Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
História da Arquitetura
no Brasil
Para falar da história da arquitetura no Brasil, enfrenta-se uma situação específica: o fato de
que as arquiteturas e os espaços urbanos que aconteceram na trajetória da formação e
consolidação desta nação não formam um percurso linear no tempo.
Nessa rica trajetória, as abordagens históricas mais conhecidas repetem narrativas que
geralmente privilegiam apenas as grandes obras, ou a ideia de estilos que vão se sucedendo
ao longo do tempo, ou ainda uma associação entre a história da arquitetura e a história dos
regimes políticos. Apesar de válidas e de explicarem uma parte consistente da história da
arquitetura no Brasil, essas narrativas não abordam uma das principais características da
nossa arquitetura: as permanências e retornos de arquiteturas de tempos e lugares variados.
Por isso, o que veremos aqui é uma trajetória cronológica das
arquiteturas que aqui surgiram ou foram aplicadas, suas
transformações e também, quando for o caso, sua
popularização, desaparecimento, ressurgimento
e permanência.
Considerações sobre a historiografia da arquitetura no Brasil
Uma das principais características da história da arquitetura no Brasil é que não há uma
progressão linear de arquiteturas, que vão se sucedendo, com uma substituindo totalmente a
outra ao longo do tempo.
O que há, de fato, é uma contínua sucessão de arquiteturas, técnicas construtivas e relações
entre edificações e espaço urbano, e, nesse processo de constante renovação, algumas
formas de construir permanecem, outras desaparecem, e algumas ressurgem.
Um exemplo é o ressurgimento da taipa de pilão como uma forma contemporânea de
construir, com o objetivo de fazer uma arquitetura ambientalmente mais amigável.
Outro exemplo é a persistência de aspectos culturais que
interferem no projeto do espaço arquitetônico, como os projetos
de residências unifamiliares com cozinhas organizadas como
ambiente de estar, e não apenas de armazenagem, produção
e consumição de alimentos. São retornos e persistências como
as citadas, entre inúmeras outras, que dão cor e vida à
nossa arquitetura.
Persistências e retornos
Ao contrário dos nossos países vizinhos nas Américas, não havia uma arquitetura de
permanência realizada pelos povos indígenas, como são chamados atualmente, que
ocupavam essa parte do território da América do Sul.
Enquanto os Incas, Maias e Astecas faziam construções em pedra e cidades encravadas nas
montanhas, na maior parte do território que chamamos hoje de Brasil, as construções eram
temporárias, feitas com madeira, cipó, galhos, terra e folhas.
Isso acontecia porque as tribos que existiam aqui antes dos europeus chegarem eram
essencialmente nômades.
Ou seja, não fazia parte do seu modo de vida construir
arquiteturas permanentes. As suas residências ou eram
temporárias (duravam pouco tempo após sua construção) ou
até duravam vários meses, mas não eram usadas
permanentemente. Uma das principais características dessas
habitações é que não tinham divisões internas, e o espaço
interno era compartilhado por mais de uma família.
A arquitetura no Brasil antes da ocupação europeia
Aldeia Ipatse (Parque Indígena do Xingu) – a principal comunidade dos Kuikuro. Imagem feita
em 2007. Região Centro-oeste.
Disponível em:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/3/3e/Parque_Ind%C3%ADgena_do_Xin
gu.jpg/1200px-Parque_Ind%C3%ADgena_do_Xingu.jpg?20070806005442. Acesso em: 22 abr.
2022.
As primeiras construções realizadas nos três primeiros séculos após a chegada dos
portugueses e outros povos europeus foram o resultado de uma profunda mistura de
arquiteturas. Nessa época, era possível identificar algumas características comuns
nessas edificações.
O telhado tinha um desenho adequado a locais com fortes e intensas chuvas, com beirais
largos para proteger as paredes da água. Essa técnica os portugueses trouxeram das suas
colônias na Ásia. As paredes eram estruturais, construídas com taipa (dependendo da
região, as técnicas da taipa variavam) ou folhas de palmeiras, como o babaçu.
A cozinha ficava fora da casa, técnica aprendida com os nativos, para deixar o calor do lado
de fora.
A distribuição interna dos espaços tinha uma influência árabe,
com uma divisão em duas partes: a de fora, com alpendres e
cômodos de acesso externo (para receber os estranhos); e os
cômodos internos, onde ficavam as mulheres e crianças,
protegidas dos olhares de fora.
A arquitetura rural entre 1500 e 1800
Casa do Bandeirante, também conhecida como casa
bandeirista, São Paulo (SP). Nesta foto, está visível um dos
dois alpendres. O outro fica do lado oposto da construção.
