pessoal. Essa categorização leva em
consideração a essência do conteúdo alimentar, indicando que a natureza jurídica
da relação de parentesco não pode ser totalmente compreendida apenas pelo viés
patrimonial, dado o seu alicerce ético-social. Em outras palavras, a análise de
14

Gomes (1999) destaca que a natureza do direito aos alimentos transcende


meramente o aspecto patrimonial, sendo também influenciada por considerações
éticas e sociais.
Segundo Gomes (1999), visão que considera os alimentos como um direito
pessoal extrapatrimonial destaca sua ligação intrínseca com a dignidade e as
necessidades básicas do ser humano, transcendendo as relações puramente
patrimoniais. Por outro lado, a perspectiva que os classifica como um direito
patrimonial enfatiza a obrigação pecuniária e a relação material entre alimentante e
alimentado.
Entretanto, a concepção de natureza mista ressoa de maneira significativa,
reconhecendo que os alimentos não podem ser plenamente compreendidos apenas
sob uma ótica patrimonial. A fundamentação ético-social da relação de parentesco,
intrínseca ao direito alimentar, sugere que sua natureza abrange tanto elementos
patrimoniais quanto uma finalidade pessoal, reforçando a dimensão humanitária
subjacente.
A respeito do pagamento ao alimentado Gomes (1999) descreve;

Não se pode negar a qualidade econômica da prestação própria da


obrigação alimentar, pois consiste no pagamento periódico, de soma de
dinheiro ou no fornecimento de víveres, cura e roupas. Apresenta-se,
consequentemente, como uma relação patrimonial de crédito e débito; há um
credor que pode exigir de determinado devedor uma prestação econômica.
(GOMES, 1999, p.430).

É importante dizer que existe um cenário de dispensa tácita de alimentos


como explica Dias (2017). “No divórcio ou na extinção da união estável, a falta de
referência sobre a questão alimentícia significa mera dispensa, e não renuncia aos
alimentos’’.
Quando ocorre a morte do credor, é disposto eventual crédito alimentar,
devido e não pago, os herdeiros do alimentado tem legitimidade para cobrá-lo. Com
o falecimento do alimentante, a obrigação alimentar transmite-se aos seus
herdeiros. Por outro lado, o implemento da capacidade civil, aos 18 anos, enseja o
fim do poder familiar, mas não a extinção automática do dever de prestar alimentos.
Persiste entre pais e filhos o vínculo de solidariedade familiar, em decorrência da
15

relação de parentesco, que também assegura direito a alimentos sem qualquer


limite de idade.
Dessa forma, estabelecidos alimentos em decorrência do poder familiar, o
fato de o filho completar maioridade não livra o genitor do dever de continuar
pagando o encargo, que deriva da relação paternal. É necessário que o genitor
busque de forma judicial a extinção do encargo.

2.1.4 CLASSIFICAÇÃO DOS ALIMENTOS

Segundo Dias (2017) não é a partir da lei que os alimentos são definidos,
muito menos as despesas fornecidas, mas sim definida diante a doutrina
determinada, “A lei não define alimentos e nem delimita a extensão das despesas a
serem atendidas a tais títulos. A distinção é feita pela doutrina.” (DIAS, 2017, p.307).
A autora complementa descrevendo que a doutrina subdivide os alimentos em
quatro formas: quanto à natureza, quanto à causa jurídica, quanto à finalidade e
quanto a forma de pagamento.
Complementa Dias (2017), A doutrina é classificada a partir da natureza dos
alimentos em duas espécies: os naturais e os civis. Os alimentos naturais ou
necessários são aqueles providos somente na proporção do mínimo indispensável e
necessário para a subsistência do alimentando, ou seja, comida, vestuário, lazer,
habitação, saúde e educação. Enquanto alimentos civis ou côngruos devem ser
suficientes para cobrir todas as necessidades do alimentando.
O autor Cahali (2009) acrescenta em relação aos alimentos côngruos;
Por alimentos côngruos entende-se o dever de ministrar comida,
vestuário, habitação e demais recursos econômicos necessários, tomando-
se em consideração a idade, a condição social e demais circunstâncias
pertinentes ao familiar em situação de necessidade. De modo diverso,
vestuário, habilitação, reclamados pelo alimentando, devem ser calculados
à base do mínimo indispensável para qualquer pessoa sobreviver, sem
tomar em consideração as condições próprias do beneficiário. (CAHALI,
2009, p.18).

É descrito por Dias (2017) em relação a esta classificação de alimentos: ‘’A


distinção entre alimentos naturais e civis, que condicionava a quantificação da
16

obrigação alimentar a culpa do credor, desapareceu. Mas persiste a tendencia de


impor a pais o pagamento dos alimentos civis aos filhos. Ex-cônjuge, ex-
companheiro e parentes fazem jus a alimentos naturais’’ (DIAS 2017, p.25).
A doutrina também classifica os alimentos em legítimos ou voluntários:
Legítimos são os alimentos devidos em razão da lei, enquanto os voluntários são
aqueles estabelecidos, ou prometidos, por ato voluntário, inter vivos ou causa
mortis, de pessoa não obrigada a tanto. Por exemplo, alguém assume obrigação

alimentar de pessoa que não é seu parente, cônjuge ou companheiro. Segundo o


autor:

Os legítimos são devidos em virtude de uma obrigação legal, que


pode decorrer do parentesco (iure sanguinis), do casamento ou do
companheirismo (CC, art. 1.694). (…) Somente os alimentos legais ou
legítimos pertencem ao direito de família. Assim, a prisão civil pelo não
pagamento de dívida de alimentos, permitida na Constituição Federal (art.
5o, LXVII), somente pode ser decretada no caso dos alimentos previstos
nos arts. 1.566, III, e 1.694 e s. do Código Civil, que constituem relação de
direito de família, sendo inadmissível em caso de não pagamento dos
alimentos indenizatórios (responsabilidade civil ex delicto) e dos voluntários
(obrigacionais ou testamentários). (GONÇALVES 2014, p. 338/339).

