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CASA RURAL ITALIANA E DA REGIÃO DE

IMIGRAÇÃO NO SUL DO BRASIL

Bárbara Ribeiro da Costa1


Natália Biscaglia Pereira1
Ângela do Valle2

1
Universidade Federal de Santa Catarina
2
Engenharia Civil / Universidade Federal de Santa Catarina / UFSC
CASA RURAL ITALIANA E DA REGIÃO DE IMIGRAÇÃO NO SUL DO BRASIL:
Comparação entre as construções no norte da Itália e no Rio Grande do Sul
Resumo: No fim do século XIX e início do século XX, a arquitetura rural italiana ganhou
destaque tanto nas colônias do Rio Grande do Sul quanto nos vilarejos do norte italiano. No
entanto, as residências construídas pelos imigrantes italianos no sul brasileiro não
reproduziram de forma idêntica características tais como os elementos construtivos, técnicas
e organização das residências do norte italiano. Neste trabalho serão analisadas as
similaridades e disparidades entre as casas rurais nas colinas italianas, local de origem de
alguns dos imigrantes que atuaram como mão de obra na colonização da região Sul do
Brasil, e as residências rurais edificadas nas colônias de imigrantes italianos no Rio Grande
do Sul. Como método, utilizou-se a análise comparativa, com suporte em revisão
bibliográfica. Acredita-se que este trabalho contribua para a compreensão das adaptações,
utilizadas nas construções dos imigrantes, ao contexto do Rio Grande do Sul.
Palavras-chave: arquitetura italiana, imigração italiana, colonização, Rio Grande do Sul.

RURAL HOUSE OF ITALY AND OF THE IMMIGRATION REGION IN SOUTH OF BRAZIL:


Comparison between the constructions in northern Italy and in Rio Grande do Sul
Abstract: In the late nineteenth and early twentieth centuries, Italian rural architecture
gained prominence both in the colonies of Rio Grande do Sul and in the villages of northern
Italy. However, the residences built by Italian immigrants in the south of Brazil did not
reproduce similar characteristics, such as the constructive elements, techniques and
organization of the residences of northern Italy. In this paper, we will analyze the similarities
and disparities between the rural residences in the Italian hills, from where some of the
immigrants who worked as colonizing labor in the southern region of Brazil came, and the
rural residences built in the colonies by Italian immigrants in the Rio Grande do Sul. As a
method, we used a comparative analysis with support in a bibliographic review. It is believed
that this work contributes to an understanding of the adaptations in the constructions of the
immigrants to the context of Rio Grande do Sul.
Keywords: Italian architecture, Italian immigration, colonization, Rio Grande do Sul.

1. INTRODUÇÃO
No fim do século XIX, a Europa passava por crise decorrente de aumento não
planejado de população, altos índices de desemprego e incidência de pestes. Estes fatores
influenciaram a emigração de milhares de italianos para diversos países, como o Brasil. Na
mesma época, o Brasil passava pela fase de colonização de seu extenso território,
enfrentando necessidade de mão de obra para tal finalidade. Esta carência de mão de obra
foi ainda mais acentuada com a abolição da escravidão no Brasil em 1888. Cerca de 1,5
milhão de italianos migraram para o Brasil entre 1874 e 1914, dos quais 70% ficaram em
São Paulo, e os outros 30% migraram para os estados do Espírito Santo, do Rio Grande do
Sul, de Santa Catarina e do Paraná. A principal atração dos imigrantes para as terras
brasileiras foi a concessão de terras aos trabalhadores mais dedicados e a rápida
emancipação das colônias. Estas terras não despertavam o interesse dos luso-brasileiros,
pois geralmente estavam em localidades distantes e acidentadas. Destaca-se que estas
características assemelhavam-se às das terras da região norte da Itália, nas colinas. Com o
passar do tempo, após a chegada dos primeiros grupos de imigrantes ao Brasil, as regiões
colonizadas pela imigração começaram a crescer e se tornaram fortes comunidades com
economia ascendente, o que acelerou o processo de desenvolvimento do Brasil
(POSENATO, 2005).
Segundo Posenato (2005), a maioria das colônias agrícolas e das pequenas
propriedades no território brasileiro estava localizada no estado do Rio Grande de Sul.
Estima-se que estas povoações eram habitadas por cerca de 80 mil imigrantes. É natural
que estes imigrantes imprimissem suas marcas na arquitetura local a partir da sua cultura e
das técnicas construtivas praticadas em seus locais de origem. Neste trabalho será
analisada a relação entre a arquitetura das colônias povoadas pelos imigrantes de origem
italiana e a arquitetura das casas rurais do norte da Itália.
Para o desenvolvimento do trabalho, fez-se uso de uma análise comparativa com
base em uma revisão bibliográfica, com autores que abordam o tema da imigração e da
casa rural no norte da Itália. Os dados de comparação se deram, principalmente, acerca do
ambiente de inserção da construção, do material disponível no local e do seu uso na
construção, da localização da construção no lote, da distribuição espacial interna das casas
e dos aspectos construtivos.

