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JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE
EM TEMPOS DE PANDEMIA
CURITIBA
2021
RENAN SANCHES PRIMO
JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE
EM TEMPOS DE PANDEMIA
CURITIBA
2021
RENAN SANCHES PRIMO
JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE
EM TEMPOS DE PANDEMIA
Orientador: ___________________________________
______________________________________
Curitiba, de 2020
AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus por essa jornada que foi ter escolhido a área
do direito e por conseguir chegar até onde cheguei. Em seguida aos meus pais Paulo
e Magna, que nunca me deixaram desistir e sempre estavam ao meu lado.
Aos meus queridos irmãos que fizeram presença nas noites mal dormidas com
trabalhos e provas, mas que se fizeram presentes o tempo todo, tornando o processo
mais leve de se seguir.
E agradeço imensamente a Professora Tanya Kozicki, que me fez adentrar a
matéria de Direito Constitucional e por todos os ensinamentos em sala de aula que
levarei para toda a vida.
E principalmente ao meu orientador Luiz Gustavo de Andrade, que despertou
ainda mais meu interesse na área constitucional e nas aulas muito bem ministradas,
que proporcionavam cada vez um desafio de aprendizado diferente e um novo jeito
de adquirir conhecimento. Sobretudo sua paciência e calma na hora das dúvidas, que
sempre foram sanadas.
E por fim a todos que participaram no processo da minha formação, meu
cordialmente, obrigado.
RESUMO
This paper aims to analyze the aspects of the judicialization of claims in times of
pandemic Covid-19, analyze fundamental rights guaranteed in the 1988 Federal
Constitution over the years. After that, we will go directly into the dynamics of the right
to health and how it has been guaranteed as a social right. Subsequently, the health
care that has been applied since the beginning of the pandemic. Next, an analysis of
the fundamentals of the existential minimum for a dignified life in opposition to the
reserve of the possible budget for the areas that need investment. Proceeding to the
judicial activism and the theories that surround it, being them, the proceduralism based
on the application of the rule over other interpretations and substantialism applied to
morality in decisions, passing after the theories of fact to the core of the judicialization
of health, the policies of prevention, care and combating the virus, especially policies
of protection for doctors, health professionals and workers. And at the end visualize
that there are still hurdles to be overcome among the federative entities in the fight
against Covid-19.
Quadro 1 ................................................................................................................... 29
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ................................................................................................................................. 8
2. DIREITO FUNDAMENTAL À SAÚDE ....................................................................................... 10
2.1 DIREITOS FUNDAMENTAIS SOCIAIS ............................................................................... 10
2.2 DIREITO À SAÚDE COMO DIREITO FUNDAMENTAL ................................................... 16
2.3 DISCIPLINA CONSTITUCIONAL DO DIREITO À SAÚDE NA ORDEM SOCIAL
BRASILEIRA ................................................................................................................................... 21
3. JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE ................................................................................................... 38
3.1 MÍNIMO EXISTENCIAL E RESERVA DO POSSÍVEL ...................................................... 38
3.2 PROCEDIMENTALISMO E SUBSTANCIALISMO ............................................................. 46
3.3 JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE: RECENTES POSICIONAMENTOS
JURISPRUDENCIAIS .................................................................................................................... 51
4. PANDEMIA E JUDICIALIZAÇÃO .............................................................................................. 62
4.1 JUDICIALIZAÇÃO DE POLÍTICAS SANITÁRIAS ADOTADAS PELA
ADMINISTRAÇÃO ......................................................................................................................... 62
4.2 JUDICIALIZAÇÃO DE POLITICAS PREVENTIVAS DE PROTEÇÃO À SAÚDE DE
MÉDICOS E OUTROS PROFISSIONAIS .................................................................................. 68
4.3 JUDICIALIZAÇÃO REFERENTE À INSALUBRIDADE DO TRABALHADOR DA
SAÚDE ............................................................................................................................................. 73
CONCLUSÃO ..................................................................................................................................... 77
REFERÊNCIAS .................................................................................................................................. 79
8
1. INTRODUÇÃO
Esse trabalho tem como objetivo desenvolver uma pesquisa por etapas o cerne
da judicialização e sua grande massificação na pandemia, exigindo uma interferência
mais acentuada do judiciário na resolução de problemas envolvendo a saúde e que
por vezes extrapola sua esfera de jurisdição, sendo reconhecido como o ativismo
judicial sendo exposto no tópico 3.2 desse presente trabalho.
Para se chegar até essa resolução final é necessário passar pelo direito
fundamental à saúde, e sua evolução com o passar dos anos até ser devidamente
elencado pela Constituição de 1988 como um direito fundamental e também seu
caráter social devendo ser prestado a todo ser humano na medida do possível.
Em se tratando de direito social esse trabalho irá esmiuçar todos os direitos
sociais garantidos pela constituição, e que garante que um cidadão possa viver em
um estado de bem-estar social e as políticas assistencialistas que o governo utiliza
para manter os direitos sociais.
Após isso no tópico da disciplina constitucional, é retratado do direito da saúde
através das constituições e como ele evoluiu com a passagem do tempo para se tornar
o que é hoje e primordialmente as diretrizes do SUS para o tratamento e cuidados
com a Covid-19.
Em seguida segue-se para a pesquisa relacionada ao mínimo existencial e sua
relação com os direitos sociais, sobretudo direito subjetivo do cidadão de utilizar como
garantia em receber do estado o mínimo necessário para se ter uma vida em
sociedade. Do outro oposto a reserva do possível que serve como freio ao mínimo
existencial, portanto só pode requerer do estado aquilo que está previamente
estipulado por ele e que o estado consegue arcar sem prejuízo dos demais.
Passa-se para os desdobramentos das teorias procedimentalistas defendida
por Habermas e seus aspectos positivistas das normas e sua contraposição a
defendida por Dworkin a teoria substancialista que fornece mais liberdade ao juiz para
decidir utilizando-se de paradigmas morais.
Esse capitulo, portanto, fechado com o núcleo da judicialização, como surgiu
esse instituto, se questiona se advém de tempos mais antigos ou algo relativamente
novo. Esse tópico final se desdobra nas causas da judicialização da saúde que se tem
no Brasil.
9
1 MORAES, Alexandre de. Direitos Humanos Fundamentais: teoria geral comentários aos arts.1º a
5º da constituição da república federativa do brasil. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2021. p. 22-23.
2 MIRANDA, Jorge et al (org.). Direitos Fundamentais uma Perspectiva do Futuro. São Paulo: Atlas,
2013. p. 78.
11
Com o estabelecimento dos direitos sociais, o Estado passa a ter uma política
mais assistencialista para com a população, focando em programas na qual o cidadão
possa ter uma qualidade de vida melhor, algo que na concepção liberal não era
atingido, pois nessa época o indivíduo por si só deveria atingir o patamar de bem-estar
que considerasse satisfatório.
O desenvolvimento dos Direitos Fundamentais sociais, tem uma grande
construção histórica e que remetem principalmente, na época da guerra, em que o
mundo se encontrava em boa parte fragilizado.3 Por meio então da globalização, e
com o intuito de trazer ao mundo uma visão mais coletiva em detrimento da individual,
buscou-se garantir meios pelo qual o cidadão se sentisse mais amparado, e que
futuramente seriam estabelecidas como os Direitos Sociais pela Constituição Federal
de 1988, no seu artigo 6º, educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o
transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção a maternidade e à
infância e pôr fim a assistência aos desamparados.
O direito à educação está presente nesse rol, pois há a necessidade de preparo
do ser humano para a vida em sociedade e aprendizado da sua língua nativa, e para
que isso seja realizado é necessário um mínimo de escolaridade, por isso a criança
desde a sua idade mais tenra já é encaminhada a escola. Portanto a educação,
moldará o indivíduo para torna-lo um profissional e que saiba conviver em sociedade,
podendo assim contribuir com a sua profissão para a coletividade.4
Assim como na saúde o Estado também deve oferecer uma porcentagem
mínima para o gasto com a educação, afim de igualar os indivíduos que são
hipossuficientes e não conseguem arcar com os custos relacionados a aprendizagem,
perante aquela parcela de pessoas que por meio da iniciativa privada garantem o
acesso. Porcentagem mínima essa estabelecida pela Constituição Federal no artigo
212º, União contribuindo com 18%, Estados, Distrito Federal e Municípios cerca de
25% da receita com impostos.
A saúde por sua vez já retratada anteriormente, também se encaixa no quesito
de direito social, pois antes de usufruir de qualquer outro direito, o vigor e o bem-estar
devem estar elevados. E há uma relação entre os cidadãos que não possuem recursos
financeiros para à saúde com os quem tem recursos para tal feito, por meio de
impostos revertidos para o auxílio desses menos afortunados, fornecendo impulso a
máquina estatal e a sociedade como um todo.
Pode ser muito bem explicitado por, Sérgio André:
5 SARAIVA FILHO, Oswaldo Othon de Pontes et al (org.). Direitos Fundamentais dos Contribuintes:
homenagem ao jurista Gilmar Ferreira Mendes. São Paulo: Almedina, 2021. p. 649.
