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SEMINÁRIO DIOCESANO NOSSA SENHORA DO ROSÁRIO

Lucas Henrique Silva de Lana

ANGÚSTIA E DESESPERO NO EXISTENCIALISMO

CARATINGA
2023
Resumo
No existencialismo muitos filósofos e pensadores defendem que a essência precede a
existência, ou seja, o homem nasce livre, mas essa tal liberdade gera um sentimento de
angústia entre escolher e não saber as consequências de tal escolha, gerando no homem
um estado de angústia, pois tal escolha não influenciará somente na vida deste, mas
também numa humanidade toda, de forma que escolhendo algo para mim, eu também
estou escolhendo por outros, gerando uma responsabilidade sobre outros. Um exemplo
simplório é que escolhendo casar-me com uma pessoa só, estou optando pela
monogamia e isto se torna um exemplo para os demais, e numa linha direta isso
influenciará nos filhos que passará para os netos etc. A angústia é também um processo
enriquecedor onde podemos buscar nos conhecer, quem sou eu, pois a partir do
conhecimento de nós mesmos, sabendo das nossas qualidades e defeitos, conseguiremos
passar por isso da melhor forma, sem cair no desespero.

Abstract
In existencialismo manny philosophers and thinkers argue that essence precedes
existence, that is, man is born free, but this freedom generates a feeling of anguish
between choosing and not knowing the consequences of such a choice, generating a
state of anguish in man, because such a choice will not Only influence his life, but also
na entire humanity, so that choosing something for me, I am also choosing for others,
generating responsibility on others. A simple example is that choosing to marry a single
person, I am opting for monogamy and this becomes na example for others, and in a
direct line this will influence the children that will be passed on to the grandchildren etc.
Anguish is also na enriching process where we can seek to know ourselves, who I am,
because from knowing ourselves, knowing our qualities and defects, we will be able to
get through it in the best way, without falling into despair.

Palavras-chave: Angústia, Desespero, Existencialismo, Homem,


Essência.1

Introdução
1
Seminarista da Diocese de Caratinga/MG, cursando filosofia pelo Centro Universitário Claretiano
Sempre que nos perguntamos que é o homem, o definimos como um ser que
nasce, que busca realizar-se na vida pessoal e profissional, um ser que está em uma
sociedade marcada por dicotomias, marcada pelo consumismo exacerbado, em uma
sociedade marcada por constantes mudanças de comportamentos e que tais
comportamentos influenciam em muitos outros, mas nos esquecemos de defini-lo como
um ser de sentimentos, que sente todas estas mudanças.
Portanto, defini-lo como ser de sentimentos é saber que o homem também é a
todo instante gerador de certos sentimentos dentro de si que corroboram na sua
edificação como ser sociável, sejam eles, os medos, as angústias, os desesperos etc. Por
isso é muito importante que ele saiba trabalhá-los, de forma que, lidando com essas
incógnitas possa se tornar um homem que não se abata e paralise diante de uma possível
frustração em sua vida. Pois como protagonista de seu projeto de pessoa, é ele próprio
quem dará sentido à sua vida, pois baseado no existencialismo é o próprio homem quem
fará que sua existência seja de fato algo que o torne mais humano, seja no
existencialismo ateu ou cristão, o importante é que determinado ou não determinado, o
homem construirá sua própria história de vida.
Nos próximos capítulos analisaremos o ser humano diante do estado de angústia
e o que o leva ao desespero, e analisaremos o conceito de angústia baseado no pensador
Kierkegaard, e posteriormente o lado positivo que devemos observar desse estado em
que pode se encontrar o homem, para que estando em estado de angustia ele saiba que
há formas de lidar com esses problemas e construir caminhos, para que essa tangente se
torne mais que um processo de aprendizado e de modelação desse ser autônomo em sua
própria vida. Então será necessário olhar a angústia como uma etapa em que o homem
deve trilhar para tornar-se mais humano, e que lidando com tais problemas ele saiba
passar por vários outros e levando-os acima de tudo como aprendizado.

