Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
ATOR E METODO
QUARTA EDrÇÃO
EDITORA HUCITEC
INSTITUT'O BRASILEIRO DE ARTE E CULTURA
São Paulo-Rio de Janeiro,7992
SUMÁRIO
Nota do Autor XI
() Ator e a Verdade Cênica ou Estar Ardendo, para Inflamar,
Fernando Peíxoto XIII
lntrodução XIX
lhrurtne Panrn
rNrcrAÇÃo À anrr DRAMÁTrCA
t'apítulo 1
SncuNoa PeRrB
MEIOS DE COMUNICAÇÃO EMOCIONAL
Capítulo 7 83
I
Enquanto âos outros artistas se dá uma definição mais concreta (escultor; o
que e..,.rlp.; pintor: o que pinta; violinista: o que tocâ violino, -etc.) ao
artista de ieatro ninguém chama de "teatralista" ou coisa que o valha, mas
sim de ator; a umâ parte de peça teatral não chamam de "capínrlo" e sim de
re
âto.
t4 EUGÊNIO KUSNET ATOR E rrlÉrOpO 15
É claro
qr.le não se trata de uma cas'ualidade. o uso dessa raiz ,.rr()u espontaneamente um caso interessante. sua ação era espontânea,
. nos prov-a que a idéia da AçÃo preocupava os homens
grcâ-
etimoló_
de teatro desde ,,'.,,1:, pela prôpria üda: "Eu, Carmen Montero, vou contar â meus amigos
milênios e milênios. ,r, (:rso muito interessante". o resto foi completado e realizado pela pró-
Vamos pois analisar como AÇÃo se processa na vida rear
,
deve se processar em
e como era I'rr.r rratureza, e Carmen Montero não precisou procurâr conseguir a fé no
teatro. ,1,r, t'la contou ela a tinha!
Durante uma aula para um gr"po-de atores prof*sionais, -
(]ue aconteceu na segunàa vez? Um texto dramático, um texto de
eu pedi a uma
atriz, carmen Montero, qrr" algum fato impressionante d'e sua vida. r' .rrro (embora criado por eLa mesma, não importa!) foi-lhe imposto como
"orràr.ã
Sua narração foi por mim gravada. ,'l'ri.t,ttôio. A atriz Carmen Montero teve que interpretar um papel (embora
Ela contou ,- .Tl que realmente impressionou muito seus r,l,.rttico a ela, não importa!) e agir como se fosse o persorogàm. para isso o
colegas. Às
dez horas da noite ela foi itacada numa das'principais ,,,irrirno necessário seria estudar e compreender alôgica da ação do perso-
ruas de são p",rio, po.
,ri i:di:,íd.u.o. que queria leváJa para d".r't.o do ,.r, ."..o. E rr,t.s,rn (entbora fosse ela mesma, não importal): 1) eual é a situição?
.f"
da rua, qrr*"o,,"
resistiu decididamente, foi espancada e atirada no meio l)ur:ulte uma aula num curso de teatro, :uma atrb ("não eu, Carmen Mon-
i..orrr-
ciente. t,'tt', e sim uma atriz idêntica a mim"), a pedido do professor, conta um
Em seguida ela contou o que se passou uns dias mais tarde: ,.,,,,, impressionante de um assalto de que ela foi vítima. 2)
quando ela eual é o obje-
estava passando numa outra ruà basta-nte escura, desceram rrv() dessa ação? O personagem acha que o caso é muito interessante e quer
da u-'.".ro doi.
rapazes, ficando ainda mais um dentro do carro, se rrrprcssionar os seus colegas com a complexidade do acontecido.3) eual
e d.irigiram , .ü.-ap.r..
de se ver num perigo m,rito maior do que na primeira víz ',, ri:r a atitude da atríz Carmen Montero diante da situação e dos objetivos
rnente por causa disso), ela inesperadamente crilu cor"gem
@u taluez exata-
,1,, pcrsonpgem? Que faria Carmen Montero se fosse aquela atriz?
porque imaginou
que estava armada com um revólver, e pensou: ,,agora á Sô depois de responder essas perguntas é que Carmen Montero poderia
,i*1,, éo*
mãos nos bolsos do casaco' ela-passou calmamente entre -iao ", ,.nrcçar a narraçâo na segunda vez. E então, agindo dentro da lógica da
os dois rapazes que
não tiveram coragem-de atacâ-la. Logo em seguida ela se üu '.rruação e dos objetivos do personagem, ela obteria a"{écênica',. Sô nessas
.or."íào
=l
EI
uma louca por uma das ruas adjaceús. E.r""últi*r
p.rr" r"i"""ilá" "o-o
.o- ,,,rrdições a atriz estaria agindo na segunda nanação como se
fosse pela
tanto^humor que ela mesma e os ouvintes riram às g".jdlrra.., neira oez,
1n i
É' Ouündo. a
-gravação
em casa eu fiquei -riio "i_p."ssionado com a Que fez Carmen Montero em vez disso? Depois de ouvir várias vezes a
expressiüdade da narração e com-a complexidade das'emoçõe;ã
Achei que o material era digno d" rer e'rt,rd"do como
;"çr. 11 :rvação, - que ela certamente achou magnífica (o que alias, era oerdade!)
Em cena nôs, atores, agimos em nome de uma outra pessoâ, agimos () mesmo acontecia com os outros intérpretes da Peça: todos eles esta-
como se fôssemos outra pessoa. Isso não quer dizer que a pessoa do ator !.'r. preocupados em "brilhar" nos seus papéis.
deva desaparecer deixando seu lugar ao personâgem. Nada disso. Isso signi-
Os que assistiram àquele espetáculo devem se lembrar que não se tratava
Êca apenas qúe o ator aceita a situaÇão e todos os problemas do personagem
,L urÍlâ simples caricatura dos atores antiquados, havia uma certa sinceri-
como se fossem dele prôpio e então, para solucioná-los, age como tal. É ,l.,tlc na sua interpretação, eles se sentiam realmente comovidos, mx5 não
eüdente que os problemas do ator - executar com brilho (como compete a ,,'rno personagens e sim como "atores formidáveis que eram"'_E.é o que
um bom ator, que é) o seu trabalho, transmitir corretamente a idéia do ,,..,lrnente acontece com muitos atores: é fácil confundir suas próprias emo-
autor, manter permanentemente o interesse e â atenção do espectador, etc. ,, oI'S COIÍr as do personagem.
- tudo isso permanece nele, mas em estado subconsciente, porque, durante Osentimenialismo ãpróprio do ator. E preciso que hajamuitaügilância para
a ação devem prevalecer esmagadoramente os problemas do personagem.
,f uc uator não seja suavítima,Étãotentador fazerumacena.quePJovoque lagri
Quando o etor não consegu.e agir no sentido dos objetivos do persona- ,i',,r.rplatéia! Á'of^r", essa cenao ator admira a si póprio, e fica comoüdo
gem, ficam apenas os objetivos do ator: brilhar, ser admirado, ser "o tal", , , ,,r, .rr"-irrt"rpretação, a ponto de chorar lágrimas de verdade' Mas o que essas 1á-
etc. Mas, durante o espetácu.lo, ao ator em si não pode interesser o especta- do personagem? Nada! O ator sai comple-
t,r rÍnas tem a ver com os problemas
dor. Ele vem ao teatro para uer a úda do persorngem na interpretação dtt ,.,,,r"rt. da ação do pêrsonagem ,mesmo sem percebê-lo' Mas o espectador per-
ator. ,,'bel Eleperceb" qu. r,"qo.l" momentoPresenciaummelodramabaratoem vez
A predominância dos objetivos do ator sobre os objetivos do persona- , l" ,m p.ofundo dà*" hu-rno_em que as lágimas.talvez
nem devessem ter lugar.
gem, ou mesmo quase-ausência desses últimos, foi admiravelmente demons- o
Eu tenho pÍazeÍ de confess:u um "crime" desses e esPero que a minha
trada pelos atores do "Teatro dos Sete" em "Ciúmes do Pedestre", de ,,,níissão rirra de prova de que toda a vigilância é pouca para salvar o ator
Martins Pena. ,h' um dos ,.u, -rio.". inimigos: o sentimentalismo'
Os intérpretes desse espetáculo não pretendiam representar os papéis Eu traduzi com meu amigo, o falecido Brutus Pedreira, uma das peças
dos personagens da peça e sim os papéis dos atores contemporâneos de ,1,, dramaturgo russo, Leonid Andréiev, "Aquele que- leva^ bofetadas".
Martins Pena, representando os papéis da sua peça naquele tempo. Por (
luàndo ."."*bi o. primeiros exemplares mimeografados, figuei muito
conseguinte, os objetivos dos personagens não eram levados em conside- , rnocionedo pelas recordações que surgiram naquele momento' E que eu fiz
ração, o problema era mostrar os objetivos dos atores canastrões daquele .,quela peça em nlsso, em 1924, com um dos geniais atores russos, I'
tempo. I'cwsov.'Aidóia de pode. representâr esse texto em Português e mais ainda,
Assim, Sérgio Brito fez o papel de um ator-trágico que, por sua vez, rcpresentar nao o papel que fi2, o do Conde Mancini, mas o papel feito por
fazia o papel de marido ciumento. O objetivo principal do ator-trágico era l,cwtsov, o papel pá"cip"l. Essa idéia me deu vontade de experimentar
demonstrar a sua formidável voz e a sua capacidade interpretativa. As excla- irnediatament" r.n" .".r.- da peça. Eu liguei meu gravador de som e li a cena
mações "Ah" e "Oh" eram feitas na base de voz superimpostada e numa das
.,o microfone. Durante a leitura, as lágrimas me sufocaramlll Então, pensei
cenas, o timbre da voz mudava conforme o animal com que o personagem se
ou, a cenâ deve ter saído maravilhosal Liguei o gravador' fiquei ouvindo
comlxrrava: houve um "Oooh! . . ." especial para tigre e leão e um ., . . , chorei novamente. Era uma prova cabal: o meu primeiro ouvinte -
eu
"Aaaahl ..." p*" elefante. É claro que os problemas do "marido traído"
prôprio - também ficou comovidà! P"." completar o.meu "triunfo", pedi
sumiam atrás dos problemas do ator-trágico.
q,re- minha mulher ouüsse a gravação. Desde os primeiros momentos
estra-
Fernanda Montenegro fuia o papel de "Primeira Dama" da companhia, uma de dureza
,rh"i o*. certâ surpresa no ro;to dela e, em seguida, espécie e
que interpretava o papel de "Esposa Adúltera". A preocupação da "Primeira
rrão sei o qrrê *ri, - tudo menos a admiração que eu esPeravâ'.Quando'
Dama" era demonstrar ao público o seu virtuosismô. Quando, "enfrentando
«lepois de ,r* lo.rgo silêncio, insisti que -:1".*" dissesse sua opinião' ela
a morte", dizia ao marido: "Agora que te ouvi, ouve-me tambéml . . ." etc., ,,nrorromDeu em uma torrente de insulios", chamando-me de canastrão, de
sua voz era de um timbre quase masculino, de tanto heroísmo e coregem No primeiro momento atribui tudo
que a atriz queria demonstrar. Mas quando passava a nâÍrâr sua infância:
.io. d" .ádio-rror"lr., e saiu correndo.