6 MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 13.
e empregado, sobretudo o elo mais fraco dessa relação que é o empregado. Que lutou
por muitos anos para se ter um ambiente de trabalho saudável, equilibrado, digno, e
que não houvesse exploração. Esse direito visa assegurar que essas conquistas não
sejam perdidas, e que o trabalhador possa manter seu emprego, com a finalidade de
saciar suas necessidades básicas, que envolvem os demais direitos sociais, por meio
da contraprestação entre chefe e empregado de natureza pecuniária justa.8
O Estado, então, criou alguns suportes que auxiliassem o trabalhador a manter
seu emprego e se pôr fim o perdesse, usufruiria de um benefício até a obtenção de
um novo emprego. Um dos institutos para a garantia do emprego, é o da multa por
rescisão sem justo motivo fixado a 40% do valor do salário, que faz com que o
empregador mantenha por mais tempo seu funcionário. Caso o empregado ainda
sofra o desligamento, torna-se beneficiário do Seguro Desemprego, uma prestação
que o estado oferece ao indivíduo que é despedido sem justo motivo, para o
abatimento das suas necessidades básicas.9
Cabe atenção ao direito de moradia, de possuir um ambiente seguro para se
alocar, constituído de uma estrutura que comporte um núcleo de família, e que forneça
segurança a todos ali moradores, na perspectiva que tenham acesso aos serviços
mínimos que garantam o bem estar social, e uma vida em sociedade.10
Nessa perspectiva de se obter um lugar para se estabelecer, os entes
federados, delimitaram aqueles que não possuem moradia, considerados como uma
população de baixa renda, direito de obter uma propriedade por meio do instituto da
usucapião. Que estabelece que se o indivíduo provar, que manteve a posse
ininterrupta do terreno por um determinado tempo, esse podendo ser variado de
usucapião civil ou constitucional, o terreno passa a ser daquele que teve posse
ininterrupta, esse foi um dos meios, para a garantia da moradia.
O quesito de transporte também encontra amparo na Constituição como um
direito social, sendo o meio de locomoção das pessoas para a aquisição dos outros
direitos sociais. Por isso fica a encargo dos entes federados, de apresentar meios de
transportes com fácil acessibilidade a toda coletividade e principalmente aqueles que
possuem alguma debilitação, e com um valor que alcance todas as camadas da
8 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito do Trabalho. 11. ed. São Paulo: Saraiva, 2019.
p. 54-55.
9 MARMELSTEIN, George. Curso de Direitos Fundamentais. 8. ed. São Paulo: Atlas, 2019. p. 197.
10 SARLET, Ingo Wolfgang; MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Curso de Direito
11 LENZA, Pedro. Direito Constitucional Esquematizado. 24. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 1350.
12 SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2020. p. 706-707.
13 GLINA, Nathan. Segurança Pública: direito, dever e responsabilidade. São Paulo: Almedina Brasil,
2020. p. 45-50.
15
previdência social, sobretudo é um direito que vem para auxiliar com a saúde e
assistência a quem necessite.
Porém, o financiamento para garantir todos esses recursos geralmente é alto o
que acaba sempre gerando discussões e mudanças no seu sistema interno de
contribuição para dar conta do pagamento de todos os beneficiários, caso esse que
ocorreu recentemente com a reforma da previdência pela Emenda Constitucional
nº103 de 12 de novembro de 2019, que trouxe mudanças relacionadas ao tempo de
contribuição, que foi aumentada em alguns anos a mais para se aposentar tanto o
homem quanto a mulher.14
Tratando-se, ainda, da previdência, a constituição também determinou que a
mulher gestante obtivesse uma atenção do estado, que seria o direito social da
maternidade.
Direito esse que pudesse garantir o bem-estar da mulher no período
gestacional, considerado um período em que a gestante deve tomar cuidados para
com a sua saúde e a do bebê.
É determinado então que depois do parto do bebê, a mulher entre em licença
maternidade, em que deve ficar em repouso com o seu filho por cerca de 120 dias,
em que recebe seu pagamento normal de salário pelo empregador, mas que na
verdade é a previdência que realiza o pagamento, pois ressarce o valor do salário ao
patrão.15
É um direito que, além de trazer benefícios e garantias a saúde, relembra a luta
das mulheres e do próprio direito do trabalho as conquistas em ter um emprego com
mais dignidade e humanizado.
E por fim a garantia do direito social aos desamparados, que tem por finalidade
amparar aqueles que de alguma forma, foram marginalizados perante a sociedade,
dever este imposto também a seguridade social para com o cuidado com essas
pessoas. É um dever assistencialista para aquele cidadão que não tem condições
alguma de garantir os próprios direitos.16
Em síntese, os direitos sociais fundamentais abarcam as necessidades básicas
do ser humano para a convivência em conjunto com as demais pessoas, de maneira
que se tenha uma união entre indivíduo e estado gerando um equilíbrio entre os
direitos público e privado, evitando que a sociedade retroceda em épocas que se vivia
apenas pelo estado de natureza.
2019. p. 154.
19 Ibid., p. 155
17
Se, apesar disso, todas as cláusulas do Bill of Rights são designadas como
direitos e liberdades do povo inglês, isso conduz à concepção de que as
restrições impostas à coroa, pela lei, constituem, ao mesmo tempo, direito do
povo.21
Esse tratado, ainda, não possuía nada que referenciasse uma possível
proteção ao direito a saúde ou até mesmo a vida, continuaria ainda por vários anos
sendo negligenciado até que no ano de 1776 surgisse a Declaração de Direitos do
Bom Povo de Virgínia.22
Sendo considerado um possível início para os direitos que tinham por objetivo
a proteção da vida, somadas aos direitos já conquistados de propriedade e liberdade,
finalmente denotava-se a necessidade da proteção ao bem estar humano face ao
poder do estado.23
Pode-se entender que após a Declaração de Virgínia, pelo seu grande avanço
na conquista dos direitos dos cidadãos passou a exercer influência para as demais
declarações e tratados de defesa dos direitos, sobretudo autonomia ao povo a um
20 RAMOS, André de Carvalho. Curso de Direitos Humanos: de acordo com a lei geral de proteção
de dados pessoais - lei n.13.709/2018. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. p. 40.
21 GARCIA, Emerson (org.). A Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão: contribuição para
a história do direito constitucional moderno. São Paulo: Atlas S.A, 2015. p. 59-60.
22 ESTADOS UNIDOS DA AMÉRICA. Declaração de Direitos da Virgínia. 1776. Disponível em:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-
cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-
de-direitos-do-bom-povo-de-virginia-1776.html>. Acesso em: 27 de maio. 2021.
23 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Manual de Direitos Humanos. 3. ed. São Paulo: Atlas S.A, 2014.
p. 3.
18
24 OLIVEIRA, Fabiano Melo Gonçalves de. Direitos Humanos. Rio de Janeiro: Forense Ltda, 2016. p.
39
25 GUERRA, Sidney. Curso de Direitos Humanos. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. 64 p.
26 LOCKE, John. Dois Tratados do Governo Civil (1689). Tradução de Miguel Morgado. Lisboa:
<http://www.direitoshumanos.usp.br/index.php/Documentos-anteriores-%C3%A0-
cria%C3%A7%C3%A3o-da-Sociedade-das-Na%C3%A7%C3%B5es-at%C3%A9-1919/declaracao-
de-direitos-do-homem-e-do-cidadao-1789.html>. Acesso em: 27 de maio. 2021.
31 RAMOS, 2019. p. 45.
20
Artigo 3
Todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.
Artigo 25
1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a
si e à sua família saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário,
habitação, cuidados médicos e os serviços sociais indispensáveis e direito à
segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou
outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de
seu controle.
32 ARAÚJO, Luiz Alberto David; NUNES JÚNIOR, Vidal Serrano. Curso de Direito Constitucional. 18.
ed. São Paulo: Verbatim, 2014. p. 158-159.
33 MONDAINI, 2020. p. 157.
34 ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS. Declaração Universal dos Direitos Humanos, 1948.
outro artigo que aborde como e por quem será realizado esses socorros públicos, a
garantia de saúde, permanecendo uma lacuna na constituição.36
Como a Constituição não disciplinava de forma aprofundada sobre a saúde, o
que se tem nessa época sobre esse assunto é as chamadas “Casas de Misericórdia”
que proporcionavam cuidados aos pobres e enfermos que dela necessitassem, e que
apenas subsistiam da caridade da população, e que aos poucos foi sendo centralizada
ao império, passando a fornecer deveres e obrigações para as câmaras municipais
com o objetivo de aprimorar esse serviço fornecido ao povo.37 Esses cuidados só
foram ser tomados com os arts. 69º e 70º da Lei de 1º de outubro de 1828, que
estabelecia as funções das câmaras e que trouxe as já ditas funções de proteção. 38
36 Art. 179. A inviolabilidade dos Direitos Civis, e Politicos dos Cidadãos Brazileiros, que tem por base
a liberdade, a segurança individual, e a propriedade, é garantida pela Constituição do Imperio, pela
maneira seguinte. XXXI. A Constituição tambem garante os soccorros publicos.
BRASIL. Constituição Política do Império do Brasil (de 25 de março de 1824). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao24.htm>. Acesso em: 27 de maio. 2021.
37 SOUZA, Simone Elias de. OS "SOCORROS PÚBLICOS" NO IMPÉRIO DO BRASIL: 1822 a 1834.
2007. 66 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de História, Universidade Estadual Paulista, Assis, 2007.
Cap. 2. Disponível em:
https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449/93420/souza_se_me_assis.pdf?s. Acesso em: 24
abr. 2021.
38 Art. 69. Cuidarão no estabelecimento, e conservação das casas de caridade, para que se criem
liberdade do povo por meio das garantias civis e políticas mesmo que isolada como a
da saúde.39
A próxima constituição que seria considerada um retrocesso quanto a saúde é
a Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil de 189140, pois não trouxe
absolutamente nada que pudesse garantir uma saúde e atendimento contra
enfermidades para os cidadãos brasileiros. A Constituição Imperial embora com
características mais autoritárias elencou pelo menos indiretamente a proteção à saúde
do indivíduo, algo que poderia ter sido trazido para a nova disciplina constitucional
vigente.