1 O Existencialismo: liberdade, angústia e subjetividade

O Homem é um ser que está inserido em uma sociedade marcada por profundas
transformações recorrentes, seja com o seu modo de ver e se posicionar no mundo, com
as evoluções tecnológicas que marcam nosso século, as mudanças de valores que regem
a sociedade, ou ainda as relações pessoais afetivas se tornando líquidas etc.
O Existencialismo é uma corrente filosófica surgida principalmente na França no
final do século XIX, que defende que a pessoa humana é um eterno projeto, sua
construção não tem um ponto final definido, mas apenas quando não houver a
possibilidade de escolher, ou seja, apenas quando se finda sua vida. O Existencialismo é
dividido entre existencialismo ateu e cristão, cada um com seu ponto de vista divergente
no que tange o surgimento da essência no homem. O existencialismo ateu defende que o
homem existe, surge no mundo e a partir da sua existência ele procura dar um sentido a
sua vida, não atribuindo a uma figura divina tal fato. Já o existencialismo cristão
defende que o homem é um projeto de Deus, criado por Deus, e este artífice cria-o
segundo um projeto pré-definido que já se faz presente na consciência divina, ou seja,
quando Deus cria o homem, tem-se uma concepção definida do que é o homem,

“...e que Deus, quando cria, sabe precisamente o que está criando. Assim, o
conceito de homem, no espírito de Deus, é assimilável ao conceito de corta-
papel, no espírito do industrial; e Deus produz o homem segundo
determinadas técnicas e em função de determinada concepção, exatamente
como o artífice fabrica um corta-papel segundo uma definição e uma técnica.
Desse modo, o homem individual materializa certo conceito que existe na
inteligência divina” (SARTRE, J; O Existencialismo é um Humanismo,
1978).

Neste caso, a essência precede a existência, pois uma divindade já tem uma
concepção do homem criado e aquilo que ele fará em sua vida como forma de dar
sentido a ela, caindo no determinismo.

Quando pensamos na figura do homem em meio a tudo isso, observamos ele


exercendo a todo instante algo inato à sua condição humana, a liberdade, seja ao
escolher ver o mundo de determinada maneira, seja acompanhar ou não a tão acelerada
evolução tecnológica atrelada ao consumismo, uma das formas de alienação do homem,
ou a sua escolha em compactuar com a modernidade líquida em que estamos.

O filósofo Jean-Paul Sartre defende que “o homem está condenado a ser livre,
condenado porque ele não criou a si, e ainda assim é livre. Pois tão logo é atirado ao
mundo, torna-se responsável por tudo que faz.” (SARTRE, J., O Existencialismo é um
Humanismo, 1978), e quando esse lançar-se ao mundo concretiza, o homem utilizará de
sua liberdade de escolha para construir seu ser, construir sua essência. E no uso dessa
liberdade quando o homem faz sua escolha, ele o faz de forma individual, mas que
refletirá na humanidade, ele escolhe para si e para os outros, e quando ele se depara com
a tangente entre escolher e não escolher ele entra em um estado de angústia por não
saber das consequências que se acarretarão posteriormente, então a liberdade se torna
para ele algo que não é bom. Nesse estado de angústia o homem se vê sozinho e sem
uma referência à qual possa basear-se, mas somente em si mesmo, assim ele entra em
um estado de desespero.

Então, o existencialismo cristão ou ateu, concordam que o homem é o principal


protagonista da sua história de vida, se assemelhando ao humanismo existencialista que
diz que é no abandono que o homem decidirá por si e pelos outros, como Sartre vai
dizer que o existencialismo é um humanismo ao colocar o homem como o seu próprio
artífice e que escolhendo moldar-se de determinada forma, acaba influenciando todos os
outros seres, por exemplo, se escolho me casar estou optando pela monogamia, e essa
escolha será adotada posteriormente até pelos próprios filhos, afirmando que a escolha
que um individuo faz se torna universal.

O filósofo Soren Kierkegaard defende que em um estado de angústia diante da


capacidade de escolher, o homem procura escapar desse estado por três formas, sendo
elas, pelo estágio estético, pela ética e pelo estágio religioso, ou seja, o homem cria
fugas da realidade para não lidar com essa tangente.

Pela estética, o homem foge da realidade pelo consumismo, pelas sensações


passageiras como sexo, comida, alcoolismo etc., e hoje isto esta como algo comum na
sociedade, o consumismo se torna um escape para mascarar ou satisfazer cetras
angústias existenciais com as quais não conseguimos lidar. Pela ética, pode-se pensar
que se formos bons e o nosso comportamento for plausível, não iremos sofrer ou passar
por problemas, o que não se sustenta, pois ninguém que seja bom ou ruim, ético ou não
ético está isento de ter problemas na construção do seu ser e da sua essência. E por fim,
pelo estágio religioso, o homem adere à uma Igreja ou seita religiosa pensando que
assim se salvará de tal sentimento de angústia. Segundo o filósofo Luiz Felipe Pondé,
“as igrejas são instituições burocráticas, hipócritas e econômicas” (Pondé, Luiz Felipe.
Como Aprendi a Pensar, 2019), e fugindo de tais sentimentos cai-se no desespero, e há a
possibilidade dele se prender a esse estado e assim permanecer ou então perceber que
não há vida sem angústia, e que angústia e desespero são inerentes no processo de
construção do homem.
2 Angústia e desespero em Kierkegaard, Karl Jaspers e Heidegger

O pensador Soren Kierkegaard define a angústia como o libertar-se do homem e


a partir disso a liberdade se torna um fenômeno possível para a existência. O ser
humano como um ser que nasce e que no decorrer do tempo se determina, logo que se
depara com a possibilidade de escolha diante da liberdade, ela contém como que uma tal
ameaça eminente que está por trás disso, pois não se sabe o que vira a ser as
consequências. Segundo o pensador, a angústia é uma vertigem da liberdade, pois ao
mesmo tempo ele sente repulsa e atração por ela.

