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Ensino do Projeto Arquitetônico_ PPGAU

RESUMO DO LIVRO de BOUDON, Philippe et al, 2000. Revisão Profa. Maísa Veloso

ENSEIGNER LA CONCEPTION ARCHITECTURALE – COURS D’ARCHITECTUROLOGIE


Éditions de la Villette, Paris.

Capítulo 3 : Modéliser la conception architecturale :


« MODELISAR » A CONCEPÇÃO ARQUITTEURAL

a) pp. 97/113
(p 97)
A partir da idéia de espaço arquiteturológico, que permite explorar o espaço de concepção,
objetiva-se construir nesse capítulo um modelo de conhecimento da concepção a partir das
noções fundamentais de “embrayage”, medida, referência, “découpage”, coerência e dimensão.

Esse modelo será desenvolvido a partir de uma representação cujo objetivo é abrir as vias para o
conhecimento, sendo o modelo um instrumento que permite a interpretação de um fenômeno que
é a concepção do espaço. Esse modelo de concepção arquitetural não visa especificar como são
os objetos arquitetônicos, mas sim como estes têm sido pensados.

Embrayage (p.98)
A “embrayage” (“embraiagem”, no sentido figurativo de comunicação/ligação/engate entre as
partes de uma máquina/sistema) é a visão particular do real que o arquiteto possui. Simboliza a
presença do espaço real no processo de concepção arquitetural. Com essa presença, toma-se
consciência da especificidade do espaço arquitetural. O arquiteto ao pensar o projeto e inseri-lo
no real, o faz dando-lhe uma dimensão. O objeto arquitetônico é uma realidade em que a
dimensão é necessariamente considerada em oposição a uma entidade geométrica desprovida de
considerações de tamanho (um cubo genérico, por exemplo). O trabalho do arquiteto implica
assim em ser acompanhado da idéia de grandeza (o cubo deve ter um tamanho determinado).
Uma conceituação do trabalho do arquiteto supõe que seja pensada a grandeza ao mesmo tempo
em que a métrica, assim como, a configuração (ver figuras à p.99).

Arquitetura e geometria
(p.100)
Observando os projetos arquitetônicos, lendo dos discursos dos arquitetos sobre sua produção, ou
ainda, seus tratados, fica clara a posição central e particular que ocupa a geometria, tema
recorrente do pensamento arquitetônico. Na arquitetura de diferentes épocas sempre esteve
presente uma relação estreita entre a problemática da concepção ou de análise e a geometria. Essa
relação se revela em vários níveis e de maneira complexa entre estes:
- A geometria utilizada como ferramenta de conceitualização; permitindo a apreensão
do espaço e a maneira de representá-lo mentalmente;
- A geometria como ferramenta de figuração; as diferentes técnicas de figuração têm
suas bases teóricas na geometria projetiva. A geometria usa o arquiteto em seu
trabalho de representação icônica.
- A geometria, enfim, que usa o arquiteto de uma maneira mais especifica em seu
trabalho de projeto; ela é uma ferramenta de projeção, o arquiteto utilizando, para isso,
figuras geométricas (quadrados, círculos, octógonos, cubos), que lhe servem como
modelo, e operações de pura geometria (simetria, translação...) para conceber uma
planta ou elevação.

Noções arquitetônicas e pensamento acadêmico


(p.101)
As noções de composição, proporção, disposição, ordem, distribuição e simetria fazem que seja
percebido o trabalho de concepção do arquiteto. No entanto, elas “desprendem” a concepção
arquitetônica das contingências da realidade, ou seja, o problema da “embrayage” não acontece.
Essas noções fazem parte de uma representação ideal da arquitetura porque são noções abstratas
que funcionam no espaço da geometria, no espaço da figuração ou, ainda, no espaço universal da
idéias. Estas posicionam o projeto arquitetônico dentro de princípios e regras.
De fato, há casos em que as pesquisas dos princípios ideais são acompanhadas de considerações
sobre as contingências materiais e reais, sem que contudo a noção de “embrayage” seja colocada
como tal. Poderia-se pensar em outras noções (como as de solidez, conveniência e caráter),
porém, estas categorias não permitiriam pensar em sua complexidade a singularidade da obra
arquitetural, sua inserção em uma realidade dada, porque funcionariam principalmente na ordem
da representação da arquitetura, como aquela de uma arte abstrata para a qual as realizações
materiais são de outra ordem.