Por sua vez a Constituição de 1891, sendo a primeira constituição republicana,
teve sua atenção voltada para abolição do absolutismo e implementação da forma
federativa do estado, tendo então como seu chefe de estado o presidente ao invés do
monarca, sendo o primeiro presidente do Brasil Marechal Deodoro da Fonseca, que
implementou ideias na assinatura da Constituição que seriam utilizadas na
Constituição de 88, como a indissolubilidade do pacto federativo, forçando o pais a
continuar como uma república e não retroceder ao regime monárquico, utilizando-se
dos conceitos de liberdade, e garantido maior participação dos cidadãos brasileiros
na escolha de seus representantes, princípios retirados da então já discutida
Revolução Francesa.41
Uma das primeiras constituições que buscou tratar de um mínimo de proteção
à saúde, foi a constituição de 193442. Não possuía nenhum capítulo especial que
tratasse apenas desse instituto, mas estava espalhada pelos demais capítulos da
constituição, sob a proteção do servidor público e do trabalhador. Entende-se,
portanto, que nessa época o constituinte não considerava proteger a saúde de forma
fundamental e que atingisse todas as camadas sociais. O constituinte de 1934 focou
sua atenção nessa época para a educação e o trabalho, tornando os dois institutos
43 FRANCO, Afonso Arinos de Melo. Curso de Direito Constitucional Brasileiro. 3. ed. Rio de
Janeiro: Forense, 2019. p. 377-378.
44 Art 10 - Compete concorrentemente à União e aos Estados: II - cuidar da saúde e assistência
públicas; BRASIL. Constituição da República dos Estados Unidos do Brasil (de 16 de julho de
1934). Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm>. Acesso
em: 27 de maio. 2021.
45 Art 121 - A lei promoverá o amparo da produção e estabelecerá as condições do trabalho, na cidade
e nos campos, tendo em vista a proteção social do trabalhador e os interesses econômicos do País.
§ 1º - A legislação do trabalho observará os seguintes preceitos, além de outros que colimem melhorar
as condições do trabalhador:
h) assistência médica e sanitária ao trabalhador e à gestante, assegurando a esta descanso antes e
depois do parto, sem prejuízo do salário e do emprego, e instituição de previdência, mediante
contribuição igual da União, do empregador e do empregado, a favor da velhice, da invalidez, da
maternidade e nos casos de acidentes de trabalho ou de morte. BRASIL. Constituição da República
dos Estados Unidos do Brasil (de 16 de julho de 1934). Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao34.htm>. Acesso em: 27 de maio. 2021.
46 BRASIL. Constituição dos Estados Unidos do Brasil (de 10 de novembro de 1937). Disponível
havia uma usurpação do poder legislativo para que o presidente assinasse leis
conforme entendimento próprio.48
As mudanças quanto à saúde passam a ser mais visíveis nessa época devido
a lei nº 378, 13 de janeiro de 1937.49 Que confere legitimidade para a esfera federal
em comunhão com os estados no cuidado a saúde e educação, estabelecendo como
preservação da saúde as delegacias de saúde para a fiscalização dos serviços de
atendimento médico, criando também por meio desta lei as Conferências nacionais
de saúde, por meio ao qual a união consegue delimitar diretrizes para um
aperfeiçoamento quantos as políticas públicas de saúde, até então o dispositivo que
mais trouxe direitos quanto a saúde aos cidadão brasileiros.
Quanto ao elucidado na Constituição de 1937 tem o artigo 16, XXVII50 que tem
por objetivo a proteção da saúde da criança em caráter especial, sendo privativa da
união delimitar como será feita as políticas públicas para a manutenção do mesmo,
podendo delegar aos estados as medidas de saúde.
A Constituição só voltaria a ser reformulada em 194651, época do pós segunda
guerra mundial, na qual vários países ainda tentavam se recuperar dos prejuízos
causados pelos confrontos bélicos.
Constituição que primava pela redemocratização do país e abolir os ditames
autoritários que a constituição de 1937 possuía, buscava-se a implementação dos
direitos sociais a população.52
Havia um anseio da nova carta em restabelecer preceitos da constituição de
1934, principalmente na questão democrática, portanto era garantido na nova carta
direitos eleitorais e sociais, devolvendo a liberdade que outrora havia se perdido, de
volta ao povo.53
48 ACQUAVIVA, Marcus Cláudio. Teoria Geral do Estado. 3. ed. São Paulo: Manole, 2010. p. 49
49 BRASIL. Lei nº 378, de 13 de janeiro de 1937. Dá nova, organização ao Ministério da Educação e
Saúde Pública. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1930-1949/l0378.htm>.
Acesso em: 24 abri. 2021.
50 Art 16 - Compete privativamente à União o poder de legislar sobre as seguintes matérias:
285 p.
53 PALMA, Rodrigo Freitas. História do Direito. 8. ed. São Paulo: Saraiva, 2019. 478 p.
26
<http://bvsms.saude.gov.br/ultimas-noticias/3252-25-7-aniversario-de-criacao-do-ministerio-da-saude-
2>. Acesso em: 25 abril. 2021.
57 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1967. Disponível em:
59 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Manual de Direito Previdenciário: de
acordo com as alterações no regulamento da previdência social decretos 10.410/2010 e10.491/2020.
24. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2021. 33 p.
60 BRASIL. Lei nº 6.439, de 1º de setembro de 1977. Institui o sistema Nacional de Previdência e
XVII - legislar sobre: c) Normas gerais de direito financeiro; de seguro e previdência social; de defesa
e proteção da saúde; de regime penitenciário; BRASIL. Constituição da República Federativa do
Brasil de 1967. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao67.htm>.
Acesso em: 25 de abril. 2021.
62 CASTRO, Carlos Alberto Pereira de; LAZZARI, João Batista. Direito previdenciário: regime geral e
próprios da previdência social, de acordo com as novas regras aprovas pela mp n.739, 07.07.2016,
jurisprudência atualizada, glossário, fluxogramas. Rio de Janeiro: Forense, 2016. p. 34.
28
– SUS, que tem a finalidade de fornecer acesso aos serviços médicos a aqueles que
não possuem condições de banca-lo, abrangendo cuidados com a saúde física e
mental da pessoa humana.66
Para se ter controle das políticas de saúde ao longo dos anos e para a correta
destinação de insumos a saúde, é criado o Plano de Saúde pela portaria Nº 2.135, de
25 de setembro de 201367, definindo as metas e objetivos que deverão ser seguidos
com a finalidade de controlar os problemas que eventualmente aparecerem no
desenvolvimento da saúde no Brasil.68
Está disposta no art. 2 dessa portaria definindo que o Plano de Saúde será o
encarregado pela elaboração do planejamento e orçamento com saúde, e por isso
deverá respeitar os prazos do Plano Plurianual. Para que de fato essas metas sejam
cumpridas é criado pela mesma portaria no art. 4, a Programação Anual de Saúde
que deve seguir estritamente o PS, é por meio da PAS que serão definidas as ações
para cada ano afim de atingir o que foi delimitado no PS, por cada ente federado.
Para uma melhor visualização do quanto o direito de saúde é necessário de ter
seu caráter fundamental e também explicitar as diretrizes para a proteção do mesmo,
segue o quadro com a finalidade da proteção a saúde do cidadão do Estado do
Paraná, e publicada no Diário Oficial do Estado nº 10.462 de 10/03/2020.
quais são os passos que estão sendo tomados sobretudo no estado do Paraná para
a contenção do vírus.
Já a defesa da saúde em caráter nacional em 2021, se deu devido ao aumento
dos casos de pessoas que contraíram o vírus, foi a abertura da campanha da
vacinação com o Covid-19 que teve seu início no dia 18 de janeiro de 2021, na qual o
governo federal realizou a distribuição de imunizantes de forma simultânea para cada
estado brasileiro.69
Demasiada é a importância do SUS que é por meio dele que os cidadãos
brasileiros recebem o tratamento para os variados tipos de enfermidade.70 Por isso há
a necessidade desse sistema, para que o estado atenda devidamente o que lhe é
imposto pela Constituição Federal, sobretudo no artigo 20071. Que trata de campanhas
de prevenção e cuidados, no período atual, vigilância epidemiológica causada pelo
SARS-CoV-2.
Para que esse sistema de saúde descentralizado funcione de maneira correta
e atenda toda a população, é necessário que os entes federados tenham condições
econômicas estáveis e planejamento para o direcionamento da verba destinada
apenas a saúde.
E isso é garantido pela Lei Complementar nº 141, de 13 de janeiro de 2012,
que contempla o quanto cada estado deve destinar do seu orçamento para a área de
saúde, no caso dos Estados e Distrito Federal corresponde 12% da arrecadação de
69 PAGNO, Marina. Ministério da Saúde abre campanha de vacinação contra a Covid-19 com envio de
doses aos estados. Ministério da Saúde, 2021. Disponível em: <https://www.gov.br/saude/pt-
br/assuntos/noticias/ministerio-da-saude-abre-campanha-de-vacinacao-contra-a-covid-19-com-envio-
de-doses-aos-estados>. Acesso em: 26 de maio. 2021.
