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INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO LUSÍADA DE BENGUELA

CENTRO DE ESTUDOS, INVESTIGAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO


DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

RELATÓRIO DO CURSO DE MESTRADO EM CIÊNCIAS JURÍDICO-FORENSE

CONTRATO DE COMPRA E VENDA: MODALIDADE TÍPICA - VENDA A


PRESTAÇÕES

Estudante: Aiken Renkel Afonso

Prof. Doutor Francisco Rodrigues Rocha

LOBITO, SET/2023

1
INSTITUTO SUPERIOR POLITÉCNICO LUSÍADA DE BENGUELA

CENTRO DE ESTUDOS, INVESTIGAÇÃO E PÓS-GRADUAÇÃO

DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS

RELATÓRIO DE MESTRADO EM CIÊNCIAS JURÍDICO-FORENSE

CONTRATO DE COMPRA E VENDA: MODALIDADE TÍPICA - VENDA A


PRESTAÇÕES

Relatório Científico apresentado a Universidade


Lusíada de Angola-Lobito, para a conclusão do
módulo na Disciplina de Contratos Civis.

Área: Ciências Jurídico-Forense

LOBITO, SET/2023

2
DIDICATÓRIA

Dedicamos o presente trabalho, a memória do meu pai, aminha querida mãe (meu Deus na
terra) e a minha querida filha o motivo das minhas lutas diárias.

3
AGRADECIMENTOS

Em primeiro lugar agradecemos a Deus, pai todo poderoso, criador dos céus e da terra, pelo
dom da vida e pela sabedoria infinita que tem nos inspirado todos os dias;

Em segundo lugar, agradecemos a todos os nossos entes queridos, com maior realce a pessoa
dos nossos progenitores, por nos terem gerado;

Em terceiro lugar, estendemos os nossos agradecimentos aos nossos amigos, vizinhos,


conhecidos, pelo apoio que nos têm prestado directa ou indirectamente;

Em quarto lugar agradecemos os nossos companheiros de luta, os colegas do curso de mestrado


em ciências jurídico-forense.

E, em quinto lugar e ultimo, agradecemos ao professor Doutor Francisco Rodrigues Rocha,


formador do presente modulo, pela robustez intelectual demostrada em cada sessão.

4
ABREVIATURAS

Art. Artigo

Arts. Artigos

CCA – Código Civil Angolano

CCP – Código Civil Português

CCF – Código Civil Francês

CCI – Código Civil Italiano

CCA/P – Código Civil Angolano e Português

Ed. Editora

Prof. Professor

LSC – Lei das Sociedades Comerciais

ss – Seguintes

p. Página

Vol. Volume

5
Resumo
O presente trabalho tem por finalidade elucidar sobre contrato de compra e venda, em
particular a modalidade típica: venda a prestações.

Primeiramente faz-se necessário conceituar o contrato de compra e venda que, constitui


a principal fonte das relações obrigacionais, não só pela sua frequência, contudo também
porque os direitos e obrigações deles resultantes são de um modo geral os de maior relevo na
vida de todos os dias. Falar-se-ia, por isso, em que o contrato consistiria num acordo
vinculativo, assente sobre duas ou mais declarações de vontades (oferta ou proposta, de um
lado; aceitação do outro).

A caracterização jurídica da compra e venda, de acordo com doutrinadores civilistas, é


muito ampla, podendo o contrato ser nominado e típico; por princípio, não sujeito a forma
especial; consensual (quanto à constituição); obrigacional e real quoad effectum; oneroso e
sinalagmático.

Quanto a forma, a compra e venda segue as regras gerais dos arts. 217.º e ss. do CCA/P,
vigorando o princípio da liberdade de forma (art. 219.º do CCA/P). Para a venda de direito de
bens imóveis, com base no art. 875.º do CCA/P, exige a celebração do contrato por escritura
pública. Nota-se que os efeitos derivados dos contratos são essencialmente reais e
obrigacionais. Em relação as mais diversas modalidades específicas da compra e venda,
faremos somente referência a modalidade da venda a prestações, tendo em conta o objecto do
nosso estudo.

O último aspecto a ser apresentado corresponde à modalidade típica de compra e venda:


venda a prestações, no qual será analisado: os aspectos gerais - nos termos do qual, a venda a
prestações é aquela cuja, obrigação de pagamento é definida e repartida no tempo. Neste ponto
também será analisado, os regimes especiais da venda a prestações previstos nos termos dos
artigos 886.º e 781.º todos do CCA/P. Será de igual modo analisado a cláusula penal - como
um mecanismo de defesa do vendedor na eventualidade de o comprador não cumprir com as
suas obrigações. Por último falar-se-á da aplicação do regime da compra e venda a prestações
a outros contratos. Como metodologia recorri a livros dos autores nomeados na bibliografia e autores de
busca como o Google. Por fim, concluo que este é uma das formas de contrato mais adoptadas pela população
Angolana nos últimos tempos.

Palavras-chave: contrato de compra e venda; modalidades típicas; venda a prestações.

1
ABSTRACT

The main purpose of this work is to clarify the purchase and sale contract, in particular
the typical modality: installment sale.

Firstly, it is necessary to conceptualize the purchase and sale contract, which


constitutes the main source of obligatory relationships, not only because of its frequency, but
also because the rights and obligations resulting from them are generally those of greatest
importance in everyone's lives. the days. It would therefore be said that the contract would
consist of a binding agreement, based on two or more declarations of will (offer or proposal,
on the one hand; acceptance on the other).

The legal characterization of purchase and sale, according to civil scholars, is very
broad, and the contract can be named and typical; in principle, not subject to special form;
consensual (regarding the constitution); obligatory and real quoad effectum; costly and
sinagmatic.

