Você está na página 1de 14

P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

UNIARA - Curso de Direito – 3ª Série – “Disciplina de Direito Civil – Contratos I”.

Períodos Diurno e Noturno: Prof. Marco Aurélio Bortolin

Aulas 1 e 2 (sinopse): I - Orientação geral sobre a disciplina. 1. Mensagem introdutória e objetivos para a disciplina. 2.
Conteúdo da disciplina “Contratos I”. 3. Sítio eletrônico de apoio e bibliografia básica. 4. Aulas e avaliações. 5. Contato
com o professor. II. Direito dos Contratos I - Visão geral. 1. Enfoque inicial. 2. Localização, conceito atual e distinção. III.
Pressupostos. 1. Enfoque principal. 2. Pressupostos de existência. 3. Pressupostos de validade. 4. Elementos de eficácia.
5. Conclusão.

I) Orientação geral sobre a disciplina.

1. Mensagem introdutória e objetivos para a disciplina. O Direito


dos Contratos se constitui em uma importantíssima parte do Direito Civil, sobretudo, porque o estudo
dos contratos habilita o alunado a aplicar concretamente na análise de uma relação jurídica grande
parte dos fundamentos já estudados na Parte Geral e na Teoria Geral das Obrigações antes analisados
no Código Civil pelas respectivas disciplinas do Curso de Direito, e ao mesmo tempo, prepara os
estudantes para o futuro estudo dos Direitos Reais, do Direito de Família e até do Direito das
Sucessões, todos de alguma forma ligados a temas dos Contratos em Geral (regras gerais) ou dos
Contratos em Espécie (tipos de contratos), além de se tratar de matéria fundamental para o correto
entendimento dos negócios jurídicos de consumo, que serão estudados pelo alunado do Curso de
Direito da UNIARA.

Para tanto, a presente disciplina, de acordo com seu plano de ensino,


alinha como objetivos centrais:

a) tornar o alunado capaz de compreender o Direito dos Contratos de


forma ampla, e de perceber a correspondência dessa disciplina e os demais ramos do Direito Civil,
além de servir de pressuposto para o estudo da disciplina de Direito do Consumidor;

b) transmitir ao alunado a importância do Direito dos Contratos na


atualidade, através de uma nova visão mais alinhada aos preceitos constitucionais e informada por
princípios contemporâneos, em razão de sua aplicação extremamente frequente nas relações humanas
cotidianas de vida em sociedade;

c) demonstrar que embora extenso, o Direito dos Contratos é passagem


indispensável para a preparação do alunado para a vida prática no Direito, já que nas mais variadas

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

1
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

carreiras jurídicas os futuros profissionais do Direito estarão diante de lides constantes em torno da
formação, desenvolvimento e conclusão dos contratos, o que somente indica a importância crescente
do conhecimento dessa disciplina para o corpo discente.

2. Conteúdo da disciplina “Contratos I”. A disciplina de “Direito


Civil – Direito dos Contratos I” é dividida em dois eixos centrais: a) “Teoria Geral dos Contratos”
(temas correlatos no Código Civil em sua integralidade); e b) início do estudo dos “Contratos em
Espécie” (mais precisamente os contratos geradores da obrigação de transmissão de bens – compra
e venda, troca e doação).

3. Sítio eletrônico de apoio e bibliografia básica. Para o


desenvolvimento de nossas aulas, contaremos com o apoio de website do professor
(www.marcobortolin.com.br) e da ferramenta Google Classroom®, e a finalidade é ampliar a
possibilidade de acessos aos temas das aulas e avaliações, com a disponibilização de resumos de aulas
expositivas, notícias, exercícios práticos e avisos. Outrossim, recomenda o professor, para melhor
absorção dos conteúdos e como simples opções (sem censurar qualquer outra), algumas obras básicas
constantes do plano de ensino da disciplina, a saber:

a) Novo Curso de Direito Civil, volume 4 / Pablo Stolze Gagliano e


Rodolfo Pamplona Filho – 3ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2020;

b) Direito Civil – Contratos, volume III / Silvio de Salvo Venosa – 19ª


ed. - Rio de Janeiro: Forense, 2019;

c) Direito Civil – Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie,


volume 3 / Flávio Tartuce – 15ª. ed. – Rio de Janeiro: Forense, 2020;

d) Direito Civil Brasileiro – Contratos e Atos Unilaterais, volume 3 /


Carlos Roberto Gonçalves - 17ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2020.