70 BRASIL. LEI 8080, DE 19 DE SETEMBRO DE 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção,
impostos, o Município por sua vez corresponde a 15% e pôr fim a União que deverá
contribuir com o valor do exercício financeiro correspondente ao ano anterior mais um
acréscimo da variação do percentual do Produto Interno Bruto.72
Sendo esse um dos principais deveres do estado para com a população, este
deve garantir que a área da saúde seja devidamente financiada com o dinheiro dos
impostos, pois assim, a sociedade estará tendo um retorno daquilo que foi pago como
receita.
É considerado, portanto, como um princípio constitucional sensível, devido a
sua obrigatoriedade, ou seja, um limite ao poder derivado para o cumprimento do que
foi pactuado, cabendo uma sanção ao ente federal que porventura venha descumpri-
lo. Nas palavras de Rodrigo Padilha:
[...]. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, 15 mar. 2021. Disponível em:
<https://www.in.gov.br/web/dou/-/emenda-constitucional-n-109-308527609>. Acesso em: 17 mar.
2021.
75 SENADO FEDERAL. Relatório da PEC Emergencial inclui cláusula para permitir pagamento de
76 VASCONCELOS, Clever; Apud, Canotilho, José. Curso de Direito Constitucional: atualizado até a
ec n.104/2019. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p. 376.
77 TAVARES, André Ramos. Curso de Direito Constitucional. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 2020. p.
755.
78 MENDES; BRANCO, 2018. p. 725.
34
79 SILVA, Marcelino José Piancó da; Apud, MOREIRA, 2011, p.3. Evolução do Direito à Saúde
Pública no Brasil: uma visão geral quanto aos fundamentos do direito à saúde, seus impactos
financeiros, responsabilidade do estado e o papel da defensoria pública para efetivação desse direito.
São Paulo: Dialética Ltda, 2020. Edição Kindle, cap. 2.2 (463-484 posições).
80 Ibid., cap. 2.2 (463 posições)
81 CALADO, Vinicius de Negreiros; SANTOS, Bruna Barboza Correia dos (org.). Direito Médico e da
públicos para auxílios ou subvenções às instituições privadas com fins lucrativos. BRASIL.
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 27 de maio. 2021.
35
que se tem acesso a esses recursos, seja por contrato em instrumento público e
convênios.83
Pontuado o envolvimento da iniciativa privada na saúde, há necessidade da
conceituação das competências dos entes federados em matéria de saúde,
competência constitucional material comum e legislativa formal concorrente.
Sarlet, Marinoni, Mitidiero ensinam que competência material é definida como:
regulamentação, fiscalização e controle das ações dos serviços de saúde no Estado do Paraná.
Disponível em:
>https://www.legislacao.pr.gov.br/legislacao/pesquisarAto.do?action=exibir&codAto=5982&indice=1&t
otalRegistros=1&dt=12.3.2020.14.10.57.692>. Acesso em: 27 de maio.2021.
89 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Relator Ministro Marco Aurélio Mello. 2020. Disponível
3. JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE
92Art. 25º.1. Todo ser humano tem direito a um padrão de vida capaz de assegurar a si e à sua família
saúde, bem-estar, inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados médicos e os serviços sociais
indispensáveis e direito à segurança em caso de desemprego, doença invalidez, viuvez, velhice ou
outros casos de perda dos meios de subsistência em circunstâncias fora de seu controle.
2. A maternidade e a infância têm direito a cuidados e assistência especiais. Todas as crianças,
nascidas dentro ou fora do matrimônio, gozarão da mesma proteção social. ONU. Declaração
39
E que também pode ser compreendido na forma do art. 3º, III da Constituição
Federal, que retrata da extinção da pobreza na sociedade brasileira, remetendo,
portanto, na concepção de que para se extinguir a pobreza ou pelo menos reduzi-la
drasticamente é necessário que o cidadão, possua condições financeiras, de saúde e
um trabalho que o afaste dessa situação hipossuficiente, e o retorne para o seio da
sociedade.93
O desenvolvimento do mínimo existencial remota ao direito Alemão pós
segunda guerra mundial, em seus direitos fundamentais, especificamente para os
direitos sociais da época, e que deveriam ser garantidos primando pelo bem estar do
cidadão alemão, discute-se que não basta apenas demonstrar o direito protegido de
forma fundamental, em uma constituição apenas formal, o estado precisa intervir e
dispor de meios para que isso seja alcançado de uma forma mínima. Não há garantia
social de saúde de forma plena e abrangente, sem políticas públicas que ofereçam o
acesso ao atendimento médico para aqueles que necessitam, estando prejudicada os
direitos mínimos de existência saudável.94
Após isso a tese do mínimo existencial ao passar pelo crivo constitucional da
corte federal alemã, teve sua eficácia consagrada em seus direitos fundamentais
passando ser uma obrigatoriedade e dever do estado para com os cidadãos, sob pena
de não o fazer, as garantias sociais se tornarem deficientes quanto sua proteção aos
direitos subjetivos do indivíduo.95
Sarlet, Mitidiero, Marinoni expressam entendimento quanto ao mínimo
existencial da seguinte forma:
na obra: natureza e eficácia dos direitos sociais, reserva do possível e mínimo existencial, proibição do
retrocesso, educação básica de qualidade: o mínimo dos mínimos existenciais. São Paulo: Saraiva,
2020. p. 219-220.
95 SARLET; MARINONI; MITIDIERO, 2019. p. 665.
40
Entende-se, pela definição dos autores, que o mínimo existencial não está
atrelado apenas as condições de vida e saúde do indivíduo, mas sim em um patamar
completamente social, é necessário que o cidadão possua os recursos necessários
para se sentir pertencente a sociedade como um sujeito ativo de direitos e
responsabilidades para com os demais, caracterizando a prestação positiva do
estado.
Dentro desse aspecto mínimo estaria também o de acesso à justiça, pois se
caso os direitos sociais adquiridos fossem violados, necessitaria de que também fosse
protegido e resguardado para o cidadão seu direito de uma prestação positiva face ao
judiciário para tutelar o direito mitigado, garantido pelo art. 5, XXXV da CF97. O direito
ao acesso à justiça sendo resguardado como requisito mínimo, fornece segurança ao
cidadão de que o mesmo possui garantias quanto ao poder inquisitivo do estado e por
consequência não lhe será turbado.98
Destacada a introdução do mínimo existencial, cabe ressaltar que o primeiro
doutrinador a aplicar esse conceito no Brasil foi Ricardo Lobo Torres, em 1989, que
trouxe até então as ideias já discutidas, dever do estado garantidor de direitos, direitos
mínimos nos direitos sociais e extinção da pobreza caracterizada por ele como a
pobreza absoluta do indivíduo que nunca teve acesso a qualquer bem que pudesse
reformar sua situação precária, por isso dever inquestionável do estado de auxiliar
pessoas que se encontrem nessa posição ou situação análoga. E pobreza relativa
ligada a economia do país, sendo contornada por políticas tributarias. 99
Outro aspecto tratado por ele, é de que o mínimo existencial também está
atrelado intimamente com a felicidade do cidadão, sendo sinônimo de uma boa
p. 224.
99 TORRES, R. L. O mínimo existencial e os direitos fundamentais. Revista de Direito Administrativo,
Para John Rawls, os cidadãos são livres e tem liberdade para atuar em meio a
sociedade da forma que melhor lhes interessarem nos limites da lei de forma regular,
de modo que o Estado garanta que todas pessoas viventes nessa sociedade tenham
a mesma ou maior liberdade entre elas, caracterizando o mínimo existencial na
perspectiva de Rawls. Aponta que as desigualdades estão presentes na sociedade
2013. p. 913-914.
42
tanto na perspectiva social quanto econômica, mas que devem ser tratadas de forma
que essas limitações ocasionadas pelas desigualdades, possam se tornar vantajosas
para os viventes.103
Explica que se essa desvantagem de alguma forma trouxer benefícios
posteriormente para a sociedade ela é válida, caso em que um indivíduo receba
remuneração muito maior para a realização de um serviço; se esse serviço for melhor
aperfeiçoado devido a essa remuneração exorbitante e esse trabalho for voltado para
o atendimento das pessoas que não teriam as mesmas condições de recebe-lo, há
uma diminuição quanto a desigualdade, portanto justiça a todos primando pela
equidade, pois esse serviço estará retornando para a sociedade e para as pessoas
menos favorecidas de forma que atenda alguma de suas necessidades.104
Retira-se da teoria de Rawls uma perspectiva de que uma sociedade liberal e
capitalista, muitas vezes desigual, pode ser reformulada para uma noção maior de
justiça mesmo não possuindo equilíbrio entre os indivíduos que participam dessa
sociedade, bastando que o estado faça esse controle na população garantindo a cada
indivíduo aquisições diminutas de seus direitos na medida que as desigualdades
encontradas sejam transformadas em virtudes para todos inseridos naquele meio.
Caracterizado o mínimo existencial nesse primeiro momento, consta-se
necessário retratar da reserva do possível, que em boa parte das judicializações é
confrontada com o mínimo existencial, cabendo uma ponderação ao juízo de qual
instituto naquele caso concreto oferece a melhor solução para com a lide.
A reserva do possível é bem pontuada por Sarlet, Mitidiero, Marinoni quando:
103 RAWLS, John. Uma Teoria da Justiça. Tradução de Almiro Pisetta; Lenita M.R Esteves. São Paulo:
Martins Fontes, 2021. p. 64.