As for form, the purchase and sale follows the general rules of arts. 217th and ss. of
the CCA, in force with the principle of freedom of form (art. 219 CCA/P). For the sale of real
estate rights, based on art. 875th of the CCA/P, requires the conclusion of the contract by public
deed. It should be noted that the effects derived from contracts are essentially real and
obligatory. In relation to the most diverse specific types of purchase and sale, we will only refer
to the installment sale method, taking into account the object of our study.

The last aspect to be presented corresponds to the typical type of purchase and sale:
sale by installments, in which the following will be analyzed: the general aspects - in terms of
which, the sale by installments is one whose payment obligation is defined and spread over
time . At this point, the special regimes for installment sales provided for in terms of articles
886 and 781 of the CCA/P will also be analyzed, and the penal clause will also be analyzed -
as a defense mechanism for the seller in the event that the buyer does not comply with its
obligations. Finally, we will talk about the application of the installment purchase and sale
regime to other contracts. As a methodology I used books by authors named in the bibliography
and search authors such as Google. Finally, I conclude that this is one of the forms of contract
most adopted by the Angolan population in recent times.

Keyword: purchase and sale contract; typical modalities; sale in installments.

2
ÍNDICE
ABREVIATURAS..................................................................................................................
Resumo ...................................................................................................................................
0. Introdução ...................................................................................................................... 4
1. Compra e Venda ............................................................................................................ 5
1.1. Noção de Contrato e Aspectos Gerais .......................................................................... 5
1.2. Classificações ................................................................................................................ 8
1.3. Forma do Contrato ....................................................................................................... 10
1.4. Efeitos do Contrato ...................................................................................................... 11
1.5. Modalidades Específicas ............................................................................................. 12
2. Venda a Prestações ...................................................................................................... 12
2.1. Noção e Aspectos Gerais ............................................................................................. 12
2.2. Regime ......................................................................................................................... 13
2.3. Cláusula Penal ............................................................................................................. 16
2.4. Aplicação do Regime da Compra e Venda a Prestações a Outros Contratos...............16
Conclusão............................................................................................................................ 18
BIBLIOGRAFIA ................................................................................................................ 19

3
0. Introdução
O contrato de compra e venda traduz-se na transmissão de propriedade e entrega da coisa mediante um
pagamento. A modalidade deste contrato trabalhado no presente relatório é, a venda aprestações
em que se dá a transmissão da propriedade e entrega da coisa, com ou sem reserva da mesma, em pagamentos
repartidos e diferidos no tempo, regulada nos arts. 934.º e ss. do CCA/P, corresponde a um tipo de
venda a crédito.

A venda a crédito entre outros aspectos, distingue-se da compra e venda em que o


comprador decorreu ao crédito porque, nesta última quando muito, pode existir uma união de
contratos (mútuo e compra e venda), ou seja, na compra e venda com recurso a crédito o
comprador celebra um contrato de mútuo e outro de compra e venda podendo eventualmente,
os dois contratos estarem coligados1.

Em Angola, a venda a prestações serve múltiplos interesses e exigências práticas dos


operadores económicos. Dele as partes estipulam que a obrigação de pagar o preço da compra
e venda será fracionada em duas ou mais prestações. Esta modalidade surgiu como forma de
tornar mais activa a circulação de bens e de permitir o gozo dos benefícios por eles
proporcionados a um maior número possível de pessoas.

Faltando o comprador a uma prestação superior a 1/8 do preço, ou a duas prestações,


independentemente do seu valor, o vendedor pode interpelá-lo, exigindo o pagamento das
prestações vincendas. A partir desse momento, o comprador estará em mora relativamente a
todas as prestações não pagas, podendo ele transformar-se em incumprimento definitivo nos
termos do art. 808.º do CCA/P.

Em suma, o art. 934.º do CCA/P, refere-se apenas à falta de pagamento. Não obstante,
deve entender-se ter a expressão normativamente dois sentidos. Tratando-se da exigência do
cumprimento da totalidade das prestações basta a mora. Estando, porém, em jogo o exercício
do direito de resolução apenas após o incumprimento definitivo, operado nos termos do art.
808.º do CCA/P, pode ele ser actuado.

1
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 25.
4
1. Compra e Venda
1.1. Noção de Contrato e Aspectos Gerais

Os contratos constituem a principal fonte das relações obrigacionais, não só pela sua
frequência, também porque os direitos e obrigações deles resultantes são de um modo geral os
de maior relevo na vida de todos os dias. Falar-se-ia, por isso, em que o contrato consistiria
num acordo vinculativo, assente sobre duas ou mais declarações de vontades (oferta ou
proposta, de um lado; aceitação do outro) contrapostas, mas perfeitamente harmonizáveis entre
si, que visam estabelecer uma regulação unitária de interesses ou que nele existe a manifestação
de duas ou mais vontades com conteúdo diversos, prosseguindo distintos interesses e fins, até
opostos, mas que se ajustem reciprocamente para a produção de um resultado unitário2.

Nos ensinamentos do prof. Fernando Araújo3, contrato é essencialmente um facilitador


da circulação de titularidade de valores e de modo de governo conjunto de problemas atinentes
ao conhecimento, ao poder e aos interesses.

Desde a construção do Estado pensadores como: Jhon Locke, Thomas Hobbes e Jean-
Jacques Rousseau, defendiam que a origem da sociedade se baseiava no contrato social. Para
eles, a vida do Homem em sociedade não era natural, mas antes resultava de um acordo de
vontades entre os homens. Nesta época o contrato assumia a natureza da pedra angular de todo
um sistema que explicava o serviço de ideologia, onde o individualismo liberal era uma fase
de ouro de contínuo progresso técnicos de que o contrato representava o grande instrumento
jurídico doptado da necessária flexibilidade para permitir e impulsionar o dinamismo da
economia.