isso a alguma outra razão. Procurei adivinhar "91". foi qu" t:lhe.fiz? "
Mas
"Minha mãe, Deus a perdoe . . ." etc., a sua voz adquiria o timbre infantil. fiquei um tanto
trão hou"ve nada. Passado meia hora nessas considerações,
Preocupada com esses problemas, poderia a "Primeira Dama" agir como o ,,e se elâ em paÍte tem razão? " Voltei a ouvir agravação . . . e
desconfiado:
personaçm?
logo tive a terrível conÊr-mação: não era em "patte", - ela tinha razão
19
ATOR E MÉTODO
18 EUGÉNIO KUSNET
I
I
cênica" de não estar enxergando. Senão não poderei convencer ninguém da cena em que meu personagem age sob hipnose. Como dàvo encarar esse
realidade da minha cegueira. O que devo fazer? problema?-" Respondi que sendo a hipnose um estâdo semelhante a sono, -
Pois bem, em primeiro lug3.r, vou procurar compreender o que se passa .*bo." haja nele alguns' pontos de "iigflia" que possibilitam o contato dó
com os sentidos de um cego. Sei que a natureza compensa a falha ou o hipnotizado com o hipnotizador - o primeiro problema seria "sentir-se
enfraquecimento de um determinado sentido, aguçando os outros. A visão, .lormindo" e que para isso, seria lógico procurar con-seguir um -estado de
por exemplo, é substituida pela audição e pelo tato. Esses dois sentidos num rnáxima abstração po.qu. a pessoa está mentalmente fora do_ambiente em
cego se transformam em tisão mental, Por exemplo, na rua, o cego anda que se encontra fisicaÀente, Para conseguir esse estado de abstraçâo seria
"tateando" o chão com os pés ou com.umâ bengala, para wr mentalmente ,iecessário encontrar uffn preocupação tão grande-que todos os cinco senti-
os possíveis obstáculos; ele procura ouür todos os ruidos dt nta paru, wr ,!os do personagern fossi* absàruidos por eln. É tagi.o que, nessás con-
nentalmente o que possa ameaçáJo, por exemplo, um automóvel que se tliçóes, o ambiente físico deixaria de existir Para o Personâgem'
aproxima enquanto eh atravessa a rua. Essa minha explicação não foi suficiente: embora concordasse comigo
Já que eu vou fazer o papel de um cego, vou procurar agir dentro das tcoricamente, a atrrz rrão conseguiu ver nela uma soluçâo prática.
I
circunstâncias as quais cheguei refletindo logicamente e a título de ensaio, funcionar os cinco sentidos numa Preocupação imagi-
oou andar setn olhar gla o chão procurando imaginá-lo, ou seja, procurando - "Como fazer
nâna? "
uê-lo mentalmente,
Experimente isso, leitor, da seguinte maneira: peça pera alguém colocar
- "Como na vida real", resPondi eu.
- "E como é que isso acontece na vida real? "
I
vários objetos, livros, caixas, tábuas, etc. Em seguida, atravesse o quarto de
olhos abertos, porém impedindo-se de ver o châo, por exemplo, segurando Compreendi que estava faltando um exemplo prático, mas uma feliz
na altura do seu queixo um liwo ou um caderno. Ao atravessar o quarto, coincidêniia ajudáu a explicação. O conhecido psiquiatra, Dr. Bernardo
i pense nos obstáculos cuja posição você ignora e quando chegar a tocar neles lllay, que assisiia , aol" poi pura curiosidade, dirigiu-se a uma das alunas: "O
com o pé, procure uê-los rnentalmente porque, com um pequeno descuido qr" a !"" a senhora está fãzendo? " A moça-em questão olhou par-a ele
de sua parte, eles podem levá-lo a um tombo. literalmente corno se estíuesse acordando naquele momento, e disse: "Nada"
Ao terminar a travessia, você constatará que apesar de ter andado com E o diálogo continuou assim:
os olhos abertos, deixou de uer (ou quase) o que se achava do outro lado do
- "A senhora ouviu o que nôs estavamos dizendo? "
quaÍto. ttNão.t'
-
Para maior clarezq faça um colega seu fazer esse exercício na sua pre-
sença e observe seus olhos enquanto ele estiver andando: se ele realmente
- "Por que? "
consegu.ir imaginar os objetos colocados no chão, rendo-os mentalmente,
- "Eu estava pensando."
você verá o olhar de um cego. Portanto, não se trata de procurar acreditar na
- "Em quê? "
sua cdgueira, - isso seria impossível - e sim, de agir dentro de uma situação
- "No eiercício de improüsação que vou fazer agora"'
em que agiria um cego precisando atravessar um espaço desconhecido. Quem Como vocês vêem, não houve necessidade de uma PreocuPação "tão
se lembra do filme "Belinda", na magnífica interpretação de Jane Wyman, grande" para que a atriz ficasse completamente abstraida, bastou vmapreo-
certamente se lembrará do olhar cego, completamente ôco, do personagem' cupação pequena, mas real.
Acredito que esse milagre da arte dramática nâo foi conseguido por inspi-
' A tiriz que levantou o problema disse que compreendeu essa lógica e,
ração e sim através de muito trabalho em que predominou a lôgica e, confor- mais tarde.ot tou que aplicou com sucesso no seu trabalho'
me veremos mars tarde, provavelmente através do uso dos outros elementos Vocês devem i.. tàt"do que nos exemplos que eu dei acima, al;gca
do Método. não é muito simples. É porqrr", na üda real ela é muito mais complicada e
Da mesma maneira podem ser resolvidas outras situações difíceis: um contraditôria do-que aquela que freqüentemente usamos em teâtro. A meu
paralítico que procura andar, o comportamento de uma pessoa que acorda, ver, um dos g..nd-'es p".igot p"." o atual - que. vive no meio.dos seus
"tot
etc. contemporân-eos tão psiqiricimente complicados - é simplificar'a lógica da
Lembrome que uma outra aluna daquele curso parâ os atores profissio- vida, tàá-la ôbvia ; hnear. E-m teatro nôs representamos "O Amor", "O
nais me pergu.ntou durante uma aula: "Estou ensaiando na teleüsão uma Ôdio", Alegria", mas raramJnte mostramos ã
"A do Fulano, o ôdio do
"t 'ot
=
=
=
=l
3
it
22 EUCÊNIO KUSNET ATOR E MÉTODO 23
Êl
ii Beltrano, a alegria do Cicrano. Mas como sâo diversos, na vida real, as ,A" mulher sabia que não podia recorrer à polícia e que a única maneira
i manifestações de alegria ou de tristeza em pessoas dife.entesl Como sào ,l, salvar o pai seria matar o "chefão". Sob o pretexto de tratar de um
i
inesperados, por exemplo, uma risada estridente no momento de um grande rri gôcio, el:L vai até o apartamento dele, Provocâ-o, excita-o e, durante um
i
sofrimento, ou imobilidade e silêncio, prôprios de um estado de pânico, no l,r'i_jomata-o com um punhal.
i
momento de extrema felicidadel Na primeira tentativa pàra a Íeallzàção dessa cena' Carminha só se preo-
i
Por que eu digo isso? É porque ja'vi isso nos muitos contâtos hurnanos ( upou com o ódio mortal que tinhâ pelo "chefão". Assim munida, chegou
durante a mirrha vida, porque já me acostumei com o inesperado e contra- .rri' o apârtamento dele e é claro que, dessa maneira, nunca seria recebida I
ditório comportamento dos meus semelhantes. lx)rque o ódio transparecia à distância, como vemos na fotografia n.o 1.
Por isso, mesmo quando numa peça não encontro nenhuma complexi Carminha procurou interpretar unicamente a ação do momento' omitin-
dade, eu procuro e, se for preciso, crio as contradições humanas porque sei ,l,r por completo os dados da ação contínua, com o passâdo e o futuro da
que meus espectadores também são seres contraditórios, que, há muito nào .,1;io, porque conforme o temâ proposto o Problema do personagem não era
aceitam em teatro a fórmula "pão-pão, queijo-queijo". .()mente matàr o "chefão" por óüo, mas sim.fingir uma paixão, envolvêJo,
Mas passemos agora a mais uma característica da açâo na vida real: a ,lrrdi-lo e só então màtá-lo, vingando as mortes "ontem" cometidas por ele e
ação é sempre contínua e íninterrupto.. Nunca deixamos dc agir, nem Ínesmo .,,,ivando "amanhã" a vida de seu pai.
quando dormimos: os nossos sonhos às vezes são forma de ação mais intensa Passamos para a segunda tentativa e o tesultado foi o oposto, embora
do que na nossa realidade. E os bons cristãos dizem que ncm a.morte ,r:io sc perdcssc de vista o primeiro objetivo, o de matar o "chefão", o ódio
interrompe a ação. licou diluído c o que vemos na fotografia n.o 2 é uma grande sensualidade,
Cada momento de nossa ação na üda real tem seu passado e seu futuro. runa volúpia. Observamos que até o punhal foi quase esquecido pelo perso-
Quero dizer que cada momento presente tem suas origens no passado e seus ,,agem :- vejam como ficaram relaxados os dedos da mão!
objetivos no futuro. A frase de Stanislavski: "O nosso 'hoje' é apenas cr Sô quando Carminha conscguiu reunir dentro da sua ação os dois obje-
resultado do movimento do nosso 'ontem' em direção ao nosso 'amanhã' ", tivos, isto ó, dirigir o scu "ontcm" (o ódio fotografia n.o 1)no sentido de
define bem a mecânicâ da ação contínua tanto na vida real, como em cr:nâ. chegar ao seu "amanhã" (salvar o pai através do fingimento de amor -
Os atores deveriam preocupaÍ-se muito menos com a ação do rnomento liitografia n.o 3), íoi que ela chegou ao resultado satisfatório, esPontanea-
do que com a ação anterior e posterior porque a ação do momento se reuliza lnente,
automaticamente se o ator realmente exerce a açio contínua. Em teatro a ação cênica frcqüetttemente sotre interrupções: intervalos
Para ilustrar isso escolhemos um tema muito banal, mas suficientemcnte cntre os :rtos ou quadros, saídas do àtor de cena, g.andes Pausas em que o
claro e lógico, que foi realizado por minha aluna e colaboradora, Carminha ator, embora prescntc em cena, fica àParelltemente inativo.
Fávero. Que dcve fazer o âtor para climina. o efeito nocivo dessas interruPções?