2. ARQUITETURA DA CASA RURAL


Apresentam-se, neste item, as principais características de construção da casa rural
no norte da Itália e da casa rural dos imigrantes italianos no Rio Grande do Sul, como
suporte para a posterior comparação das construções.
2.1. A casa rural no norte da Itália
Segundo Palloni (2000), a arquitetura das edificações do norte italiano mantinha
uma estreita relação com o ambiente em que estavam inseridas. O terreno influenciava, não
só na dimensão e nível da edificação (a maioria acompanhava o desnível do terreno), bem
como o principal material com que esta seria construída. Sendo assim, a residências
poderiam ser de pedras de mão, geralmente pedras calcárias do tipo rosa, de tijolos, de
barro ou de madeira. O fato de se ter que utilizar o material disponível no local da edificação
dos novos lares dos colonos acarretou, na época, o surgimento de diversas técnicas e
soluções inovadoras de construção.
As residências eram enfileiradas lado a lado e algumas destas casas eram
dispostas longitudinalmente, com dois ou mais pavimentos. Esta disposição permitia o
compartilhamento de utensílios comuns, como o poço de água, o forno e o curral/estábulo.
Os colonos geralmente viviam em vilarejos e uma grande marca destes locais no século XIX
era a forte utilização da mão de obra braçal, sendo que a própria família executava todas as
atividades domésticas e/ou construtivas (PALLONI, 2000).
As casas, em sua maioria, de dois pavimentos, eram formadas pelas varandas e
pelo estábulo, que em geral ficavam no primeiro andar. Geralmente havia uma escada
dentro dos estábulos que dava acesso à ala principal, no segundo andar, composta pela
sala, dormitório, banheiro e cozinha (Figura 1). As escadas que davam acesso aos
pavimentos da casa eram quase sempre em madeira, material este que também compunha
os pisos dos cômodos (PALLONI, 2000; POSENATO, 1983).
Figura 1. Residência característica do norte da Itália no século XIX.
Fonte: adaptado de PALLONI, 2000.
Palloni (2000) afirma que as primeiras residências construídas pelos colonos
italianos eram feitas em grande parte de barro, similar ao adobe como conhecemos
ultimamente, ou de madeira de baixa qualidade. Geralmente, estas casas eram pequenas e
insalubres, pois as técnicas construtivas, ainda muito primitivas, não favoreciam o
isolamento térmico destes locais. As paredes externas em geral eram constituídas de uma
mistura de terra e pedras miúdas e sua espessura não excedia 50 centímetros. As portas e
janelas eram em madeira, característica que se tornou cada vez mais comum nas casas
rurais com o passar do tempo. A fundação era feita, em geral, de pedras ou tijolos
enfileirados, sendo este primeiro o mais comum. Posteriormente, as pedras calcárias e os
tijolos foram os materiais mais utilizados pelos italianos do norte do país para edificar suas
casas, fato justificado pela abundância destes, na região e no entorno, e pela sua
durabilidade e resistência mecânica. Por mais que apresentassem uma resistência menor
que as pedras, os tijolos cerâmicos foram mais utilizados, pois o solo em que as casas
seriam inseridas era geralmente argiloso, favorecendo a produção deste material. Com o
passar do tempo, foram-se utilizando ligantes mais resistentes nas paredes das casas mais
recentes. Era comum se utilizar tijolos nas paredes externas, sem reboco ou pintura. Esta
característica, juntamente com a utilização de aberturas em arcos nas portas e janelas
externas, caracterizava a elegante e decorada fachada das casas rurais (Figura 2). Estas
residências, quando de dois ou mais pavimentos, possuíam as escadas internas em
madeira e as escadas externas de acesso à casa em pedra ou tijolos. A sua cobertura
também era, geralmente, com telhas de barro e, posteriormente, em telhas cerâmicas. A
inclinação do telhado variava de acordo com a altura da casa e seus limites (PALLONI,
2000).