Desta feita, para os franceses, a figura de contrato é vista como uma convenção de que
nascem obrigações (art. 1101.º, do CCF), de acordo com a referida corrente, a convenção
constitui o género de que o contrato representa a espécie. Quando o acordo de vontades se
dirige á criação de obrigações, existe um contrato, posto que possa também envolver a
transferência da propriedade, mas se esse acordo recai sobre a modificação ou extinção de

2
Cfr. LEITÃO, Luís Manuel Telles de Meneses. Direito das Obrigações, Vol. I 11.ª Ed. Almedina Editora,
Coimbra: 2011, p. 167.
3
Cfr. COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações 12.ª Ed. Revista e actualizada. Coimbra: 2010,
p. 14
5
relações obrigacionais ou sobre relações jurídicas de natureza diversa, nomeadamente reais,
familiares ou sucessórias, trata-se de uma convenção4.

Para os italianos o contrato é um acordo de duas ou mais partes que tenda à produção
de efeitos jurídicos (art. 1321.º do CCI). A doutrina portuguesa acolhe a doutrina italiana,
consequentemente a doutrina angolana é unânime a de Portugal em considerar o contrato como
um acordo de vontades. Porém, o Código Civil Português aderiu a orientação mais ampla, indo
além do Direito Italiano, tal como resulta no art. 398.º n.º 2, do CCP. Deste modo, aceitando a
compreensão mais ampla de contrato, o seu conceito coincide com o de negócio jurídico
bilateral ou contrato quando existe manifestações de duas ou mais vontades com conteúdos
diversos, prosseguindo distintos interesses e fins até opostos mas se ajustam reciprocamente
para produção de um resultado unitário. Está-se diante de declarações de vontade convergentes.

Dentre os portugueses Luís Manuel Telles de Meneses Leitão5, conclui dizendo que os
contratos formam-se pelo simples encontro de duas declarações de vontade (uma proposta e
uma aceitação), diferenciado desta feita, dos negócios jurídicos unilaterais, onde há apenas uma
declaração negocial, da qual resultam todos os efeitos jurídicos estipulados,
independentemente de ter um único ou autor ou vários. No contrato, a emissão apenas de uma
das declarações negociais não se apresenta como suficiente para a produção de efeitos jurídicos
estipulados, uma vez que, a lei os faz depender da emissão de uma segunda declaração negocial
contraposta, mas integralmente concordante com a primeira. O contrato assume-se assim como
o resultado de duas ou mais declarações negociais contrapostas, mas integralmente
concordantes entre si, de onde resulta uma unitária estipulação de efeitos jurídicos.
Consequentemente, os contratos pressupõem sempre uma proposta e a sua aceitação, das quais
deve resultar o mútuo consenso entre todas as cláusulas sobre as quais uma das partes julgue
necessário o acordo.

Augusto Guerra Manuel6, na sua tese de dissertação de mestrado escreve que, a


formação dos contratos aqui se distinguem em duas fases: a fase negociadora e a fase decisória
sujeitas a regimes divergentes.

4
Cfr. COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações, 12.ª Ed. Revistas e actualizada. Coimbra: 2010
p. 214.
5
Cfr. LEITÃO, Luís Manuel Telles de Meneses. Direito das Obrigações, Vol. I 11.ª Ed. Almedina Editora,
Coimbra: 2011, p. 168.
6
Cfr. MANUEL, Augusto Guerra. Contrato-Promessa de Compra e Venda em Angola. Dissertação de Mestre
em Direito na área de Ciências-jurídicas: Universidade Autónoma de Lisboa, Lisboa: 2014, p. 15.
6
A fase negociadora inicia-se com o primeiro contacto dos interessados, estabelecido
sem carácter vinculativo em ordem a eventual celebração de um contrato. Finda quando um
deles ou ambos desistem de prosseguir as conversações, por não lhes interessar levá-las mais
longe ou um deles ou ambos assentam na outorga de um contrato com determinado conteúdo.
Podem desenhar-se várias perspectivas uma das partes formula proposta que a outra aceita ou
não ou conclui logo o contrato, que revestem ou não de formalismo necessário se não revestem,
existe apenas um mero contrato de facto. Pois, a fase negociadora destina-se apenas às
conversações, tendentes à eventual conclusão de um contrato.

Por outro lado, a que se ter em conta que, a declaração negocial que tenha um
destinatário, como é o caso da proposta e da aceitação, torna-se eficaz logo que chega ao seu
poder ou é dela conhecida (art. 224.º n.º 1, do CCA/P). Contudo também é considerada eficaz
a declaração que só por culpa do destinatário não foi por ela recebida (art. 224.º n.º 2, do
CCA/P). Mas, será ineficaz a declaração recebida pelo destinatário em condições de sem culpa
sua, não poder ser conhecida, nos termos do n.º 3 do artigo mencionado.

Por fim, a declaração negocial, bem como a proposta ou aceitação, pode ser feita
mediante anúncio publicado num dos jornais da residência do declarante, quando se dirige a
pessoa desconhecida ou cujo paradeiro seja ou se tenha tornado desconhecido (art. 225.º do
CCA/P).

Quanto a proposta e aceitação, ambas constituem actos jurídicos7. A proposta tem


eficácia jurídica própria, consistente em tornar-se irrevogável assim que recebida ou conhecida
pelo destinatário. Existe ainda outro efeito jurídico, ou seja, há possibilidade de o proponente
retractar a proposta, dando-lhe sem valor. Se o proponente comunicar a retractação da proposta
à outra parte antes de esta receber ou conhecer a proposta ou no mesmo instante, fica a proposta
desprovida de qualquer valia.