Já os alimentos definitivos, também conhecidos como regulares, são aqueles


que possuem natureza permanente, mesmo que sujeita a revisão do (art. 1.699),
presente no Código Civil de 2002. Vez que decorrem de sentença transitada em
julgado. Ligados a esses, temos os “alimentos provisórios”, concedidos com arrimo
no art. (4º) da Lei nº 5.478/68, que nada mais são do que os próprios alimentos
definitivos concedidos em antecipação de tutela. De natureza diferente são os
“alimentos provisionais”, que podem ser pedidos prévia ou concomitantemente às
ações de separação, divórcio, reconhecimento de união estável ou de anulação de
casamento. Entre as muitas diferenças entre os alimentos provisórios e provisionais
se destacam as seguintes: os procedimentos são diferentes, enquanto os
provisórios representam antecipação dos alimentos definitivos, os provisionais, que
são pedidos por meio de cautelar, visam à manutenção do requerente e de sua
17

prole durante o processo (separação, divórcio, anulação etc); os alimentos


provisionais podem incluir valores para pagamento de despesas do processo; os
alimentos provisórios exigem para sua concessão prova pré-constituída do
parentesco ou do vínculo legal (casamento, união estável).

2.1.5 EXECUÇÃO DE ALIMENTOS

É profundamente desanimador para quem tem direito a alimentos não


conseguir receber o pagamento após uma fase demorada e angustiante do
processo judicial. As necessidades básicas, como alimentação, saúde e educação,
não podem ser adiadas conforme a vontade do devedor. A urgência é crucial para
aqueles que dependem desses recursos, pois fome e outros aspectos vitais não
podem ser postergados indefinidamente. Apesar de ser uma execução para pagar
quantia certa, em razão da natureza especial do direito tutelado, é tratado como
execução especial. A imprescindibilidade do crédito alimentar motiva a criação de
técnicas processuais diferenciadas, cuja tutela deve ser eficaz e com rapidez.
Segundo Dias (2020) o direito não pode trabalhar com teses definitivas e
inquestionáveis. Diante da questão alimentar as interpretações devem sempre ter
em vista o prestígio da verba alimentar, pois diz com a própria existência da pessoa
e com sua vida com dignidade. O Código de Processo Civil de 2002 veio para
acabar com os inúmeros desencontros que havia entre a legislação pretérita e a Lei
de Alimentos. De modo expresso revogou os dispositivos que cuidavam da
execução nos artigos (16) ao (18) desta lei. Onde pretendeu com esta ação para
colocar um ponto final na dupla regulamentação que sempre gerou dúvidas e
incertezas, onde encontra-se no Código de Processo Civil de 2002 (art. 1072, V)
reversa para si: cumprimento de sentença ou de decisão interlocutória que fixa
alimentos (CPC, art. 528 ao 533) e a execução de título executivo extrajudicial que
contenha obrigação de alimentar (CPC, art. 911 ao 913).Apesar desta tentativa de
formalização única, quanto ao prazo da prisão persiste divergência. Na lei de
processo é estabelecida pena de um a três meses (art. 528, § 3º). Porém, continua
18

em vigor o (art.19) da Lei de Alimentos, que prevê a prisão do devedor por até 60
dias.
A prisão deve ser cumprida em regime fechado de acordo com (art. 528, §4º),
ficando o preso em cela separada dos outros presos. Apesar de se sujeitarem a
protesto as decisões judiciais transitadas em julgado (CPC, art.517), em sede de
alimentos, decisões não definitivas podem ser levadas a protesto (CPC, art.528).
Dispõe o credor de uma série de opções executórias: Desconto em folha de
pagamento (CPC, art. 529 e 912), desconto de rendimento ou suas rendas (CPC,
art.529 §3), expropriação de bens (CPC, art. 528 §8º).
Outras medidas, apesar de não servirem para a satisfação do encargo
alimentar, são meios de coerção para que o devedor voluntariamente faça o
pagamento. Para isso serve: O protesto, a inscrição no cadastro dos
inadimplementos, o aprisionamento.
Exclusivamente dívidas recentes, vencidas até três meses, autorizam o uso
da execução sob a ameaça de prisão. Esse não senso formou-se na via
jurisprudencial, tanto que o Superior Tribunal de Justiça simulou esta orientação. O
Código de Processo Civil de 2002 atendeu esta limitação, restringindo a cobrança
do débito pelo rito da coação pessoal a três prestações (CPC, art 528 §7º). A
eleição do meio executório depende do número de parcelas não pagas.
O Código de Processo Civil de 2002, dedica uma seção ao processo de
cumprimento de sentença que reconhece a exigibilidade da obrigação de fornecer
alimentos e uma seção separada para a execução de acordos extrajudiciais que
envolvem a obrigação alimentar.
A modalidade de cobrança depende do período de inadimplência. Somente
as três prestações mais recentes autorizam a cobrança pelo rito da prisão. Débitos
mais antigos obrigatoriamente são cobrados por vias expropriatórias. Mas o credor
pode renunciar à ameaça da prisão e promover a cobrança mediante a penhora de
bens.
É fundamental esclarecer que, quando os alimentos são determinados
judicialmente, a cobrança é realizada no mesmo processo, uma vez que se trata da
execução de uma sentença com trânsito em julgado. Se a obrigação alimentar foi
19

estabelecida fora do âmbito judicial, o credor deve iniciar o processo de execução.


Essa distinção justifica o fato de, no cumprimento de sentença, o réu ser intimado,
enquanto na execução é necessária a citação. A decisão judicial relativa aos
alimentos, independentemente do montante das prestações envolvidas, é tratada
exclusivamente por meio do cumprimento de sentença. Vale ressaltar que a
possibilidade legal de prisão só se aplica à cobrança de débitos referentes ao último
trimestre anterior ao início do cumprimento, acrescido do valor das prestações
vincendas. Como é colocado pela autora, ‘’A cobrança de alimentos estabelecidos
em sentença ou em decisão interlocutória pode ser levada a efeito
concomitantemente: ameaça de prisão e rito expropriatório’’ (DIAS 2017, p.345).
Por fim, é importante destacar que, com frequência, o devedor de alimentos
recorre ao habeas corpus na tentativa de se libertar da prisão, alegando
incapacidade financeira para cumprir com suas obrigações alimentares. Entretanto,
é crucial observar que esse recurso é considerado inadequado para tal finalidade. A
Constituição da República 1988, assegura o habeas corpus sempre que a liberdade
de locomoção estiver ameaçada por ilegalidade ou abuso de poder. No entanto, se
o cerceamento da liberdade resulta de uma decisão regular em processo judicial,
não se configura um ato ilegal ou abusivo. Complementa Dias (2007) a respeito do
Habeas Corpus. ‘’O habeas corpus não é remédio adequado para o devedor se
livrar do decreto de prisão’’ (DIAS, 2007, p.371).
Na execução por quantia certa, é vedada a cumulação de pedidos, salvo
quando se tratar de execução para entrega de coisa com execução por quantia
certa ou para entrega de coisa com execução para entrega de coisa de outro
gênero. Ou seja, o texto legal, à primeira vista, estabelece que em uma execução
por quantia certa não se pode cumular pedidos de naturezas distintas. No caso da
execução alimentar, uma quantia certa devida é determinada por uma decisão
judicial que fixou os alimentos.