4. Aulas e avaliações. A disciplina de Direito dos Contratos I da


UNIARA é semestral, com duas provas bimestrais. Ademais, comumente são sugeridos exercícios
que simulam casos práticos visando desenvolver no alunado a rotina de dissertar sobre temas expostos
em sala de aula, mas aplicados em determinadas situações cotidianas, e tais exercícios são
contabilizados nas notas bimestrais em conjunto com as notas das provas. Outro fator relevante pode
ser destacado para a proximidade entre o conteúdo ministrado nas aulas presenciais e os objetivos

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

2
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

pretendidos pelo professor com as avaliações, o que recomenda preocupação com a frequência e
aproveitamento das aulas com a resolução de dúvidas. Outrossim, relembro aos alunos e alunas que
se faz imprescindível que as aulas sejam acompanhadas com o Código Civil (Lei nº 10.406/2002)
para maior aproveitamento e reflexão sobre a correta interpretação dos dispositivos legais.

5. Contato com o professor. Gostaria, ainda, encarecidamente, de


solicitar que eventuais requerimentos individuais ou coletivos sejam formulados exclusivamente
através de requerimento escrito simples protocolado no Departamento de Direito, ou por mensagem
eletrônica dirigida também ao Departamento de Direito (direito@uniara.com.br), que serão
respondidos e encaminhados pelas funcionárias do próprio Departamento de Direito ao professor, e
que também se incumbirão de dar o consequente feedback aos requerentes. Desejo a todos(as) um
excelente ano letivo que se inicia, com ótimos estudos e excelente aproveitamento!

II. Direito dos Contratos I - Visão geral.

1. Enfoque inicial. Inegavelmente, o contrato representou, desde as


civilizações mais remotas, um instrumento indispensável para garantir o bem-estar do homem. Por
óbvio, tal como o homem, nas insipientes formações coletivas humanas, os contratos se estabeleceram
como veículos sociais bem simples e igualmente rudimentares como normalmente nos lembramos
dos escambos, das trocas de bens materiais (caça, peles, etc) em sociedades tribais.

Ocorre, no entanto, que em decorrência do desenvolvimento da


sociedade, ainda na Antiguidade, percebeu-se através das mais desenvolvidas, que o contrato era,
além de veículo para a satisfação das necessidades individuais, um importante elo mantenedor das
grandes civilizações que se formaram na Antiguidade, e o melhor exemplo disso, embora não o único,
se dá pela identificação da noção jurídica mais específica do contrato no Direito Romano no Século
VI d.C, ou seja, com a distinção entre o simples acordo entre particulares (conventio) e o contrato
(ainda inominado) gerador de obrigação formal, dotada de ação correspondente (contractus), através
do Código de Justiniano1, em Constantinopla (Império Romano do Oriente), datado do ano de 534.

1
Novus Justinianus Codex

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

3
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

Sabemos, outrossim, que após a desestruturação e queda do Império


Romano do Ocidente, a crise que se seguiu foi a do homem em sociedade, e é claro que embora o
contrato não tenha desaparecido, com a desestruturação das sociedades obedientes a uma ordem
estatal central, igualmente o contrato cedeu sua importância, perdendo em conjunto com outros
valores jurídicos sua vinculação e obrigatoriedade indispensáveis. Mesmo assim, ao longo da Idade
Média, o contrato seguiu reconhecido pelos povos europeus que aplicavam o direito romano e o
direito canônico, e com o passar do tempo ganhou um aspecto importante que se verifica até os dias
atuais, que é a sua preponderância escrita.

Como breve resumo, destacamos:


“[...] No Direito Romano, convenção e pacto eram conceitos equivalentes e
significavam o acordo de duas ou mais pessoas a respeito de um objeto determinado. O simples acordo, convenção ou
pacto, porém, não bastava para criar uma obrigação juridicamente exigível. O simples pacto não criava a obrigação. Essa
noção, que vem do Direito clássico, atinge a época de Justiniano. Para que se criasse uma obrigação, havia necessidade
de certas formas que se exteriorizassem à vista dos interessados. A solenidade dava força às convenções. Cada uma
dessas convenções, sob certas formalidades, constituía um contractus. Não conhecia, portanto, o Direito Romano uma
categoria geral de contrato, mas somente alguns contratos em particular. O elemento subjetivo da vontade só vai
conseguir sobrepujar o formalismo representado pela exteriorização de fórmulas na época de Justiniano, quando de certo
modo se unifica o conceito de contrato com o de convenção. Não chegou, porém, a ser uma identificação completa. Afora
os contratos formais, em época posterior passaram a ser conhecidas outras figuras: os contratos reais (depósito,
comodato, mútuo e penhor) e os consensuais (venda, arrendamento, mandato e sociedade). Posteriormente, na história
romana, foram sendo reconhecidos outros pactos, que se utilizavam para certos negócios. Só com Justiniano é que se
confere uma ação (actio praescriptis verbis) para qualquer convenção entre as partes (contratos inominados). À parte
prejudicada não bastava provar a existência do contrato; devia provar que cumprira uma prestação. Como vemos, a
vontade era colocada em segundo plano. A proteção dependia mais do interesse do que da vontade. A intervenção do
pretor mostrou-se importante no preenchimento das lacunas do ordenamento. De qualquer modo, qualquer convenção
poderia tornar-se obrigatória, se revestida das formalidades legais da stipulatio. Isso criou a tendência de aumentar as
convenções vinculativamente obrigatórias. Na fase final da codificação, já o que importa para a validade do contrato é a
conventio, o acordo de vontades, ficando acima das formalidades. Quando da queda do domínio romano, o Direito
Germânico é um direito menos avançado que o Direito Romano, estando dominado pelo simbolismo. Para se obrigar, há
necessidade de um ritual. Esse procedimento simbólico conserva-se até a alta Idade Média (Iturraspe, 1988:25). As
práticas medievais evoluem para transformar a stipulatio romana na traditio cartae, o que indica a entrega de um
documento. A forma escrita passa, então, a ter predominância. A influência da Igreja e o renascimento dos estudos
romanos na Idade Média vêm enfatizar o sentido obrigatório do contrato. Os costumes mercantis dinamizam as relações
e tendem a simplificar as formas contratuais. Com a escola do direito natural, assimilam-se os pactos e convenções aos
contratos” (VENOSA, Sílvio Salvo. Direito Civil - Vol. 3 - Contratos, 18ª edição. Atlas, 12/2017. VitalBook file, p.4/5).

Novamente, para a correta demonstração da evolução histórica do


contrato, citamos:

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

4
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

“[...] Foi em Roma que mais resplandeceu o direito. A partir do Século V antes de
Cristo, iniciaram a fluir importantes leis, como a Lex Plaetoria, de 490 a. C., formando o jus civile e o optimum jus civium
romanorum, culminando a Lex duodecim Tabulorum, de 303 a. C., a qual representou a vitória dos tribunos da plebe
contra os representantes do patriarcado. Foi justamente na Tábua VI que apareceu a origem da obrigação e do contrato,
ao consignar a norma cum nexum faciet mancipiumque uti lingua nuncupassit ita jus esto. O vocábulo nexum exprime um
elo, uma cadeia, significando, também, contrato. O conceito de obrigação emana desta regra, induzindo a concluir que o
credor podia dispor do corpo de seu devedor no caso de impontualidade ou de inadimplemento da obrigação. Até chegar
ao Corpus Juris Justiniano, que representa o momento supremo do direito romano, ficou bem consolidado o conceito de
contrato, que o gênio jurídico dos romanos distinguiu em três formas: a convenção, o pacto e o contrato propriamente
dito. Segundo ensinava Ulpiano, a convenção era um termo geral, que abrangia o pacto e o contrato. Definia-se como o
assentimento de duas ou mais pessoas para formar entre elas algum compromisso, ou para resolver, ou solucionar
qualquer obrigação. [...] Pacto compreendia as convenções não sancionadas pelo direito civil, despidas de ação e de
força obrigatória – ou pactum est duorum consensus at que conventio. O contrato referia-se às convenções previstas e
reconhecidas pelo direito civil, dotadas de força obrigatória e providas de ação. [...] Com o direito canônico, o contrato se
firmou, assegurando à vontade humana a possibilidade de criar direitos e obrigações. Surgiu o princípio pacta sunt
servanda. A teoria da autonomia da vontade humana foi desenvolvida pelos enciclopedistas, filósofos e juristas que
precederam a Revolução Francesa e afirmaram a obrigatoriedade das convenções, equiparando-as, para as partes
contratantes, à própria lei. Os jusnaturalistas levaram o contratualismo a um grande realce. Rousseau baseia no contrato
a própria estrutura estatal. O contrato não apenas se limita a criar obrigações, mas vai além, ao criar, modificar ou
extinguir, inclusive, os direitos reais” (RIZZARDO, Arnaldo. Contratos, 17ª edição. Forense, 01/2018. VitalBook file, p.
8/9).