Medida
(p.103-104)
Toda edificação, qualquer que seja a natureza ou qualidade, tem um tamanho, de dimensões que
podem ser expressas em metros. As medidas, comumente chamadas de cotas, dependem do
instrumento de medida utilizado. A palavra “tamanho” procede geralmente de um instrumento de
medida métrica, enquanto que a expressão “tomar a medida” evocada grandezas que são de outra
ordem, mais qualitativa que quantitativa. As medidas prescindem de um ponto de vista, que
podem ser múltiplos, e de um instrumento de medida que depende do ponto de vista. O
instrumento de medida não existe só. Medir é comparar dois universos no qual um permite a
medida e o outro permite ser medido.
O arquiteto quando concebe encontra uma situação em que o objeto medido não é dado a priori.
Isto ocorre na concepção onde o trabalho do arquiteto é dar medida a todos os objetos que não
existem ainda. O arquiteto, no entanto, tira as medidas dos “dados”: o local geográfico, natural ou
urbano, os meios técnicos ou financeiros, o programa, as maneiras de viver, a própria história da
arquitetura, o que constituem uma reserva de modelos para a arquitetura; todos os ambientes no
qual será realizada a edificação e dos quais o arquiteto deve ter a medida. Contudo, o arquiteto
lida com uma realidade que escolhe/se dá, podendo levar em consideração ou não esse ou aquele
dado no processo de concepção.
A realidade é múltipla: cada qual tem na memória uma realidade social, econômica ou
geográfica, mas para o arquiteto a realidade concerne a fatos de visibilidade, voltados ao objeto.
Isso se faz em uma realidade na qual a unidade de medida pode ser tanto qualitativa como
quantitativa, ou mesmo formal. O arquiteto escolhe o elemento a medir e a maneira de medir. A
medida tem que ser um dado constitutivo da concepção que resulte de uma intenção de quem
concebe, estabelecendo assim uma relação de ida e volta entre medida tomada e medida dada. O
arquiteto a todo tempo tem as medidas e dá as medidas ao espaço.

Proporção e escala como forma de medida


(p.105)
A idéia de medida repousa sobre a comparação; a correspondência entre dois universos a partir de
um ponto de vista. O arquiteto quando concebe pode dar medidas a seus projetos a partir de dois
modos de correspondência de seus elementos: em primeiro lugar, no interior de um mesmo
espaço em que a unidade de medida será definida pelo sistema métrico; em segundo lugar, o
arquiteto pode voltar-se a um elemento exterior ao espaço medido,a partir dele definindo seu
interior.
Em um projeto os elementos não são medidos da mesma maneira. Propõe-se chamar de escala
uma grandeza, métrica ou não, que mantém a proporção no uso em sua relação aritmética ou
geométrica, independente da idéia de grandeza. A proporção nega a diferença entre o pequeno e o
grande, ignorando a questão de tamanho. No caso da proporção, a medida se efetua como
informante de um elemento de um espaço em relação a um outro elemento do mesmo espaço. O
todo é considerado como um sistema fechado. As proporções de um cômodo não permitem per si
que se conheçam suas medidas. A escala supõe a medida de um edifício ou de uma parte de um
edifício em relação a um elemento exterior a ele.

Elasticidade e precisão da medida


(p.106)
Durante o trabalho de concepção, o objeto ainda não existe, já que a finalidade é justamente o
conceber: ele é virtual. Essa virtualidade é importante porque permite contemplar uma ordem de
grandeza da medida. Quando se fala aqui em “escala do objeto”, utiliza-se uma acepção vaga
desse termo, muito utilizado por arquitetos. (a casa do cachorro deve estar na “escala” do
animal). A medida considerada é dotada de uma certa elasticidade (cachorros grandes e
pequenos). Todavia, um tal “medida-elástica” não pode ser progressivamente esticada (até à
medida de um burro, por exemplo) sem que ela se rompa. Essa ruptura indicaria uma “mudança
de escala”. A fluidez da medida autorizada pela virtualidade do objeto permite o ajuste dos
diferentes elementos do projeto entre si. Essa fluidez é mesmo indispensável. Contudo, o caráter
necessariamente fluido/elástico da medida não exclui que um trabalho de precisão esteja a todo o
momento por fazer. Fluidez e precisão podem coexistir no projeto(pensemos no caso da junta de
dilatação).