Figura 2. Residência de dois pavimentos em cantaria com porta em forma de arco.


Fonte: PALLONI, 2000.

Assim, conclui-se que as casas rurais dos italianos no Norte da Itália, em uma
primeira fase construtiva, fez uso de barro ou madeira e de fundações em pedra ou tijolos, e,
em uma segunda fase construtiva, utilizavam, geralmente, as pedras calcárias e os tijolos
como material de construção. A abundância de solo argiloso e pedras à disposição na
região norte da Itália fez com que a madeira não fosse uma opção comum de material
construtivo, por ser rara. Segundo WEIMER (2012 p.172), a utilização da madeira deveria
ser muito parcimoniosa, por isso as paredes eram de cantaria e só os entrepisos e as
estruturas de telhados eram confeccionados em madeira.
2.2. A casa rural dos imigrantes italianos no Rio Grande do Sul
A emigração dos povos italianos para o Brasil, em meados do século XIX, teve
como principal motivo o caos social de pestes, desempregos e crises que perduravam à
época na Europa. Entre 1875 e 1914, cerca de 100 mil italianos migraram para o Rio
Grande do Sul, no qual 90% destes provinham do norte da Itália (POSENATO, 1983). A
concessão de terras aos trabalhadores e a rápida emancipação das colônias permitiu que os
imigrantes italianos logo construíssem comunidades com uma economia e arquitetura
notáveis no estado.
A arquitetura da imigração italiana no Rio Grande do Sul, segundo Júlio Posenato
(1983), era espontânea e possuía características peculiares, tais como: a utilização da mão
de obra livre e a linguagem arquitetônica própria. Estes povos se destacaram também por
criarem uma diversidade de soluções e técnicas construtivas em meio às limitações
industriais e materiais disponíveis no lote e no entorno, fato que resultou em edificações que
se transformaram em verdadeiras obras de arte. O autor chega a afirmar que esta consistia
numa arquitetura popular considerada como a melhor já erigida no Brasil.
No início do século XX, a madeira, especialmente de árvores do gênero Pinus, era
abundante em algumas regiões do Rio Grande do Sul, como no Alto Uruguai. Este material
foi largamente utilizado nas edificações, seja na parte ornamental, como portas e janelas, ou
mesmo como peças estruturais de grandes dimensões, tais como pilares, vigas e barrotes.
Foi a partir do desenvolvimento industrial, com o surgimento de serrarias, que a utilização da
madeira se tornou algo mais comum entre as diversas comunidades de imigrantes italianos.
A produção, em larga escala, de peças em madeira serrada tornou popular a utilização do
encaixe macho-e-fêmea em forros e pisos e o uso das mata-juntas em paredes, como pode
ser visto na Figura 3 (POSENATO,1983).