104 Ibid., 65.
105 SARLET; MITIDIERO, MARINONI, 2020. p. 652.
43
escolha da profissão que se quer seguir, a ideia que se retira da reserva do possível
nessa época é do princípio da razoabilidade, em que foi de entendimento do Tribunal
Federal alemão de que não era razoável e nem proporcional, a liberação e obrigação
do estado ao acesso de todos os alunos para realizar o curso de medicina, ficando
subentendido de que compete aos alunos interessados no curso, realizar por si só os
meios disponíveis para entrada no curso superior.106
Com o decorrer do tempo esse “principio” foi trazido ao Brasil, mas teve seu
sentido reformulado pelos tribunais, sendo, portanto, destacado, como algo que pode
ser exigido pelo particular utilizando-se de seu direito subjetivo amparado por alguma
pretensão relacionada a direitos sociais já discutidos nos capítulos iniciais (mínimo
existencial), mas que seja cabível para a capacidade orçamentaria do Estado, sendo
caracterizado como um freio as pretensões de direito social.107
Esse embate entre mínimo existencial e reserva do possível está atrelado
também ao direito administrativo no que tange a supremacia do interesse público
sobre o privado.108 É permitido como discutido anteriormente a pretensão do cidadão
em requerer auxilio para o estado, quando se depara com seu direito sendo deturpado
de alguma forma por algum ente, mas há necessidade por vezes de uma limitação,
por isso já é estipulado uma reserva do dinheiro público para o atendimento dessas
ocasiões supervenientes, cabendo ao juízo discutir o merecimento de tal pretensão
do Estado.
O Estado, portanto, deve destinar uma parte do orçamento para esses
imprevistos, a reserva do possível deve ser atentar a Lei de Diretrizes Orçamentarias
e a Lei Orçamentaria Anual, a primeira tem como objetivo calcular os gastos e
despesas para o exercício financeiro subsequente, além de orientar o
desenvolvimento da segunda lei. E a LOA por seguinte deve elaborar o orçamento
fiscal, investimentos nas empresas públicas e para com a seguridade social as duas
ao final devem estar alinhadas ao Plano Plurianual que estabelece meios para
administração pública cuidar das despesas de capital.109
106 BERTHOLDI, Juliana. Direitos Sociais e Políticas Públicas. Curitiba: Contentus, 2020. p.23.
107 MARTINS, 2020. p. 179.
108 SILVA, 2014. p. 584.
109 MENDES, 2018. p. 767.
44
110 BARCELLOS, Ana Paula. Curso de Direito Constitucional. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Ltda,
2020. p.202.
111 Ibid., 202
45
órgãos que necessitariam com mais urgência dos mesmos, e que se por acaso não
houver a destinação adequada como prevista pelo orçamento haverá consequências
para os demais.112
Consequências essas que podem ser centralizadas em desordem no equilíbrio
estatal financeiro, que tem a premissa de estar em perfeitas condições e estruturada
para que possa fornecer boa qualidade de vida aos cidadãos, mantendo a tutela
estatal para com os direitos sociais fundamentais113, ou seja, a boa gestão financeira
do estado e de seu discernimento para tratar com as responsabilidades econômicas
irá determinar o quanto o sistema econômico permanecerá em ordem enquanto
destina recursos para as áreas que a sociedade mais necessita, de forma que
permaneça em equilibro.
Marcos Sampaio pontua acerca dos direitos sociais conquistados pelo indivíduo
e que enseja auxilio do judiciário se necessário, definindo que não é mera citação de
regras, ele dispõe:
Retira-se a ideia de que para o autor os direitos sociais já são de uso pleno dos
indivíduos e que devem ser exercidos a qualquer momento, que não basta estar
definido como uma norma e ser incorporado no ordenamento jurídico. Os direitos
sociais já devem estar ao alcance do cidadão como direito subjetivo, para
reconhecimento da força de lei e da eficácia da Constituição e não ser apenas letra
morta.
Portanto, quando há conflito entre a reserva do possível e mínimo existencial,
princípio do interesse público e princípio da dignidade da pessoa humana deve haver
uma ponderação entre os dois institutos, objetivando a concretização daquele direito
112 BUCCI, Maria Paula Dallari; DUARTE, Clarice Seixas (org.). Judicialização da Saúde: visão do
poder executivo. São Paulo: Saraiva, 2017. p. 189.
113 CONTI, José Mauricio (org.). Dívida Pública. São Paulo: Blucher, 2018. 63 p.
114 SAMPAIO, 2013. p. 89.
46
que melhor se encaixa no caso concreto. Como pontua Robert Alexy, quando leciona
o caráter prima facie dos princípios, definindo que não possuem caráter “terminativo”
e que podem ser relativizados quando em confronto contra outro princípio, como é o
caso.115
Havendo essa colisão de princípios e a necessidade de uma decisão quanto
ao assunto, surgiram duas teorias com relação a atividade do judiciário no seu papel
de proteção e aplicação de direitos e seu ativismo na realização desse objetivo. Para
definir o melhor meio a realizar essa tarefa há a formulação da teoria procedimentalista
e outra denominada substancialista, que serão trabalhadas nosso próximo tópico.
115 ALEXY, Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. Tradução de Virgílio Afonso da Silva. São
Paulo: Malheiros Editores Ltda, 2006. p. 103-104.
116 MONTESQUIEU. Do Espírito das Leis. Tradução de Miguel Morgado Lisboa: Edições 70, 2018. p.
305.
47
Pode-se constatar, após esse trecho, a crítica que Montesquieu faz a regimes
que sejam regidos por uma única pessoa e seu repúdio a governos despóticos, e o
poder de forma centralizada. Dessa maneira a repartição de poderes é bem-vinda
para balancear e dar equilíbrio ao estado soberano repartindo o poder e obrigações
primando o interesse do coletivo sob o individual.
Entretanto, essa visão da repartição dos poderes no Estado Liberal mitigava
sobretudo o poder dos juízes nas decisões das causas. Devido à época ser marcada
por um ideal mais positivista das normas, o papel do juiz era de apenas adequar o fato
concreto para com lei, que havia sido anteriormente aprovada pelos representantes
do povo. Não era admitido que o juiz fizesse interpretação conforme seus
entendimentos internos para o caso, primava-se pela neutralidade do julgador. Cada
poder exercia sua função sem transpassar sua área de atuação, a finalidade era a
aplicação da lei conforme descrita nos dispositivos jurídicos, não importando as
especificidades que cada caso exige, logo se o juiz aplicasse a norma e o individuo
não conseguisse atingir seus objetivos, não comportava ao julgador realizar alguma
ação para complementar o direito, pois seu dever estava completo realizando a
subsunção do fato a norma.119
públicas e protagonismo judiciário. São Paulo: Almedina, 2016. Edição Kindle, cap. 4.1.1 (5378
posições).
48
Explicitado essa fase inicial cabe adentrar no conceito de ativismo judicial, que
consiste em uma ação por parte do poder judiciário, em evadir sua esfera de controle
e administração, que no caso de o poder judiciário julgar as demandas que lhe são
oferecidas, e adentrar em função e obrigações de um poder que não é de sua alçada,
na busca da resolução de um conflito que lhe foi imputado.120
Desenvolvido anteriormente a noção dos três poderes, se obtém um sistema
balanceado de forças evitando-se os excessos que um pode vir ocasionar para com
o outro, cabe ressaltar que a constituição adotou a teoria de Montesquieu, aderindo
ao ordenamento jurídico brasileiro a separação de poderes em seu art. 2º da
Constituição Federal.121 Portanto segundo o autor Elival da silva Ramos no ativismo
do judiciário, se romperia esse equilíbrio já previamente positivado na constituição,
ocasionando uma decadência no poder julgador e afetando sobretudo o poder
legislativo, que para o autor é o poder mais lesionado com a ruptura do princípio da
tripartição.122
O cerne principal no ativismo é a expansão da sua esfera de atuação em
julgamentos, para decidir e julgar em caráter mandamental outra entidade em sua
função posta pela Constituição de maneira que siga a interpretação que o judiciário
realiza.123
Por outro lado, pode se encontrar um aspecto positivo dessa interferência, os
casos complexos são a maior fonte do ativismo, visto demandarem mais tempo,
estudo e compreensão do caso concreto para a elaboração de uma decisão que
ponha fim a lide. Os casos mais intricados apontam o autor, geralmente estão
resolvendo conflitos em que há o desrespeito ou negligência de direitos fundamentais
e limitação do poder do estado para salvaguardar direitos dos cidadãos. Portanto
nesses casos um dos poderes deixou uma lacuna que necessitava ser preenchida
pelo poder judiciário e chegar a uma solução terminativa do processo.124
A partir desse momento é que se discute a atuação do judiciário, se é válida
pelo ordenamento jurídico ou não, se a interferência se fazia necessária para a
120 RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetro dogmáticos. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2015.
p. 119.
121 Art.2º São poderes da união, independentes e harmônicos entre si, o legislativo, o executivo e o
resolução do conflito ou poderia ter optado por um método menos abrasivo do que a
interferir em instituição fora de seus limites.