Forma e medida
(p.107)
Avaliar qualquer elemento ou dar-lhe uma ordem de grandeza remete habitualmente a algo
métrico, quantitativo ou escalar. Em arquitetura, o termo “medida” deve ser considerado de
forma muito mais vasta, incorporando a idéia de que a medida pode ser dada a uma forma. Pode-
se considerar primeiro a idéia de forma antes de dar-lhe uma medida métrica ou quantitativa,
mas, nesse caso, a forma possui uma medida qualitativa, ordem de grandeza ou outra. Aidéia de
um cubo permanece interligada. Este aspecto, que amplia o sentido dado à idéia de medida,
renova igualmente a relação entre medida e forma. É necessário de fato saber que a autonomia da
medida em relação à forma não é um fato recente para história das ciências e que, além disso, na
concepção arquitetural, a imbricação/interligação de decisões que concernem a forma e as
medidas não permitem tal autonomia.

Referência
(p.109)
Dar múltiplas referências a uma forma (um cubo, no exemplo dado do Arco da Defesa, em Paris)
consiste em selecionar, ao mesmo tempo,dados e instrumentos e, para além da atmosfera da idéia
que eles contribuem em enriquecer, os utilizar concretamente na concepção de formas ou de
objetos arquitetônicos. Para um arquiteto, tudo é suscetível de tornar-se referência. O trabalho de
concepção se alimenta de todo tipo de dado potencial. Esses dados, o arquiteto os tira do
programa que lhe é proposto, do sítio, dos objetos vizinhos, mas também da história da
arquitetura, de uma imagem vista em um filme ou de um encontro aleatório.
Cada referência pode provir de um domínio infinitamente vasto e, de certa maneira, oferecer um
caráter de singularidade pouco acessível ao conhecimento. Deve-se então distinguir essa
referência (potencialmente infinita) de uma pesquisa deliberada, em vista de um projeto, feita por
quem o concebe.
Por um lado, deve-se identificar então a constituição, por quem concebe, das classes de
representação da realidade atuando como parte ativa no trabalho de concepção. Falamos aqui de
um “espaço de referência”. Por outro lado, deve-se identificar o trabalho que consiste em fazer
referência, para a concepção de uma forma, a uma realidade reconhecida por quem concebe
através sua experiência de indivíduo ou de profissional de arquitetura. Falamos aqui do “trabalho
de referenciação”.

Espaço de referência, referente e referenciação


(p.111)
A noção de espaço de referência permite compreender o significado das modalidades de
referenciação que tem lugar na concepção. As referências pertencem a determinadas classes:
sejam elas morfológicas, culturais, sociais ou geográficas. Em todos os casos, há uma
referenciação, seja a um objeto, seja a uma classe (através do objeto). Há então possibilidade de
pertinência (cf. p. 119): através dela o arquiteto insere seu peojeto num universo que um
significado para ele.
Convém distinguir o “referente” (objeto da referência) do “espaço de referência” (a classe à qual
pertence a referência), na medida em que o primeiro pertence à realidade, enquanto que o
segundo é uma representação do real, própria de quem concebe. Se, para o arquiteto, as classes de
representação lhe permitem identificar as referências suscetíveis de intervir ativamente em seu
trabalho de concepção, é a referenciação que terá um papel ativo em seu trabalho.
Referência metafórica e referência metonímica

Os espaços de referência podem ser constituídos de referências que se distinguem entre as que
têm ou não uma relação de contigüidade entre o objeto arquitetônico projetado e o ou os
referentes (objetos das referências). No caso da continuidade espacial (contigüidade), diz-se que
há uma referência metonímica (de ordem sintagmática) e no caso de se fazer uma continuidade
não espacial diz-se ter uma referência metafórica.

