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O DIREITO PROCESSUAL PENAL E A (CARÊNCIA DE) SISTEMATIZAÇÃO

CIENTÍFICA

Muito esforço já foi feito para se estabelecer o Direito como Ciência, o que
de fato é. De acordo com o ensinamento de Maria Helena Diniz, “A ciência
“constitui, um corpo sistemático de enunciados verdadeiros. Em suma, ciência é
um saber metodicamente fundado, demonstrado e sistematizado. A
sistematicidade é o principal argumento o para afirmar a cientificidade”
Na árdua, mas vitoriosa tarefa de demonstrar a natureza científica do
Direito, a Professora nos aclara que “O principal escopo da ciência do direito é a
sistematização jurídica, tendo uma função organizatória, por criar condições para
classificação, tipificação e sistematização dos fatos relevantes.”1
Para entender a extrema importância da qual se reveste a sistematização
para quaisquer ramos da ciência, mister se faz conceituar o termo. Segundo os
dicionários, sistema é um conjunto integrado de componentes regularmente
inter-relacionados e interdependentes criados para realizar um objetivo definido,
com relações definidas e mantidas entre seus componentes e cuja produção e
operação como um todo é melhor que a simples soma de seus componentes.

Assim, temos que o sistema, para a Ciência do Direito, é uma associação


racional, que permite a análise do objeto da ciência de forma ordenada. Para a
correta sistematização do Direito e dos institutos que compõem o seu objeto, é
importante ter em mente a linguagem a ser utilizada, que deve ser clara, simples
na comunicação dos seus termos, conceitos e contextos, coerente e,
consequentemente, metódica.

Realizado este breve escorço, passemos a uma rápida e perfunctória


análise do Direito Processual Penal e seus institutos, para, ao final, apenas
deixar engatilhada crítica acerca das falhas da sistematização dos seus
procedimentos, sendo apenas esta a intenção deste texto. O que se deseja, é,

1
Maria Helena Diniz - SISTEMATIZAÇÃO: PROBLEMA CENTRAL DA CIÊNCIA JURÍDICA
- Revista de Direito Brasileira - Revista de Direito Brasileira | São Paulo, SP | v. 13 | n. 6 | p. 88 - 94|
jan./abr. 2016
simplesmente, promover uma faísca de crítica acerca da falta de sistemática,
logo, de racionalidade, do sistema processual penal brasileiro.

Hodiernamente, com o avanço das discussões acerca da importância do


papel do Processo, mais especificamente do Processo Penal, para a ciência do
Direito, podemos afirmar o protagonismo que este ramo vem atingindo, para a
consecução da sua finalidade.

Não mais se pode afirmar, em absoluto, que o direito processual penal é


um “direito adjetivo”, acessório ao assim chamado “direito substantivo” ou
“material”.

José Olindo Gil Barbosa afirma, acertadamente, que “É em razão do


processo que se opera o direito propriamente dito, bem como é, parafraseando
DINAMARCO, é o instrumento da cooperação existente entre o agente do poder
e as pessoas interessadas e que por isso só pode ser ele o polo metodológico
de sistematização do Direito Processual.”2
Assim, conforme nos acrescenta Roberto Ferreira Archanjo da Silva em
brilhante tese, “isso faz, segundo Cândido Rangel Dinamarco, da teoria geral do
processo uma disciplina teórica em busca de princípios comuns e de “reconstruir,
sobre bases sólidas, o edifício sistemático do direito processual como um todo
harmonioso”. Afirmando ainda que “O Direito Processual Penal se fez assim
como Ciência; utilizando o métodotécnico-jurídico, construiu um amplo e sólido
conhecimento sistematizado.”3
A fim de apontar as incorreções sistemáticas do processo penal, portanto,
é imperioso se fazer uma breve diferenciação entre os institutos do processo e
do procedimento.
O processo, em linhas breves e gerais, é o conjunto de atos que leva à
prestação jurisdicional pretendida. É o instrumento através do qual se diz o
direito. Os procedimentos são os ritos através dos quais os atos processuais são
cumpridos. Numa pobre analogia, o processo é o rio, o conjunto e volume das
águas, e o procedimento é o caminho pelo qual ele percorre até o mar.

