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14 Mancha angular do feijoeiro comum


Murillo Lobo Junior, Adriane Wendland Ferreira

1. Introdução
A mancha angular é uma das doenças foliares mais frequentes
que incidem sobre o feijoeiro comum (Phaseolus vulgaris L.), e
possivelmente a que atinge a maior área geográfica no Brasil. Foi
uma das primeiras doenças desta cultura registrada no país, em 1898
(Noack citado por COSTA, 1972), e é um exemplo relevante de
mudança em importância epidemiológica ao longo do tempo. A man-
cha angular é causada pelo fungo Pseudocercospora griseola (Sacc.)
Crous & Braun e foi descrita inicialmente como uma doença de
importância secundária até década de 70, quando era raramente cau-
sadora de prejuízos severos (KIMATI, 1980), exceto quando incidia
no início do ciclo da cultura. Nesta ocasião, não se recomendava
medidas de controle exceto cultivares resistentes, e a eventual
desfolha no final do ciclo facilitava a colheita manual da cultura.
No início dos anos 2000, a doença já era considerada uma das
mais importantes com importância epidemiológica, exigindo cons-
tantemente medidas de manejo integrado para evitar perdas de pro-
dutividade. Sua evolução em importância ocorreu a partir dos anos
80, devido à distribuição dos cultivos ao longo do ano nas safras
“das águas”, “safrinha” cultivada no outono e, posteriormente, com
a expansão de plantios irrigados durante o outono/inverno em sis-
temas de pivô central. Com contribuição da alta variabilidade do
patógeno, mudanças no manejo da cultura para maior área foliar e
produtividade que privilegiam o microclima favorável à doença
sob o dossel, a mancha angular se tornou então um dos maiores
problemas fitossanitários do feijoeiro comum no Brasil.
Esta doença ocorre em todas as regiões produtoras de feijoeiro
comum e está registrada em todos os países de clima tropical e
sub-tropical, de todos os continentes (SCHWARTZ et al., 2005;
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CABI, 2022) (Figura 1). Sua disseminação tem atraído maior atenção nos
últimos anos devido a registros de alta severidade, que resultam em perdas
quantitativas e qualitativas de produção. A mancha angular está presente em
todas as principais regiões produtoras da cultura no Sul, Sudeste, Centro-
Oeste e Nordeste do Brasil, causando maiores perdas de produtividade tradi-
cionalmente na safra da seca (ou “safrinha”) durante o outono, quando tem-
peraturas altas durante o dia e baixas durante a noite proporcionam condi-
ções ideais para o seu desenvolvimento (WENDLAND et al., 2016).

2. O feijoeiro comum
O feijoeiro comum é a leguminosa mais importante para consumo dire-
to da população no mundo, e dentro da América Latina, o Brasil se encon-
tra como o maior produtor desta leguminosa (BEEBE et al., 2009). Com
seu uso agrícola, os cultivos desta espécie apresentam uma ampla distribui-
ção geográfica, estão presentes em todos os continentes, em regiões com
variação térmica entre 10°C e 35°C. O cultivo do feijoeiro comum é bas-
tante difundido em todo o território brasileiro apresentando diversos siste-
mas de cultivos distintos com importância regional, tais como o solteiro,
consorciado com outras culturas, em plantio direto ou convencional, de
sequeiro ou irrigado. Em muitas pequenas propriedades o feijoeiro comum
ainda é uma cultura de subsistência, apesar do crescente aumento no inte-
resse de produtores dedicados ao agronegócio nos últimos 25 anos. O
feijoeiro comum se adapta bem à luz difusa, permitindo o cultivo em siste-
mas consorciados de produção, porém, em consórcio com milho se observa
maior incidência da mancha angular do que em plantio solteiro, seja no
cultivo das águas ou na safrinha (SARTORATO et al., 1982).
São típicos destes plantios direcionados ao comércio em maior escala a
adoção de tecnologias mais avançadas que incluem irrigação, manejo inte-
grado de doenças e colheita mecanizada (POSSE et al., 2010). A importân-
cia da cultura extrapola o aspecto econômico, por sua relevância em segu-
rança alimentar, nutricional e cultural na culinária de diversos países. Ca-
racterísticas técnicas, agronômicas e culturais credenciam a cultura como
excelente opção de exploração agrícola em pequenas propriedades.
A temperatura ideal para o cultivo de P. vulgaris corresponde a 21ºC,
sendo regiões aptas aquelas que apresentam temperaturas médias entre 17ºC
e 29ºC. Sob condições ideais, a germinação das sementes ocorre geralmen-
te a partir do quinto dia após o plantio com a temperatura do solo próximo
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a 16ºC. Nas cultivares de ciclo médio de 90 dias, o florecimento ocorre