2.1.6 FIM DO DIREITO


20

No divórcio e na dissolução amigável da união estável, levados a efeito por


escritura pública ou mediante uma homologação judicial, constará, disposição
relativa aos alimentos entre cônjuges, ou companheiros.
Mesmo que seja obrigatória previsão, uma possível omissão não afeta a
legalidade da descontinuação do vínculo afetivo. Trata-se de uma dispensa tácita
dos alimentos, que poderão ser requeridos a qualquer tempo.
Desta maneira, a autora complementa a respeito do divórcio, “No divórcio ou
na extinção da união estável, a falta de referência sobre a questão alimentícia
significa mera dispensa, e não renuncia aos alimentos” (DIAS, 2020, p.133).
Existe uma diferença importante entre extinção do direito a alimentos e
exoneração do encargo alimentar. A extinção ocorre quando o alimentado atinge a
maioridade, porém não é automática e precisa de decisão judicial ou com a morte
de qualquer uma das partes e a exoneração a partir do momento que ocorre a
incapacidade absoluta para a realização do pagamento, desta forma, a autora relata
“A obrigação de alimentar se extingue com a morte do alimentante ou do
alimentado. O fim da necessidade do credor ou a impossibilidade absoluta do
devedor de pagar autorizam a exoneração do encargo’’ (DIAS, 2020, p.133).
Tratando-se da morte do credor, havendo eventual crédito alimentar que não
foi pago, os herdeiros do alimentado tem legitimidade para cobrá-lo.
Por outro lado, com o falecimento do alimentante, a obrigação de alimentar
transmite-se aos herdeiros, porém existe um certo desentendimento quanto ao
alcance da transmissibilidade legal.
O casamento, união estável ou concubinato do credor dos alimentos enseja a
cessação do encargo alimentar, assim como disposto no artigo (1708) do Código
Civil de 2005. Quanto ao casamento e a união estável, presume a lei o fim da
necessidade, pois o dever de assistência é assumindo pelo novo par. Portanto, para
cessação do encargo, é indispensável a demonstração que o concubino presta
assistência material ao credor de alimentos.
Há, ainda, a aquisição da capacidade civil aos 18 anos, que marca o término
do poder familiar, mas não implica automaticamente no fim da obrigação de fornecer
alimentos. A ligação de solidariedade familiar entre pais e filhos persiste, mantendo
21

o respaldo na relação de parentesco, o que garante o direito aos alimentos sem


restrições relacionadas à idade. Portanto, quando os alimentos são estabelecidos
com base no poder familiar, o fato de o filho atingir a maioridade não exonera o
genitor da responsabilidade de continuar cumprindo com o encargo. Para
interromper esse dever, é necessário que o genitor busque judicialmente a extinção
do encargo nesse contexto.
Assim sendo, o simples atingimento da maioridade não é motivo suficiente
para interromper o pagamento da pensão. A decisão de encerrar a obrigação
alimentar está sujeita à determinação do sistema judiciário. Com o alcance da
maioridade e o consequente término do poder familiar, também cessa a
responsabilidade de prover sustento. Contudo, a obrigação persiste em virtude da
solidariedade familiar.
Por fim é necessário relatar que assim que estabelecida a obrigação
alimentar a favor do ex-cônjuge ou ex-companheiro, o casamento, a união estável
ou o concubinato do credor, enseja a extinção da obrigação. A formação de um
novo vínculo afetivo desonera o devedor de alimentos, presumindo-se o fim da
necessidade do alimentando. O encargo de assegurar o sustento passa a ser do
novo parceiro, extinguindo a obrigação alimentar.

1. PRISÃO CIVIL DO DEVEDOR DE ALIMENTOS

3.1 NASCIMENTO DAS PRISÕES CIVIS POR DÍVIDA

Segundo Humenhuk (2002), evolução histórica da prisão civil por dívida na


antiguidade, apareceu em seus primeiros resquícios entre os egípcios, que
acreditavam que os deuses eram testemunhas do pactuado entre o devedor e o
credor e menosprezavam sua inadimplência. No código de Hamurabi, constava a
morte do devedor de dinheiro ou sementes e a escravidão de sua Família. No
Direito Romano, versava a lei das XII Tábuas que era permitido a execução pessoal
do devedor através de certos requisitos.
22

Desde tempos remotos, a imposição de penalidades se apresenta como um


dos instrumentos indispensáveis que motivam o devedor a efetuar o pagamento ou
a participar de um esforço conjunto para cumprir suas obrigações. Em diversas
circunstâncias, percebe-se a ineficácia da legislação, uma vez que o beneficiário
dos alimentos possui plenas condições de prover o sustento necessário, mas opta
por não o fazer. Isso ocorre mesmo quando se trata de uma obrigação fundamental
de prover o suporte básico à saúde humana. No entanto, há a percepção
equivocada de que, pelo simples fato de o filho residir sob a guarda de sua genitora,
a responsabilidade integral recai sobre ela, sendo-lhe atribuída a total obrigação de
prover o sustento do menor.
De forma codificada encontrava-se a primeira previsão normativa que
permitia a prisão civil por dívida, insculpida nos artigos (115-117) do Código de
Hamurabi, 1694 a.C., previa o diploma que o bem tomado como garantia seria o ser
humano, fosse livre, fosse escravo, caso não pagasse a dívida seria morto a
pancadas ou submetido a tortura, bem como sua esposa e filhos seriam escravos
por três anos. Dessa forma era paga a dívida.
Ainda se verifica a prisão por dívida no Código de Manu, de origem hindu
(século XIII a.C.), e no antigo Egito. No Direito Romano, essa obrigação derivava do
nexum, situação de inferioridade jurídica do plebeu em relação ao patrício, em que o
plebeu, não conseguindo crédito, vinculava sua própria pessoa. Caso não efetuasse
o pagamento do crédito liberado, poderia ser colocado em cárcere privado do
credor.
No contexto jurídico brasileiro, os primórdios da prisão civil remontam à era
colonial, sendo influenciados pelo sistema legal português e estabelecidos nas
Ordenações Filipinas (1580-1640). Nesse período, a prisão era aplicada ao
depositário que retinha um objeto específico sem entregá-lo ao proprietário legítimo,
bem como àquele que fazia uso desse objeto sem a devida autorização. Além disso,
a detenção podia ocorrer quando um indivíduo parte em uma demanda judicial
perdia o caso e não arcava com as custas associadas (PINTO, 2017) É relevante
destacar que a Constituição Federal de 1988, no artigo 5º, inciso LXVII, proíbe a
prisão civil por dívidas. Entretanto, é importante notar que tanto a Constituição
23