A primeira teoria a ser abordada é a procedimentalista defendida
ferrenhamente pelo filósofo alemão Hügen Habermas que possui uma visão mais
atrelada ao jus positivismo, em que o código e as normas são mais aplicados para a
resolução do dissídio do que pela razão personalíssima do indivíduo, existindo a
norma é ela que deve ser seguida. Dessa forma Habermas faz uma crítica aos juízes
apontando a forma como ditam o direito, na perspectiva em que ultrapassam a esfera
do judiciário e chegam na esfera do legislativo, o resultado é uma legislação de forma
indireta pelo poder julgador, o que ocasiona uma decisão que é desproporcional e que
causa danos aos fundamentos do qual foi criado o poder judiciário, seguir as normas
que foram formuladas pelo povo através de seus representantes.125
É o que expõe Roberto Barroso, que manifesta sobre a teoria procedimentalista
explicitando que é aquela atinente apenas ao que está na constituição não cabendo
formulação pelo juiz no processo decisório abstração no caso concreto, não havendo
matéria disciplinada pela constituição fica encargo do poder legislativo de oferecer
norma que complemente essa matéria.126
Contudo, Eduardo Cambi faz uma crítica quanto a essa teoria que Habermas
defende, a apenas aplicar a constituição e não usar da cognição pelo interprete da
norma, diz ele:
125 HABERMAS, Hürgen. Direito e Democracia: entre facticidade e validade. 04. ed. Tradução de
Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1997. p. 175.
126 BARROSO, 2020, p. 104.
127 CAMBI, 2016. Edição Kindle, cap. 5.2 (8.625 posições).
50
prática, não oferece proteção aos direitos sociais, portanto a própria teoria viola a
constituição no momento em que prega uma democracia em um mundo ideal
abrangente e garantidor de direitos a todos os cidadãos. Pois, essa teoria trata todos
em pé de igualdade uns com os outros, mas que na realidade isso definitivamente não
acontece. A sociedade é variada e nem todos sabem dos seus direitos e de sua
autonomia política na participação das decisões e até mesmo a quem recorrer quando
violados, não há uma democracia plena como a teoria defende, que prega que toda a
coletividade possui direitos e exerce de forma constante, na medida que não
estabelece meios e forma de como usa-los. Ressalva que a discricionariedade é
necessária para tomar as decisões com base nos princípios conjuntamente com a
norma, como explicitado que não há sociedades que funcionem no mesmo patamar
de igualdade entre os membros, é de interesse em alguns casos uma interpretação
mais profunda da norma, do que a aplicar objetivamente.128
Encerrada a teoria procedimentalista, cabe explanar a teoria susbtancialista
defendia por Ronald Dworkin, que critica o positivismo exacerbado da teoria anterior.
Propondo a utilização dos princípios em meio as decisões, expressa ele que há casos
em que a norma não é suficiente para ditar o direito e necessita de auxilio de outro
dispositivo, os princípios em conjunto com as normas estabelecidas no ordenamento
jurídico ditariam o direito conforme a necessidade do caso concreto.129
Expõe ainda que os princípios devem possuir pesos diferentes, para se mudar
o entendimento daquele caso concreto, a diferença na valoração de cada princípio é
a sistemática que faria com que a regras no ordenamento jurídico não fossem
descartadas, pois se dependesse exclusivamente da discricionariedade do juiz em
escolher o princípio que melhor correspondesse o caso, não haveria o porquê da
formulação de normas.130
E havendo colisão de princípios atinentes para a resolução do caso com
proposta diferentes, o juiz deverá fazer a ponderação com o mesmo perpassando por
um processo hermenêutico de valoração dos princípios e depois aplica-lo.131
134 PASSOS, Daniel Silva. Intervenção Judicial nas Políticas Públicas o Problema da
Legitimidade. São Paulo: Saraiva, 2014. p. 24.
135 Ibid., p. 25.
136 MANAUS, Pedro Paulo Teixeira. Direito do Trabalho. 16. ed. São Paulo: Atlas, 2015. 8 p.
53
137 JUNIOR, Osvaldo Canela. Controle Judicial de Políticas Públicas. São Paulo: Saraiva, 2011. p.
141
138 RAMOS, Elival da Silva. Ativismo Judicial: parâmetros dogmáticos. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2015.
139 BUCCI, 2017. p. 36
140 CIARLINI, 2013. p. 92.
54
141 MAPELLI JÚNIOR, Reynaldo. Judicialização da Saúde: regime jurídico do sus e intervenção na
administração pública. Rio de Janeiro: Atheneu, 2017. p. 3.
142 Ibid., p. 3.
143 PINHEIRO FRANCO, Geraldo Francisco. Ciclo de Palestras-Pandemia da Covid-19. In:
2017. p. 21.
146 BRASIL. Lei nº 10.858, de 13 de abril de 2004. Institui o sistema Nacional de Previdência e
dano para a população, antes de poder fazer esses testes, para que o produto ser
liberado há a necessidade de que as empresas tenham interesse em disponibilizar o
remédio, e registrem na Anvisa, dando início aos processos para a liberação do
produto no Brasil, porém o processo é rigoroso e demanda tempo, causando prejuízo
ao cidadão que necessite dele com urgência, mesmo que já tenha sido liberado
internacionalmente, para o Brasil só pode ser disponibilizado após confirmação do
órgão.147
Devidos aos atrasos para a liberação do medicamento, normalmente os de
valor elevado, destinados a doenças mais graves, aumenta-se as ações de
medicamentos no judiciário, visto diminuir a demanda de processos e os custos extras
ao estado com o fornecimento do remédio, o Supremo Tribunal Federal decidiu que
só deve ser fornecido o medicamento com o registro na Anvisa, observando exceções
no caso de registro em agências estrangeiras de renome e a inexistência de substituto
no Brasil para o mesmo tratamento148.
Dito isso há mais limitações quanto ao acesso ao fármaco, é imprescindível o
laudo técnico médico para a formulação de prova, constatando a necessidade da
obtenção do remédio para a enfermidade, ressalta-se ainda confirmação por parte do
requerente se não há o remédio disponível pelo SUS ou algum outro que possua a
mesma eficácia contra a doença do que se pretende receber e atentar também quanto
ao valor.149
Para uma maior elucidação do que tem acontecido quanto a judicialização da
saúde, se faz presente a exposição de decisões/entendimentos quanto a esse
assunto.
O primeiro julgado é o Recurso Extraordinário 667.718, que tem como partes
a recorrente Alcirene de Oliveira e recorrido o Estado de Minas Gerais, que iniciou em
2011 e teve seu deslinde em 2019 e que possui tese em repercussão geral. Dos fatos,
foi proposta ação pela recorrente para a obtenção de remédio, Mimpara 30mg, para o
tratamento de doença grave de paciente que realiza dialise, mas que foi negado o
Santos. Judicialização da Saúde: saúde pública e outras questões. 2. ed. Belo Horizonte: Dialética,
2020. p. 69-71.
57
fornecimento do mesmo pelo Estado de Minas Gerais, pelo fato do medicamento não
possuir registo na Anvisa, sendo inviável o seu fornecimento. O Tribunal de Justiça
partiu do entendimento de que realmente não é possível a disponibilização do remédio
pela falta de registro, mesmo o direito à saúde estando disposto na Constituição,
prima-se pelo direito do coletivo frente ao individual, estando a cargo do administrador
público a destinação dos recursos da maneira que for mais viável e não cause danos
aos outros indivíduos, portanto após essa decisão foi interposto o recurso
extraordinário.150
A recorrente fundamentou seu recurso com os artigos 1º, III; 6°; 23º, II; 196;198,
II e § 2º; 204º, frisando o seu direito fundamental a saúde e pedindo uma
excepcionalidade para o seu caso e afastamento do principio da reserva do possível,
subentendendo aplicação do princípio do mínimo existencial para uma vida digna.
Devido a isso, nota-se a repercussão geral do tema, sendo necessário a
manifestação do Supremo Tribunal Federal para fixação de tese sobre o assunto.
Dessa forma o Ministro Marco Aurélio relator do processo, manifestou entendimento
em consonância com o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, aludindo que:
150 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
2019. p. 11-13 Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312026>. Acesso em: 13
de out. 2021.
151 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
Após o voto do Ministro Marco Aurélio, o Ministro Luís Roberto Barroso pediu
vistas do caso, para uma análise mais aprofundada sobre o tema, devida a margem
de interpretação. Liminarmente vota pelo conhecimento do recurso ainda que o
fármaco tenha sido incorporado pelo SUS, mas dada a relevância da questão em
caráter constitucional, merece atenção. Os procedimentos adotados pela ANVISA não
são apenas burocráticos, as substâncias passam por um crivo rigoroso de testes para
verificar sua aplicabilidade, e reduzir ao mínimo possível os riscos após a ingestão
humana.152Então caso um tribunal opte pelo fornecimento do fármaco sem o registro
estaria violando o direito social da saúde, devido aos riscos que o remédio pode
apresentar ao usuário e violação do principio da tripartição dos poderes.
Em sede de repercussão geral, o ministro vota que a ausência quanto ao
registro do medicamento pela ANVISA continua vigorando, mas abre exceção para a
concessão do fármaco, respeitando três exigências, que possua pelo menos o pedido
de registro na ANVISA, que tenha eficácia comprovada nos demais países e que não
tenha nenhum outro medicamento que possa ser utilizado como substituto.153
No voto do Ministro Luiz Edson Fachin, da integral provimento ao recurso,
devendo o remédio ser fornecido ao requerente primando pelo direito à saúde como
direito subjetivo de cada indivíduo, quanto ao acesso ao medicamento fora da ANVISA
segue os mesmos parâmetros estabelecidos no voto do Ministro Luís Roberto
Barroso. Ademais posteriormente na votação, o Ministro Luiz Edson Fachin, muda o
seu entendimento para parcial provimento.154
Em seguida há o voto do Ministro Alexandre de Moraes que se faz semelhante
ao do Ministro Luís Barroso, e acrescenta pela constitucionalidade do artigo 19-T da
Lei 8.080 com redação da Lei 12.401 de 2011, que disciplina a proibição do
ressarcimento de medicamento em fase de testes ou que não possua vinculação com
152 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
2019. p. 39. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312026>. Acesso em: 13
de out. 2021.