Destaca-se também a culpa na formação dos contratos ou culpa in contrahendo, que


manda pautar a conduta das partes pelos princípios da boa- fé8, percebida esta no sentido ético,
quer durante a fase negocial quer decisória, isto é, proposta e aceitação, do contrato. Trata-se
da responsabilidade pré-negocial, tanto vale no caso de rupturas de negociações como no caso
o contrato se concluir e vir ser nulo ou ineficaz ou ainda por causa da violação dos ditames da
boa-fé por parte. Nesse caso há danos da confiança, ou seja, deve colocar-se o lesado na

7
Cfr. PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 4.ª Ed. Coimbra Editora 2007. p. 379 e ss.
8
Cfr. PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 4.ª Ed. Coimbra Editora 2007. p. 124 e ss.
7
situação em que estaria se não tem chegado a depositar uma confiança na celebração de um
contrato válido e eficaz. Finalmente o dano a ser ressarcido pela responsabilidade pré-
contratual é, em princípio o chamado dano da confiança (arts. 227.º a 235.º todos do Código
Civil).

1.2. Classificações

De acordo com o prof. Francisco R. Rocha9 a compra e venda classifica-se como um


contrato nominado e típico; por princípio, não sujeito a forma especial; consensual (quanto à
constituição); obrigacional e real quoad effectum; oneroso e sinalagmático.

O contrato diz-se nominado, quando a lei o reconhece como categoria jurídica através
de um nomen iuris. Pelo contrário o contrato diz-se inominado, quando a lei não o designa
através de um nomen iuris, não o reconhecendo assim as suas categorias contratuais. Esta
classificação não se confunde com outra classificação, entre contratos típicos e a típicos. O
contrato diz-se típico, quando o seu regime se encontra previsto na lei, sendo a típico quando
o tal não sucede10. Os contratos nominados podem ser típicos e atípicos. O contrato inominado
é sempre atípico, assim, a compra e venda (art. 874.º do CCA/P) ou a doação (arts. 940.º e ss.
do CCA/P) são contratos nominados e típicos, uma vez que, além de possuírem um nome, têm
estabelecido um regime jurídico na lei, outros contratos como a hospedagem, são contratos
nominados e atípicos, pois apesar de a lei os reconhecer como categorias jurídicas (art. 755.º
do CCA/P) não estabelece qual o seu regime. Se as partes celebrarem um contrato que a lei
desconhece por completo, tratar-se-á de um contrato inominado e atípico.

Uma outra classificação dos contratos distingue-se entre contratos formais e não
formais. Os contratos formais ou solenes são aqueles para os quais a lei prescreve a necessidade
da observância de determinada forma, o acatamento de determinado formalismo ou de
determinadas solenidades. Os não formais ou não solenes (consensuais) são os que podem ser
celebrados por quaisquer meios declarativos aptos a exteriorizar a vontade negocial, porque a
lei não impõe uma determinada roupagem exterior para o negócio.

A exigência de forma para os negócios jurídicos ou para certos negócios - é uma


constante de todos os tempos. Em fases mais recuadas da história jurídica dos povos o

9
Cfr. ROCHA, Francisco Rodrigues. Direito dos Contratos – Material de Apoio, in aulas no Curso de Mestrado
da Universidade Lusíada de Angola - Benguela, Lobito: 2023.
10
Cfr. LEITÃO, Luís Manuel Telles de Meneses. Direito das Obrigações. Vol. I 11.ª Ed. Almedina Editora,
Coimbra: 201, p. 185.

8
formalismo era exigido para todos ou quase todos os negócios, era muito aparatoso, com
cerimónias cheias de ritualismo, e variava de tipo negocial para tipo negocial. Tornava-se
necessário o emprego de palavras ou de gestos muito precisos, a celebração em determinados
locais, ante o tribunal ou ante testemunhas. Via-se na forma, que assim tinha de ser cumprida
vigorosamente, o próprio fundamento da criação de vínculos jurídicos. Hoje o formalismo é
exigido apenas para certos negócios jurídicos.

Por exemplo: transmissão de quotas de sociedade (art. 228.º da LSC), na alienação da


herança (art. 2126.º CCA/P) ou na transmissão total e definitiva do conteúdo patrimonial do
direito de autor, compra e venda de imóveis (art. 875.º do CCA/P), doação de imóveis (art.
947.º do CCA/P); outros actos de reconhecimento, constituição, aquisição, modificação,
divisão ou extinção dos direitos de propriedade, usufruto, uso e habitação, superfície ou
servidão, bem como contrato-promessa (e pacto de preferência) com eficácia real, desde que
se exija escritura pública para o contrato prometido (arts. 413.º e 421.º todos do CCA/P).

Uma outra classificação dos contratos distingue-se entre contratos obrigacional e real
quoad effectum. A compra e venda é um contrato obrigacional cujo, processo formativo a
entrega da coisa é dispensável, ou seja, para a celebração do negócio jurídico basta o consenso.
Nesta sequência cabe referir que a compra e venda é um contrato real quoad effectum, por via
de regra, a transferência do direito designadamente real objecto do negócio jurídico dá-se por
mero efeito do contrato (art. 408.º n.º 1, do CCA/P). Por exemplo no momento em que se
celebra a escritura da venda de um prédio, independentemente da sua entrega transfere-se a
propriedade para o comprador. Esta regra comporta algumas excepções, como sejam: nas
situações da venda de coisa genérica, a transferência da propriedade dá-se aquando da
concertação (art. 541.º do CCA/P) e não com a celebração do contrato, nestes casos o efeito
translativo fica dependente de um facto futuro, que na hipótese indicada é a concentração11.