quanto o Pacto de São José da Costa Rica resguardam a possibilidade de prisão do


devedor de alimentos. Isso significa que, embora a legislação brasileira tenha uma
restrição geral à prisão civil por questões financeiras, uma exceção é feita para o
caso específico do devedor de alimentos, reforçando a importância da obrigação
alimentar e sua prioridade diante de outras formas de dívida. O Pacto,
compreendido como norma de direito interno com status supralegal, deve ser
tomado como um parâmetro normativo de direitos humanos e, nesta medida, o
conceito de Justiça Social, contido no seu preâmbulo, deve parametrizar a ações e
medidas.
Neste contexto, a prisão civil não configura uma pena, sanção ou punição,
mas sim uma medida coercitiva com o propósito de compelir o devedor a cumprir
sua obrigação. Uma vez que a obrigação é integralmente cumprida, a prisão atinge
seu objetivo, que é assegurar o pagamento da dívida. Portanto, uma vez que a
dívida é quitada, a ordem de prisão não deve mais persistir, cabendo ao juiz
suspendê-la. Isso reflete o caráter transitório da medida, cuja vigência é
condicionada à necessidade de garantir o cumprimento da obrigação e cessa tão
logo esse propósito seja alcançado.

3.1.2 CONCEITO E NATUREZA JURIDICA DA PRISÃO CIVIL

Evidencia-se que a finalidade da norma não consiste em prescrever a prisão


civil por dívida, mas, pelo contrário, em proibi-la, admitindo-a apenas nas exceções
expressamente ressalvadas por ela mesma. Essas exceções incluem a dívida
voluntária e injustificada de alimentos, bem como o depósito infiel. Importante notar
que, mesmo nessas situações excepcionais, a possibilidade de prisão está
condicionada à existência de previsão legal específica. Dessa forma, a legislação
estabelece restrições claras à aplicação da prisão civil, restringindo-a a
circunstâncias expressamente delineadas, o que destaca a importância do rigor

legal na utilização desse recurso. Contudo, a visão de que a prisão civil não tem
caráter de pena, mesmo a própria norma processual civil, utilizando-se da
24

nomenclatura “pena”, quando diz que o cumprimento da pena não exime o


executado do pagamento das prestações vencidas e vincendas.
Nesta esteira preconiza Azevedo (2012), p. 35) que:

A prisão civil por dívida é “o ato de constrangimento pessoal,


autorizado por lei, mediante segregação celular do devedor, para forçar o
cumprimento de um determinado dever ou de determinada obrigação”.
Assim, prossegue Azevedo, ela se reveste de uma sanção de caráter civil,
verdadeiro instrumento coercitivo para constranger o devedor de alimentos.
(AZEVEDO, 2012. p.35)

Como descrito por Azevedo (1993) A prisão civil por débito alimentar não
corresponde à pena, mas como meio coercitivo de execução para compelir o

devedor ao pagamento da prestação de alimentos. Verifica-se assim que a natureza


jurídica da prisão civil é de meio coativo, direto ou ativo, com o intuito de
constranger o devedor ao cumprimento de uma obrigação de caráter privada, nos
casos previstos em lei.
Nessa mesma linha, os autores concluem a respeito da função da prisão;

A prisão se constitui como o meio legal de privação da liberdade de


locomoção de uma pessoa, epessoa, e constitucionalmente pode assumir
o caráter penal e civil, sendo esta meramente técnica de pressão
coercitiva para impelir o devedor a pagamento de uma dívida, não tendo,
por conseguinte, qualquer relação com as prisões de caráter penal.
(SAMPAIO JÚNIOR; CALDAS NETO, 2013, p. 70)

Nesse contexto, é evidente que a prisão é uma medida extrema destinada a


garantir o cumprimento de uma obrigação. É crucial ressaltar que a situação envolve
uma colisão de direitos fundamentais, na qual se aceita o sacrifício de um desses
direitos para assegurar o cumprimento do outro, considerando sua preeminência.
Essa ponderação destaca a delicada balança entre os direitos básicos, onde a
prisão é considerada como recurso derradeiro diante da necessidade de assegurar
o cumprimento de uma obrigação.

3.1.2 INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL


25

Os argumentos que defendem a prisão como resposta ao descumprimento do


dever alimentar estão, portanto, essencialmente ancorados na preservação da vida,
dignidade e integridade física do alimentando.o. Neste contexto quando algo é
considerado ineficaz no âmbito jurídico, significa que não atingiu o resultado ou
propósito para o qual foi criado ou estabelecido. Por conseguinte, a ineficácia da
prisão civil trazida neste trabalho revela-se através de análises doutrinárias
demonstrando que a prisão não cumpre seu objetivo coercitivo.
Neste sentido, Pena Júnior afirma que:

Fazer da prisão civil meio de coerção pessoal para o devedor de alimentos,


equiparando-o a um criminoso qualquer, é de uma violência medonha.
Acreditamos que os próprios alimentados, em sua maioria, filhos do
devedor de alimentos, se não contaminados pela síndrome da alienação
parental, em sendo consultados, não concordariam com esse tipo de
punição aos seus pais. A dignidade e integridade deles devem ser
asseguradas com o pagamento das prestações alimentícias e não com a
prisão de seus genitores. Esta, com certeza, não estará em sintonia com o
melhor interesse dos filhos. Somos contra a prisão civil do devedor de
alimentos, principalmente por uma questão de respeito à dignidade dessas
pessoas, porém ferrenhos defensores de providências imediatas e eficazes
de combate à sonegação da prestação alimentícia. Se o devedor de
alimentos é solvente, deve-se atacar seu patrimônio. Abalar sua condição
econômico-financeira, seja pela expropriação de seus bens, da aplicação
de multa diária, de anotações restritivas ao seu nome nos serviços de
proteção ao crédito e nas instituições bancárias e por outras medidas
cabíveis. Agora, tudo isso de maneira uniforme e urgente. Questões de
alimentos devem ser resolvidas no máximo em setenta e duas horas, e
esse é o grande desafio do sistema processual, já que a fome não pode
esperar. (JUNIOR, 2008, p. 123)

Contudo, apesar das características específicas da obrigação alimentar


discutidas ao longo deste estudo, existem outras razões que se opõem à
manutenção dessa medida coercitiva. Essas razões fundamentam-se no respeito à
dignidade do devedor de alimentos e no princípio da proporcionalidade, que exige
uma abordagem solidária do Estado na prestação de alimentos. Essa perspectiva
amplia a compreensão sobre os aspectos éticos e proporcionais envolvidos na
execução dessa obrigação, além de considerar não apenas os direitos do
alimentando, mas também os direitos e a dignidade do devedor.
Neste sentido enfatiza o autor Maciel;
26

Ocorre incongruência na Constituição, pois não retrata o regime


democrático de vontade geral, andando na contramão de sua unidade,
maculando um ideal de justiça embasado em princípios como a dignidade
da pessoa humana, a proibição da degradação do ser humano, o direito ao
livre desenvolvimento da personalidade e o princípio da igualdade.
Observem-se, na sequência, argumentos contrários e favoráveis à prisão
civil do devedor de alimentos. Por certo, o tema não encontra unanimidade
na doutrina pátria, tendo sido alvo de inúmeras controvérsias. Muitos
doutrinadores defendem o instituto da prisão civil alimentícia, até porque é
preceito constitucional, como é o caso do ministro Fux (2009, p. 427), do
STF, ao dizer que: “A natureza da prestação alimentícia, urgente e
indispensável ao ângulo da solidariedade humana, timbra-lhe
singularidades marcantes, e justifica a forma de sua efetivação”. (MACIEL,
2009, p. 38).

A ineficácia da prisão civil do devedor de alimentos no Brasil é um tema


complexo que envolve diversos aspectos do sistema jurídico e das relações
familiares. O caráter punitivo da medida, muitas vezes, não se traduz em efetividade
na garantia do pagamento da obrigação alimentar. Isso se deve a uma série de
fatores, como a própria condição econômica precária do devedor, a dificuldade em
localizá-lo, a superlotação carcerária e a ausência de políticas que promovam, de
fato, a regularização do pagamento dos alimentos.
A prisão, por si só, não aborda as raízes do problema e pode resultar em
efeitos colaterais negativos, como a perpetuação do ciclo de inadimplência devido
às dificuldades enfrentadas pelo devedor após o período de reclusão. Além disso, a
privação da liberdade pode não resolver a questão financeira subjacente que levou
à inadimplência.
Uma análise crítica desse cenário destaca a necessidade de abordagens
mais abrangentes, como a implementação de políticas públicas eficazes, mediação
familiar e soluções que visem à resolução do conflito de maneira mais conciliatória e
menos punitiva. A ineficácia da prisão civil do devedor de alimentos ressalta a
importância de repensar e aprimorar os instrumentos legais e sociais disponíveis
para lidar com essa complexa questão.
Marinoni e Arenhart descrevem que:

Entre todas as técnicas destinadas à execução da obrigação


alimentar, a prisão civil é a mais drástica e a mais agressiva ao devedor, de
27

modo que a sua adoção somente é possível quando não existirem outros
meios idôneos à tutela do direito. Isto pelo simples motivo de que os meios
de execução se subordinam às regras do meio idôneo e da menor restrição
possível. (MARINONI; ARENHAT, 2008. p. 390-391)

Compreende-se a necessidade de impor uma sanção ao devedor de


alimentos; no entanto, a prisão se revela como uma medida desproporcional para
esse caso. A detenção do devedor está distante de proporcionar uma solução
satisfatória ou resolver a questão da dívida alimentar.
A prisão civil é uma medida que se revela cruel, privando o indivíduo de sua
liberdade e impedindo-o de trabalhar para cumprir com suas obrigações. Azevedo
(2012) destaca que o patrimônio do devedor deveria ser o responsável por quitar a
dívida, ao invés de restringir sua liberdade. Ele argumenta que, dado que o Estado
frequentemente não consegue prover adequadamente a alimentação da população,
com a existência de crianças e famílias passando fome, questiona-se a intervenção
no âmbito do Direito Civil para privar alguém de liberdade por questões de dívida.
Essa abordagem levanta questões éticas sobre a eficácia e a humanidade da prisão
como solução para a inadimplência na obrigação alimentar. É importante destacar,
uma decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ), proferida pela 4ª turma do
referido Tribunal, na qual a prisão civil foi afastada, pelo fato do devedor não possuir
condições de pagar a dívida sem prejudicar o seu próprio sustento.
Portanto, o devedor de alimentos que se encontra em uma situação
econômico-financeira desfavorável deve prontamente buscar a revisão dos valores
estabelecidos pelo Juiz. A iniciativa de propor uma ação revisional evidencia que o
descumprimento não decorre de uma escolha voluntária e injustificada, mas sim das
limitações financeiras enfrentadas pelo devedor.
Para Junior (2008) defensor da abolição do instituto da prisão civil, preconiza
que:

Fazer da prisão civil meio de coerção pessoal para o devedor de


alimentos, equiparando-o a um criminoso qualquer, é de uma violência
medonha. Acreditamos que os próprios alimentados, em sua maioria, filhos
do devedor de alimentos, se não contaminados pela síndrome da alienação
pariental, em sendo consultados, não concordariam com esse tipo de
punição aos seus pais. A dignidade e integridade deles devem ser
28

asseguradas com o pagamento das prestações alimentícias e não com a


prisão de seus genitores. Esta, com certeza, não estará em sintonia com o
melhor interesse dos filhos. Somos contra a prisão civil do devedor de
alimentos, principalmente por uma questão de respeito à dignidade dessas
pessoas, porém ferrenhos defensores de providências imediatas e eficazes
de combate à sonegação da prestação alimentícia. Se o devedor de
alimentos é solvente, deve-se atacar seu patrimônio. Abalar sua condição
econômico-financeira, seja pela expropriação de seus bens, da aplicação
de multa diária, de anotações restritivas ao seu nome nos serviços de
proteção ao crédito e nas instituições bancárias e por outras medidas
cabíveis. Agora, tudo isso de maneira uniforme e urgente. Questões de
alimentos devem ser resolvidas no máximo em setenta e duas horas, e
esse é o grande desafio do sistema processual, já que a fome não pode
esperar. (JUNIOR, 2008, p.359).