153 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
a ANVISA. Desse modo realiza seu voto de maneira parcialmente procedente devido
a morte do requerente.155
Ministra Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Carmén
Lucia foi de consonância com seus colegas e proferiram voto para parcial provimento
do recurso.
Ministro Dias Toffoli, profere no seu voto que o direito a saúde está intrincado
ao aval da ANVISA, é de entendimento do ministro que não pode haver fornecimento
de remédio sem passar pelos testes da agência, portanto é de seu conhecimento que
o poder judiciário deve se atentar apenas ao objeto da lide, ou seja, como há
dispositivos proibindo o fornecimento, não há que se falar em excepcionalidade. Ainda
frisa o art. 16 da Lei nº 6.360/76 que estabelece parâmetros para registro de novas
drogas, dessa forma há proteção do direito fundamental à saúde do cidadão na
medida em que não fornece medicamentos que forneçam riscos a integridade física
do usuário. É seu voto ao não provimento do recurso, em consonância com o relator
do caso.156
Por fim estabelece o entendimento em tese de repercussão geral, de acordo
com o voto do Ministro Luís Roberto Barroso, parcial provimento ao recurso, tendo os
votos vencidos apenas dos Ministros Marco Aurélio e Dias Tofolli. Pela maioria fixou
entendimento, de que o estado não irá fornecer medicamento em fases iniciais de
teste, visto o risco à saúde. De forma geral é proibido o fornecimento de medicamentos
sem o registo adequado a ANVISA, com exceção ao prazo fornecido pela lei nº
13.411/2016 que remete na demora pela agência na aprovação do fármaco e que
ainda siga três requisitos, deve haver o pedido de registro agência, comprovação de
efetividade em demais países no exterior e a não existência de qualquer outro remédio
com efeito análogo.157
155 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
2019. p. 127-128. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312026>. Acesso em: 13
de out. 2021.
156 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário 657718/MG. Rel. Min. Marco Aurélio.
4. PANDEMIA E JUDICIALIZAÇÃO
Este tópico tem como escopo, vislumbrar as medidas que administração tem
tomado perante a pandemia para resguardar direitos dos trabalhadores, profissionais
da saúde e sobretudo dos médicos que estão em contato direto com pessoas
contaminadas com o vírus.
É tratado dos assuntos como o auxílio emergência destinados para os cidadãos
que ficaram desamparados com o início da quarentena, a disponibilização de mais
leitos visto os picos de contaminação as unidades da federação quase entrarem em
colapso, aquisição de respiradores, políticas de teletrabalho, aquisição de mascaras,
adicional de insalubridade para a categoria de médicos.
Portanto esse tópico é destinado justamente a aquisição do direito à saúde
pelos asseguradores da saúde, que necessitam de proteção tanto quanto o resto da
sociedade.
160BRASIL. Senado Federal. Decisão do STF sobre o isolamento de estados e municípios repercute
no Senado. 16 abr. 2020. Disponível em:
<https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2020/04/16/decisao-do-stf-sobre-isolamento-de-
estados-e-municipios-repercute-no-senado>. Acesso em: 02 de set. 2021.
63
funcionando devido a sua utilidade. A tese defendida pelo PDT é de que a medida
provisória inova em matéria que não é de seu âmbito de formulação, sendo reservada
a lei complementar a matéria de saúde que possui competência comum entre os entes
federados, caracterizando uma atitude de excesso de poder pelo presidente.161
Explicitado os fatos, o Relator Ministro Marco Aurélio fornece seu parecer, é de
seu entendimento que os artigos citados nos fatos não ensejam em descumprimento
a dispositivo constitucional, visto a necessidade de decisões em caráter emergencial
para o logo enfrentamento a contaminação, aponta como o próprio artigo 3º expressa
que as medidas cabíveis para cada autoridade estão limitadas a sua competência,
portanto não violando dispositivo constitucional, quanto a medida provisória, estando
presente necessidade e urgência faz o certo editar tal medida. Profere seu voto em
parte para a competência concorrente para lidar com a pandemia.
O voto do Ministro Alexandre de Moraes, vai de consonância com o voto do
Ministro Relator, no mesmo sentido que as competências de cada estado devem ser
respeitadas no limite de suas atribuições, faz apenas uma ressalva quanto o art. 3º,
VI, alínea “b” que se refere as locomoções dentro do território estadual, frisa-se que
se for de interesse local ou nacional é permitida a restrição de passagem em caráter
temporário para a mitigação do contágio.162
O voto do Ministro Luiz Edson Fachin, expressa que mesmo em uma
emergência internacional, não deve haver o desbalanceamento entre os poderes, os
entes federados devem seguir conforme suas competências delimitadas pela
constituição federal, ao passo em que funcionem de modo cooperativo umas com as
outras. Para fundamentação do seu voto aponta os seguintes dispositivos a lei nº
8.080/1990 que assegura aos municípios legitimidade para os serviços de saúde, art.
12 do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais que estabelece
os estados membros adotarão as medidas que foram cabíveis relacionadas a
epidemias. Dessa forma vota conforme o ministro relator, fornecendo ao presidente
autonomia para regular serviços públicos e essenciais.
161 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754372183>. Acesso em: 15
de out. 2021
162 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
163 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754372183>. Acesso em: 15
de out. 2021.
164 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
165 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754372183>. Acesso em: 15
de out. 2021
166 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6341. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
coloca estado na fase vermelha. G1, 25 de dez. 2020. Disponível em: <https://g1.globo.com/sp/sao-
paulo/noticia/2020/12/25/prefeitos-de-18-cidades-de-sp-mantem-cidades-na-fase-amarela-e-
descumprem-determinacao-que-coloca-estado-na-fase-vermelha.ghtml>. Acesso em: 14 de set. 2021.
66
federados nas medidas de saúde, deve ser um sistema coordenado com vistas de
evitar atitudes apressadas sem um pensamento lógico para a resolução do
problema.168
Outra prova do desequilíbrio entre os entes federados no enfrentamento ao
vírus foi no início do ano de 2020 em que união e o estado do Maranhão entraram em
embate devido aos respiradores, que para época eram essenciais devido a uma forte
onda de contaminação e que ocasionaram quadros graves em vários habitantes,
necessitando auxilio de oxigênio fornecido pelos respiradores.169Porém que teve seu
deslinde com a decisão do Ministro Celso de Mello, após remessa dos autos
realizados pela juíza da 5ª Vara Federal Cível do Maranhão, por entender ser matéria
de competência originária pelo Supremo Tribunal Federal, conforme art.102, I, “f” da
Constituição.170Posto isso o ministro expressou que não pode ser qualquer motivo
irrisório a receber parecer do Supremo, mas que pela matéria que se tratava havia
pertinência com o dispositivo constitucional elencado, a controvérsia entres os entes
federados demandava urgência. Esclareceu que a união não poderia reter os
respiradores por serem bens públicos e não podendo ser alvo de apropriação, sendo
também de caráter de urgência visto índice de contaminação do estado, e primando
pelos direitos sociais a saúde, decidiu em favor do estado do Maranhão o recebimento
dos respiradores.171
Outro ponto a ser exaltado no tópico de políticas sanitárias, são os leitos
destinados a tratamentos intensivos contra a Covid-19, pois houve momentos de pico
em 2020 no qual não havia mais leitos para alocar indivíduos contaminados com a
fase mais grave da doença e que necessitavam além dos leitos, profissionais
especializados e respiradores, devido a esses fatores o Ministério da Saúde fez o
168 YOUNG, Carlos Eduardo Frickmann; MATHIAS, João Felippe Cury Marinho (org.). Covid-19 meio
ambiente e políticas públicas. São Paulo: Hucitec Editora, 2020. p. 124-125.
169 Celso de Mello impede bloqueio pelo governo de 68 respiradores comprados pelo Maranhão. G1,
172 Ministério da Saúde pede R$ 5,2 bilhões à economia para custear gastos com leitos de UTI. O
GLOBO BRASIL. 06 de fev. 2020. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/brasil/ministerio-da-
saude-pede-52-bilhoes-economia-para-custear-gastos-com-leitos-de-uti-24872100>. Acesso em: 14
de set.2021.
173 BRASIL. 1º Vara Federal de Paranaguá. Procedimento comum nº 5011178-
23.2021.4.04.7000/PR. Juiz Federal Substituto, Guilherme Roman Borges, j. 17/03/2021. Disponível
em: https://folhadolitoral.com.br/wp-content/uploads/2021/03/Liminar-Justica-Federal-Barreira-
Sanitaria-BR-277.pdf>. Acesso em: 15 de out. 2021.
174 BRASIL. 1º Vara Federal de Paranaguá. Procedimento comum nº 5011178-
23.2021.4.04.7000/PR. Juiz Federal Substituto, Guilherme Roman Borges, j. 17/03/2021. Disponível
em: https://folhadolitoral.com.br/wp-content/uploads/2021/03/Liminar-Justica-Federal-Barreira-
Sanitaria-BR-277.pdf>. Acesso em: 15 de out. 2021.
68
178 Covid-19: Atualizada norma de dispositivos médicos. ANVISA, 04 de mai. 2020. Disponível em:
<https://www.gov.br/anvisa/pt-br/assuntos/noticias-anvisa/2020/covid-19-atualizada-norma-de-
dispositivos-medicos>. Acesso em: 16 de set. 2021.