Outrossim, a compra e venda qualifica-se como um contrato oneroso, na medida em


que dele advém vantagens económicas para as partes. Vantagens essas que evidentemente, não
precisam de ter valor equivalente, todavia, não deixa de ser compra e venda se o preço acordado
for excessivamente baixo ou elevado em relação ao valor do direito transferido12. Neste sentido
pode dizer-se que no negócio oneroso as partes estão de acordo em que a vantagem que cada

11
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano, Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 25.
12
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 24.
9
uma visa obter é contrabalançada por um sacrifício que está numa relação de estrita causalidade
com aquela vantagem. As partes consideram as duas prestações ligadas reciprocamente pelo
vínculo da causalidade jurídica13. Já os negócios gratuitos ou a título gratuito caracterizam-se,
pela intervenção de uma intenção liberal (animus donandi, animus beneficiandi), ou seja, uma
parte tem a intenção, devidamente manifestada, de efectuar uma atribuição patrimonial a favor
da outra, sem contrapartida ou correspectivo, a outra parte procede com a consciência e vontade
de receber essa vantagem sem um sacrifício correspondente14.

Na noção legal retira-se igualmente que a compra e venda é um contrato sinalagmático,


pós as prestações das partes – vendedor e comprador na relação contratual em particular as de
entrega da coisa e de pagamento do preço funcionam em termos de correspectividade, ou seja,
são recíprocas e interdependentes15.

1.3. Forma do Contrato

Quanto a forma, a compra e venda segue as regras gerais dos arts. 217.º e ss. do CCA/P,
vigorando o princípio da liberdade declarativa, liberdade de forma ou consensualidade (art.
219.º do CCA/P). Contudo para a venda de direito de bens imóveis, o art. 875.º do CCA, exige
a celebração do contrato por escritura pública. Com base no Decreto - Lei n.º 255/93, de 15 de
Julho e o decreto – Lei n.º 180/99, de 22 de Maio, ambos de Portugal, estabelecem que, a
exigência de documentos pode ser afastada se o bem for adquirido com recurso ao crédito
bancário, casos em que se requer que o contrato seja tão só reduzido a forma escrita, outrossim,
a escritura pública não é exigida no caso de compra e venda do direito real de habitação
periódica16.

A falta de forma legalmente prescrita para o contrato de compra e venda, nos termos do
art. 220.º do CCA/P, acarreta a nulidade do negócio jurídico, segundo o regime geral dos arts.
286.º e ss. do CCA/P.

13
Cfr. PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 3.º ed. 12.ª Reimpressão, Coimbra
Editora: Coimbra: 2007. p. 401.
14
Cfr. PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 3.º ed. 12.ª Reimpressão, Coimbra
Editora: Coimbra: 2007. p. 401.
15
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 24.
16
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 28.

10
1.4. Efeitos do Contrato

Na orientação do prof. Francisco R. Rocha, a compra e venda é um contrato pelo qual


se transmite a propriedade de uma coisa (rectius: um direito sobre uma coisa), ou outro direito
(direito de crédito), mediante um preço. Assim, o contrato de compra e venda produz
essencialmente três efeitos principais, são eles, de acordo com o art. 879.º do CCA/P: al. a) a
transferência da propriedade ou da titularidade do direito; al. b); obrigação de entregar a coisa
al. c) obrigação de pagar o preço, que se configuram em efeitos reais e obrigacionais, ou seja,
al. a) - corresponde ao efeito Real que, se reconduz no efeito translativo automático com a
perfeição do acordo contratual e, os dois últimos são efeitos obrigacionais que, se reconduzem
à constituição das obrigações de entregar a coisa e pagar o respetivo preço.

O efeito real da compra e venda decorre dos art. 408.º, 874.º e 879.º todos do CCA/P),
consagra em termos genéricos, a eficácia real dos contratos cujo objecto seja a constituição ou
transferência de direitos reais (de gozo) sobre coisa determinada.

No que toca ao segundo e terceiro efeito, estes nascem das características de


sinalagmatissidade que esses contratos têm. Isto é, estes contratos geram obrigações para
ambas as partes envolvidas no contrato. Por um lado, para um dos lados nasce a obrigação de
entregar a coisa objecto do contrato e para o outro gera a obrigação de pagar o preço.

Nesta característica temos bem presentes as obrigações fundamentais do contrato de


compra e venda a esse respeito, importa no entanto esclarecer que, a transferência da
propriedade é por isso primeiro efeito, não está sujeito ao cumprimento desses dois últimos
efeitos, isto porque a propriedade se transfere por mero efeito do contrato.

Quanto a entrega da coisa em particular se atentarmos o art. 882.º do CCA/P, a coisa


deve ser entregue no estado em que se encontrava no tempo da venda. Quanto a
contemporaneidade desta entrega, esta deve ser feita de forma a dar ao comprador a posse
efectiva, quer isto dizer que deve ser-lhe dada posse e detenção do objecto do contrato. A este
respeito Fernando Lima, João Antunes Varella diz “o dever de investir o comprador na posse
efectiva (ou seja, na posse e na detenção) dos direitos transmitidos, para que este os possa fluir
plenamente17”.

17
Sg-advogados.pt. Dra. Ana Eduarda Gonçalves, Advogada Estagiária.
11
Quanto ao lugar da prestação esclarece-nos o art. 772.º do CCA/P, que faltando a
estipulação em contrário o lugar da restituição deverá ser o lugar do domicílio do devedor.