3.1.4 ALTERNATIVAS A PRISÃO CIVIL

Segundo o autor Grisard (2006), os devedores de alimentos que não


possuem recursos podem recorrer a prestação de serviços à comunidade, tendo em
vista que poderá sofrer danos assim como a suspensão ou restrição de direitos, e
até mesmo a retenção da Carteira Nacional de Habilitação, do CPF, do passaporte,
além da impossibilidade do exercício de certos direitos ou atividades pessoais ou
profissionais.
Também pode ser proposta a proibição de abrir contas bancárias, de prestar
concurso público, a suspensão dos direitos políticos, enfim, quaisquer dessas
medidas como alternativas ao cárcere. Grisard (2006) descreve que é difícil não
observar a desproporção da prisão por alimentos quando, por exemplo, o devedor é
preso e paga a dívida. Pois, se pagou, é porque tinha meios para fazê-lo. Se tinha
meios para pagar, o Estado deveria utilizar medida menos gravosa para coagir o
devedor. Nesse caso, o Estado foi incapaz de forçar o pagamento usando
instrumentos menos estigmatizadores.
Outro modo que buscaria solucionar o litígio, sem necessitar do uso
excepcional da custódia civil, seria na oportunidade garantida pelo Estado ao
devedor, de um serviço social temporário, em que os valores que resultariam de seu
trabalho seriam convertidos diretamente ao credor de alimentos, o que não deixaria
de ser uma medida coercitiva, visto que está impondo o devedor a ocupar uma parte
29

de seu tempo, por algo que não lhe trará lucros, porém o cumprimento de suas
obrigações.
Essa tese é igualmente defendida por Maria Berenice Dias (2020), quando
diz que:

Em relação a quem tem capacidade laborativa, desonera-se o


Poder Público de tal dever fomentado o desenvolvimento social e o
crescimento econômico, de forma a garantir o trabalho a todos. Por meio do
trabalho é que as pessoas conseguem manter a si e a sua família, com o
que se desonera o Estado de diretamente alcançar-lhes alimentos. (DIAS,
2020, p.115).

Dessa forma, em vez de submeter o devedor ao encarceramento, sujeitando-


o à ociosidade que ainda persiste em nosso sistema penitenciário, estar-se-á
proporcionando a ele a oportunidade de exercer uma atividade laboral. Ao mesmo
tempo, esse enfoque atende à obrigação alimentar dependida pelo alimentando,
cumprindo assim o papel institucional do Estado, que visa à construção de uma
sociedade mais desenvolvida. Essa abordagem destaca a importância de medidas
que não apenas reprimam, mas também busquem soluções construtivas para o
problema da inadimplência na obrigação alimentar.
O desconto em folha de pagamento é uma alternativa à prisão civil muito
eficaz, de certo até mais eficiente do que a decretação da privação da liberdade do
devedor inadimplente, uma vez que não viola nenhum dos direitos fundamentais do
devedor, assim como dificulta a inadimplência.
Neste contexto, Cahali (2009) leciona:

O credor de alimentos pode optar, desde logo, pela execução por


forma diversa daquela comum, estatuída para pagamento de quantia certa;
sujeita-se, porém, aqui, a determinadas limitações que a lei estabelece na
composição dos dois valores em confronto (necessidade premente do
alimentando e liberdade individual da alimentante), devendo assim respeitar
a ardem de prioridade que visam tornar efetiva a condenação. (CAHALI,
2009, p. 20).

Dessa maneira, existem alternativas para compelir o devedor a cumprir com


sua obrigação, sem que seja necessária a restrição dos seus direitos fundamentais.
Na ação de execução de alimentos, o devedor pode optar pelo desconto automático
30

em sua folha de pagamento. Essa abordagem destaca a viabilidade de soluções


que, ao invés de recorrerem à prisão civil, buscam meios mais eficazes e menos
invasivos para assegurar o adimplemento da obrigação alimentar.

3.1.5 PRISÃO CIVIL NA PANDEMIA DA COVID-19


De fato, o isolamento social compulsório proporcionado pela pandemia
transformou bruscamente a vida das pessoas em que foi necessário tempo para se
adaptarem a nova realidade e a disposição da convivência familiar onde por muitas
vezes foi sacrificada para uma preservação de saúde.
Desta forma, foi sancionada a Lei nº 14.010 de Junho de 2020 que cria um
Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado
no período da pandemia do COVID-19, onde no artigo 15, traz especificadamente
que a prisão civil por dívida alimentícia deverá ser cumprida exclusivamente sob a
modalidade domiciliar e não mais em regime fechado com objetivo de reduzir os
riscos epidemiológicos e contexto relacionado a propagação do vírus. Com a
sanção desta nova lei trazendo a prisão domiciliar como única modalidade de prisão
civil do devedor de alimentos a administração de coercibilidade foi flexibilizado, de
maneira que os devedores que foram afetados pela crise pandêmica, de certo
modo, foram incentivados ao inadimplemento por saberem que não seriam mais
levados a regime prisional.

A COVID-19, originada na China, tornou-se uma pandemia global,


impactando profundamente a sociedade, economia e saúde pública. Esta doença
respiratória, causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, desencadeou medidas de
isolamento social, lockdowns e mudanças significativas no estilo de vida. O
distanciamento físico, o uso de máscaras e a busca por vacinas tornaram-se
elementos cotidianos. Nesse cenário desafiador, diversas áreas do direito
experimentaram turbulências. Entretanto, entre as responsabilidades que se
mantiveram em vigor, a obrigação alimentar destacou-se, demonstrando sua
essencialidade em um período de incertezas econômicas e sociais.
31

Em meio a essa adaptação legal, Schreiber (2023) destaca:

Em virtude da pandemia de covid-19, algumas decisões do STJ


autorizaram, excepcionalmente, ao longo do ano de 2020, o cumprimento
da prisão civil do devedor de alimentos em regime domiciliar. Outras
decisões da mesma Corte decretaram a suspensão da prisão durante a
pandemia, diferindo o seu cumprimento da medida. O legislador, contudo,
inclinou-se pela primeira solução, tendo a Lei n. 14.010, publicada em 12
de junho de 2020, estabelecido que, “até 30 de outubro de 2020, a prisão
civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes da Lei nº
13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), deverá ser
cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da
exigibilidade das respectivas obrigações” (art. 15). (SCHREIBER, 2023,
p.2101).