No submundo do crime, uma mulher que faz parte de uma "gang" Deve manter o seu "cstado cênico", isto é, continuar agindo como o Perso-
sofreu várias ofensas graves - mortes de muita gente querida - e nunca nagem, mesmo quando está fora de cena? Há atores que Procuram fazer isso
conseguiu descobrir os autores dos crimes. Na realidade todos eles foram na medida do possível, mas não literalmente, é claro, pois muitas coisas que
cometidos pelo "chefão" qr", posteriormentc, sempre aparecia como eles têm que fazer nos intervalos não podem ser feitas como se fossem
defensor e protetor da rnulher, mas que, "infelizmente", sempre por um personagens: rnelhorar a maquilagem, rever o texto, consultar o diretor a
triz, não conseguia salvar as vítimas. O seu objetivo eüdentemente era fazcr .erp"ito- de algum detalhe importante, etc. Outros atores acham e talvez
com que ela se lhe entregasse "por amor" e não à força - o que seria fácil com razão - que nos intervalos eles não devem cansar demais a sua imagina-
ção, e por isso "se desligam do papel". Mas o mínimo que se deve exigir
demaisl de
Um dia ela foi prevenida por um velho membro da "gang", .- que todo e qualquer ator é que, antes de entrar novamente em cena, ele recorra à l1
também estava apaixonado por ela, - que o "chefão" tinha planejado o ação anterior (o "ontem") e posterior (o "amanhã") do personagem' como j
âssassinato do seu pai para o dia seguinte. Desta vez, ele tomaria parte no ümos no exemplo acima. I
crime pessoalmente. Como sempre, ele seria encontrado no local como se Infelizmente nem todos os atores correspondem a essa exigência míni-
tivesse chegado no último momento para defender o pai, mas.. . que azarl ma. São capâzes de contar uma piada exatamente no momento de entrar
Tardedemaisl .., para fazer rrln^ ."r" trág|ca. Há atores que parà demonstrar aos colegas sua
=
u EUGÊNIO KUSNET ATOR E MÉTODO 25
I ffi
scu contato com a cena.
E agora vamos ver a terceira característica da ação: ela tem sempre e
*. simultaneamente dois aspectos - ação inteior e ação exterior, ou seja, ação
rrrental e ação física,
Essas duas formas de ação não podem existir em separado, elas se
l)rocessam sempre simultaneamente, mesmo quando uma delas aparente-
rnente está ausente. Por exemplo: a imobilidade total de uma pessoa (açá-o
(xterioÍ nula) simtitaneemente com ume série de pensementos frenéticos
(açio interior intetsa). Para compreender como isso funciona, faça uma
t'xperiência na base de uma ação imaginária: você acompanha com um olhar
,lc longe, o enterro de uma pessoa muito querida. Por uma ou outra razío (é
importante que essa razão seja bem clara para oocê), você não pode acompa-
,rhar o enterro de perto. Complete com sua imaginaçâo os detalhes faltantes:
quem é o falecido? Em que circunstâncias ele morreu? O que impede você
chegar mais perto? Quem sâo as pessoas que acompanham o enterro? etc. E
:rgora vá agindo, ou seja: apcnas acompanhe com o olhar o enterro que você
M
vô na sua imaginação, pensando tudo o que pensaria o personagem nessas
circunstâncias. Se você não cometer ncnhum erro de lôgica e não esquecer o
"ontem" e o "amanhã" dessa ação, nós, espectadores, certamente sentire-
I
26 EUGÉNIO KUSNET ATOR E METODO 27
W ru
"Ópe." dos três vinténs", (foto n.o 4), e a segunda, de "Maneco Terra", do
íilme "Ana Terra" (foto n.o 5), - filme que nunca foi realizado porque a
oompanhia Vera Cruz, naquela época, tinha quase entrado em falência.
Vou thes contar a histôria das duas fotografias. Eu fiz o papel de
"Pitchum", no espetáculo realizado pela Escola Dramática da Bahia, sob a
rüreção de Martim Gonçalves. Antes de começâr uma das representações, eu
cstava muito preocupado com alguns detalhes da roupa e dos acessórios. Uns
poucos minutos antes do início, um aluno da Escola me aüsou que um
,M
rcpórter precisava tirar com urgência uma fotograÍia minha. Eu me recusei
pois não haüa mais tempo. Ele insistiu: "Kusnet, sô um instante". Para me
ver liwe desse problema, aceitei pedindo que fossem rápidos. Mal tive tempo
,W .le me colocar ao lado da escrivaninha do escritório de "Mister Pitchum",
0t,,,, tomei rapidamente ((a atitude de Mr. Pitchum" e pronto; a fotografia foi
tirada. O resultado como vocês podem ver (vejam a fotografia n,o 4), foi
lamentável: há apenas uma careta de Pitchum e nenhum vestígio da ação
W interior do personagem. Por quê? Porque naquele momento eu não pensei
1,
algum objetivo de Mr. Pitchum. Sô havia um objetivo, e este era um
"m
objetivo do ator Kusnet - ser fotografado o mais rápido possível.
Agora vejam a outra fotograÍia, a de Maneco Terra (vejam a fotografia
rr.o 5). Ela foi tirada bem no início dos trabalhos. Trata-se de umacena em
que Maneco faz sinal a seus dois filhos para que matem o índio que seduziu
rua filha Ana. O objetivo de Maneco é muito complexo: por um lado ele
rlecidiu cumprir o dever do pai cuja filha foi desonradâ mâs, ao mesmo
tempo, ele daria a vida para eütar a mágoa que essa decisão causaria a sua
Íllha adorada. Esses dois objetivos contraditórios foram cuidadosamente
cstudados e usados no trabalho.
Casualmente analisando com meus alunos alguns detalhes dessa cena,
constatamos que cobrindo com um cartão a parte inferior do rosto, na
Fotografia n.o 3
I
EUGÊNIO KUSNET ATOR E MÉTODO 31.
30
Vejam bem: com essa forma em que se revestiu o seu objetivo, ela só
podia se sentir humilde. E tudo isso provinha da comparaçío do'g.rrde
presidente com a "insignificante" Maria, da grande pát.ia com o ,,inlignifi-
cante" teatro. Mas por que a insignificante Maria? po. qr. o insignificante
teatro? os problemas da arte,em nosso país não são
-"ir i-po.i.ntes do
que muitos, mútos outros problemas? por que então essa insignificância?
Para dar maior ênfase a minha idéia, sugeri Maria que consid"erâsse o selr
" ," .oráp"netrasse
teatro o fator mais importânte do mundã, q,r. da idéia de
que a falta do seu tearro em são paulo p..iudica.i" â frt,r.o das geraçôes
inteiras, que mesmo os problemas da misérla, da fome são
-enof impor-
tantes, etc, etc. "convencida disso," pergu,tei eu, "em que estado de ânimo
você entraria no Catete? "
Enquanto eu falava, os olhos de Maria brilhavam caàavez mais, e vocês
precisavam::r com que infinito orgulho ela se ajoeihou perante o delfim e
começou a falar: "Garboso delfim, eu, Joana D'Arc . . .,,, it .
Assim, através de um paralelo, os objetivos do personagem tornaram_sc
grandiosos, empolgantes para a atriz.
Mas não se deve e-squecer de que o âtor scmpre corre o perigo de
confundir objetivos do personagem, que o induzeÀ ,gi. .orr,á tal com
.os
"
os seus prôprios objetivos, que o induzem a se exibir, a brilÁar, como naque-
le caso que citei no início deste capítulo, quando contei o que aconteceu
comigo depois de ter gravado uma cena de "Áquele que leva bofetadas".
- Para-se apoiar realmente sobre um objetivo do personagem, o ator deve
saber definí-lo com e máxima clareza, tornando-o po. ,.sini d.izer, p;rlpável.
Nâo me ente'dam mal: não cstou sugerindo a simpliÍicaçâo do objeiivo, mas
apenas a necessidade de eútar a possível con[úsâo por falta ã" .1r."r".
Mesmo um objetivo muito complexo e conrraditôrio, como por exemplo
aquele de Maneco Terra, deve ser estabelecido com toda a lógica e clareza.
Por isso é aconselhável ao definir o objetivo, ura. o ,erbã ,,querer" na
primeira pessoa e não numa forma descritiva. Em vez de dizer: "õ objetivo
do pe.rsonagem é vingar sua honra", diga: ,,Eu quero ..ing". a ái,h"
.a
1l
honra", O uso desse verbo facilita a aquiiição da ^,,fé cêricã,, e evita a
Ii confusão a que nos referimos acima. certamente, Maria Della costa ao
Ír
,,*MlfrlWffiIil entrar naquela cena com o delfim, deve ter pensado mais ou menos assim:
"Eu quero que o delfim me obedeça, quero que me entregue o comando do
ilHfrflflW[iflfl exército, porque sou a única pessoa cepaz de salvar a Fãnçal', Mas se em
ryffiilro,
..: vez disso, Maria pensasse: "Eu quero fazer essa cena maiavilhosamenter
Quero sentir muito orgulho no momento de me ajoelhar", a que resultado
ela chegaria? A uma ação completamente falsa.
Apesar dos meus longos anos de teatro profissional, eu também nem
sempre me sinto isento dessa confusão. Um caso desses aconteceu comigo
em "Os Pequenos Burgu.eses" na cena da briga de,,Bessêmenov,'com seu
Fotografia n.o 5
-
34 EUGÊNIO KUSNET
I
o-
zZ
9:
qx
ffiffi
tr.l
o
U)
EI
I
r=
SÉTIM) CAPíTUL)
L."io que você, leitor, muitas vezes ouyiu esses famosas frases: "O
espetáculo não é mau, mas falta ritmol . . .", ou "Essa cena precisa de muito
maisritmo! ..."
Esses comentários são comuns nos intervalos de um espetáculo, tanto
na platéia como nos bastidores do teatro. Não sei se os comentadores que
usam essas frases têm uma idéia exata do que significa o ritmo em teatro. Sei
que em muitos casos, ao üzer "ritmo", eles subentendem simplesmente a
rapirlez com que a ação da peça deveria se desenrolar.
E indiscutível que o ritmo em teatro é um problema de imensa impor-
tância, e é exatamente por isso que ele nâo deve ser encarado com tanta
ingenuidade.
Por onde vâmos começar para entender como e por que o ritmo faz
parte da arte dramática. Comecemos por ver como se define o significado da
palavra "Ritmo". No Pequeno Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa
encontramos o seguinte :
"Em Música, agrupamento de valores de tempo combinados por meio
de acentosi organização do movimento dentro do tempo, com volta perió-
dica de tempos fortes e tempos fracos, num verso, numa frase musical, etc.;
em Física, Fisiologia, etc., movimento com zucessão regular de elementos
fortes e elementos fracos; em ârtes plásticas e nâ prosa, harmoniosa corre-
lação das partes."
Se a definição é clara no que diz respeito à música e à poesia, e se
mesmo em relação à física e à fisiologia, ela é bastante compreensível, não se
pode .li,er o mesmo a respeito da definição do ritmo na prosa: harmoniosa
correlação das partes. Em que consiste essa harmonia? Como se processa a
correlação das partes?
Por isso me parece, que para compreender o que é o ritmo na prosa, é
bom começar por entender melhor como funciona o ritmo na música.