“Découpage” (recorte)
(p.114)
Como vimos, existe uma multiplicidade de espaços de referência para o projetista. Conceber um
cubo arquitetural não se limita ao recorte geométrico geral do objeto em seis faces, mas leva a
outros recortes, tanto na sua globalidade como nas suas partes, e que estão ligados à diversidade
das abordagens pelas quais o arquiteto “encara” o cubo, a partir da multiplicidade de espaços de
referências que lhe concernem.

Compreende-se efetivamente que a multiplicidade dos espaços de referência, na relação deles


com o espaço arquitetural, não se refere sempre à globalidade do objeto projetado. Isto significa,
para o arquiteto, recortar no projeto, mas nem sempre de maneira consciente, o que é inerente a
um espaço de referência. O recorte é uma operação necessária a qualquer ato de concepção.
Resulta da necessidade para o arquiteto de só tomar em consideração certos elementos para
efetuar o seu trabalho de concepção. Assim, o recorte dá lugar a uma série de elementos sobre os
quais o projetista vai operar, considerando-os, num primeiro tempo, como elementos de valor
idêntico.
Recortar a continuidade do espaço arquitetural permite domina-lo... O que torna os elementos de
recorte coerentes é que eles têm em comum a relação com um mesmo espaço de referência.

Recortes ilimitados
(p.116)
Os recortes são múltiplos em arquitetura. Eles são dados de maneira implícita ou de maneira
explícita, mas devem geralmente ser produzidos por quem concebe. Certamente, existem
tradições, convenções, hábitos, que produzem recortes: planta, corte, fachada, constitui um
recorte canônico do objeto arquitetural. A arquitetura clássica notadamente é ela própria de um
vasto recorte da arquitetura. Mas a concepção produz recortes funcionais, geográficos, visuais,
etc. O que quer dizer que um arquiteto pode criá-los tanto quanto lhe forem necessários.

Recortes das palavras

De todos os recortes, o primeiro e mais empírico às vezes é o recorte verbal. As palavras


recortam o espaço, instituem agrupamentos sob uma designação comum. A começar pela palavra
“templo”: etimologicamente designa um recorte, recorte de um interior, um interior sagrado. A
arquitetura clássica, por sua vez, é recortada em partes nomeáveis. Às vezes, alguns elementos
não são nomeáveis mas podem ser considerados pelo arquiteto na concepção (como o conjunto
de janelas de uma rua).
Todo/Parte
(p.117)
O recorte procede da fragmentação de um todo, da identificação de elementos a partir dos quais o
trabalho de concepção se torna possível. No entanto, a concepção arquitetural não poderá residir
no fragmentário, porque tende a uma totalidade, a do objeto desta vez. Assim, paradoxalmente, a
concepção arquitetural é fundada sobre recortes e, ao mesmo tempo, ela tende para uma unidade.
Apesar do objeto se constituir a partir de fragmentos, estes se encontram constantemente
confrontados com "a dura obrigação do todo", para retomar os termos de R. Venturi. O recorte
em partes é uma condição da concepção. A totalidade, que significa mais que a soma das partes,
procede da obrigação de apreender o objeto a ser concebido na sua globalidade, de acordo com as
relações de dependência entre os elementos, uns para com os outros. Em arquitetura, a expressão
"o todo é ligado", de Viollet-le-Duc, significa que não há problema isolado na concepção: em
todos os níveis e apesar da distinção entre eles, os elementos do espaço arquitetural estão contudo
ligados, ainda que esta relação se efetue de maneira variável segundo os pontos de vista adotados
pelo projetista.

Pertinência
(p.119)
Se o lado do cubo possui uma medida dada pelo arquiteto, este não lhe terá conferido esta medida
sem nenhuma intenção. Para um projetista, a noção de pertinência permite responder à pergunta
seguinte: qual é o valor de uma aresta de um cubo de 9m, por exemplo, no olhar de tal intenção?

"O primeiro vem e diz: “a arquitetura é geometria, o cubo será a expressão mais pura da essência
mesmo da arquitetura”.

O segundo vem e diz: “Sigamos Le Corbusier! O seu poema do ângulo direito nos diz o valor do
símbolo: inscrevam por conseguinte nossa construção num cubo, que segue a regra."

O terceiro diz então: “Fabriquemos antes um espaço servido por quatro postes/colunas e que se
porta como uma mesa. Formaremos assim a estrutura elementar que nos dá a solução: um cubo
para a nossa construção.”