2 BARBOSA, José Olindo Gil. Os Pólos Metodológicos de Sistematização do Direito Processual. Portal
Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 20 Set. 2008. Disponível em: investidura.com.br/biblioteca-
juridica/artigos/processocivil/709-os-polos-metodologicos-de-sistematizacao-do-direito-processual. Acesso
em: 11 Dez. 2022
3 Roberto Ferreira Archanjo da Silva - Por uma teoria do Direito Processual Penal:organização sistêmica
Assim, temos um único processo penal, para o qual o Legislador Pátrio,
ao que parece de forma assistemática e, às vezes, sem se atentar para a
racionalidade e economicidade que devem permear os sistemas jurídicos, legou
diversos ritos.
Tal realidade nos faz afirmar que há uma infinidade de procedimentos
inadequados, que, ao invés de possibilitar uma prestação jurisdicional célere,
econômica e efetiva, é extremamente contraproducente aos fins para os quais o
processo penal se propõe.
Temos no nosso ordenamento, assim, procedimentos semelhantes com
base de incidências diferentes, cujo critério é estabelecido com base na pena
máxima cominada ao tipo penal (ordinário, sumário e sumaríssimo), e
procedimentos especiais, residuais, estabelecidos no art. 394 do Código Penal
e em leis especiais esparsas, que são regidos pela natureza do ilícito praticado
ou qualidade específica do réu (crimes cometidos por funcionários públicos,
crimes de ação penal privada, procedimento especial do júri, crimes eleitorais,
crimes militares, crimes praticados por pessoas com foro por prerrogativa de
função, rito da lei antidrogas, rito da lei de licitações, crimes contra a honra...).
O questionamento primordial e natural, diante de tal elenco de ritos, é o
seguinte: Qual o benefício, em termos práticos, ao processo penal, de tamanha
especialização? A lógica e a prática indicam que, ao contrário, os malefícios são
mais evidentes.
Como afirmado acima, o protagonismo do processo penal não permite
mais a possibilidade de tamanho “adjetivismo”. “Isso porque num Estado
Democrático de Direito, sob o ponto de vista da política criminal, a dogmática
processual penal, assim como a penal, segundo Antonio Chaves Camargo, tem
um papel relevante na reafirmação dos direitos humanos fundamentais e na
orientação do legislador para aperfeiçoar a persecução penal e a execução da
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pena”
Para uma Ciência do Direito que se propõe a estes fins, mister se faz
começar a imaginar um processo cujos ritos sejam uniformes, mínimos e céleres,
cujo principal escopo seja o cumprimento das garantias constitucionais dos

4 Roberto Ferreira Archanjo da Silva - Por uma teoria do Direito Processual Penal:organização sistêmica
autores e vítimas, bem como a efetividade e suficiência da prestação jurisdicional
que, no caso do Direito Penal/Processual Penal, é exclusiva do Estado.

BIBLIOGRAFIA
1. DINIZ, Maria Helena. SISTEMATIZAÇÃO: PROBLEMA CENTRAL DA
CIÊNCIA JURÍDICA - Revista de Direito Brasileira - Revista de Direito
Brasileira | São Paulo, SP | v. 13 | n. 6 | p. 88 - 94| jan./abr. 2016
2. BARBOSA, José Olindo Gil. Os Pólos Metodológicos de Sistematização
do Direito Processual. Portal Jurídico Investidura, Florianópolis/SC, 20
Set. 2008. Disponível em: investidura.com.br/biblioteca-
juridica/artigos/processocivil/709-os-polos-metodologicos-de-
sistematizacao-do-direito-processual. Acesso em: 11 Dez. 2022

3. SILVA, Roberto Ferreira Archanjo da. For a theory of the criminal


procedural law: system organization. 2009. 333 f. Tese (Doutorado em
Direito) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2009.

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