Para facilitar a compreensão do nosso problema, comecemos por simpli-
ficar a própria definição. Para nós o ritmo em müsica será: "diüsão do
compesso musical em valores de tempo".
Vamos ver isso num exemplo muito simples.
I
Imaginem,os que cada um desses cinco compassos tenha duração de Apresentamos esses exemplos em dois pentagramas cada um, e o último
quatro- segundos, Nessas condições, poderíamos dividir o espaço de quatro em três, para que o leitor possa experimentálos em forma de percussão
segundos em vários valores de tempo, conforme feito no rrossã e*"-plà: organizada com duas ou três pessoas, ou então usando um metrônomo para
C,omp.sso n.o 1 - Não dividindo o compasso, temos uma nota (ualor marcar o tempo-ritmo do pentagrama de baixo e executando as batidas dos
de tempo) de duração de quatro segundos. outros personagens pessoalmente.
Regule o metrônomo para várias velocidades, alterando assim o ter.lpo,
Compasso n.o 2 - Diúdindo em dois temos duas notes de duraçâo de
e acompanhe as batidas de acordo com a diüsão conitante do pentagrama
dois segrndos cada uma,
de cima- Procure sentir e constatar o efeito que lhe causa cada alteração do
Clmpasso n.o 3 - Ditidindo em quatro temos quatro notas de um tempo: ela o torna mais animado? ou mais concentrado? ou mais triste?
segu.ndo cada uma.
Compsso n.o 4* Dividindo em duas notas de duração diferente te- L. t.
mos uma nota de três segundos e uma de um segundo.
Compsso !.o S - Dividindo em cinco notas de duração diferente te-
mos uma nota de dois segundos e quatro de meio segundo cada uma-
1,'[
difícil de se explicar por escrito num livro. Tentarei aPresenter uma idéia conveniente para as pe-ssoas pouco versadas em música. os que conhecem
çe talvez torne possível uma ou outra experiência pessoal- música ou possuem o dom musical, podem preferir o uso de tàchos de uma
- Longe de mim a idéia de dar aqui uma receita
Para o uso do "tempo' música coúecida cujo ritmo corresponda na sua opiniâo, às características
ritmo", Esse elemento é de uma sutileza e complexidade tão grandes que a do texto. sendo essa música conhecida, poderia .., faciim"rrte gravada na
dificuldade de seu uso só pode ser vencida Por um longo e sistemático memôria do ator, seria ainda-melhor se eÍe pudesse compor uma"espécie de
trabalho com muitas e muitas experiências práticas que semPre devem ser "música de fundo", como o fez o nosso hipttético comiorito.
feitas sob um controle rígido. "-'"irr"-".
E finalmente, há atores de grande senso .ítmlico cuja imaginação cria
e fixa o
A sugpstão que pretendo fazer aqui, só deve ser encarada por vocês "tempo-ritmo" que não precisa ser gravado, .1" o texto por
como um meio de adquirir aPenas uma noção de como se cria e se usa o pura intuição do ator.
- ""oÀp"rh"
"tempo-ritmo". Não se "mpólguem pois com uma possível sensação de Agora quero lembrar aos leitores que, sendo o .,tempo_ritmo,' um dos
sucesso nas experiências que vou ProPor.
-
fatores da ação humana,-ele obedece às leis que regem a
Vamos usar parâ esse fim o exemplo de Rubens Corrêa. Imaginem que o
irópria ação, _ ele
tem, simultaneemente dois aspectos: "tempo-ritÀo inieriàr', e ,,tempo-
"tempo-ritmo" do trecho citado fosse criado por uma simples intuiçâo' ritmo exterior". os dois raramente têm :rs mesmas características, como
Nesse caso, nem o prôprio Rubens Corrêa teria noção do "tempo-ritmo" também raramente as tem a prôpria ação em seus dois aspectos.
que ele mesmo criou. O uso simultâneo dois aspectos do ,,tempo-riimo,' produz o que
Mas se ele pudesse ouvir a gravação da cena e transcrevê-la' como eu a .dos
chamamos de "tempo-ritmo compo-sto".
fi2, teria diante dele a reprodução, em forma gráfrca, do "tempo-ritmo" que Na cena de "o Diário de um Louco" temos um raro exemplo do contrá-
ele criou intuitivamente e cuja existência ignorava, Assim ele teria o seu rio, isto é, de "tempo-ritmo simples".
" tem po-ritmo" c onscie ntiz aào e mat e ri ali z a do vi s ualmen t e. Que os leitores mais esclarecidos em psiquiatria me perdoem a simplifi-
úa, poderia ir ainda mais longe em suas experiências, Em vez de caçâo exagerada que eu adoto para tornaimais cl"r, estárápida explicação.
"le
dizer o texto da cena em voz alta, ele poderia "pensá-lo", como se o texto Psicose é caracterí.za{1 p"t" perda do senso de realidade obj'etiva.
o
fosse o seu "monôlogo interior" e, enquanto pronunciasse mentalmente as mundo objetivo é substituído rr"
-int" do psicopata pelo mundo fítástico,
palavras, marcaria cada sílaba com uma batida na mesa' Toda a seqüência que o seu cérebro doente criou.
àessasbatidas deveria ser registrada num gravador de som' . Nessas condições não há contradições possíveis na psique do doente, ere
Ao ouvir a gravação, ele estaria diante da materialização, desta vez diz o.que pensa e pensa o que diz. Daí-a unicidade do seu 'i.^po-ri*o".
sonora, do seu "tempo-ritmo" qr", acredito deveria causar-lhe as mesmas pessoas consideradas psiquicamente normais ,irem permanente
-As entre a "m (interpre-
sensaçóes que ele já tlnha obtido intuitivamente, o que certamente seria de conÍlito, ."Jid"de objetiva e a representa
.p:rc.epçio .d" ção
grande utilidade no seu trabalho' tação) dessa realidade. Daí a permanente divergência entre . irt".io.
Portanto, seria útil se o ator, ao ensaiar, pudesse dizer o texto da cena ("Monôlogo Interior") e a ação fÍsica (fatas e moíimentos). "çaà
ouvindo simultâneamente o som gravado do seu "tempo-ritmo". Para ilustrar isso com.um exemplo muito simples, proponho que
imagi_
Mas, não podendo semPre ter a seu lado um gravador para poder ouür o nem uma vendedora de feira, rrum dia de muito ."lor, ,.nà"ndo .ir"
,,tempo-riimo" enquanio ensaiasse a sua cena, ele seria obrigado â gravâr doria, ügamos, frutas. -....-
seu
os sons da percurssão na sua memôria. A sua "realidade objetiva" é essa: sol impiedosamente quente, sonolên-
Nessas condições, enquanto estipesse dizendo o texto da cena, ele pro- cia, fraqueza, apatia. Sâo esses os fatores que originam o ,e'u ,,t"mpo-.it,,,o
cttraria outir mental^"ni, o "tempo-itmo" grartado que, assim correria interior" muito lento,
paralelamente ao texto, ativando ainda mais o efeito causado anteriormente Mas a sua "realidade subjetiva" é a absoruta necessidade de vender,
outros elementos do Mêtodo, com "a visualização", "o mágico SE quanto antes, suas frutas. Por isso ela tem que gritar alto e alegremente os
|los
FOSSE", "o monólogo interior", etc. das frutas que vende,- para chamar i atÃçao . pro.,o."f a simpatia
suas experiências 1om1
dos tregueses. E isso que forma o seu "tempo-ritm; exterior" muito
. É este o caminÉo qo. me parece aproveitável para
pessoais, na forma que nôs usamos em nossas aulas. agitado.
A maneira de fixar o "tempo-ritmo" através de uma percussâo, como -o "tempo-ritmo composto" resultante da fusâo dos dois, deve dar o
exemplificamos acima, evidenternente é longe de ser a única. Ela é mais resultado procurado
- a contradição humana.
92 EUGÊNIO KUSNET ATOR E METODO 93
Sempre procurando meios <ie dar a maior clareza possível às minhas .batidas
.9
r:g""do pentagrama mostra o ,,tempo-ritmo', básico em forma de
explicações, vou novamente recorrer a exemplos apresentados graficamente, do metrônomo e deve ser mantido antes, durante e depois da,,fala
embora saiba que a matéria tão sutil como o "tempo-ritmo" não possa ser interna", bem como durante todo o diálogo.
reduzida à materialização exagerada. Assim seria o "tempo-ritmo" da preparação da cena, da sua ,,ação ante_
Vamos pois a um exemplo de "tempo-ritmo composto". rior",
Uma senhora recebe em sua casa vários amigos da família. Ela procura âgora ao texto da cena. Dentro do ,,tempo-ritmo', preestabe_
.lecido,
. .Passemos
ser gentil com todos os convidados para tornar sua visita agradável. Digamos o seu aspecto seria o seguinte:
que kso seja o seu único objetito, Ela está calma e segura de si, Sâo estas as
"circunstâncias propostas". De_pois de submetê-la ao trabalho igual ao que MODERATo: J sa
vocês fizeram nos exercícios dos capítulos anteriores e, principalmente,
depois de criar as "falas Internas" correspondentes à situação anterior à ação
cênica (o que ela fez ou pensou antes da recepção), Procurem executar a PERSON.
ação que contêm apenas duas frases que a senhora dirige a um amigo cuja nas que Prâzer voce PoÍ
visita ela não esperava.
I,íETRON.
SENHORA Oh, mas que prazer! Você por aqui?
-
VISITA - Você sabe como eu gosto de sua casa. Alice nâo pôde vir,
está um pouco adoentada.
SENHORA - Que é isso? Nada de grave, espero? . VISITA - (falando dentro do ritmo basico que o metrônomo continutt
VISITA - Não, nada. batendo) você sabe como eu gosto de suâ casâ. Àlice não pôde vir, está um
pouco adoentada.
É bom notar desde já que entre
a primeira e a segunda frase da senhora
há uma pausa durante a qual ela escuta o visitante. Essa pausa também está
zujeita aã "tempo-1itmo" ãa cena. PERSON.
Que "tempo-ritmo" deve ser usado nessa cena? A personagem está Nada de grave, espcro
cdma, segura de si, contente. Que "música de fundo" você escolheria? Não
seria uma valsa calma, não muito lenta, nem muito viva? Portanto, seria um METRON.
ritmo de 3/4.
O que estaria pensando a personâgem antes de começar o diálogo com o
üsitante? Digamos que seja o seguinte: "Tudo corre muito bem. Graças a VISITA - (sempre dentro do ritmo basico) Não, nada.
Deus!" Esta "fala interna" teria o "tempo-ritmo" que graficamente Poderia
ser apresentado assim: Assim se apresenta o_"temporitmo simples,' dessa simples cena, porque
preestabelecemos que o único objetiuo da senhora seria sei agraür;el', o que
elimina toda a qualquer contradiç'do em sua ação.