Um outro, muito mais preocupado com o futuro do que com o presente, emitiu outro parecer: “se
queremos um dia entender a nossa construção, deveríamos prever algo que se possa fazer da
maneira mais simples possível. Sugiro então um cubo: poderíamos, quando for o caso,
acrescentar ao cubo inicial mais cinco cubos idênticos sobre cada um das suas faces, e isso de
maneira ilimitada.”

O seguinte só concordava em parte: “certo, um cubo, mas por razões diferentes, em especial para
poder ter uma vizinhança com outros prédios que, embora diferentes, seriam submetidos à mesma
regra”.
A idéia foi retomada por um outro: tem razão, mas estabeleçamos primeiro o parcelamento em
tabuleiro e poderemos edificar a nossa construção, segundo a forma do terreno mesmo, elevando-
a simplesmente na vertical sobre a sua forma de base..." (In “Doctrines et Incertitudes,", Cahiers
de la recherche architecturale, 1980).
Quando o arquiteto decide uma medida para um espaço, ele escolhe uma ordem de grandeza, uma
intensidade, enfim, se ele introduz o quantificável ou o qualificável, ele toma sua decisão
segundo um ponto de vista. Este ponto de vista, em arquitetura, remete, como já vimos, às classes
de representação da realidade, a um ou vários espaços de referência.

Qualquer que seja modo de medida e o seu grau de precisão, uma medida só tem valor se um
ponto de vista lhe for associado, ou seja, se uma pertinência lhe for dada. Na concepção,
convocar um espaço de referência em relação ao qual uma ou várias operações de medida tomam
sentido consiste, entre outras, em definir a pertinência destas operações de medida. Como
veremos, a pertinência constitui a unidade teórica do termo escala. Em resumo, para decidir sobre
uma medida é preciso pensar sobre sua pertinência, ou seja, apreciar seu valor em relação a um
espaço de referência.

Multiplicidade das pertinências


(p.121)
Um objeto ou espaço qualquer pode ser objeto de várias medidas. No caso das torres municipais
(beffrois), por exemplo, a contigüidade com o prédio da prefeitura da cidade é lhes confere uma
medida. É, de certo modo, o seu pedestal. Mas a sua necessária visibilidade de todos os pontos da
cidade, ou mesmo do exterior da cidade, dá-lhes também uma medida. A medida de um beffroi
deve ser, por conseguinte, duplamente pertinente, dado que procede ao mesmo tempo de um fato
de visibilidade e de um fato de vizinhança: o arquiteto pode assim encarar a medida de um espaço
seguindo uma, duas ou mesmo várias pertinências.

Compatibilidade das pertinências


(p.122)
Quando um mesmo objeto é o apoio de várias operações de medidas, estas medidas são mais ou
menos compatíveis. Uma grandeza óptica que seja visualmente pertinente será talvez não
pertinente do ponto de vista funcional ou de vizinhança. A liberdade do arquiteto de decidir as
pertinências pode muito bem levantar problemas de compatibilidade. Com efeito, nada obriga a
um projetista levar em conta certos espaços de referência. Mas veremos que o arquiteto
geralmente é conduzido a fazer várias hipóteses de medida que dependem de espaços de
referência diversos. O problema da compatibilidade se coloca quando diferentes medidas de um
objeto ou de um espaço devem ajustar-se, mas também quantos os apoios, medidos de acordo
com pertinências diferentes, são espacialmente contíguos.

Pertinência do instrumento de medida

Numa operação de medida, não existe instrumente a priori e absoluto: ele resulta da escolha do
arquiteto. Contudo, o instrumento não pode ser qualquer um: que interesse teria medir um
radiador através de uma pipa? O instrumento de medida deve permitir avaliar a característica do
objeto, o que supõe uma certa comunidade entre o medido e o medidor. Além disso, há sempre
uma intenção, da qual dependerá a escolha do instrumento. A pertinência do instrumento designa
então a capacidade de ter o sentido relativo à operação tencionada, ou seja, dar um valor ao
objeto em função da intenção inicial.
Dimensão
(p.124)
Que se dá o valor x ao lado de um cubo ou à sua diagonal, nós o definimos por uma única
operação de medida. Trata-se de um cubo à uma dimensão qualquer. Nem sempre isso ocorre: o
cubo pode proceder de operações distintas, respectivamente para cada um de seus lados: será,
então, do ponto de vista da sua concepção, um cubo tridimensional.