Disponível em:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/b/b4
/Casa_do_Bandeirante_02.JPG/640px-
Casa_do_Bandeirante_02.JPG. Acesso em: 24 abr. 2022.
A arquitetura rural entre 1500 e 1800
Casa do sítio do Padre Inácio (século XVIII). Cotia (SP).
Disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Casa_do_S%C3%A
Dtio_do_Padre_In%C3%A1cio_01.jpg. Acesso em: 24 abr.
2022.
A arquitetura rural entre 1500 e 1800
Nas cidades, algumas edificações não seguiam a inserção típica dentro do lote descrita
anteriormente. É o caso de igrejas, edifícios administrativos e as casas de alguns
comerciantes e donos de terras mais ricos. Isso pode ser visto na antiga Casa de Câmara e
Cadeia da cidade de Mariana, Minas Gerais. Observe a inserção mais solta em relação ao
lote, o telhado de influência asiática e a organização da fachada, com o ritmo típico das
janelas e da escada, que seguia as normas portuguesas.
No início da ocupação portuguesa, os templos das diversas ordens religiosas ficam no litoral
e são muito simples, limitadas pela escassez de materiais e de mão de obra qualificada.
As principais ordens religiosas que se implantam na colônia são os Jesuítas, Franciscanos,
Carmelitas e Beneditinos. Cada uma possui uma maneira de construir e um conjunto de
programas arquitetônicos adequados à sua doutrina. No litoral são construídos os
monastérios e claustros e, com o desenvolvimento econômico da cana-de-açúcar no
Nordeste, as igrejas, abadias e demais construções religiosas ficam mais sofisticadas
e requintadas.
Na segunda metade do século XVIII, o Barroco se impõe.
Nesse momento, os arquitetos e construtores portugueses e
brasileiros produzem uma arquitetura com plantas ousadas de
igrejas e capelas de formas ovaladas e exteriores cada vez
mais sofisticados. Essas são as principais construções no
interior do território porque, principalmente nas Minas Gerais,
era proibida pela Coroa portuguesa a construção de
monastérios e claustros religiosos nessas regiões.
A arquitetura religiosa urbana entre 1500 e 1800
Durante o século XIX, ocorre a introdução de novas formas de construir, novas tipologias e
sistemas construtivos inimagináveis nos séculos anteriores. Essas mudanças, que começam
a se popularizar em quase todo o país, não ocorreram de maneira uniforme ou como um
movimento organizado. O que ocorreu naquele século pode ser explicado como uma
progressiva substituição do que na época se considerava velho e arcaico (que era a
arquitetura produzida durante quase 3 séculos desde a chegada dos portugueses) por uma
sequência de novas arquiteturas.
Giuseppe Antonio Landi (Bolonha, Itália 1713 – Belém, PA 1791) foi desenhador, gravador,
geógrafo e astrônomo, ele veio para estas terras por conta de sua capacidade de elaborar
mapas e levantamentos cartográficos. Ele vem para o Brasil integrando uma equipe que
seria a responsável por demarcar os limites das colônias portuguesa e espanhola na América
do Sul. Conhecido por aqui e em Portugal como Antônio José Landi, seu trabalho como
arquiteto foi uma das inúmeras atividades que ele realizou em Belém, no Pará, e não era seu
objetivo principal ao viajar a serviço da coroa portuguesa.
Antônio Landi realizou vários projetos arquitetônicos e obras em Belém. As mais famosas
são: o Palácio do Governo (1759/1772), a Capela de São João Batista (1769/1772), que fica
nos fundos do palácio, e a Igreja de Sant’Ana (1762/1782).
A arquitetura da Igreja de Sant’Ana encontra-se entre o barroco
italiano tardio com algumas características do neoclássico, o
que de fato foi uma mudança considerável, ainda mais
considerando-se que a arquitetura neoclássica só começa a ser
praticada no país com mais intensidade após a vinda da
Missão Francesa, em 1816.
Novas arquiteturas no Brasil: o século XIX
Igreja de Sant’Ana, Belém, PA. Projeto de Antônio
Landi, teve uma construção demorada por falta de
recursos.
Disponível em:
https://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/thumb/
9/9b/Igreja_de_Santana_DSC_3454-
_%286766140695%29.jpg/1200px-
Igreja_de_Santana_DSC_3454-
_%286766140695%29.jpg?20180809214317. Acesso
em: 22 abr. 2022.