MODERADO: J 88 . Mas digamos que as "circunstâncias propostas" sejam acrescidas de unr
elemento novo: a personâgem está em de abandonar seu marido. o seu
arnânte exige que ela o faça hoje mesmo "ias
e disse que telefonaria durante a
festa. Ela não tem coragem dã ir embo.a hoje e nâo sabe o que fazer.
PEP.§oN.
Evidentemente está múto nervosa, mas faz questâo de nâo deixaios convi-
Tudo conc muito Creçes a Dcus! dados perceberem o seu estado.
Que forma tomaria, nesse caso, a preparação da cena?
METRON.
um lado, ela procurari, .o.,r"*à. a calma e, para isso faria o pos-
sível para ela prôpria âcreditar que nada de extraordinário estivesse aconre-
I
ATOR E METODO 95
94 EUGÊNIO KUSNET
cendo, pois só assim poderia convencer os seus convidados. Ela estaria pen-
sando:'itudo.o.r" rrrrrito bem! Graças a Deusl . .."
Mas, ao mesmo tempo, não poderia deixar de sentir o peso de sua Vaê sbc como gosto dc sue cua Alicc nio podc vü . . . ctc
indecisão, o pâvor do que pode acontecer. A sua "fala interna", neste caso
poderia ser, por exemplo: "Que faço? . . . Nâo tenho coragem! . . . Oh! meu
Deusl...".
Se procurarmos unir o "tempo-ritmo" da preparaçâo da cena com outro
que possa corresponder ao acréscimo que fizemos nas "circunstâncias pro- Creio que, embora compreendesse bem a mecânica do "tempo-ritmo
postas", o conjunto poderá ter o aspecto seguinte:
composto", o leitor certamente teria que fazer uma pergunta: "Depois de
criar e fixar os dois componentes ) como poderia o ator ntanter em nrcnte L>
MODERATO: J SA
"tempo-ritmo interior", enquanto exercesse o "tempo-itmo exteríor" com
rclativa facilidade graças ao apoio substancial que lhe dá o ato de dizer o
texto? Onde poderia ele encontrar esse apoio para o "tempo-ritmo
Ntno 1.o
interior? "
Tudo cor- rc muito bcm Gregu Dcus Acho que ele poderia procurá-lo nas ações físicas que acompanham as
,-;\
falas. Basta que essas ações estejam dentro da lógica das "circunstâncias
Ritqro 2.o ír#,1;*1.-2 ffi propostas" e correspondam, por sua natureza, ao "tempo-ritmo" procurado.
Que faço? Não tcnho coreçm Mcu Dcus Todos nôs fazemos mútos movimentos, gestos, sem mesmo nos dar
conta disso. Mas esse comportamento inconsciente deve ter sua razão de
METRON,
ser e, certâmente reflete algum "tempo-ritmo interior". Por exemplo, um
tremor do pé enquanto o resto do corpo está em absoluta imobilidade;
um homem que, falando calmamente, faz um milhão de assinaturas numà
Este é um exemplo de "tempo-ritmo composto", contraditório em que
folha de papel; uma pessoa que rôi unhas, apesar de parecer muito calma.
os dois componentes devem influir um sobre o outro. Como conseguir isso
Todos esses tiques, e muitos outros que vocês podem imaginar,
na prática? Não há fórmula alguma, mas podemos tentar.
podem ser usados, mesmo em cena aberta, para apoiar e, por assim dizer,
Para começar, creio que seria conveniente:
materializar o "tempo-ritmo interior". E cvidentc que esses tiques só
1) Gravar a percussão do "ritmo 2.o" juntamente com as batidas do podem ser usados quando cabem logicamente dentro da ação cênica.
metrônomo, para poder ouvi-las enquanto diz o texto do "ritmo 1.o". Muitos atores usam para fil<ar o "tempo-ritmo interior", os sons, os
2) Gravx a percussão do "ritmo 1.o" com as batidas do metrônomo ruídos e os movimentos em cena, como por exemplo, o tique-taquc do
enquanto pronuncia o texto do "ritmo 2.o". relôgio, o barulho do mar, a trovoada, ctc., e finalmente, a música que
acompanha a cena.
Assim você teria a primeira sensação do efeito de um "tempo-ritmo"
Atores que não utilizam a sonoplastia do cspetáculo são inimigos de
sobre o outro,
si prôprios, pois num bom espetáculo não há sons casuais, - todos eles
Quando você constatar que sente o efeito inquietante e angustiante são criados pelo diretor exâtâmente para fixar os "tempo-ritmos" da
desse "tempo-ritmo composto", deixe de lado as gravações e trate de sirn-
.", etc. Acredito que, nessas condi-
plesmente dizer o texto: "tudo corre . . Peça'
É freqüente nos trabalhos de alguns bons diretores brasileiros, - seja em
çÕes, você poderá constatar que a sua maneira de dizer o texto tornou-se
teatro, em cinema ou em televisão, - que a sonoplastia entra proposital-
diferente.
mente em contredição com a ação cênica.
Se você tiver dificuldade em chegar ao resultado desejado, poderá expe-
'rimentar uma outra maneira, por exemplo, usar o "tempo-ritmo interior" (o Um magnífico exemplo disso é uma cena do filme de Anselmo Duarte,
"ritmo 2.o") ao pronunciar o texto, - ("Qr" faço? . . ." etc.) - enquanto
"O Pagador de Promessas". Nessa cena, enquanto o Personagem, Zê do
Burro, extenuado, perdendo as últimas forças, lentamente carrega a sua
ouve a fala do üsitante.
96 EUGÉNIO KUSNET
Em que consiste o método da "Análise Ativa"? Como diz o próprio adquire a capacidade de conceber sempre com surpreia a ação preestabele-
termo, é uma maneira dos atores analisarem o material dramatúrgico: anali- cida, como se ela fosse inesperada.
sá-lo em ação, ou seja, procurar compreender a obra dramática através da Não devemos estranhar esse fenômeno, - temos vários exemplos disso
ação praticada pelos intérpretes dos papéis na base de conhecimentos super- em outras artes. Um pianista, tocando e mesma música em todos os seus
Êciais da peça, e não na base de longos estudos cerebrais. concertos, executa as mesmas combinações de notas escritas na Partitura'
Isso, eüdentemente, pressupõe a diminuição ou quase eliminação, da dentro do mesmo ritmo e leva em consideração semPre as mesmes indica-
análise puramente racional que, anteriormente, representavâ a pârte essen- ções do composítor. E entretanto, se o concertista for realmente um artista,
cial do trabalho com umâ peça. No trabalho com o método da "Análise sempre haverá uma diferença na sua interpretação em cada concerto, dife-
Ativa" basta que os atores conheçam o conteúdo da peça a ponto de poder ."rrç" que os ouüntes constatarão emocionalmente' São bem conheci-
contá-la com clareza, para que a "Análise Ativa" possâ ser iniciada. "rt,
dos os comÀntários dos freqüentadores dos concertos: "Hoje ele tocou tão
Nessas condições, é eüdente que a única maneira de executar a ação da diferente! Parecia outrâ música! . . .", mas em que consistia a diferença, esse
peça nos ensaios é improvisáJa de acordo com que os atores acabam de ouünte não saberia explicar. É pois evidente que o pianista também impro-
conhecer. visa dentro dos limites obrigatórios da obra musical, tocando-a como se
A improvisação é a base da criação em todas as artes. Improúsa o fosse pela primeira tez.
escultor, improvisa o músico, improvisa o ator, Não improvisa o contador, o O que estimula a sua improvisação são vários elementos que se encon-
mecânico, - no seu trabalho eles apenas imitam o que já foi criado e tram fora da obrigatoriedade e que variam de um concerto Para o outro: o
transformado em regras fixas pelos outros. seu próprio estado psicofísico, a sua "visualização" da obra musical, a
O artista sempre cria coisas inéditas. Por isso um músico ao criar ou ao reação da platéia.
executar uma obra musical não deve sofrer influência de outras obras ou Na prática do ator esses elementos são ainda mais ricos e estimulantes.
outras interpretações, senão ele corre o perigo de imitar em vez de cnar, A Sem contar a influência do seu estado psicofísico (que em grande parte
sua ciação deue ser sempre espontânea. depende dele prôprio, pois a predisposição para o seu trabalho artístico
Em teatro a espontaneidade é a mais importante qualidade de um ator. depende da sua "primeira instalação"), há um vasto camPo de surpresas
Espontaneidade e talento tornaram-se, em teatro, quase sinônimos. A frase: esiimulantes, que representâ o seu contato, em cena' com os companheiros'
"ele é um ator muito espontâneo" pode ser substituída pela frase: "Ele é de que também nunca representam com a mesma precisão, bem como a reação
muito talento". Se partirmos do princípio de que â espontaneidade se revela da platéia, que em teatro, geralmente, rcage da maneira mais sensível do que
na ação improvisada, - ou vice-versa, que a ação improüsada é o resultado nos auditôrios de música.
da espontaneidade inata, - podemos chegar à conclusão de que o dom de E note-se: num verdadeiro teatro o espírito de improvisação nunca
improvisação bem desenvolüdo pode substituir o que chamamos de talento. perturba, nem prejudica a harmonia do espetáculo' Porque todos os_ atores
Mais tarde veremos como se processa a improvisação no correr dos são acostumados a improrisar sem nunca perr)er de uista os objetitos
ensaios pelo método da "Análise Ativa". Por enquanto quero apenas frisar comuns e, por isso, sempre improtisam dentro dos limites preestabelecidos.
que a presença da improúsação, numa ou noutra forma, é absolutamente Isto é, dentro das "circunstâncias propostas".
necessária em todas as etapas do trabalho, a começar do primeiro ensaio e O exemplo mais convincente desse fenômeno é o jogo dc futebol. Nin-
terminando pelo último espetáculo. guém duüda que o sucesso de um jogador de futebol, depende da sua
Para o leitor deve ser bastante clara a idéia de começar os trabalhos pela capacidade de improüsar o jogo, conforme âs surPresas que lhe causa o jogo
improvisação de uma ação apenas conhecida superficialmente, Mas como dos adversários; mas o seu improviso, por mais agudo que seja' nunca pode
improvisar aquilo que já foi decorado e repetido mil vezes nos ensaios e nos ser totalmente livre, porque dele dependem os seus dez companheiros que
espetáculos? Como poderia funcionar a espôntaneidade do ator nessas têm em mira o mesmo objetivo que ele: gol'
condições ?
Para desenvolver o seu dom de improüsação o jogador de futebol üve
Em primeiro lugar, é preciso esclarecer que não estamos falando de treinando, sempre tendo em vista o aPerfeiçoamento da técnica do jogo de
improvisação relativamente liwe, como no início do trabalho, e sim da conjunto, e não apenas o seu sucesso pessoal.
presença do espírito de improvisação, numa ou noutra forma, durante todos É o que deve {azer também.o ator: treinar o seu dom deimproüsação
os períodos do trabalho com uma peça, E isso só é possível quando o ator no sentido de desenuoluer a sua receptitidade da ação dos outros, ou seja, a
ATOR E METíJDO 101
100 EUGÊNIO KUSNET
"acontecimentos", ele invariavelmente lhe propunha cortes drásticos, para atores acostumados com o- método de improvisação,
a escorha deve ser feita
que a peça pudesse ser vista pelo ator, como ele dizia, "du vol d'oiseau", isto pelo diretor, conforme vários fatores q,r"'"I"
a""" r"r*-"*r-.liria"."çu", .