Por fim, importa referir que, o que foi dito até aqui se refere ao normal funcionamento
desse tipo de contrato, no entanto pode acontecer que alguma das partes não cumpra com a sua
obrigação. Nestes casos temos, a excepção de não cumprimento presente nos arts. 428.º e ss.
do CCA/P.

Relativamente ao preço, uma das outras obrigações geradas neste âmbito a lei permite
a liberdade das partes nesta fixação. Não se exige uma reciprocidade preço fixado e preço real.
Esta liberdade é sempre no entanto algo balizada por institutos como, art. 400.º do CCA/P, que
nos indica as regras gerais da determinação da prestação, bem como os negócios usuários do
art. 282.º do CCA, neste âmbito surgem ainda institutos como o da falta do pagamento do preço
art. 886.º do CCA, tempo e lugar do pagamento do preço (art. 885.º do CCA/P).

1.5. Modalidades Específicas

A natural e tendencial tipicidade de conteúdos nos contratos de compra e venda permite


detectar uma multiplicidade de situações, mas faremos somente referência a modalidade da
venda a prestações, tendo em conta o objecto do nosso estudo.

2. Venda a Prestações
2.1. Noção e Aspectos Gerais

A venda a prestações é aquela cuja, obrigação de pagamento é definida e repartida no


tempo. Ou seja, na venda em prestações, o pagamento do preço é feito rateadamente, o preço
devido corresponde a uma obrigação unitária que, todavia, foi dividida e escalonada no tempo
no que respeita o seu cumprimento.18

A compra e venda a prestações vem regulada nos arts. 934.º e ss do CCA/P, e


corresponde a tipo de venda a crédito. A expressão venda a prestações não retrata de modo
rigoroso esta modalidade de compra e venda. A prestação é uma só como uma só dívida. A
realidade a que se dá o nome de prestações traduz antes parcelas de uma prestação. Deste modo,
as vendas a prestações não passam de negócios doptados de prestação dividida ou fraccionada.

18
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 87.
12
A modalidade da venda em prestações teve uma grande importância prática facilitando
a transmissão de bens que são entregues ao comprador antes do pagamento integral do preço.
Por vários motivos, em particular de ordem económica numa determinada conjuntura, essa
relevância prática foi limitada19. O facto de no preço estarem abrangidas todas as quantias a
pagar pelo comprador ao vendedor como efeito da alienação, mesmo se se tratar apenas de
despesas, juros ou outras importâncias.

A compra e venda a prestações implica o estabelecimento de dois regimes especiais, de


certo modo diversos das regras gerais. Primeiro em relação ao regime especial da compra e
venda, estabelecido no art. 886.º do CCA/P e o segundo relativo ao regime geral das obrigações
estabelecido no art. 781.º do CCA/P.

2.2. Regime

Nos termos do art. 886.º, por falta do pagamento do preço, salvo cláusula em contrário,
não possibilita ao vendedor resolver o contrato de compra e venda, mesmo que esse não
cumprimento seja definitivo, se já foi transferido o direito sobre a coisa e feita a entrega desta.

No art. 934.º do CCA, atento o facto de o direito não ser ter transferido por via da
cláusula de reserva de propriedade, admite que a falta de pagamento do preço constitua causa
de resolução do contrato. Assim sendo, esta regra constante do art. 934.º do CCA/P representa
uma concretização do regime especial do art. 886.º do CCA/P, só que, a solução supletiva e
naquela imperativa20.

Debate-se a natureza supletiva ou imperativa do art. 934.º do CCA/P, atento o facto de


na parte final do preceito se estatuir de forma ambígua, ser a regra aí definida aplicável sem
embargo de convenção em sentido oposto. Todavia a imperatividade do preceito tem sido
defendida, de forma esmagadora a nível doutrinal. O facto de o art. 934.º do CCA/P ter um
sentido restritivo do regime geral e de visar defender o comprador perante o vendedor dos
perigos e seduções da venda a prestações.

Para Pires de Lima e Antunes Varela defendem que, não havendo reserva de
propriedade, mesmo perante a entrega da coisa, julgam nada obstar a que os contraentes no

19
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 86-87.
20
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 88.
13
acordo negocial, preverem uma cláusula resolutiva para a hipótese de o comprador faltar ao
pagamento de alguma prestação, mesmo se de valor igual ou inferior a uma oitava parte do
preço.

Já Pedro Romano Martinez, manifesta-se em sentido inverso por entender que, dada a
imperatividade do art. 934.º, não parecer poder ser ajustada uma compra e venda sem reserva
de propriedade, mas com entrega da coisa, com cláusula de resolução para a hipótese de falta
de pagamento pelo comprador21. Pedro de Albuquerque diz, não fazer sentido não aplicar a
limitação do art. 934.º do CCA/P, às situações de ausência de reserva de propriedade.

Já o prof. Francisco R. Rocha manifesta-se, no sentido de que, a expressão sem embargo


de convenção em contrário in fine do art. 934.º do CCA/P, por ser uma questão linguística, de
lógica formal, não podemos através dela chegar a uma solução jurídica satisfatória; devemos,
por conseguinte, perscrutar a ratio da norma – ora, esta vale para corrigir uma assimetria
contratual, para proteger o devedor do preço, em termos não dissímiles daquilo que vemos
ocorrer no hodierno ou mais recente Direito do consumidor, logo trata-se de norma imperativa.

Vai mais longe o prof. Francisco R. Rocha ao afirmar que, nos termos do art. art. 934.º
do CCA/P, vendida a coisa a prestações, com reserva de propriedade, e feita a sua entrega ao
comprador, a falta de pagamento de uma só prestação que não exceda a oitava parte do preço
não dá lugar à resolução do contrato, nem sequer [a mesma falta], haja ou não reserva de
propriedade, importa a perda do benefício do prazo relativamente às prestações seguintes, sem
embargo de convenção em contrário.