Mas vale se perguntar, quando a angústia surge no homem e se ela torna o


homem angustiado para sempre? Segundo o mesmo pensador, a angústia passar a existir
no homem a partir do momento em que ele tem a possibilidade de escolha, ou seja, a
partir da existência do homem a angústia se instaura. O mito da queda de Adão e Eva
ajuda a entender esse processo, pois a partir do momento da queda em que eles são
expulsos do paraíso eles passam a ter a possibilidade de escolha e com isso entram na
existência, pois a existência implica escolha, decisão, e com isso eles deixam de estar
determinados por alguma lei da natureza. Antes essa possibilidade não existia, já que a
possibilidade de decidir algo era nula pois estavam determinados a algo. E a angústia
não é uma doença que nos leva ao fim existencial, mas algo crucial que nos acompanha
durante a nossa construção e que nos diferencia dentre os outros seres da natureza, seres
que podem escolher, mas que tais escolhas possuem suas consequências.

O desespero para Kierkegaard seria o fracasso da condição de seu ser, onde o


homem reconhecendo ser finito (matéria) deseja também o infinito (espírito),
transcendendo o conceito de finitude. E ele caracteriza o desespero como uma doença
mortal, pois segundo é como vivenciar a morte em vida, perecendo para a existência. E
ele ainda define angústia como objetiva e subjetiva na obra O conceito de angústia,

“Por angústia objetiva [entendemos] o reflexo da pecabilidade da geração do


mundo inteiro”. E a angústia subjetiva [é a]: “(...) a angústia que está na
inocência do indivíduo que corresponde a de Adão. Porém que, em razão da
determinação quantitativa de cada geração, é diversa em quantidade”.
(Kierkegaard.1968 p. 62)

O filósofo Martin Heidegger distingui angústia do sentimento de medo, pois o


medo se refere a um objeto determinado. Na obra Ser e Tempo, Heidegger escreve que,
“na angústia a presença se dispõe frente ao nada da possível impossibilidade de sua
existência” (HEIDEGGER, 1998), ou seja, a angústia é indeterminada e caracterizada
como um sofrimento particular que nos abre para a compreensão da nossa finitude. O
medo por sua vez chama nossa atenção para nos atermos aquilo que ameaça a nossa
vida e desperta em nós uma defesa, no intuito de adotarmos medidas que nos protejam,
como Heidegger descreve na obra Ser e Tempo a respeito da angústia:

O ser-para-a-morte é, essencialmente, angústia. Isso é testemunhado, de


modo indubitável embora “apenas” indireto, pelo serpara-a morte já
caracterizado, no momento em que a angústia se faz temor covarde e,
superando, denuncia a covardia da angústia. (HEIDEGGER, 1998, P. 50)

Para Heidegger o ser-para-a-morte terá o sentimento de angústia como fato


determinante no seu existencialismo e que ela se manifesta e manifestará no cotidiano
do seu estar-no-mundo.

Karl Jaspers distingui a angústia em dois tipos, sendo elas, angústia empírica e
angústia existencial. A angústia empírica estaria voltada para fatores psicológicos e a
angústia existencial estaria ligada a momentos de culpa, de dor, luta e morte; sendo que
estas duas no pensamento do filósofo ascende o homem à transcendência.

3 O conceito positivo de angústia


Utilizando o pensamento do filosofo Kierkegaard seria de grande valia buscar
entender o lado positivo que envolve a existência do ser humano, como esse ser que
constrói a sua essência, e marcado por escolhas que trazem consequências e
consequências que podem levá-lo a cair no desespero. Ele nos dá pistas de como tornar
a angústia um sentimento superado, de forma que tratando-a como algo inerente ao ser
humano e assumindo-a, saibamos encontrar algo positivo que torne a constituição da
nossa existência, uma existência autêntica.