A Missão Artística Francesa de 1816
A transferência da Família Real Portuguesa e de grande parte de sua corte da Europa para o
Brasil, em 1808, afetou muito a arquitetura e o urbanismo. Primeiro, a inserção de regras
construtivas novas na cidade do Rio de Janeiro que, por vir a se tornar a capital do império
português, deveria, na visão da aristocracia portuguesa, europeizar-se. Isso significava
abandonar certos hábitos construtivos, como os muxarabis, gelosias e o aspecto geral de
construções antigas. Aos poucos, o vidro plano importado (material raro até então), o uso do
arco pleno e as reformas em construções existentes para ficarem com aparência neoclássica
foram ocupando espaço.
Depois, a vinda de uma Missão Francesa, em 1816, composta
por profissionais de várias áreas, que traziam a arquitetura e o
urbanismo do Neoclassicismo europeu. De origem e finalidade
controversas, a Missão foi organizada por Joachim Lebreton
(1760-1819). Auguste Henri Victor Grandjean de Montigny
(1776-1850) foi o arquiteto de origem francesa que fez parte da
Missão, e atuou como professor na Escola Real de Belas Artes
e como profissional.
A Escola de Belas Artes no Rio de Janeiro
A Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios (1816-1822) foi o resultado da Missão. Com a
independência do Brasil, seu nome mudou para Academia Imperial das Belas Artes (1822-
1889). Em 1826, mudou-se para a sua primeira sede construída especificamente para esse
fim, um projeto de Grandjean de Montigny. Com a República, alterou-se para Escola de
Belas Artes. Atualmente, seus cursos fazem parte da Universidade Federal do Rio de
Janeiro.
Projeto, de Grandjean de Montigny, da primeira sede específica da Escola Real de
Ciências, Artes e Ofícios (1826). A imagem mostra a fachada principal e, abaixo, a
planta do pavimento térreo. Esse desenho foi feito por Jean-Baptiste Debret
(1768-1848). Disponível em:
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:Planta_e_Fachada_da_Academia_Imperi
al_de_Belas_Artes-Debret-1826.jpg. Acesso em: 25 abr. 2022.
A importação do neoclássico
A arquitetura neoclássica espalhou-se durante o século XIX pelo país, aplicada em sedes
administrativas do governo, palácios, bibliotecas, teatros e residências de luxo. A linguagem
arquitetônica era muito similar àquela usada na Europa, mas havia uma diferença essencial:
os materiais utilizados nessas construções ainda eram predominantemente os mesmos
usados nos séculos anteriores. A exceção ocorria quando os materiais também eram
importados, prática que se tornou comum a partir desse século.
Além de Grandjean de Montigny, outros arquitetos estrangeiros que vieram para o Brasil na
primeira metade do século XIX contribuíram para introduzir o Neoclássico nas cidades
brasileiras. Esse estilo carregava consigo uma ideia de apagar o passado precário e arcaico,
e colonial. Além das formas e da volumetria, o interior das construções também trazia algo
novo. No entanto, o funcionamento das construções, baseado em mão de obra escrava, a
maneira de se construir nos lotes urbanos e os materiais locais continuavam como uma
herança colonial que demoraria para ser substituída.
A arquitetura produzida no período colonial em São Paulo tem como remanescentes as Casas
Bandeiristas, sobre a qual temos o seguinte texto: “a residência instala-se em um retângulo,
com paredes de taipa de pilão, telhado de quatro águas e coberturas com telhas de canal.
Geralmente, fica em uma plataforma natural ou artificial, à meia encosta, nas proximidades de
um riacho. A planta começa por uma faixa social, fronteira, com a capela e o quarto de
hóspede e, no meio, o alpendre. Após essa faixa, e em torno de uma sala central, os quartos
se dispõem lateralmente”. Escolha a alternativa correta sobre o texto:
A arquitetura produzida no período colonial em São Paulo tem como remanescentes as Casas
Bandeiristas, sobre a qual temos o seguinte texto: “a residência instala-se em um retângulo,
com paredes de taipa de pilão, telhado de quatro águas e coberturas com telhas de canal.
Geralmente, fica em uma plataforma natural ou artificial, à meia encosta, nas proximidades de
um riacho. A planta começa por uma faixa social, fronteira, com a capela e o quarto de
hóspede e, no meio, o alpendre. Após essa faixa, e em torno de uma sala central, os quartos
se dispõem lateralmente”. Escolha a alternativa correta sobre o texto:
O jardim lateral: muitas das novas construções são feitas com um afastamento lateral em
relação ao lote vizinho, onde se coloca um jardim e se acessa a edificação. Essa entrada fica
em uma varanda, coberta por um pequeno telhado com estrutura metálica.