Diz ainda o prof. Francisco R. Rocha, citando os profs. Vasco da Gama Lobo Xavier,
Nuno M. Pinto Oliveira e Pedro de Albuquerque que, a exigência de entrega da coisa não faz
sentido se estiver em causa apenas exigibilidade antecipada, ou seja, a regra da não
exigibilidade antecipada por falta de pagamento de 1 (uma) prestação inferior a 1/8 do preço
vale para vendas a prestações com ou sem entrega da coisa ao comprador, pois a interpretação
literal desprotegeria comprador no confronto com adquirente favorecido pela traditio, apesar
de a omissão do comprador com entrega ser até mais censurável, por já estar avantajado pela

21
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos. 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão. Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 88.

14
entrega, e concederia, sem fundamento plausível, uma protecção diferenciada ao vendedor
segundo tivesse ou não procedido a entrega (podendo até levar a situações fraudulentas).

Ainda nas lições do prof. Francisco R. Rocha, a falta de pagamento de 1 prestação


superior a 1/8 do preço total ou de 2 ou + prestações acumuladas (independentemente do seu
valor), o credor não pode, todavia, resolver o negócio, se o não cumprimento parcial, atendendo
ao seu interesse, tiver escassa importância.

Tal como sucede nos casos previstos nos arts. 934.º e 801.º n.º 2 e 802.º todos do CCA/P,
restringe 801.º n.º 2 e 802.º do CCA, ao impedir que falta de pagamento de 1/8 do preço seja
motivo de resolução; mas o inverso não é verdade, ou seja, se a falta de pagamento for superior
a 1/8 do preço, deixa de funcionar restrição do 934.º ao 801.º n.º 2 e 802.º e passam a aplicar-
se digamos plenamente os 801.º n.º 2 e 802.º, cuja luz deve a questão ser analisada em termos
gerais. Por conseguinte se o vendedor quiser resolver, em caso de falta de 1 prestação superior
1/8, basta-lhe exigir as restantes prestações em falta, fixando prazo e, se devedor não cumprir,
incorre em mora quanto a todas (tratando-se de incumprimento total, não parcial, não está
sujeito ao 802.º n.º 2 do CCA/P, aplicando-se, depois, em caso de incumprimento definitivo, o
801.º n.º 2 que permite a resolução)

Vendida a coisa sem reserva de propriedade, a falta de pagamento de 1 prestação igual


ou inferior a 1/8 do preço total permite ao vendedor resolução do contrato nos termos do 886.º
do CCA? Quanto a essa questão esclarece o prof. Francisco R. Rocha, não existir razão
atendível para tratar diversamente a possibilidade de resolução da venda a prestações consoante
tenha havido, ou não, reserva de propriedade (aplicação analógica do 934.º do CCA/P); se o
vendedor, dotado da propriedade de um bem, não pode resolver, por força do artigo 934.º, o
contrato, a não ser perante as situações de inadimplemento qualificadas por este preceito, então,
a aceitação da possibilidade de o alienante, já desprovido da propriedade, proceder à resolução
do contrato em razão de falhas de menor relevância envolveria uma profunda contradição
valorativa.

Chegamos, pois, com fundamentação diversa, a resultados iguais aos propostos pelos
mais diversos autores aqui estudados, no sentido a inadmissibilidade da convenção de uma
cláusula de resolução na compra e venda a prestações, com entrega da coisa, mas sem reserva
de propriedade, para a hipótese de se não se assistir a um incumprimento de uma prestação
superior à oitava parte do preço ou à falta de duas independentemente do seu valor.

15
2.3. Cláusula Penal

O art. 935.º do CCA, define o regime da cláusula penal na eventualidade de o comprador


não cumprir com o estipulado no contrato. A estipulação de uma cláusula penal é admitida para
os diversos contratos, e de forma geral, no art. 810.º do CCA/P, como meio prévio de fixação
de uma indemnização pelo não cumprimento das obrigações.

Por força do disposto no art. 935.º do CCA/P, a indemnização estabelecida em cláusula


penal, por o comprador não cumprir, não pode ultrapassar metade do preço, salva a faculdade
de as partes estipularem, nos termos gerais, a ressarcibilidade de todo o prejuízo sofrido22 (art.
935.º n.º 2, do CCA/P).

A indemnização fixada pelas partes será reduzida a metade do preço, quando tenha sido
estipulada em montante superior, ou quando as prestações pagas superem este valor e se tenha
convencionado a não restituição delas; havendo, porém, prejuízo excedente e não se tendo
estipulado a sua ressarcibilidade, será ressarcido até ao limite da indemnização convencionada
pelas partes.

Se os prejuízos forem superiores a metade de preço e as partes não tiverem estipulado


a ressarcibilidade de todos os danos o vendedor será compensado até ao limite da indemnização
pactuada pelos contraentes, mesmo se ultrapassar metade do preço. Isto exprime passar a
cláusula penal superior a metade do preço depois de reduzida, a funcionar como um teto ou
limite máximo de indemnização de todos os prejuízos sofridos pelo vendedor.

Assunto debatido é o de saber se a limitação estabelecida no art. 935.º do CCA/P, vale


para toda a situação de incumprimento ou apenas para as situações de resolução pelo vendedor.