Em decorrência da emergência da situação da COVID-19, o STJ, ao avaliar


a crescente rápida e sem precedentes das mortes e números de infecções
causadas pelo vírus, decidiu flexibilizar em partes as decisões jurídicas,
principalmente relacionadas a prisão civil. Logo, o STJ ordenou que tal prisão
poderia ser feita em domicílio. Neste sentindo, a jurisprudência:

HABEAS CORPUS. DECRETAÇÃO. PANDEMIA. SÚMULA Nº 309/STJ.


ART. 528, § 7º, DO CPC/2015. PRISÃO CIVIL. PANDEMIA (COVID-19).
SUSPENSÃO TEMPORÁRIA. POSSIBILIDADE. DIFERIMENTO.
PROVISORIEDADE.
1. Em virtude da pandemia causada pelo coronavírus (Covid-19), admite-se,
excepcionalmente, a suspensão da prisão dos devedores por dívida alimentícia em
regime fechado.
2. Hipótese emergencial de saúde pública que autoriza provisoriamente o
diferimento da execução da obrigação cível enquanto pendente a pandemia.
3. Ordem concedida.
(HC 574.495/SP, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA
TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 01/06/2020).

Deve ser levado em consideração que muitos alimentantes, de fato,


enfrentaram desafios financeiros sem precedentes durante a pandemia. Contudo, o
dever de sustento dos alimentandos manteve-se, e eles sofreram os efeitos
colaterais de um sistema que, temporariamente, não poderia fazer valer seus
direitos na mesma medida que antes.
32

Durante o auge da pandemia, quando as prisões civis estavam suspensas, os


beneficiários solicitaram soluções alternativas, pois não podiam esperar até o final
desse período para receber o suporte financeiro essencial à sua subsistência.
Devido à suspensão das prisões durante a pandemia, favorecendo o
devedor, houve a necessidade de equilibrar a situação, beneficiando também o
credor. Dessa forma, considerando a urgência dos alimentos para a subsistência do
menor, permitiu-se a apreensão de bens do devedor, sem, no entanto, converter
procedimentos. Essa abordagem visa garantir o atendimento imediato das
necessidades essenciais.

4. CONCLUSÃO

No desfecho desta análise sobre a prisão civil do devedor de alimentos,


emergem considerações cruciais que permeiam não apenas o âmbito jurídico, mas
também questões éticas, sociais e humanitárias. A medida coercitiva da prisão,
quando aplicada para compelir o cumprimento da obrigação alimentar, destaca-se
pela sua complexidade, desencadeando reflexões sobre sua eficácia,
proporcionalidade e impactos no contexto mais amplo da sociedade.
É indubitável que a prisão, enquanto meio de pressionar o devedor a honrar
sua obrigação, frequentemente se revela ineficaz. Em muitos casos, o devedor já
pode enfrentar dificuldades financeiras, tornando a prisão uma medida pouco eficaz,
visto que, não aborda a questão financeira subjacente. Logo, a prisão civil se torna
até um ciclo vicioso, destoando totalmente do entendimento de doutrinadores, e até
mesmo dos tribunais superiores, os quais norteiam que a prisão só deve ser
aplicada como última alternativa. Pode também ter consequências negativas na vida
profissional e social do devedor prejudicando ainda mais sua capacidade de cumprir
com as obrigações alimentares após a liberação, mostrando-se evidente em
estudos doutrinários citados ao longo deste trabalho, como o livro do professor
Marcos José Pinto, a prisão civil do devedor de alimentos: constitucionalidade e
eficácia.
33

A sua aplicação, por vezes, não soluciona a questão da inadimplência e pode


resultar em efeitos colaterais indesejáveis, tais como a perpetuação do ciclo de
inadimplência após a liberação do devedor. Esse ciclo, por sua vez, expõe as
fragilidades do sistema e aponta para a necessidade de abordagens mais
abrangentes e humanitáriass que considero neste trabalho a possibilidade de
medidas restritivas de direitos como forma mais eficaz para a questão tratada..
Ao analisar os princípios fundamentais, torna-se evidente que a restrição da
liberdade do devedor, muitas vezes em um contexto de dificuldades financeiras,
suscita questionamentos éticos. A dignidade da pessoa humana, pedra angular de
qualquer sistema jurídico, encontra-se comprometida quando a prisão é empregada
de forma indiscriminada., desconsiderando as complexidades individuais e as

nuances das situações econômicas. A jurisprudência pátria, nesses casos, tem


entendido não consistir justificativa plausível para o não pagamento dos alimentos
a simples alegação de desemprego, ainda que, verificada a mudança nas
circunstâncias fáticas, a despeito do entendimento do Superior Tribunal de Justiça,
e com base na distinção doutrinária entre dilação probatória e análise de prova
pré-constituída, principalmente em casos de desemprego do devedor de
alimentos, é possível localizar precedentes de Tribunais de Justiça Estaduais que
admitem e concedem a ordem de habeas corpus nessas situações, recolhendo-se
o mandado de prisão expedido pela autoridade coatora.