A distribuição interna: consolidam-se os espaços destinados a receber visitas, principalmente
nas residências mais ricas. É o que chamamos hoje de sala de estar ou sala de jantar,
descendentes diretos do living inglês. Esse processo aumentou a diferenciação entre esses
ambientes e os de uso íntimo e familiar. Apesar da evolução, ainda era a mão de obra de
escravos e escravas de origem africana que fazia a casa funcionar.
O tijolo de barro cozido: esse material consolida-se no século
XIX como o mais comum e onipresente material construtivo do
país, e lembra a taipa antiga, pois era usado como parede
estrutural e vedação, e tem uma alta inércia térmica, adequada
às condições climáticas do país. Havia também o adobe, tijolo
de barro não cozido, material mais antigo, mas menos comum.
O ecletismo
O Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, é um dos muitos edifícios construídos de acordo com
o Ecletismo da época. Nele se percebe a mistura de vários estilos antigos e um grande
interesse na ornamentação interna e externa. A construção foi originalmente feita para ser
residência da família do barão de Nova Friburgo.
O estilo neocolonial no Brasil está ligado à busca de uma arte genuinamente nacional. O
marco de lançamento do movimento foi a conferência "A Arte Tradicional no Brasil“, ditada
em 1914, na Sociedade de Cultura Artística de São Paulo, pelo arquiteto e engenheiro
português Ricardo Severo. Nela, Severo defende o estilo colonial brasileiro de raízes
lusitanas como o verdadeiro estilo nacional, em contraposição ao ecletismo e o revivalismo
da arquitetura da época que, segundo ele, eram estilos estranhos à tradição brasileira.
Assim, o estilo neocolonial seria um movimento ao mesmo tempo tradicionalista e moderno.
José Mariano Filho, historiador de arte e diretor da Sociedade Brasileira de Belas Artes, teve
um papel importante no movimento, patrocinando viagens de arquitetos às cidades mineiras
coloniais. Muitos renomados arquitetos aderiram ao neocolonial à época, como Victor
Dubugras, Heitor de Mello, Archimedes Memória e outros. Durante a Semana de Arte
Moderna de 1922, dedicada à busca de uma arte nacional, Georg Przyrembel apresentou
projetos no estilo. Lucio Costa, quando jovem, também foi adepto do movimento, e projetou
algumas casas neocoloniais.
A principal característica desse estilo é o seu léxico arquitetônico, formado por um amplo
conjunto de elementos construtivos e ornamentais com um desenho baseado em releituras
das construções do período colonial. Assim, para projetar uma arquitetura neocolonial era
suficiente aplicar esse léxico no projeto. Mas observe que, ao olharmos um projeto nesse
estilo, há muito pouco da linguagem construtiva antiga, aparentemente usada
como referência.
Nem todos os estilos importados da Europa, mesmo quando rapidamente absorvidos pelos
poucos arquitetos que existiam e por alguns construtores, conseguiam alcançar muita
popularidade. Em geral, ficavam restritos aos grandes projetos, seja pelo porte, seja porque
foram escolhidos por uma instituição com recursos para construir. Mas o Art Déco
foi diferente.
O estilo artístico e arquitetônico intitulado Art Nouveau (Arte Nova, em francês) popularizou-
se entre o final do século XIX e o início do século XX, na Europa, chegando a outros países,
incluindo o Brasil. Também era conhecido por outros nomes, dependendo do país, como
Jugendstil (Alemanha), Stile Liberty (Itália), Estilo Floreal (Brasil) e Secessão (Áustria).
Houve arquitetos que trabalharam no Brasil fazendo projetos nesse estilo, como Carlos
Eckman (1866-1940), que projetou uma residência em São Paulo para a rica família
Penteado. Essa edificação é conhecida por ter sido a primeira sede da Faculdade de
Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo.
BAZIN, G. Arquitetura religiosa barroca no Brasil. Rio de Janeiro: Record, 1983. (2 vol.)
BRUAND, Y. Arquitetura contemporânea no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 1991.
FARTHING, S. Tudo sobre arte: os movimentos e as obras mais importantes de todos os
tempos. Rio de Janeiro: Sextante, 2011.
MENDES, F. R.; VERISSIMO, F.; BITTAR, W. Arquitetura no Brasil: de Cabral a Dom João
VI. Rio de Janeiro: Imperial Novo Milênio, 2011.
REIS FILHO, N. G. Quadro da arquitetura no Brasil. São Paulo: Perspectiva, 2019.
VERISSIMO, F. S.; BITTAR, W. S. M. 500 anos da casa no Brasil: as transformações da
arquitetura e da utilização do espaço de moradia. Rio de Janeiro: Ediouro, 1999.
WEIMER, G. Arquitetura popular brasileira. São Paulo: Martins
Fontes, 2012.
ATÉ A PRÓXIMA!