179 SERPRO. Intra Serpro. Siscomex - Sistema Integrado de Comércio Exterior. Disponível em:
<http://intra.serpro.gov.br/linhas-negocio/catalogo-de-solucoes/solucoes/principais-
solucoes/siscomex-sistema-integrado-de-comercio-exterior>. Acesso em: 16 de set. 2021.
180 BRASIL. Lei Nº 14.128, de 26 de março de 2021. Dispõe sobre compensação financeira a ser paga
pela União aos profissionais e trabalhadores de saúde que, durante o período de emergência de saúde
pública de importância nacional decorrente da disseminação do novo coronavírus (SARS-CoV- 2) [...].
Disponível em: <https://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/2021/lei-14128-26-marco-2021-791199-
publicacaooriginal-162552-pl.html>. Acesso em: 16 de set. 2021.
181 Sancionada lei que indeniza profissionais de saúde incapacitados pela Covid. Câmara dos
182 BRASIL. Lei 13.892, de 2 de abril de 2020. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezembro de 1993, para
dispor sobre parâmetros adicionais de caracterização da situação de vulnerabilidade social para fins
de elegibilidade ao benefício de prestação continuada (BPC) [...]. Disponível em:
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183 SENADO FEDERAL. Auxilio emergencial: governo sanciona com vetos ampliação de
186 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6380. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312993>. Acesso em: 15
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187 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6380. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
188 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6380. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312993>. Acesso em: 15
de out. 2021.
189 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6380. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
Ministros, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Roberto
Barroso e Celso de Melo. Quantos aos votos vencidos, fica exposto que o Ministro
Marco Aurélio e Dias Toffoli estão vencidos quanto ao indeferimento da liminar. E o
Ministro Luiz Edson Fachin e Rosa Weber no tocante ao deferimento parcial da
medida. E novamente vencido Ministro Ricardo Lewandowski no deferimento parcial,
motivado por suas razões de voto. 190
Visto essa decisão na época da vigência da medida provisória, o direito
resguardo principalmente daqueles indivíduos que se enquadrassem na área da
saúde que estavam a frente com os cuidados para com a COVID-19, o direito de poder
alegar doença ocupacional caso fosse contaminado pelo vírus.
190 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADI 6380. Rel. Min. Marco Aurélio. 2020. Disponível em:
<https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=754312993>. Acesso em: 15
de out. 2021.
191 Sancionada lei do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e Renda. Governo do Brasil,
Retira-se desse trecho a crítica que se faz, pela lei não abranger todos os
trabalhadores, apenas os da iniciativa privada. O fato de o surto epidemiológico estar
atingindo o globo, deveria ser parâmetro o suficiente para aplicação dessa lei a todos
os trabalhadores e não apenas a um grupo como o faz, adiante o autor mostra mais
insatisfação, devido excluir a sociedade de economia mista e empresas públicas, que
embora tenha necessidade de concurso não possuem garantia de estabilidade, sendo
como qualquer outro trabalhador da iniciativa privada que poderia usufruir do
benefício.
Adiante com a pesquisa, para um reconhecimento do efetivo trabalho que os
médicos e profissionais da saúde têm realizado com a pandemia e do alto risco que
enfrentam todos os dias no auxílio de pacientes com as mais variadas doenças e
sobretudo agora com a pandemia aumentando exponencialmente os riscos de
contaminação, foi proposto um Projeto de Lei pelo Deputado Mauro Nazif, PL 2494/20,
que ainda está em tramitação, estabelecendo que a porcentagem de adicional de
insalubridade deve ser compatível com risco da profissão, propõe que a porcentagem
máxima seja aumentada de 40% para 50% sobre o salário mínimo pelo tempo que
perdurar a pandemia.193
192 GARCIA, Gustavo Filipe Barbosa. Coronavírus e Direito à Saúde: repercussões trabalhista,
previdenciárias e na assistência social. São Paulo: Saraiva, 2021. p. 56.
193 Proposta eleva adicional de insalubridade para profissionais da saúde durante pandemia. Câmara
Dessa forma fica entendido que essa classe de trabalhadores está na linha de
frente ao combate da Covid-19, devido a isso não há como cumprir todas as
recomendações da OMS igual o restante da população, portanto é necessário a
preservação da saúde de outras formas, nesse quesito a atuação do Sindicato dessa
categoria é primordial para a defesa e garantia de seus direitos.194
Tratando referente aos sindicatos o Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região
no Ceará publicou a judicialização de uma demanda referente a porcentagem do grau
de insalubridade devido aos profissionais da saúde. O Sindicato dos Empregados de
Estabelecimento de Serviços de Saúde no Estado do Ceará tem desde o alerta da
OMS de pandemia, requerido pagamento de adicional de insalubridade de 40% o
máximo permitido devido a atuação dos médicos na pandemia, decorre que o pedido
foi recusado para aplicação imediata necessitando de perícia, o sindicato rebateu
demonstrando que a pandemia é grave o suficiente para não necessitar de uma
perícia.
Recorrendo ao segundo grau foi de entendimento do Relator José Antonio
Parente para estabelecer o grau máximo de adicional de insalubridade fixando em
40%, sendo tese de Repercussão Geral é de conhecimento de todos a garantia do
direito a saúde que foi resguardo.195
Cabe trazer mais um julgado para esse tópico no que consta a insalubridade
do trabalhador. No mandado de segurança nº 000882-87.2020.5.09.0000 impetrado
pelo Sindicato dos Médicos no Estado do Paraná contra a autoridade coatora o juízo
da 15º Vara do trabalho de Curitiba. Dos fatos, em outra ação movida pelo impetrante
contra a FEAES – FUNDAÇÃO ESTATAL DE ATENÇÃO À SAÚDE DE CURITIBA,
foi rejeitado seu pedido da tutela de urgência que tinha como objetivo o afastamento
dos funcionários da saúde que possuíssem 60 anos ou mais, estando evidentemente
194 ZORNIG FILHO, Luiz Fernando; ANDRADE, Luiz Gustavo de. A atuação da justiça do trabalho
em tempos de pandemia. In: Gustavo Afonso Martins; Luciano Ehike Rodrigues; Erika Leahy. (Org).
O Direito do Trabalho em Transformação. 1ed.Curitiba: Instituto Memória, 2020. p. 252-270. Disponível
em: <http://zornig.com.br/a-atuacao-da-justica-do-trabalho-em-tempos-de-pandemia/>. Acesso em: 17
de set. 2021.
195 Adicional de Insalubridade de 40% é devido a profissionais da saúde expostos à covid-19. Tribunal
no grupo de risco, alegam que não receberam pelo município os EPIs corretos para a
prevenção do contágio com o vírus. 196
Argumentou que a decisão atacada era contrária ao art. 1º do Estatuto do Idoso
que estabelece que deve ser assegurado a dignidade da pessoa humana e seus
direitos para com a pessoa de idade avançada, utilizou-se do argumento do impetrado
que manifestou que sendo um funcionário da saúde em algum momento haverá a
contaminação, dessa forma preconizou novamente que os idosos de 60 anos fossem
afastados antes que fossem acometidos pela doença.
Após esses fatos foi de entendimento do relator, pela concessão da segurança
em caráter definitivo, visto o disposto pelo Ministério da Saúde que pessoas no grupo
de risco não devem trabalhar em contato com outras pessoas, pelo aumento do risco
de infecção e por consequência aumento dos leitos ocupados.197
Com análise dos dois julgados, verifica-se a ampla observância dos direitos a
saúde e do trabalho dos profissionais da área médica, visto no primeiro caso o
aumento do adicional de insalubridade constitucional, e devido aos cidadãos que
estão desde o início da pandemia resguardando a vida dos demais. E no segundo
caso decisão certeira em prol da vida dos mais frágeis.
CONCLUSÃO
tratar de uma questão tão delicada quanto a saúde, ficando a cargo do juiz e sua
abstração para a resolução da lide de modo que não afete negativamente o elo mais
vulnerável desse liame.
Adentrando mais para com a pesquisa em relação as decisões chega-se as
teorias do procedimentalismo calcado no positivismo e na teoria substancialista que
prima para uma vertente que não tem a norma como único caminho correto, com
decorrer da pesquisa notou-se que o ideal seria optar por uma vertente mais
procedimentalista, que na teoria aplicando apenas a norma seria o suficiente para
resolução da demandas, mas quanto mais a pesquisa se aprofundava a teoria
substancialista aparentava ser a mais correta a se utilizar, visto a sociedade brasileira
ser multivariada e diversificada, a interferência do judiciário se faz necessária em
alguns momentos, quando não há outra alternativa para a solução do processos. O
ideal como foi expresso pelo ponto de vista de alguns autores seria o equilíbrio entre
as teorias, e uma diminuição do ativismo do judiciário para a resolução de problemas
que fogem da sua alçada.
Encaminhando-se para o final da pesquisa no tópico propriamente dito da
judicialização chega-se ao alvo da judicialização, a propositura da ação para obtenção
de remédios de alto valor monetário e necessários para a sobrevida do indivíduo,
conclui-se que o sistema para a aprovação de remédios pela ANVISA embora seja
muito criterioso, primando pela a maior eficiência quanto a liberação de remédios que
não causem danos à saúde, ainda é um processo lento e moroso, causando ações
demasiadas na justiça que poderiam ser evitadas com a liberação do fármaco.
Conclui-se pôr fim ao último tópico do presente trabalho, a necessidade da
melhor integração entre os entes federados para o enfrentamento da pandemia que
ainda não teve seu fim e que necessita que sejam traçados parâmetros em comum
para o combate ao vírus e sobretudo politicas ainda maiores em caráter assistencial
de todos os profissionais da saúde.
79
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