"Os mapas geográficos são considerados geralmente como objetos bidimensionais." Mas eles
podem facilmente ter mais dimensões. Se, por exemplo, o mapa representa o plano de uma
cidade, pontos podem ser acrescentados para representar a densidade de populações em diferentes
bairros, os pontos podem ter formas diversas para distinguir as origens étnicas. O uso de cores
pode distinguir ao mesmo tempo a variação da densidade e a da origem étnica no tempo;
portanto, no caso, o plano terá cinco dimensões... "(CH Moore, G. Allen, 1981).

Em outras operações de medida, dar uma dimensão consiste em privilegiar um apoio em


detrimento de outro, ou ainda, a privilegiar uma parte do espaço arquitetural à qual o arquiteto
decide dar medida. Por motivos econômicos, um projetista pode tanto reduzir uma superfície
linear de fachada, quanto colocar um revestimento cerâmico menos dispendioso nas partes de
serviço. A dimensão é a que o arquiteto mede: refere-se ao objeto que está sendo concebido em
operações de medidas e ela é o apoio desta medida.

Além disso, como apoio para a medida, a palavra dimensão abrange uma realidade geométrica.
Com efeito, o espaço geométrico euclidiano é dotado de três dimensões (x, y, z). No entanto, do
ponto de vista da concepção arquitetural, as dimensões não são, a priori, em número limitado,
dado que é o arquiteto que dota o seu projeto de dimensões, a fim de acoplá-lo, instalá-lo no
espaço real. Dimensionar, no modelo arquiteturologico, é ao mesmo tempo decidir o que é que
deve ser medido e lhe atribuir uma medida, qualquer que seja a precisão ou a fluidez.

A palavra “dimensionamento” será aqui utilizada para designar esta operação. Reservemos o
termo “dimensão” aos objetos do dimensionamento: a "dimensão" é o operando da operação de
dimensionamento. Portanto, a palavra "dimensão" toma aqui um significado especificamente
arquiteturologico, e não deve ser confundida com o significado usual do termo que remete às
idéias de dimensão e de grandeza. Incluir o dimensionamento numa atividade de concepção torna
necessário distinguir apoio de medida e medida. Porque na ordem da concepção, os objetos que
se dimensiona não são dados a priori, mas são ao mesmo tempo objetos de concepção e
dimensionamento. Está aí toda a dificuldade da concepção arquitetural.

Dimensões e dimensão
(p.126)
A palavra "dimensão" é uma palavra correntemente utilizada pelos arquitetos. Pode significar
cota, tamanho (no sentido onde se diz que uma construção tem uma dimensão de 35m), mas
designa também, de uma maneira mais metafórica e mais específica, as grandezas próprias ao
domínio da arquitetura. O arquiteto G. Allen fala de três dimensões X, Y, Z, o espaço arquitetural
às quais ele acrescenta, entre outras, aquelas do espaço sensível... A acepção corrente entre os
arquitetos do termo "dimensão" abrange o que nós na arquiteturologia chamamos de “espaço de
referência”, uma classe ou uma categoria ligadas às representações que fazem os arquitetos da
própria arquitetura. Portanto, a palavra dimensão será usada por nós nos termos que ela foi
definida.

Cotas
(p.127)
No fim, ou mesmo durante o processo de concepção, o objeto é dotado de "dimensões" no
sentido usual do termo. Estas são traduzidas, para fins de comunicação ou de verificações, em
cotas. Cotar é atribuir às dimensões grandezas métricas. A atribuição de uma cota corresponde
um momento da concepção que permite a execução. A cota pressupõe um longo trabalho de
definição da medida. Representa também um código que permite ao arquiteto comunicar o seu
projeto aos diversos corpos de ofícios que serão responsáveis pela execução. Acontece contudo
que o arquiteto manipula, no seu trabalho de concepção, objetos cujas cotas são definidas e não
susceptível de variações (elementos pré-fabricados...) Neste caso, as cotas tornam-se elementos
da concepção. Falar-se-á posteriormente deste efeito de modelo dimensional.

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