A favor da ideia de o art. 935.º do CCA, limitar tão-só a cláusula penal na eventualidade
de se resolver o contrato, o prof. Francisco R. Rocha, defende com base nas seguintes teses.

i. 1.ª tese - 935.º do CCA/P, só se aplica à resolução, pois 806.º do CCA/P, vale para obrigações
pecuniárias e 935.º não derroga o regime geral do 806.º do CCA/P: (1) não é aceitável o vedado
na venda comum (i.e. sujeitar o contraente que incumpriu a obrigação de pagar o preço a uma
indemnização diversa da dos juros 806.º do CCA/P) ser admitido na venda a prestações, onde
há especial protecção do comprador (ou seja, caso exigido cumprimento, pressupondo

22
Cfr. ROCHA, Francisco Rodrigues. Direito dos Contratos – Material de Apoio, in aulas no Curso de Mestrado
da Universidade Lusíada de Angola - Benguela, Lobito: 2023.
16
mora/exigibilidade antecipada, o que se está a dizer é que a indemnização = juros moratórios
do 806.º do CCA/P, não podendo haver cláusula penal nem, muito menos, a sua redução, pois
solução do 806.º é imperativa); (2) 935.º/2 mostra que o subjacente ao 935.º é apenas a
indemnização na eventualidade de resolução do contrato (V. Lobo Xavier).

ii. 2.ª tese - mais literalista ambas resolução e qualquer incumprimento/exigência do


cumprimento: 806.º do CCA/P, não é imperativo (P. Lima/A. Varela).

iii. 3.ª tese - que, não sendo literalista, acaba por ir ao encontro da letra da lei problema: a
doutrina parece partir do pressuposto de que a cláusula penal tem sempre uma mesma natureza
deve, todavia, distinguir-se perante o tipo de cláusula penal em causa.

2.4. Aplicação do regime da compra e venda a prestações a outros


contratos

O regime estabelecido para a compra e venda a prestações vale para todos os contratos
pelos quais se pretende obter um resultado semelhante (art. 936.º do CCA/P). Sejam eles
contratos atípicos, como a troca e a venda a em grupo, como a doação em cumprimento23.

A norma constante no art. 939.º do CCA/P, deve ser entendida no sentido de alem da
previsão estabelecida no art. 939.º do CCA/P, isto traduz valer também o regime da venda a
prestações em relação a contratos donde não resulte a transmissão onerosa de bens, como
sucede na empreitada é, inclusive frequente acordar-se o pagamento do preço a prestações24.

Ainda quanto a aplicação extensiva do regime da compra e venda a prestações, há que


aludir ao facto de nas situações jurídicas análogas raramente se estipular a reserva de
propriedade, mas isso não obsta a validade da extensão do regime.

23
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos. 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 92.
24
Cfr. MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações, Parte Especial-Contratos, 2.ª Edição, 3.ª
Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007, p. 92.

17
Conclusão

Como decorre do que atrás ficou exposto, a doutrina Angolana acolhe a doutrina
Portuguesa em considerar o contrato como um acordo de vontade. Assim, o regime da venda
em prestações em Angola é também unânime a venda a prestações no direito privado
Português. Ou seja, o regime estabelecido para a compra e venda a prestações vale para todos
os contratos pelos quais se pretende obter um resultado semelhante (art. 936.º do CCA/P).
Sejam eles contratos atípicos, como a troca e a venda a em grupo, como a doação em
cumprimento.

A venda em prestações é, sem dúvidas, uma das formas mais utilizadas pelos
consumidores. Nos últimos tempos a maioria da população angolana recorre a este tipo de
contrato para adquirir certos bens, por diversas causas nomeadamente: a constante
desvalorização da moeda nacional, a falta de fundos suficientes para a compra de um produto,
a escassez de bens materiais e monopólio acentuado. Um exemplo flagrado é a venda resolúvel
que, tem sido recorrente pelo surgimento de vários condomínios nas mais diversas cidades de
Angola.

O somatório de todas as prestações com juros é superior ao valor do bem se este fosse
adquirido totalmente no mesmo momento. Porém, isto pode não ser visto como uma
desvantagem pois os consumidores ao realizarem uma compra a crédito, pagam uma quantia
muito mais baixa e diferida no tempo, até a sua dívida ficar saldado, detendo já a propriedade
do objecto e, ao contar com as prestações que faltam pagar, podem gerir melhor as suas contas.

Chegamos, pois, com fundamentação diversa, a resultados iguais aos propostos pelos
mais diversos autores aqui estudados, no sentido a inadmissibilidade da convenção de uma
cláusula de resolução na compra e venda a prestações, com entrega da coisa, mas sem reserva
de propriedade, para a hipótese de se não se assistir a um incumprimento de uma prestação
superior à oitava parte do preço ou à falta de duas independentemente do seu valor.

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BIBLIOGRAFIA

COSTA, Mário Júlio de Almeida. Direito das Obrigações 12.ª Ed. Revista e
actualizada. Coimbra: 2010.

LEITÃO, Luís Manuel Telles de Meneses. Direito das Obrigações, Vol. I 11.ª Ed.
Almedina Editora, Coimbra: 2011.

MARTINEZ, Pedro Romano. Direito das Obrigações. Parte Especial-Contratos, 2.ª


Edição, 3.ª Reimpressão, Almedina Editora, Lisboa: 2007.

MANUEL, Augusto Guerra. Contrato-Promessa de Compra e Venda em Angola.


Dissertação de Mestre em Direito na área de Ciências-jurídicas: Universidade Autónoma de
Lisboa, Lisboa: 2014.

PINTO, Carlos Alberto da Mota. Teoria Geral do Direito Civil. 4.ª Ed. Coimbra
Editora 2007.

ROCHA, Francisco Rodrigues. Direito dos Contratos – Material de Apoio, in aulas


no Curso de Mestrado da Universidade Lusíada de Angola - Benguela, Lobito: 2023.

Sg-advogados.pt. Dra. Ana Eduarda Gonçalves, Advogada Estagiária.

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