entre o 28º e o 42º dia após o plantio, com o enchimento dos grãos próximo
ao 50º dia após o plantio. A maturidade fisiológica da cultura ocorre a partir
do 60° dia após o plantio (GRAHAM; RANALLI, 1997). A cultura apre-
senta baixa tolerância a estresses abióticos como altas temperaturas duran-
te a fase reprodutiva e estresse hídrico, que aumentam as taxas de aborta-
mento de flores e pegamento de vagens.
A cultura do feijoeiro comum tem um melhor desenvolvimento produti-
vo em regiões com chuvas médias, não se adaptando muito bem em regiões
úmidas ou tropicais úmidas, pois o excesso de chuvas e o clima quente
provoca a queda das flores e da produtividade, além de aumentar a incidên-
cia de doenças. A necessidade hídrica para a sua produção máxima fica
entre 300 e 500 mm (FAO, 2013). Como as culturas são instaladas numa
grande diversidade de ecossistemas, com frequência os cultivos estão ex-
postos a riscos diversos, entre os quais se destacam as doenças.

3. Importância econômica
Esta doença pode causar sérios prejuízos ao feijoeiro comum, se não for
manejado adequadamente, e é importante em todos os estados das regiões
Sul, Sudeste, Centro-Oeste, Nordeste. A alta frequência e a alta severidade
da doença ocorrem em consequência à intensificação de plantios com a
condução de até três safras anuais, facilidade de multiplicação e dispersão
dos conídios, alta variabilidade do patógeno e a predominância de cultiva-
res suscetíveis (Jesus Junior et al., 2001).
SARTORATO; RAVA, (1992) estimaram que a cada 10% de aumento da
severidade da doença há uma perda entre 7,8% e 11,5% do rendimento da
cultura. A produtividade é reduzida em consequência da perda de área
fotossinteticamente ativa e da desfolha das plantas, sendo maior quanto mais
precoce for o seu aparecimento. Estas perdas podem variar de 7 a 70% de-
pendendo da suscetibilidade das cultivares, das condições de ambiente e da
agressividade dos isolados (SARTORATO, 2006). Reduções de produtivida-
de em 70% e entre 40-80% foram reportadas respectivamente no Brasil e na
América Latina (SARTORATO; RAVA, 1992; IICA, 2008). Em áreas de maior
altitude, na Colômbia (1700 a 2000 m altitude) foram relatadas perdas de até
80% da produtividade (SCHWARTZ et al., 1981). Na Índia, foram registradas
perdas de 40 a 70 % e danos suficientes em vagens verdes que inviabilizam a
sua comercialização (SINGH; SAINI, 1980).
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4. Sintomas
Os sintomas da mancha angular manifestam-se nas hastes, folhas e va-
gens. Nas folhas primárias as lesões são geralmente circulares, de cor cas-
tanha ou marrom-avermelhada. Nas folhas trifolioladas, as lesões apresen-
tam-se necróticas de coloração acinzentada e de formato irregular, que de-
senvolvem uma coloração marrom-escura com formato angular que se de-
limitam pelas nervuras. A doença também ataca hastes e vagens de feijoeiro
comum (Figura 2). Quando a severidade da doença se torna elevada estas
lesões coalescem, causando necrose das folhas e desfolha prematura. Nos
ramos e pecíolos as lesões são alongadas escuras e, nas vagens, as manchas
são arredondadas e castanho-escuras, de tamanho variável, diferenciando-
se da antracnose por não ser deprimida e não apresentar o centro mais cla-
ro. As sementes são infectadas principalmente pelo hilo reduzindo a germi-
nação e o desenvolvimento das plântulas (WENDLAND et al., 2016).
Apesar dos sintomas típicos da doença serem amplamente conhecidos,
é possível que haja confundimento com os causados por outros patógenos.
Em especial, a mancha de Alternaria (Alternaria spp.) também produz man-
chas circulares, com anéis concêntricos (WENDLAND et al., 2016) nas
folhas primárias (mas não só nestas). O fitonematoide Aphelenchoides
besseyi, conhecido no Brasil como causador da síndrome de retenção foliar
conhecida como “Soja Louca II” é causador da falsa mancha angular no
feijoeiro comum na América Central e também já foi relatado no Brasil
(FAVORETO et al., 2021).