é, no seu aspecto geral em que se destacasse apenas o mais importante, nível intelectual e artístico do seu,elenlo, a
experiência profissionar dos seus
deixando os detalhes aos cuidados da própria "Aná,lise Ativa". atores' a complexidade da obra dramárica,
ir"uiria"ãáà" frãpl" air"r".
"Quanto ao sentido dos "laboratórios", continua M. Knebel, "a idéia de de despertar a atenção e a curiosidad"
do, " através de trima'narração, o
Stanislavski também mudou. Anteriormente, ele improvisava com os alunos "tor",
prazo que ele tem p:rf,a os ensaios, etc. Enfim,
é prátic" qu"-fãá" i"ai"* .
várias cenas "em redor" da peça. Os "laboratórios" referiam-se ao passado melhor escolha. o importante q-" o di.etàr "
9 não perca de vista o objetivo
do personagem ou âos episódios capezes de esclarecer a "biografia" do desiertar o maior inte.esse porríJ.
t, personagem, Posteriormente, os alunos faziam "laboratôrios" sobre os acon- :.""T1,*:"i:""
o esprrrro cÍosl)1-neríodo:
arores ,..p"r".
..é.ie
tecimentos da própria peça". pequenos exercícios de .p-1 " improvisaçâo da ação cênica. Um, d"
"visualizição" e de "mlnórogo inr"i".", .o-"
Stanislavski nâo se cansava de repetir que o método da "Anáüse ativa", que sugerimos no fim do tercei.o capíturo, ,";-"-
permite, âo ator incluir no processo de análise nâo somente o seu cérebro, ]9]eles
*o.:.Pill d. s.lnáe utili-
poderiam predispor o ator para o d. improvisaçeof
como támbém o seu corpo. Assim o ator penetra fisicamente no âmago da (J unrco membro da equipe, "to
que deve conhecer d"i"lhadamente é
ação, dos choques e dos conflitos em que o personagem toma parte. o diretor. Ele deve estar em.àrrdiç0". de ,.rford.. " i"ç"
a todas as persunras dos
Embora aparentemente muito simples, o método, na sua aplicação prá- atores, mes em hipótese dguT", d"re co-.ir
or.t."b.lho, pãüir"". p.a
tica, apresenta muitas diÍiculdades por não ter sido ainda suficientemente prios comentários. A razãá desta ,ecomendaçâo
é óbvia: q"'.^i"
sistematizado ples e menos detalhada for a ação proposra, -à ,ir"-
tanto mais liwe será p.r-";"
Stanislavski deixou-nos um plâno, bem concreto, de trabalho com um improvisação dos atores. "
papel pelo "Método de Ações Físicas", no seu citado livro Qtag. 248). Pela Na medida do possível, tudo deve ser entregue
à iniciativa do ator, É ele
riqueza dos detalhes e pela sua clareza, esse plano deveria servir de exemplo,
çe deve procurâr as melhores corrdições para o seu próximo improúso e,
aparentemente ainda hoje, para quem se interessasse por esse trabalho espe- portanro, é ele que deve pedir
sobre J q";il; ;;:;, ,rg"
cífico. Mas o plano foi criado no período anterior àquele em que M. Knebel "r.1".".i-"rtos
ou insuficienre durante a- leitura ou narraçâo d" i;";;: Er;; ã;;;p."",
cooperou com Stanislavski na elaboração e nas pesquisas do método da orientá-lo para eütar, desde o início, erros jrimários.
"Análise Ativa". Como já vimos, Stanislavski alterou profundamente alguns O diretor não deve começar a improvisaçâo de uma
detalhes, principalmente no que diz respeito à diüsão do material dramaúr- determinada cena
antes de constatar que os atores estão
em condições d" p"d;;,--"'-"-*'
gico em "pedaços", substituindo-o pela seleçâo dos "fatos ativantes". Ele
morreu antes de concluir esse trabalho.
1) Contar o que acontece ne cena. Em termos de ,.lnstalaçâo,,
(vide o
quarto capítulo) isso significa: responder a pergunra,
Os seguidores de Stanislavski continuaram suas experiências. Alguns qual é a,,ritr"çai,,
publicaram os resultados obtidos, mas não é fácil assimilar a técnica do
que se processa a ação em cada determinado
p.iíodo da cena? "_
mêtodo através da leitura dos livros e artigos escritos a respeito. Eles não são 2) Resp.onder. a pe.rgunta:
.euais os objetivos do ..necessidades,,
termos de "l nstalação" isso significa: personagem? Em
concludentes e, às vezes, são até bastante contraditórios, o que nos dá a guais sao as i'l1l
impressão de que todos os trabalhos dos adeptos de Stanislavski ainda se personâgem gue ele precisa satiifazer em cada -p".iãá" do
determinado a"
encontram em fase de pesquisas indiüduais. Não nos resta, pois, outra solu- cena?
Desta vez não ümos lágrimas nos seus olhos, ele parecia quase
,,Mas eu não disse", - respondi eu, - "que você não devia .preo- mas a tensão nervosa que a cena causou entre os ,.us iolegas,
calmo,
- disse? A frustàção de toda a sua
vida' o i.rou
cupâr-se com úú ,o,a"' io'úcídio' Nina' não deles às lágrimas. "lgum ilil1
desespero ao perder Pensou
seu fracasso como dramaturgo' o seu o seu."monólogo interior", que ele procurou restabelecer em voz alta,
em tudo isso? " correspondia à nossa sugestão, . r,". fÀ"r que desta vez ele citou, não
nis-so? "
- "Quando eurasgava
Poüa PensaÍ
os papéis"'
houve nenhuma referência aos "sentimentos rãgicos", nâo houve ,rr.i,
qrr"
ilili
- "Enquanto .. um raciocínio sobre a situaçâo sem outra saída senâo a morte. Entretanto,
a
- "Bem, eu Penser' mas ' ' ' antes"' sua improvisação foi um verdadeiro exemplo de comunicação
emocional
- "Quando"? entreoatoreaplatéia. ililtl
depois da leitura da peça"'
- "dnr.rn,vale'dizer qu-e desta vez não pensou? "
uma excelente demonstração de como se usa uÍn simples raciocínio no
- "ó-;;.
,,É.rerdade",
trabalho com a "Análise Ativa" e como disso resultam .áoções, e i"ã"
- - confessou o ator' anexo do liwo "A criação de um papel". "o
alto demais' ele só via a morte e , Numa cena que não foi publicada no texto do livro, o professor Tortsov
Resumindo: o seu "vol d'oiseau" era barata
em ,.o
demonstra aos alunos d, escól^ o trabalho com o papel d. i(ert"kor,
suas conseqüências, o que lhe
causou uma grande auto-piedade lchaue
sobre "as circunstâncias inspetor geral", na cena de sua primeira entrada. pa.a maio, clareza, traàrzi
pra todos o, ^."uaii^Ã)' e' i"fotãaçóes foram insuficientes' Na Peça o um pequeno trecho, no qual o professor Tortsov raciocina em voz alta
propostas", que ele ;; improvisação
"t; do que cnquanto ensaia a cena, improvisando tudo,
íato de sua morte '"*"'i""otiápo'ta"ci" "t:""t"t-1:::"Yf:
por si' pouco rmPresslona'
ao suicídio. Se as causas são omiiidas'
a morte' ". . . Estou com fome, mas onde é que vou arranjar comida? Não sei o
Embora absolutamente sincero' o
ator não caltsou ao expectador mars que fazer' Mandar ossip ou_ir pessoalme-nte ao bufetã e fazer Iá um grande
pouco mais do que causaria uma cscândalo com o dono da hospedaria? No lugar de Klestakov
do oue "a pena a" ttti"ái"r'" qt'" mo"t"' cstaria indeciso". "r,
,.]rrbé-
norài, policial num jornal'
que ele esquecesse detalhes Tortsov novamente saiu do palco. Demorou fora muito tempor prova-
Tudo isso eu contei ao ator, e receando
importantes, p"U q"t- ttpetisse todas
as oue levaram Trepliov ao mental-Ãt" d". ,.circunstánci". p.oport"r',,,' '
velmente para se cercar
'azõJs d'
,,ri.ídio. Quando .h ;';:;i" Jst;d""lt" "o"to' Ptt:*TP]:l:::"*
caderno com a primeua cena
Depois lentamente abriu a porta e, indeciso, parou no umbral. Em
ou de um .,:ryid"' tendo resolüdo ir ao bufete, Tortsov abruptamente virou
uma carta de amor, "'ià a" "'iá-1"' as costas a
de teatro, que ele "tt'";";;;ãTnã
t"-po de colégio' e.outros^PaPéis quc (hsip para que este lhe tirasse dos ombros o sobretudo,
e ordenou curto:
ele deüa
..visualizar" ;;; ã;;tgáJo,, "u sublinha=va a importância desses "Tte!"
detalhes' - ua a cena' a sua concentração - Depois começou a fechar â porta atrás de si para descer ao bufete, mas
a de repente acovardou-se, parou muito quietinho, e timidamente de novo
Quando o ator começou PreParaçao P: Isso me deixou inquieto' -
levou muito -"i' ú;";til"i'" "'' cntrou no quarto, fechando a porta devagarinho. illtil
"*ioã; o raPaz com o
comecei a sentir t l""'"ot"i o meu erro: sobrecarreguei
"A pausa foi longa demais", comentou Tortsov, ,,houve muitos detalhes
de detalhes, dificultando-lhe a
improvisação'
;;;;';; supérfluos, inventados, mas uma ou outra coisa veio da realidade".
Realmente, um minuto depois de
ter começado a-cena de rasgar or (É que durante todo esse tempo, Tortsou não estatta procurando
llliilr
por oue? ele disse que não conse' "sentir"-1laro,
papéis, ele parou. q""tJ" r.h9 rytqunlei'
llrll
carta e do coka alguru, ele estaua simplesmente raciocinand.o e comentando
mria lembrar-r. o o'"**-J'-tt"'a*ü"
l"' rasgar' alénr-da
,ção que acabaua de executar. E. I(.)
a
lui
""t"tàt
fora de ação' -
:;d.;;;:;;r;i.,Jo d.i*o' completamente
imperdoável que co-meti'.propur - "Be-e-eml . . .", continuou ele falando entre os dentes. .,para com-
Além de pedir-lhe desculpas peloerro
";";;"'.' preender a realidade da ação na peçâ, por enquanto basta-me o que eu achei
q,.'i; " d'
pÀ :":. à".t
".' ":: -'.ttlff :'" :::TL[":""
"fl:H;i nesta cena. com tempo tudo isso vai assentar melhor. vamos adiante, ao
llii[i
It
1.08 EUCENIO KUSNET
AToR E METODO
109
Ele parou, ficou muito tempo pensativo, imóvel, falando baüinho:
"Be-e-em! ... Compreendol ... A escada principal fica... aí", ele Expliquei-lhe
- Jlj me
mas que esre faro nâo l"r:"r*;nte- julgava_me unr péssrnc,
im provisador,
indicou o corredor, por onde acabava de entrar. "O que é que me atrai impedia a.,,r.;. improüsaçào
po,ssibilidades, porque dentro àr, minha,
", perguntou ele a si próprio.
mais?