Alternativas mais coerentes com a justiça e com o respeito aos direitos


fundamentais apresentam-se como caminhos promissores. A revisão dos valores
estabelecidos pelo Juiz, a busca por desconto automático em folha de pagamento e
a fomentação de acordos extrajudiciais surgem como medidas mais construtivas e
menos draconianas. Tais abordagens não apenas evitam a privação da liberdade,
mas também promovem soluções mais efetivas para lidar com as reais dificuldades
econômicas enfrentadas pelos devedores. Nesse contexto, a sociedade e o sistema
jurídico têm a oportunidade de repensar e aprimorar a aplicação da prisão civil do
devedor de alimentos. A busca por soluções mais humanizadas e contextualmente
sensíveis é crucial para a construção de um sistema mais equitativo e eficiente.
34

Surge a necessidade de um diálogo contínuo entre juristas, especialistas em


políticas públicas e a sociedade em geral para desenvolver estratégias que protejam
os direitos dos alimentandos sem desconsiderar os princípios basilares da justiça e
da dignidade humana.
Assim, ao refletir sobre a prisão civil do devedor de alimentos, vislumbramos
a oportunidade de transcender paradigmas antiquados, aproximando-nos de
soluções mais alinhadas com uma visão moderna e compassiva da justiça. A
resposta ao desafio da inadimplência na obrigação alimentar deve ser moldada pela
empatia e deve ser baseada em princípios legais e considerações objetivas pa, pelo
entendimento das complexidades sociais e pela busca incansável por métodos que,
verdadeiramente, cumpram a nobre missão de garantir a proteção dos direitos
fundamentais. A empatia pode desempenhar um papel, especialmente ao
considerar circunstâncias individuais, mas a decisão final deve ser fundamentada
em princípios jurídicos e nas leis aplicáveis.
Por fim durante o período da pandemia revelou-se primordial a necessidade
de uma decisão estrutural para a efetiva e adequada proteção dos credos e
devedores de alimentos, superando as intercorrências de interesse e burocráticas,
eliminando aos poucos a medida extrema da prisão civil, reestruturando-se, a
execução de alimentos, a dignidade humana das partes e como as formas se
interação social se dão em determinados momentos.

5. REFERÊNCIAS

AZEVEDO, Álvaro Villaça. Direito de família. São Paulo: Atlas, 2013.

AZEVEDO, Álvaro Vilaça. Prisão Civil por Dívida. 3ªed. São Paulo: Atlas,
2012.

BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. OBRIGAÇÃO ALIMENTÍCIA.


INADIMPLEMENTO PRISÃO CIVIL, SÚMULA Nº 309/STJ. ART. 528, § 7º, DO
CPC/2015. São Paulo,: Superior Tribunal de Justiça, [2020].
35

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília,


5 de out de 1988.

BONIFACIO, Geilson. Prisão Civil do devedor de alimentos, JUSBRASIL São


Paulo, 2019, Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/artigos/prisao-civil-do-
devedor-de-alimentos/795073382> Acesso em: 12 nov. 2023.

CAHALI, Francisco. In: DIAS, Maria Berenice; PEREIRA, Rodrigo da Cunha.


Dos Alimentos. 3º ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2003.

CAHALI, Yussef Said. Dos Alimentos. 6. ed. rev. atual. e ampl. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2009.

DIAS, Maria Berenice. Manual do direito das famílias. 4. ed. atual. e ampl.
São Paulo: Editora dos Tribunais, 2007.

DIAS, Maria Berenice. Alimentos- Direito, Ação, Eficácia, Execução.


Salvador: Editora JusPodivm, 2020.

FILHO, Waldyr Grisard. O futuro da prisão civil do devedor de alimentos:


caminhos e alternativas. In: PEREIRA, Belo Horizonte. IBDFAM, 2006.

FUNCK, Rodrigo; LACERDA; Emanuela. Medidas alternativas que


substituem a prisão civil do devedor de alimentos. Itajaí, 2010, Disponível em:
https://www.rghadvogados.adv.br/upload/files/rodrigo_medidas%20alternativas
%20coercitivas%20que%20substituem%20a%20prisao%20civil%20do%20devedor
%20de%20alimentos.pdf Acesso em: 10 nov. 2023.

GAGLIANO, Pablo Stolze. Prisão Civil do Devedor de Alimentos. São


Paulo: Ed. Saraiva, 2003.
36

GALLASSI, A.; RODRIGUES, C. H. do V. P. .; OLIVEIRA, D. da S. de . A


INEFICÁCIA DA PRISÃO CIVIL EM TEMPOS DE PANDEMIA. Boletim de
Conjuntura (BOCA), Boa Vista, v. 15, n. 44, p. 705–724, 2023. DOI:
10.5281/zenodo.8312193. Disponível em:
https://revista.ioles.com.br/boca/index.php/revista/article/view/2034 Acesso em: 21
nov. 2023.

GOMES, Orlando. Direito de Família. 11ª ed. Rio de Janeiro: Revista


Forense, 1999.

HUMENHUK, Hewerstton. Prisão civil. Revista Jus Navigandi, Teresina, ano


8, n. 64, 1 abr. 2002. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/3928>. Acesso em:
20 nov. 2023.

NUNES, Fabrício Alimentos á Luz do Código Civil Brasileiro e da Constituição


Federal bem como seus impactos na lei processual vigente. JUSBRASIL, São
Paulo, 2014, Disponível em: <https://www.jusbrasil.com.br/artigos/alimentos-a-luz-
do-codigo-civil-brasileiro-e-da-constituicao-federal-bem-como-seus-impactos-na-lei-
processual-vigente/153477021> Acesso em: 13 nov. 2023.

SILVA, C. T. E. DISCUSSÕES SOBRE A PRISÃO CIVIL DO ALIMENTANTE.


Revista Jurídica da FA7, v. 5, n. 1, p. 301-310, 30 abr. 2008.

SILVA, José; SILVA, Josnei. Prisão Civil para o devedor de alimentos e


seu procedimento comparado com o novo código de processo civil. In:
SIMPÓSIO DE SUSTENTABILIDADE E COMTEMPORANEIDADE NAS CIÊNCIAS
SOCIAIS, 4., 2016, Paraná, UTFPR, 2016. p. 2-12.

STUANI, Clari José; ADAME, Alcione. Alternativas à Prisão Civil do Devedor


de Pensão Alimentícia. Revista da Faculdade de Direito da Ajes, Juína, v. 4, n. 8,
p. 81-111, jul./dez. 2015. Disponível em:
37

https://revista.ajes.edu.br/index.php/iurisprudentia/article/view/162/128 Acesso em:


15 de nov. 2023.

TARTUCE, Flávio; SIMÃO, J. Direito Civil. Direito de Família. 2. ed. Vol. 5.


Série Concursos Públicos. São Paulo: Método, 2007.

PINTO, Marcos José. A prisão do devedor de alimentos:


constitucionalidade e eficácia. Brasília. ESMPU, 2017.

Você também pode gostar