Sentimos, portanto, que as fontes do Direito Romano não informaram


apenas o estudo do contrato na Idade Média.

Como podemos notar na citações doutrinárias acima invocadas, o


Iluminismo buscava alçar seus ideais de liberdade, igualdade e fraternidade como novo norte de uma
nova forma de sociedade e de Estado, abolindo os excessos da monarquia e o empobrecimento do
povo, e através do desenvolvimento do pensamento jurídico que embasou a própria Revolução
Francesa (1789/1799), resgataram os juristas da época diversas fontes do antigo direito dos romanos
para acoplar ao conceito de liberdade, de consolidação popular desta, o contrato como elemento
fundamental para a conquista da propriedade, do respeito à herança como bem individual, de outros
direitos das coisas e de família.

O contrato, portanto, como instituto jurídico alçado ao patamar de lei


particular, ou seja, dotado de obrigatoriedade e vinculação extremas, surge com o Código de
Napoleão (1804), tornando-se base das legislações europeias e latino americanas que se seguiram à
Revolução Francesa.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

5
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

A Revolução Industrial que surgiu na Europa no Século XIX transforma


não apenas o modelo econômico das nações desenvolvidas da época, mas a própria sociedade, e o
Liberalismo vê no contrato uma pilastra segura para garantir o maior desenvolvimento econômico,
mesmo com o sacrífico dos trabalhadores, mas gerou em razão disso uma revisão paulatina do
pensamento jurídico em torno do instituto do contrato desde então até os dias atuais.

Esse é um divisor de águas entre as noções jurídicas moderna e a


contemporânea do instituto do contrato.

O contrato contemporâneo continua a servir para circular riquezas,


transferir bens, otimizar a vida em sociedade, agilizar os negócios e conferir segurança aos celebrantes
do pacto contratual, mas não por sua força obrigatória deve servir de mecanismo para opressão
econômica, ou como máscara ou ferramenta legalizada para a imposição desmedida do forte contra o
fraco econômico ou social apenas por gerar vinculação entre as partes.

Atualmente, a força jurígena do contrato, qual seja, a de criar pela força


humana a obrigação, encontra limites na dignidade da pessoa humana, nos direitos sociais, e na
concepção de que o contrato deve ser legal, mas também justo de acordo com o segmento econômico
em que se situa. Obrigatório, mas justo.

2. Localização, conceito atual e distinção. Atualmente, forçoso é


reconhecer que a complexidade e importância do contrato atingiram um nível elevadíssimo, sobretudo
em razão da forma e frequência dos contratos de consumo, da complexidade e importância econômica
dos contratos empresariais, e sem dúvida, na garantia e efeitos jurídicos que os contratos entre
particulares e os de consumo propiciam, mormente para a criação e estabilização de direitos.

Necessário, assim, reconhecer que para o estudo do Direito Civil, a


Teoria Geral dos Contratos é fundamental, já que esta materializa a própria obrigação antes estudada,
exige simultâneo conhecimento dos fundamentos da Parte Geral do Código Civil, e acaba por ser
invariavelmente utilizado para o exercício da propriedade, posse, direitos reais de garantia no Direito
da Coisas, além de também incidir no estudo do Direito de Família e no Direito das Sucessões.

Mas para iniciarmos nosso estudo, importante investigarmos a


localização do estudo do contrato na organização sistêmica do Direito Privado no ordenamento
jurídico.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

6
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

Nesse prisma, não podemos esquecer que o Direito Privado pode ser
dividido em dois grandes ramos, quais sejam, o primeiro, consistente em direitos privados não
patrimoniais, que são aqueles notadamente referentes ao estado e personalidade da pessoa humana, e
o segundo, consistente em direitos patrimoniais, ou seja, de expressão ou valor econômico direto ou
indireto, que por sua vez se dividem em direitos pessoais ou obrigacionais (contratuais) e direitos
reais (das coisas).