"Tortsov não íazia nada,
apenas mexia os dedos, como que procurando
método. " p.áii." _. d.*.
rr!ç uemonstrou a grande utilidade desse
ajudar o seu raciocínio. Contudo estava se operando nele uma certa altera-
ção, ele se tornava desamparado, com os olhqs de um coelho assustado, e
.,. *!:;T,";;Ti: fi:,'i:T: [";5*
envorver o ator. :
"r
ab oraç ào d o s se u s c or
cena em que fosse mais
e gas m ais
todo o seu rosto parecia o de uma criança, mais manhosa do que zangada, F"i fácij
Ele ficou imôvel, entorpecido, não pensando em nada, com o olhar parado "r.;;i;; ;'í;:'""1,r-a
personasema".,".""*","á.".*i.",-l;:;[,:ffi."ii.1,,.['j;,:T"r;:,,:
num ponto. Depois, como que acordando, perscrutou com os olhos todo o gado por todos nós, ele, pouco a
Iide ra Douco.
a o h, u a i da de,t
quarto procurando alguma coisa". n ç (
"lmprovise o que eu acabo de te contar", para que ele se sinta ainda mais
há "',":.
r
;:o^::
t::ili i" i: *I#::
nâo adianta nenhum Io ha esPontaneidade
constrangido do que nas famosas "leituras expressivas" às quais obrigavam rnétodo,,. "rT e, então,
o ator antigamente parâ que ele revelasse as suas "possibilidades no ôampo
Um dos meus alunos,.discutindo
cssc problema
emocional da peça".
disse que achava ,-:",:l::l
,r*;;,;", ;;"r,aneidadedurante uma aula,
real, iguat àquet;r
Nesse caso, o andamento do trabalho depende muito da habilidade do :lr;::o'r,.111, pela própria naturcza, ,r"r.o arravés
dos iecursos da
diretor, O constrangimento desaparece quando o diretor consegue "se-
Para ilustrar sua idéia, clc
duzir" os seus atores tomando partl do jogo de improvisação junto com citou o espetáculo de Adcmar
Ele achava que o sesredo Guerra, ,,Hair,,.
eles, atraindo-os ao jogo até que eles próprios "achem graça" nas impro- d" i;;;;;rr"'.lro"rr.r,. era a esponraneidade
visações.
Lembro-me de um ator que, desde Àinício dos trabalhos com uma lJi :f',',1'ÂIff :3,';:,lJó,"
;;:; ";' ;il';'
res ur ra do i gu a r n u
nc. poderia
"Os atores do elenco,,, dissc
peça, declarou-se contrário ao método da "a\álise ativa", Ele explicou que ele, .,realmente_adoram juventude
a
estava acostumado a um outro processo, com.o qual, aliás, dava-se muito e suas
r1T Í I j:::l,t1r"jj. ; r;ilr, # i i',.0,,.,.
bem: receber o texto, procurar compreendê-lo através de várias leituras,
assimiláJo a ponto de "sentir o papel" e só começar a agir no lugar do
i:: :: ; rj* : :,j,1li:r,
uma flor com a água d"..rlônir,,. lvvells :€ o mesmo que perfumar
personagem depois de decorar o texto. Ele não concebia nenhuma outrl .Acredito que, cm princípio, cle tinha razâ o
neidade d"quel"rjovens esponta- e que a admirável
maneira de trabalhar. intocável.
arores era
A razâo de sua atitude, a meu ver, nâo era apenas o hábito de traba- Mas eu pergunto: por quânto
espontaneidade autêntica
tempo o diretor poderia
lhar de maneira diferente, era um ator muito jovem para ter hábitos enrai. de todos manter essa
algum dia, cansados dessa
o. .J* iité.p."t.ri N;o .rtr.ir_
zados. verdadeira rtzão era simplesmente a inibiçào. Ele se julgavr
A alegria diá;;;"; rlu"
o risco de sucumbir ,"1 "1.r,
não correria
incapaz de improvisar e, como a maioria dos atores, tinha medo dr ;l Fd;r'#
"rrorr"reidade
expor-se ao ridículo. açâo? E entào, em vez de " rEro de repetir sempre a mesma
uma r".drd"i.".fà_,
chave do e s pe t á cur o, n ao
fi.
".i"
;;;; ;;}:H,t:;. :ffi,'.T*:;.f":
ATOR E MÉTODO 111
110 EUGÊNIO KUSNET
aproximadamente a metade dos participan- nados em improvisaçôes lembora de pouca prática em teatro profissional),
Quando no palco reuniu-se finalmente' todos os atores
tes, a ação ficou bastante animadã'
Mas quando' foi provado que uma peça pode ser estreada com apenas um mês de ensaios.
de suprema
se encontrara- eles chegararrr a crtar um ambiente Em parte, isso se explica pelo fato de que as improüsações, além de
"* """', transformou em verdadeira comuni- indispensáveis no trabalho do ator, redundam numa real economia de tempo
amizade efelicidade";;'"";; ;;;it lágrimas e aplausos tanto nâ platéia'
cação emocior,tl tol"tiãt-tt""i""i'o" no trabalho do diretor, por várias razões entre as quais há as seguintes:
como no Palco.
novo'
r -:^-- ^a :-^^.
capaz-de.excitar imaginação - porque o diretor, durante as improvisações dos seus atores, freqüen-
E note: não se tratava de um tema temente consteta e corrige possíveis erros de sua prôpria concepção do texto
e sim de um espetáculo em üas de
meca-
dos atores pela sua dramatúrgico, elaborada previamente, - ele gasta menos temPo em seus
""'iatat'
nização. estudos teóricos;
esgotada pod'e se1 readqui-
Isso nos demonstrou que a esPontaneidade - porque, durante as improüsações, ele adquire idéias novas e tnais
Ariva". se-o resultado não for tão
rida através ao ,."uliã1.'ii-"1.Á'"ai"e através da espontaneidade
nítidas iobre as futuras "marcações", que às vezes podem ser fixadas desde
perfeito .o,,,o'q"ll'"l;;";'"";;íi,*;' logo;
autênticadoator,pelo'menoselesetánaisdutadouÍoernenossuieitoa
ser semPre renovado conscientemente
e - e, principalmente, porque o diretor obtém exemplos de "tempo-
&.soaste *",o'i'oçlõ', poi' pod"'e ritmo" criado espontaneamente que também pode ser selecionado e fixado
"
naJdependerá da inspiração do ator' da na hora.
para ver .. ."rrà .""is disro, basta lembrar-se das particularidades
e conÍirmadas cientiÍic amente'
Mas a improvisação é um "pau de duas pontas". Ela pode trazer um
" t rrri"l.ç ao;;, verifi cadas bem inestimável, como também pode causar grandes transtornos' se não for
método de Stanislavski' a "fé
' 1) A "Instalação", ou usando o termo do a aceitação de uma usada racionalmente.
nos oossibilita
cênica", é um estado psicofísico que nossos (ueia o fim do pd'
Na prática do uso dos "laboratórios" em nossos teatros houve muitos
'" foí"^
,,o'io
sitwção e de obietilos' olh"io' c"so, quàr,do os atores, estimulados pelo diretor que lhes dava a liberdade
meiro caPítulo).
ilr
tt2 EUGÊNIO KUSNET ATOR E METODO 113 lx
ilimitada parâ improvisar dentro de um tema relativamente vago' conse- suas qualidades e, além disso, teria ficado mais exposto ao risco de se ver um
g1ri"- r"tirfr.do. irrrpr"r.ionantes da üvência interior autêntica do perso- dia, mecanizado, Acredito que o apoio sôlido para o permanente frescor
adqui- daquele espetáculo foi o seu "tempo-ritmo" encontrado intuitivamente, mas
nagem, nas suas mals agudas manifestações',Aparentemente os atores 1I
riaL, através dirro, .rri material emocional de grande importância Pâra a 6xado conscientemente junto aos outros elementos selecionados durante os
do PaPel. ensaios.
interpretação
- Nesse processo de permanente seleção dos resultados da ação impro-
ii". qorrrdo, p"." fi*". os resultados obtidos - o que' eüdentemente
o diretor pedia para repetir o impro- visada é que reside o verdadeiro valor da "Análise Ativa".
o objetiro essencial dos trabalhos - Nas recordações de Maria Knebel no seu livro "A üda toda" encontra-
"ra
viso, os áto.es não conseguiam reproduzir a décima parte do resultado ante-
mos uma admirável conclusão que a autora tira de uma conversa que el4, no
.ior, Irro freqüentementJ crur"r" perplexidade -de p1te. Perte' chegava a
a
seu tempo de aluna da escola+stúdio do Teatro de Arte, teve com a profes-
p."a"ri. um, decepção total e até o "b"t'do'o do método de improüsação'
' sora E. S. Telechova.
Qo.l seria a causa do insucesso do ator ao rePetir "laboratório"?
o Po1
resultado igu'al ou, ao menos' semelhante ao da Prr- A professora lhe disse: "Improüsação sô pode se tornar forma suprema
que ele não conseguia
de arte teatral, se o ator conseguir enquadrar seu improüso sempre dentro
meira vez ?
repetição desaparecia o fator novidade, surPre^sa'
," das "circunstâncias propostas".
É qu.
Na primeira ve, o aga esPontâneamente sob o efeito da estimula- E depois, falando do ator genial, Mikhail Tchekov, com quem M.
"to,
e incitação da sua prôpria imaginação que em Knebel estava estudando anteriormente, a professora disse: "Foi bom ele ter
ção sugestiva do diretor da
contagiado você com o espírito de improüsação, mas o mal é que você não
nada foi limitada pelo diretor.
do. dire- aprendeu a fazer o essencial: conservar o que você adquire através da impro-
Mas n" ,.grr,d" vez' antes de repetir o "laboratório" a pedido
inconsciente' üsação e saber usálo à sua vontade".
tor, o ator, r", de se entregar novamente a uma excitação
"rri vou Depois da criação espontânea da ação cênica, deve-se usar novamente o
.rrcorrt.aua-.. diante de u.t pÃbl.tn' bem consciente: "Como é que
E' aliás' qual foi esse mais puro raciocínio sobre os resultados consegtridos, para selecioná-los,
."p"titZ O que é que vou f^,2, p^'^ fixar o resultado?
rejeitando os que estejam fora da lôgica das "circunstâncias propostas" e os
resultado ? "
E a resPosta não vinha, Porque o ator não conseguia restabelecer na que sejam de pouca eficiência ou importância,
memória as ações que lhe tinÊam causado as sensaçóes do prim-eiro
impro- No decorrer de muitos trabalhos feitos por mim junto aos alunos e
deixava de fazer o mais atores constatei que a consciência da necessidade de selecionar os elementos
üso; porque .l., d"poir do primeiro "laboratório"'
o resultado coueguido' constatar' sele.cionar da ação improüsada, nem sempre é suficiente para levar o trabalho a resul-
;#;;i;;; oirroi 1ao*rire
d*", os elementos de ação usados por ele intuitivamente durante a imPro- tados satisfatórios. Para usar esses elementos novos com o máximo proveito
",i."çao, o seu ,,monôlogo interior" ó suas "visualizações". Graças a inter- nas improvisações subseqüentes, é precko saber usá-los com a mestkt espon-
^, do
d"firrdên"i" da ação f?ri." . à ação mental' ele poderia. na .rePetição tattei dade da impr ouisação anterior.