Figura 3. Casa em madeira


Fonte: POSENATO, 1983.
Posenato (1983) afirma que, na arquitetura rural da imigração italiana no Brasil, o
conjunto das edificações é geralmente composto pela casa (volume principal), cozinha,
instalações domésticas e edificações complementares. A casa poderia ser dividida em três
setores: porão ou alpendre, ala residencial e sótão. A ala residencial, formada pelos quartos
e sala, o sótão e o alpendre, era executada em sua maioria por madeira, diferentemente do
porão, que era construído com pedras de mão (quando este material era abundante no
local), pois servia também como alicerce da casa. A cozinha geralmente ficava separada do
volume principal da casa, estando anexa ou ligada ao volume principal por meio de um
corredor coberto. As paredes, portas, pisos e janelas da cozinha também eram feitas em
madeira. As edificações complementares, compostas pelos galinheiros, estábulos, depósitos
e chiqueiros, eram construídas em madeira de classificação baixa, inferior às madeiras dos
outros elementos do conjunto. As instalações domésticas eram os poços, cisternas, fornos,
dentre outros, e seu material variava de acordo com abundância de matéria-prima no lote.
Segundo Posenato (1983), os principais elementos construtivos constituídos por
madeira, e comumente utilizados nas residências dos imigrantes italianos, eram as portas,
marcos, janelas, bandeiras e paredes, internas. As portas poderiam ser de uma ou duas
folhas e ser ornamentadas ou não. Geralmente, as portas externas eram mais
ornamentadas que as internas, recebendo diversos tipos de decoração, seja com almofadas
em madeira nos vãos ou mesmo formadas pela junção de fasquias (lascas de madeira). Os
marcos das portas e janelas quase sempre eram em madeira e possuíam uma série de
espessuras e larguras. As janelas da casa, em sua maioria, eram em madeira. As mais
modernas possuíam componentes em vidro e dimensões maiores que as janelas do sótão.
As janelas do porão eram, em geral, de pedra, porém algumas delas possuíam grades de
madeira.
Elementos de pisos das edificações dos imigrantes italianos, assim como as
paredes, as escadas internas e os forros, eram geralmente em madeira. A cobertura das
casas dos imigrantes era feita inicialmente em tabuinhas de madeira com espessura de
cerca de 2 centímetros (Figura 4). No entanto, com o passar do tempo este tipo de cobertura
foi substituída por telhas de barro (POSENATO,1983).

Figura 4. Casa em madeira com cobertura de duas água em madeira.


Fonte: POSENATO, 1983.

Então, é possível afirmar que as casas rurais dos imigrantes italianos no Rio Grande
do Sul são constituídas, geralmente, de madeira, desde as paredes, partes estruturais e até
as aberturas. Isso é resultado da ampla disponibilidade do material na região, que dispunha
de uma rica floresta, na qual a madeira da araucária era a matéria prima insuperável para
exploração.
Weimer (2012) afirma que rapidamente as construções de pedra, que foram as
primeiras construídas pelos imigrantes na Serra Gaúcha, foram reservadas para as
fundações sobre as quais passaram a erguer construções de madeira. No caso da
existência da cantina, as fundações correspondiam às paredes.

3. COMPARATIVO ENTRE A CASA RURAL DO NORTE DA ITÁLIA E A CASA DOS


IMIGRANTES ITALIANOS NO RIO GRANDE DO SUL
Identificaram-se vários aspectos semelhantes entre estre as casas erigidas nas
colinas italianas e as casas dos imigrantes nas terras gaúchas, tais como: a existência de
utilização exclusiva da mão de obra artesanal para a construção de casas; a integração com
o meio em que se localizavam de forma a inserir-se harmonicamente na paisagem; e a
construção de casas funcionais e práticas. Todavia, havia também diferenças entre as casas
rurais das duas regiões em estudo.
Na Tabela 1, sintetizam-se as principais diferenças e similaridades nos principais
componentes das duas edificações, evidenciando o uso da madeira em alguns
componentes da edificação e comparando aspectos construtivos.
Tabela 1. Comparação da casa rural italiana e da casa rural dos imigrantes italianos no Rio
Grande do Sul: especificação de materiais dos componentes da edificação e de aspectos
construtivos.
ITEM CONSTRUÇÃO RURAL CONSTRUÇÃO RURAL DE
NO NORTE DA ITALIA IMIGRANTES ITALIANOS NO RS
ESTRUTURA PRINCIPAL: BARRO E MADEIRA PEDRA BASALTO
MATERIAIS USADOS NA 1ª
FASE CONSTRUTIVA
ESTRUTURA PRINCIPAL: PEDRA CALCÁRIA E MADEIRA
MATERIAIS USADOS NA 2 ª TIJOLOS ALVENARIA DE TIJOLOS OU
FASE CONSTRUTIVA PEDRA APENAS PARA PORÕES E
CANTINAS
ABERTURAS: EM MADEIRA COM EM MADEIRA COM VERGA RETA
MATERIAIS E VERGAS VERGA EM ARCO PLENO
TÉCNICA CONSTRUTIVA CANTARIA CARPINTARIA- TÁBUAS COM
DAS PAREDES MATA-JUNTAS
ESTRUTURAS DE MADEIRA MADEIRA
COBERTURA
ESTRUTURAS DE PISO E MADEIRA MADEIRA COM ENCAIXE MACHO
ENTREPISO E FÊMEA
ESCADAS INTERNAS MADEIRA MADEIRA
FUNDAÇÕES E SUBSOLO TIJOLOS E PEDRAS TIJOLOS E PEDRAS
IMPLANTAÇÃO NO LOTE AGLUTINADA ESPARSA
DISTRIBUIÇÃO INTERIOR 2 PAVIMENTOS 3 PAVIMENTOS (PORÃO, TÉRREO
DA CASA COM COZINHA E SÓTÃO)
INCORPORADA AO COM COZINHA SEPARADA DO
CORPO PRINCIPAL CORPO PRINCIPAL