Basicamente, os direitos reais, notadamente erga omnes, recaem


diretamente sobre as coisas, vinculando essas ao seu titular, que passa a deter sobre as mesmas as
prerrogativas de sequela e preferência, ao passo que os direitos obrigacionais, caracterizam-se por
seu efeito inter partes, e conferem ao credor o direito de exigir do devedor determinada prestação, e
neste campo dos direitos pessoais ou obrigacionais, evidente é a correlação entre os já estudados
negócio jurídico e obrigação e o agora visado contrato, pois trata-se o contrato do melhor exemplo
do primeiro (negócio jurídico) e principal fonte de criação da segunda (obrigação).

Sabemos também, que a obrigação é a relação jurídica através da qual


alguém se compromete a dar, fazer ou deixar de fazer algo em favor de outrem, de forma tal que, caso
não observe a estipulação voluntariamente, poderá ser compelido patrimonialmente a honrar o
compromisso.

Na relação obrigacional, o liame, o vínculo estabelecido entre as partes


é admitido e regulado pela lei, e por tal razão recebe proteção do ordenamento e reconhecimento do
Estado Juiz, na medida em que tal poder obrigacional é dotado de sanção. Do vínculo obrigacional,
decorre a dívida e a responsabilidade para o sujeito passivo.

Os alunos e alunas do Curso de Direito, por certo, devem conhecer


desde o estudo da Parte Geral do Código Civil a importância da correlação entre o negócio jurídico e
a obrigação, unindo seus conceitos e regramento.

Basicamente, portanto, podemos conceituar com total segurança que o


contrato é via criadora privada da obrigação, viabilizando a constituição do negócio jurídico
desejado, cujos efeitos são exatamente os almejados pelas partes celebrantes e admitidas pelo
Direito, o que concede reconhecida força jurígena (de criação jurídica) ao resultado visado pelos
contratantes.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

7
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

Na visão clássica de Caio Mário da Silva Pereira o “contrato é um


acordo de vontades, na conformidade com a lei, e com a finalidade de adquirir, resguardar,
transferir, conservar, modificar ou extinguir direitos” (Instituições de Direito Civil, V.III, , 8ª ed.,
Rio de Janeiro: Forense, 1990). Sim, inegavelmente. No entanto, sob a moderna ordem
constitucional vigente, o contrato aparece mais socializado em sua estrutura, como podemos notar no
sentido que se extrai dos artigos 113, 421 e 422, todos do Código Civil, e que atualmente é repercutido
pela melhor Doutrina2.

Aliás, ainda como uma visão apenas geral, devemos lembrar que a ideia
de contrato é utilizada em acepções distintas na experiência prática cotidiana, ora para designar o
negócio jurídico gerador de obrigações, ora para designar o instrumento em que se formaliza o acordo
de vontades. No plano teórico, contudo, por contrato devemos entender apenas o negócio jurídico
propriamente havido por acordo de vontades provido de força jurígena, ou seja, capaz de criar direitos
ou obrigações, ao passo no plano fático sua materialização em escrito público ou particular, ou ainda
por comunicação verbal ou mímica, deve ser tido como o instrumento contratual. Esse instrumento
contratual que todos nós conhecemos e em especial em forma escrita, normalmente é composto de
duas partes, denominadas de preâmbulo e contexto. O preâmbulo apresenta as partes contratantes e
indica a natureza do negócio jurídico, ao passo que o contexto encerra todas as cláusulas que contém
as disposições contratuais específicas.

III. Pressupostos.

1. Enfoque principal. Além do conceito teórico de contrato e da ideia


sobre ser o contrato a mais clara representação de negócio jurídico, cujas vontades emanadas dos
contratantes têm o condão de materializar validamente perante a ordem jurídica os efeitos perseguidos
por seus celebrantes com a criação de direitos e obrigações nas esferas particulares de seus celebrantes
com força de uma autêntica “lei particular”, devemos nos recordar que o contrato, por ser

2
“[...] “negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos princípios da função social e boa-fé objetiva,
autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia de suas próprias vontades” (Novo Curso de Direito
Civil, volume 4 / Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho – 2ª ed. – São Paulo: Saraiva, 2019).

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

8
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

essencialmente um negócio de natureza jurídica, não se distancia jamais da análise sempre obrigatória
de seus elementos essenciais (pressupostos) e de outros, ditos acidentais.