"laboratôrio", usar conscientemente o que de "palpável" tivesse encon- De que maneira pode o ator conseguir que a colocação consciente de
tr"Jo, ,r" certeza de que a "ação interioi" com as suas emoções' voltaria fatores racionalizados não prejudique a sua espontaneidade na prôxima
âutomaticam"nt. drrr"int. a repetição, enriquecida ainda mais pelas novas improvisação?
'exemplo d" i,te.dependência desses dois Em primeiro lugar, procuremos compreender o que é que pode preju-
descobertas. Lembrem-se do
;;; da ação humana, ,ru-, t.n"ãt "O Caato da Cotoüa"' que citamos ücar a espontaneidade nesse caso? E exatamente a tendência de u.sar os
nouos elementos conscientetnente. Se o ator, durante a improvisação, se It
no segundo capítulo.
o "tempo-ritmo" da cena
Muitas vezes o ator cria intuitivamente todo lembrar de repente que ele deve incluir este ou aquele elemento, é claro que,
naquele momento, desaparece o próprio espírito de improvisaçâo, pois o
queimprovisâ'masseeleeodiretornãosederemcontadisso,apreciosa
descoberta ficará esquecida.
ator, em plena ação improvisadora, procurâ racionalizá-la, o que, evidente-
Lembrem-se do maravilhoso "tempo-ritmo" do "Diário de um
louco" mente, exclui a prôpria improvisação
Albuquerque e Rubens Correa' Por isso, o ator nunca deve perder de vista a necessidade de üstinguir,
de N. Gogol. Se os seus criadores, Ivan de
ptot,rtei demonstrar no capí- durante o trabalho pelo método de "Análise Ativa", as duas fases que se
não o tive"ssem Íixado fisicamente - como
"t, usam alternadamente:
tuloanterior,-talvezoprôprioespetáculoteriaperdidograndepartede
lri
ATOR E MÉ'TODO 115
tt4 EUGÊNIO KUSNET
l) Selecionar racionalmente os elemenros da ação improvisada. Esses Durante os comentários que, normalmente são feitos depois de cada
elementos devem tomar forma de "Monôlogo Interior" e de "Visualizações" "laboratório", o diretor, para justificar suas críticas às falhas de lógica,
do personagem, de cujo teor o ator pode tomar nota Por escrito. Portanto' cometidos pelos atores, ou pera tornar mais claras as indicações que thes dá iil
cena, usando'p"." irro os "Circulos de Atenção" e-a "Visualização das improvisado, pouco a pcuc .l é substituído pelo texto exato da peçâ. iliil
Falas,,, .o-"rràrrdo e avaliando ininterruptamente toda a ação improvisada Nas poucas experiênc.as em que a "Análise Ativa" foi usada correta-
pelos outros. Sô assim o ator pode fazer func.ionâr novamente a sua esPon- mente, os atores nunca precisaram decorar o texto, ele se fixava na memória
Lneid.de dentro das circunstâncias novas resultantes da seleção feita. ill1
imperce ptivelmente.
selecionados o Aos leitores que duvidarem disso gostaria de contar um dos casos que
Quanto ao perigo de perder de vista os novos elementos
iil
freqüentemente aconteciam nas minhas experiências com os nossos atores.
ator ;ão d"". pr"o.-rrp".-rã .o- isso, pois a prôpria na rrrezase encarregará
Ao trabalhar com um determinado grupo de atores, usamos como mate-
do processo di Í^r", i"s.urgi. em ação impróvisada, independentemente de ilrl
rial para os nossos estudos o texto de "Os Pequenos Burgueses". A improü-
*"'.rorrt"d., tudo o que foi gravado na sua mente através do raciocínio. Se o sação da cena de Helena com Têterev no 3,o ato foi repetida muitas vezes
ator realmente passou pelo ireino no sentido de desenuoluer a sua receptirti'
pelos mesmos intérpretes, As improvisações sempre foram comentadas antes
dade da oção ios outios, conforme comentamos no início deste capítulo,
de serem repetidas.
ele estará ,"-pr. pronto para receber esse auxÍüo de sua naturezacriaàora.
Numa certa altura, notamos que durante a improvisação muitas fa.las
possíveis pequenas falhas nesse processo, isto é, o desaparecimento de Âcaram idênticas às do texto de Gorki.
urn ou outro deialhe selecionado, não representa perigo dgo*, pois nos Como aconteceu isso, se a atriz fazia questâo de não memorizar o texto,
comentáÍios seriam constatadas e novamente sublinhadas' e sim sempre e unicamente improvisáJo? Não podia tê-lo memorizado invo-
Embora a seleção dos elementos da ação improüsada seja, normal- luntariamente? Foi exatamente o que aconteceu, porque durante os comen-
mente, feita pelo diretor e comunicada durante os comentários aos atores, tários nós citávamos vários detalhes do texto original para corrigir os erros
estes também^podem e devem fazer aseleção por contâ prôpria. Não impor- de lôgica cometidos durante a improüsação. Se, por exemplo, na cena
ta que . seja errada, durante os comentários surgirá uma discussão improvisada não sentíamos a feminilidade de Helena, âpontávamos à atriz
"r.ol'hu
.o- o diretor isio só poderá ser útil, pois o autor chegará à conclusão
e essa omissão e, para justificar a nossâ crítica, citávamos as falas como: "Eles
correta não por uma simpies indicação do diretor, mas através da sua própria adoravam os passarilhos, como adoratam a mim também ...", ou: "Eu me
iniciativa, o que certamente fixará o resultado na mente do ator mais natu- vesria, só para agraü-los, da maneira ma"is üstosa possível . , ." Essas cita-
ralmente. ções eram tão oportunas e interessavam tanto aatrtz, que se fixavam na sua
A aplicação dos elementos selecionados nas improvisações subseqüentes memória muito mais facilmente do que através da "decoraçâo".
quc deve saber encaminhar as É eüdente â enorme vantagem desse processo, A assimilação paulatina
-irit" irabilidade e prática do diretor
ltr
".ig"
implovisações sempre na àireção certa, estimular a imaginação dos atores do texto da peça elimina o maior mal do processo de decorar o papel: d
coà sugestões oPortunas, que Podem§er feitas em voz alta durante a ação aceitação obrigatoria de um texto em cuja ciação o ator nunca tornou
improri"sada. Ao'intercalar L r-ir"r réplicas, o diretor não deve ter medo
de prte.
,,dãstruir o estado emocional do ator-". Para maior eficiência desse trabalho, No processo de assimilação paulatina o ator aceita as correções do texto ll
o diretor pode, inclusive tomar Pârte na ação improvisada como um Perso- por ele improvisado, pouco a pouco, não por imposição, mas em sucesslvas
sua vez' discussões depois de cada improvisação, cedendo à lógica e à qualidade do
rlagpm imaginario auxiliar, não existente na Peça' Os atores, Por
lillr
li
EUGENIO KUSNET ATOR E MÉTODO Ll7
116
Se no início dos trabalhos, é aconselhável evitar detalhes das "circuns- Felizmente, o uso de um elemento novo levou-me casualmente â uma
tâncias propostas" para não deixar de ver a peça "du vol d'oiseau", é preciso série de experiências bastante detalhadas e deixou-me um material consi-
não esquecer g,,te a colocação paulatína desses detalhes é ineütável e neces- derável que me parece útil para resolver o problema de improvisações sobre
sária. Os atores devem pouco a pouco, começar a tomar conhecimento tanto os temas das ações "extra-cênicas".
dos diá,logos, como das ações físicas exatas. É este método que eu pretendo exPor no próximo capítulo.
O bom ou o mau termo desse processo de conhecimentos e assimilações
paulatinos dos elementos obrigatórios da peça (texto, movirtentos, am-
biente, costumes, etc.) depende inteiramente da sensibilidade do diretor:
apressando demais esse processo, ele prejudica a improúsação, porque ao
introduzir antes do tempo muitos detalhes obrigatórios, tolhe com isso a
liberdade da ação do ator; mas, atrasando-o, perde tempo, vicia seus âtores
em improvisações gratuitas e improdutivas e reduz o seu interesse pelo
trabalho.
Esse ultimo fator, - o permanente interesse dos atores pelo processo do
trabalho, - taTvez possa servir de critério pera o diretor. Notando alguns
sinais de tédio, - a falta de atenção espontânea e de curiosidade, - o diretor
talvez deva acelerar a colocação dos detalhes.
É p.eciso levar em consideração a natural impaciência dos atores no
sentido de querer experimentar, quanto antes, os resultados obtidos nas
improvisações diretamente sobre o texto da peça,
É preciso explicar aos atores que, se a tentação os levar a experimentar
isso em c:xa, eles porão em risco o bom andamento do seu trabalho nos
ensaios, porque, fazendo a experiência sem controle alheio, eles certamente
prestarão atenção quase exclusiuamente ao resultado emocional do trabalho
(é tão conhecido esse uício do ator!) e poderão chegar à uer&tdeira adoração
dos seus prôpríos senümentos. Com isso, é evidente, eles porão em perigo
toda a necessíxíal6gca e acabarão tomando por base de trabalho elementos
completamente errados.
Até aqui, em traços gerais, procuramos expor a iàéia de como deve ser
processada a "Análise Ativa" de uma peça.
É eüdente que seria um absurdo estabelecer com precisão a ordem
cronolôgica em que devem ser usadas as etapas do trabalho. O bom senio e a
prática devem sugerir ao diretor as alterações dessa ordem, de acordo com as
particularidades do seu eventual trabalho: o nível e a experiência do elenco,
a natureza da peça, o prazo designado para os ensaios, etc.
Resta-nos acrescentar que, quando falamos do uso dos "laboratórios"
no processo de analisar as "circunstâncias propostas", é evidente que nâo
nos referimos apenas aos "laboratórios" sobre as ações constantes do texto
da peça. E de cnorme importância submeter ao mesmo processo as açôes
"extra-cênicas", a começar pela biografia dos personagens e ao terminar pela
"ação anterior" de cada cena.