A organização da casa rural edificada pelos imigrantes italianos no Brasil diferencia-


se em alguns aspectos das casas instaladas no norte da Itália. Posenato (1983) afirma que
as instalações residenciais rurais europeias eram geralmente aglutinadas em uma só
edificação. Já no Brasil, as instalações eram separadas, cada uma cumprindo sua função
em seu respectivo local. Tal adaptação pode ser justificada pelas diferenças climáticas nas
duas regiões e pela maior disponibilidade de terras na colônia. Na Itália, as casas eram mais
compactas pelo fato dos lotes serem pequenos. Os celeiros e os estábulos nestas
edificações eram incorporados ao corpo principal da casa, pois, com os invernos rigorosos o
calor irradiado pelos animais ajudava a aquecer a casa. No Rio Grande do Sul, a
temperatura, mesmo no inverno, era mais elevada que na região de origem, o que
dispensava a ligação dos dormitórios e da sala com os animais.
A casa dos imigrantes italianos nas terras gaúchas também divergia das casas
rurais do norte da Itália por possuir a cozinha anexa ao volume principal. Os imigrantes
alegavam que este cômodo ligado à casa aumentaria o risco de incêndio, tornando
vulneráveis os ambientes de uso comum. Ao isolá-la, inúmeros benefícios seriam
agregados, inclusive a diminuição do barulho nos dormitórios e na sala.
Outra diferença encontrada nas edificações era a disposição nos lotes. Na Itália,
era comum existir o agrupamento em aldeias rurais, onde diferentes funções eram
desempenhadas em um mesmo local, de modo a aproveitar ao máximo o espaço e as terras
boas. Já no Rio Grande do Sul, onde os terrenos eram maiores, as casas geralmente
ficavam separadas e havia várias edificações espalhadas nos lotes dos colonos, cada uma
cumprindo sua função.
Dependendo da localidade, as casas dos imigrantes italianos no Rio Grande do Sul,
poderiam ser em pedra (como as casas de alvenaria em basalto construídas na região da
Serra Gaúcha), em madeira (como casas encontradas na região do Alto Uruguai) ou mesmo
mistas. Diferentemente do que ocorria na Itália, onde terrenos com o solo argiloso ou
carsticos propiciou a construir com tijolos ou pedras calcárias, respectivamente, sendo este
primeiro mais comum.
Weimer (2012) aponta que a tradicional estrutura em arco pleno das construções
em pedra acabou por ser levada à arquitetura em madeira, e que foi preciso algum tempo
para que os construtores descobrissem que as linhas curvas não eram coerentes com as
peças retas da madeira. O uso da madeira, que se tornou a matéria-prima mais utilizada dos
imigrantes italianos no Rio Grande do Sul não implicou o abandono da alvenaria de pedra,
continuamente utilizada nos porões e cantinas.
Fato importante a se destacar é a singularidade da arquitetura da imigração italiana
no Brasil, país de grande miscigenação e cultura diversa. Esta arquitetura sofreu
considerável influência de outras culturas e do estado em que estava inserida. Este fato é
notado na improvisação e no surgimento de diversas soluções e técnicas ao se trabalhar
com os materiais disponíveis nos lotes, principalmente a madeira, mesmo com o baixo nível
de industrialização do país à época.
No entanto, sob o aspecto de funcionalidade, havia similaridade entre as casas
rurais destes dois países distintos. Assim como as casas rurais dos imigrantes no Rio
Grande do Sul, as do norte da Itália eram, sobretudo, funcionais, independente do material
com o qual eram construídas.
Outra característica comum nas duas arquiteturas era a escolha do local onde seria
construída a casa. Esta era uma das primeiras e mais importantes decisões a serem
tomadas. A escolha era, principalmente, baseada na existência de água boa para consumo
no lote ou próxima a ele. Outro fator importante, tanto para os italianos residentes na Itália
quanto para os no Rio Grande do Sul, era ser determinante, para a construção de um lar,
que a moradia deveria ficar a uma distância relativamente próxima da estrada, facilitando a
locomoção de pessoas. .
Segundo Posenato (1983), outra característica de origem italiana, que ficou
inalterada nas construções dos imigrantes italianos, foi a divisão dos territórios em léguas, e
estes em linhas, ou travessões, paralelas as estradas que margeavam os lotes coloniais.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Pode-se afirmar que as casas rurais dos imigrantes italianos eram semelhantes, em
grande parte, às casas rústicas do norte das colinas da Itália, com uso de mesmos tipos de
elementos construtivos e do material disponível no lote, além de evidente valorização do lar.
Porém, houve desvinculação do padrão de origem nas seguintes características: as casas
eram construídas de forma esparsa no lote e a cozinha não fazia parte do corpo principal da
casa.
Quanto aos materiais, verificou-se que enquanto nas casas rurais do norte da Itália
se tinha majoritariamente o emprego da alvenaria em pedra calcária ou tijolos, os quais
tinham acesso facilitado no terreno, no Rio Grande do sul os imigrantes italianos
diversificaram o uso dos materiais conforme a implantação das colônias. Em colônias
antigas, utilizou-se inicialmente a alvenaria de basalto, e após, utilizou-se amplamente a
madeira como material de construção, reservando a alvenaria para os porões e cantinas.
Desta forma, nota-se que os imigrantes italianos e seus descendentes,
estabelecidos no Rio Grande do Sul, não reprisaram simplesmente as tecnologias
construtivas do seu país de origem, mas adaptaram às condições locais, e com criatividade
se tornaram os italianos do Rio Grande do Sul. Os ítalo-gaúchos estruturaram uma vida com
uma linguagem própria, influenciada pela cultura e fortes tradições italianas, porém aberta a
influência de outras culturas disseminadas no Brasil.
Este pesquisa, que ainda se encontra em andamento, apresentou a análise
comparativa entre os métodos e elementos construtivos das casas rurais do norte da Itália e
das casas dos imigrantes italianos no Rio Grande do Sul, construídas no final do século XIX
e início do século XX. Pretende-se dar continuidade aos estudos, esperando-se obter no
futuro informações mais aprofundadas.