Recordemos, pois, o que já entendíamos como pressupostos do negócio


jurídico (Parte Geral do Código Civil), e que se revela totalmente aplicável ao estudo inicial do
contrato, informado e influenciado pelas lições deixadas pela inigualável obra de Pontes de Miranda3
e pelo que se passou a conhecer como “Escada Ponteana”.

2. Pressupostos de existência. O contrato, como negócio jurídico,


necessita primeiramente existir juridicamente para que as partes contratantes possam alcançar os
efeitos desejados.

Essa existência do negócio contratual de que estamos a mencionar é


extraída sempre da presença de quatro pressupostos indispensáveis, sem os quais o contrato não se
forma e sequer chega a existir (agentes, vontades, forma e objeto), mais precisamente, uma vontade
manifestada, ou seja, não apenas um querer pensado, mas sim, concretamente exteriorizado; agentes
da contratação que venham a externar essa vontade recíproca, o que nos faz perceber a necessidade
de dois ou mais agentes na formação do contrato; um objeto almejado pelos agentes; por fim, uma
forma apta a canalizar a vontade dos agentes que visam atingir certo objetivo.

3. Pressupostos de validade. Por certo, devemos aqui recordar o estudo


do negócio jurídico na Parte Geral do Direito Civil e adequar os conceitos outrora analisados ao
presente estudo do contrato, extraindo da regra basilar do artigo 104, do Código Civil4 os pressupostos
de existência e de validade do negócio jurídico, e, por conseguinte, dos contratos em geral.

Em outras palavras, na elaboração de um contrato, podemos afirmar


com segurança que se for possível identificar as vontades manifestadas por seus celebrantes, seguindo
certa forma em torno de determinado objetivo ou fim, por certo estarão presentes os pressupostos de
existência de um contrato, ou seja, o contrato existirá.

3
PONTES DE MIRANDA, F. C. (1954-1970). Tratado de Direito Privado, 60 Vols. Rio de Janeiro: Borsoi

4 Art. 104, Código Civil. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou
determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

9
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

Mas o contrato será válido, e terá seus efeitos reconhecidos pela ordem
jurídica, sobretudo o efeito de vincular as partes e de apresentar força obrigatória?

Não necessariamente.

A existência jurídica de um contrato, identificada no reconhecimento


de seus pressupostos específicos (agentes, vontades, objeto e forma), não determinará por si apenas
que concretamente o contrato criará, modificará ou extinguirá direitos ou obrigações de forma válida
entre as partes. Para a validade jurídica de um contrato existente, necessário buscar a identificação
de outros elementos essenciais além dos de existência, mais precisamente, os chamados pressupostos
de validade, que, na verdade, são pressupostos qualificadores dos elementos de existência. Os
pressupostos de validade são qualificadores juridicamente obrigatórios dos pressupostos de
existência acima apontados. Vale destacar que doutrinariamente esse alcance dos elementos de
validade se apresenta um pouco mais extenso do que basicamente prevê o artigo 104, do Código
Civil.

Assim, se temos como necessário para a caracterização de existência de


um contrato a manifestação de vontade, faz-se necessário que essa vontade seja manifestada sempre
de maneira livre e de boa-fé (pressupostos de validade que qualificam o pressuposto de existência
“vontade”); se temos como necessário para a caracterização de existência de um contrato a presença
e atuação de agentes contratantes, faz-se igualmente necessário que tais agentes contratantes sejam
capazes e materialmente legitimados para a celebração daquele negócio (pressupostos de
validade que qualificam o pressuposto de existência “agentes contratantes”); se temos como
necessário para a caracterização de existência do contrato um objeto, faz-se também necessário que
tal objeto contratual se revele lícito, possível, determinado ou determinável (pressupostos de
validade que qualificam o pressuposto de existência “objeto”); por fim, se temos como necessário
que a vontade manifestada por agentes em torno de um objeto observe uma forma, faz-se necessário
que essa forma seja adotada como a prescrita (recomendada) ou não defesa (proibida) por lei
(pressupostos de validade que qualificam o pressuposto de existência “forma”).