É necessário tornar-se discípulo da angústia, para que assumindo está angústia


de forma positiva possamos torná-la algo qualitativo, de forma que ela não se torne um
empecilho na caminhada, mas um degrau que precisamos subir para se chegar a algo
melhor. Por isso, é importante que o homem reconheça que de fato os problemas que
levam os homens a um estado de angústia fazem parte de sua vida e, é nesse percurso
trilhado por cada indivíduo que a construção do seu ser acontece, no que tange ao seu
caráter, a sua vida em sociedade, deforma que ele se torne cada vez mais um ser
humano autêntico.

Mas na atualidade encontramos pessoas que fogem dessa realidade, da busca em


enfrentar essa angústia que se levada como ensinamento capacita o individuo para as
adversidades da existência, como está explicito no artigo de Luiz Cláudio Batista,

Feliz por ter à mão as facilidades possíveis, feliz pois consegue jogar com a
máquina e com isso sua vida torna-se mais cômoda. Qualquer momento
infeliz é logo compensado por uma aquisição no primeiro shopping da
esquina. O paradoxo talvez esteja em encontrar um homem triste, indiferente,
isolado”. (BATISTA, 1997.P. 311)

Ou seja, o homem busca a todo custo desviar essa responsabilidade de lidar com a
angústia, seja se perdendo nas massas, no consumismo, de forma que ele não busca
responder isso na sua individualidade, e isso se torna um problema quando se mascara
tanto, que isso retorna como neuroses. Delfim Santos diz o seguinte sobre o medo que o
homem tem de lidar com a angústia,

(...) a nossa época pode caracterizar-se pelo medo da angústia. Nunca este
medo se revelou com tal intensidade, e também nunca os estados patológicos
derivados do medo foram tão frequentes. (...) em época mecanizada sob
forma burocrática, em que a pretensa autenticidade e competência são
garantidas pela convenção e pela rotina, em que a angústia não tem onde
reclinar a cabeça, não é de se estranhar que a diagnose leve a conclusão de
que o signo do nosso tempo, em todos os planos se caracteriza pela
predominância da reação neurótica”. (SANTOS, 1982.p. 164).

E esse medo do estado de angústia se dá pelo fato do homem erguer barreiras


que o afastam das mesmas, e Kierkegaard defende justamente o contrário, de que o
homem se aceitando como finito busque a infinitude enfrentamento as angústias e é isso
que lhe dará um salto qualitativo. Pois quando ele se aceita assim, a angústia será levada
como um processo libertador e de amadurecimento do homem, mas caso contrário, se
tornará um individuo com medo de viver e julgo impossível construir um ser autêntico
que sabe lidar com seus problemas e com isso se fecha vivendo num mundo em que ele
se esconde desses medos e com isso não desenvolve a sua maturidade em buscar trilhar
novos caminhos que efetivem e colaborem com a sua existência.

Conclusão
Neste artigo, através dos filósofos Heidegger, Kierkegaard, Sartre e Karl Jaspers,
pude abordar o ser humano e analisar o seus comportamentos diante do estado de
angústia e desespero no conceito de existencialismo ateu e cristão, onde os dois
concordam que o ser humano deve ser o protagonista da construção da sua essência, ou
seja, a existência precede a essência, o ser humano existe e a partir dessa existência ele
busca a sua realização, a sua essência, então o ser humano constrói-se em sociedade
moldado por certas condutas e estas interferem sobre si, e vemos pelo lado positivo da
angustia formas do ser humano lidar com as mesmas, driblando tais problemas e tê-los
como etapa de aperfeiçoamento.

Referências bibliográficas

http://periodicos.unincor.br/index.php/revistaunincor/article/viewFile/271/pdf

https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/5616157/mod_resource/content/
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ABBAGNANO, Nicola, 1901-Dicionario de filosofia, Nicola Abbagnano; tradução


Alfredo Bosi. – 2° ed. – São Paulo: Martins Fontes, 1998

ALECRIM, Leandro de Sousa; BINDA, Suderlan Tozo. Uma leitura filosófica do


fenômeno da depressão pela perspectiva existencialista de Sartre. Disponível:
<https://unisales.br/wp-content/uploads/2021/12/UNISALES_TCC-FILOSOFIA-2020-

leandro.pdf> Acesso em 26 mar. 2023.

SARTRE, Jean-Paul. O existencialismo é um humanismo. In: PESSANHA, José


Américo Motta (Org.). Sartre (Coleção Os Pensadores). Trad: Vergílio Ferreira, Luiz
Roberto Salinas Fortes, Bento Prado Júnior. Abril cultura: São Paulo, 1978.

SOUSA, Leandro Silva, & ROCHA, Fábio Libório. Kierkegaard: Entre a angústia e o
desespero de se tornar autêntico. Revista Húmus, 4(10), 2014.

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