5. AGRADECIMENTOS
Os autores agradecem ao CNPq pela concessão de bolsa PIBIC - UFSC, ao Grupo
Interdisciplinar de Estudos da Madeira (GIEM) e ao apoio institucional do Programa de Pós
Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina
(PósARQ).

6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
PALLONI, Renata. La casa rural en Las Marcas (Italia). In: TERCER CONGRESO
NACIONAL DE HISTORIA DE LA CONSTRUCCIÓN, 3., 2000, Sevilla. Actas del Tercer
Congreso Nacional de Historia de la Construcción. Sevilla: CEHOPU, 2000. p. 779 - 788.
Disponível em: <http://www.sedhc.es/biblioteca/actas/CNHC3_091.pdf>. Acesso em: 01
jun. 2017.
POSENATO, Júlio. Arquitetura da Imigração italiana no Rio Grande do Sul, Est- Educs,
1983.
POSENATO, Júlio. A arquitetura do Norte da Itália e das colônias italianas de pequena
propriedade no Brasil, In: Turbulência cultural em cenários de transição: o século XIX Ibero-
americano p. 51 a 88. Marcondes, N; Bellotto, M. (org.) Edusp, 2005.
WEIMER, Günter. Arquitetura popular brasileira. Martins fontes, São Paulo, 2012.

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