Sinteticamente, a vontade livre é a vontade que não sofre a turbação, a


alteração, a modificação imposta por um vício de vontade ou de consentimento. Normalmente, o erro
e o dolo são vícios que atuam sobre o verdadeiro querer do contratante, permitindo a exteriorização
da vontade sem que exista exata correspondência entre o querer do agente e a vontade manifestada.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

10
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

Há ainda a coação, que suprime de forma violenta a própria vontade ou


a obriga a ser manifestada, e é por isso que os vícios de consentimento contaminam a validade de um
contrato, já que alteram negativamente o mais elementar pressuposto de validade (ou seja, a alteração
da vontade é imaginada no caso do erro e do dolo, pois em se tratando de certas coações, desaparece
o próprio pressuposto de existência, já que em alguns casos a vontade chega a ser suprimida). Já a
vontade manifestada de boa-fé exige não apenas a aparência formal de correção do negócio, mas
uma sintonia entre a vontade manifestada e o conhecimento que a parte nutre sobre as particularidades
do negócio.

Agente capaz é todo aquele dotado de personalidade jurídica e


capacidade de direito, bem como, de capacidade de fato para a celebração sem necessidade de
representação, apto a adquirir e exercer direitos, assim como de validamente se obrigar. Além da
capacidade, não podemos nos esquecer da legitimidade negocial ou material, que não se confunde
com a legitimidade processual.

Há alguns negócios jurídicos legalmente proibidos para alguns agentes


em razão da posição que ocupam, ou seja, há situações em que agentes plenamente capazes não
podem exercer determinados negócios por razões de ordem moral ou de ordem pública. Exemplos:
a) a venda de um imóvel por um pai a seu filho exige a concordância expressa dos demais filhos, sem
a qual não há legitimidade do comprador e o negócio se torna anulável (artigo 496, Código Civil); b)
um tutor não pode comprar um imóvel do menor tutelado e um juiz não pode comprar um bem sobre
o qual partes litigam no lugar de sua Jurisdição sob pena de nulidade do negócio (artigo 497, Código
Civil.

O objeto lícito é o objeto legal, admitido e permitido pelo Direito para


ser igualmente perante o Direito exigido. O objeto deve também ser possível, ou seja, realizável física
e juridicamente. Por fim, se exige do objeto que o mesmo seja determinado ou determinável,
significando que deve ser individualizado ou apresentar elementos que permitam a sua
individualização desde a sua celebração, o que impede, portanto, cláusulas que permitam um campo
contratual vago a ser preenchido pela vontade exclusiva de uma das partes, como, aliás, veda
expressamente o artigo 489, do Código Civil.

Há contratos cuja forma possível para veicular a vontade é a forma


exigida por lei para maior segurança das partes e da coletividade, como ocorre, por exemplo, com a

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

11
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

compra e venda de bens imóveis. Portanto, a forma deve ser a prescrita em lei quando assim exigido
pela norma, ou a não defesa em lei (não proibida por lei), quando igualmente for assim exigido pela
norma, conforme estabelecem os artigos 107 e 108, ambos do Código Civil, e essa última é a regra,
sem dúvida. A forma não é uma exigência constante na lei civil (mas sim, quase exceções em nosso
cotidiano atual), ao contrário do que víamos na Antiguidade.

4. Elementos de eficácia. Com os pressupostos de existência temos um


contrato palpável, e se restarem identificados ainda nessa análise jurídica os pressupostos de validade
acima destacados, esse contrato existente está apto a gerar efeitos válidos perante a ordem jurídica.
Contudo, embora se presuma que em um contrato existente e válido seus efeitos jurídicos são
irradiados automaticamente (plano da eficácia jurídica), sabemos que os contratantes poderão, em
querendo, alterar o plano da eficácia os efeitos do contrato, desde que incluam na contratação um ou
mais elementos modificadores da eficácia naturalmente imediata, e por essa origem não natural do
negócio contratual escolhido são chamados de acidentais ou eficaciais, já estudados na Parte Geral
do Direito Civil. São eles o termo, a condição e o modo ou encargo.

Considera-se condição a cláusula acessória que subordina a eficácia do


ato jurídico a um acontecimento futuro e incerto, mediante autolimitação da vontade originária das
partes. Toda condição visa suspender os efeitos jurídicos válidos até o acontecimento de um fato
futuro e incerto, ou extinguir a geração de efeitos válidos ante o acontecimento de um fato futuro e
incerto. Portanto, a condição será suspensiva se a mesma produzir um obstáculo para que a
declaração de vontade produza desde logo efeitos, ou então, ao contrário, a condição será resolutiva
se impor a cessação antecipada dos efeitos, até então desenvolvidos. De acordo com a norma em foco,
dir-se-á que o ato jurídico é condicional, sempre que sua eficácia estiver submetida à verificação de
um fato futuro e incerto.