5. Etiologia
O agente causal da mancha angular pertence à classe dos
Dothideomycetes, Ordem Moniliales, Família Stilbelaceae e foi descrito
originalmente por Saccardo em 1878 como Isariopsis griseola Sacc. Em
1909 foi reclassificado como Phaeoisariopsis griseola (Sacc.) Ferr. e pos-
teriormente, com base em análises moleculares que consideraram o gênero
indistinguível de outros associados a Mycosphaerella (um Ascomyceto), o
fungo foi reclassificado como Pseudocercospora griseola (CROUS et al.,
2006). Aparentemente não há um teleomorfo conhecido para o patógeno
que, conforme CABI (2022), ainda possui outras sinonímias: Arthrobotryum
puttemansii Henn., Cercospora columnaris Ellis & Ever., Cercospora
griseola (Sacc.) Raghun. & K. Ramakri., Cercospora solimani Speg.,
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Cercospora stuhmannii Henn., Graphium laxum Ellis, Isariopsis laxa (Ellis)


Sacc., Phaeoisariopsis laxa (Ellis) S. C. Jong & E. F. Morris e
Pseudocercospora columnaris (Ellis & Everh.) J. M. Yen.
O patógeno produz sinemas na face inferior da folha, com 250 µm de
comprimento, de 20 µm a 40 µm de largura, compostos por conidióforos
paralelos e escuros, formando tufos visíveis a olho nú. Os conídios são de
cor cinza, cilíndricos e fusiformes, às vezes curvos, com 2 a 6 septos me-
dindo entre 35 µm e 70 µm de comprimento e 5 µm a 7,5 µm de largura no
centro e 1,5 µm a 2 µm de largura na base (CROUS et al., 2006).