Termo é o elemento acidental que subordina os efeitos de um negócio


jurídico a uma data futura e certa. Em outras palavras, a eficácia de um ato jurídico pode ser
temporalmente determinada, subordinando-se a declaração de vontade ao curso de certo tempo.
Fixam as partes um momento certo para que comece a produção de seus efeitos, ou ao contrário, que
esses efeitos jurídicos válidos cessem. A essa data certa e futura dá-se o nome de termo, que pode
assim, ser inicial ou final.

O encargo é um elemento acidental de eficácia, verdadeira limitação

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

12
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

de vontade, que se apresenta como restrição à vantagem criada para o beneficiário de um negócio
jurídico, quer estabelecendo o fim a que se destina a coisa adquirida, quer impondo uma obrigação
correlata a cargo do favorecido a ser cumprida por este em favor do próprio instituidor, de um terceiro
ou da coletividade. É uma limitação trazida com uma liberalidade, quer por dar destino ao seu objeto,
quer por impor ao beneficiário um dever ligado à conquista da vantagem. Trata-se de ônus que
diminui a extensão da liberalidade, ou em outras palavras, é um elemento acidental que se escolhido
e admitido pelas partes, restringirá a vantagem criada pelo ato jurídico, estabelecendo o fim a que
deve ser aplicada a coisa adquirida, ou impondo certo ônus ao beneficiário do negócio.

5. Conclusão. Ao longo do estudo dos contratos, em especial, em sua


teoria geral, as alunas e alunos verão como deve ser frequente, quase obrigatória, a análise dos
elementos essenciais de um contrato para apurar se o contrato sob estudo está apto a gerar efeitos
válidos na ordem jurídica. Daí a razão de retomarmos esses conceitos da Parte Geral do Código Civil,
pois sem a aplicação de tais elementos na análise de um contrato, há risco de ignorarmos a eficácia
de uma contratação (geração de efeitos jurídicos válidos para os contratantes) e passarmos a debater
o tratamento legal específico que determinado contrato em espécie recebe da norma, e para tanto,
podemos destacar como um simples exemplo: imaginemos que dois contratantes celebram negócio
de compra e venda de um imóvel de valor correspondente a 100 salários mínimos, através de um
contrato particular. No plano da existência, os pressupostos estão presentes numa primeira verificação
(partes, vontades, objeto e forma). No plano da validade jurídica, contudo, o contrato não vinga, pois
embora os contratantes sejam capazes, e tenham externado vontade livre e de boa-fé em torno de um
objeto lícito, possível e determinado, não utilizaram a forma exigida por lei (escritura pública). Essa
invalidade será determinada pela norma, ora reputando o negócio como absolutamente inválido,
posto que previsto como nulo, ora como negócio relativamente inválido, previsto como anulável. No
exemplo específico, o negócio é absolutamente nulo, consoante previsão do artigo 108, combinado
com o artigo 166, IV, ambos do Código Civil5, e, portanto, nenhum efeito dele se extrairá no plano
jurídico (posse, propriedade, pagamento, etc).

5 Art. 108, Código Civil. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à

constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente
no País.

Art. 166, Código Civil. É nulo o negócio jurídico quando:[...] IV - não revestir a forma prescrita em lei;

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

13
P R O F E S S O R M A R C O A U R É L I O B O R T O L I N

IV. Dispositivos legais referidos em aula.

Art. 104, Código Civil. A validade do negócio jurídico requer: I - agente capaz; II - objeto lícito, possível, determinado ou
determinável; III - forma prescrita ou não defesa em lei.

Art. 108, Código Civil. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos
que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta
vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Art. 113, Código Civil. Os negócios jurídicos devem ser interpretados conforme a boa-fé e os usos do lugar de sua
celebração.

Art. 166, Código Civil. É nulo o negócio jurídico quando:[...] IV - não revestir a forma prescrita em lei;

Art. 421, Código Civil. A liberdade de contratar será exercida em razão e nos limites da função social do contrato.

Art. 422, Código Civil. Os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua
execução, os princípios de probidade e boa-fé.

© Todos os direitos reservados – vedada a reprodução ou publicação de qualquer natureza – Lei no. 9.610/98.

14

Você também pode gostar