6. Epidemiologia
Pseudocercospora griseola tem um número restrito de hospedeiras, que
inclui outras espécies do gênero Phaseolus e espécies de Vigna, como Vigna
unguiculata (caupi). A fonte de inóculo primário do patógeno inclui sementes
contaminadas e restos de plantas infectadas. Em ambos os casos, os esporos
produzidos são disseminados para as folhas pela ação dos ventos, respingos de
chuva, ou ambos. A doença é policíclica, incide sobre toda a parte aérea do
feijoeiro comum, e encontra-se amplamente distribuída nas principais regiões
do planeta onde se cultiva esta leguminosa (SCHWARTZ et al., 2005). A infec-
ção e a doença são favorecidas por temperaturas entre 16 ºC e 28 ºC, que prati-
camente coincidem com a faixa de temperaturas favoráveis ao feijoeiro co-
mum (SCHWARTZ et al., 2005). Nas lavouras com ocorrência da doença, o
patógeno pode ser transmitido com auxílio de respingos d’água e do vento.
Conforme estimado por DALLA PRIA et al., (2003), os sintomas da
mancha angular podem se desenvolver a partir de seis horas de molhamento
foliar ou também numa média de 13 horas diárias (COELHO et al., 2003),
na faixa de temperatura entre 10°C e 29°C. A severidade aumenta propor-
cionalmente com o molhamento foliar, especialmente entre 20°C e 25°C.
Também sob 25ºC, ocorrem o menor período de incubação e a maior taxa
de crescimento das lesões DALLA PRIA et al., (2003). O período de incu-
bação (intervalo entre a inoculação e o aparecimento dos sintomas da do-
ença) varia conforme a cultivar e condições ambientais durante a avalia-
ção, mas é variável entre seis e 15 dias (LIEBENBERG; PRETORIUS,
1998). Há ainda a liberação de conídios e desenvolvimento de sintomas
mesmo em condições relativamente secas (PAULA JR. et al., 2004). Em
clima temperado o patógeno pode sobreviver em restos culturais por até
dois anos (CORREA; SAETTLER, 1981).
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Há diversas escalas para avaliação da severidade da mancha angular do


feijoeiro comum. Entre as mais populares, GODOY et al., (1997) propuse-
ram e validaram uma escala diagramática com nove níveis de severidade
sendo 30,4% o nível máximo, pois a partir deste ponto os autores relatam a
queda das folhas. LIBRELON et al., (2015) estabeleceram uma escala
diagramática com nove graus de severidade, recomendada para a avaliação
em folhas primárias (estágio V2) visando a seleção de genótipos resisten-
tes: 0 %; 0,1 a 0,5 %; 0,6 a 4,0 %; 4,1 a 7,0 %; 7,1 a 16 %; 16,1 a 26 %; 26,1
a 32 %; 32,1 a 38 % e 38,1 a 60 %.
Em campo, há recomendações para avaliação da severidade da doença
nos estágios R6 e R8 da cultura, que equivalem ao florescimento pleno e
enchimento de vagens (VAN SCHOONHOVEN; PASTOR-CORRALES,
1987) com escala de notas. Esta escala considera as notas 1 = sem sintomas
visíveis; 3 = presença de poucas lesões sem esporulação que cobrem cerca
de 2% da área foliar ou das vagens; 5 = presença de várias lesões geralmen-
te pequenas com esporulação limitada que cobrem aproximadamente 5%
da superfície das folhas ou vagens; 7 = lesões abundantes, em geral gran-
des e com esporulação que cobrem 10% das folhas ou vagens; as lesões
podem coalescer e há presença de tecido clorótico, podendo ocorrer lesões
nas hastes e ramificações; 9 = folhas e vagens possuem mais do que 25%
da sua superfície com lesões grandes e esporulantes, que coalescem com
frequência. Ocorre desfolha severa. As vagens normalmente são deforma-
das e contém um pequeno número de sementes e, nas hastes e ramos, as
lesões também são esporulantes.
A severidade de doenças e a área abaixo da curva de progresso de doen-
ça são variáveis bem conhecidas nos estudos epidemiológicos, mas não são
boas preditoras da produtividade do feijoeiro comum em estudos com a
mancha angular (BERGAMIN FILHO et al., 1997). A remoção de tecidos
que ocorre com a desfolha conforme a doença progride compromete este
tipo de avaliação, incluindo aí também dificuldades para se estimar a pró-
pria desfolha. Para este caso, estes autores e também JESUS JUNIOR et
al., (2001) e PARELLA et al., (2013) recomendam avaliar o índice de área
foliar sadia, a duração (em dias) da área foliar saudável, e também a absor-
ção total da área foliar saudável (MJ m–2).
A ocorrência generalizada da mancha angular indica que há uma ampla
região no Brasil favorável à doença. O mapeamento de condições ambientais
mais favoráveis ao seu desenvolvimento também orienta as ações de manejo
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integrado, e pode também indicar hot spots onde serão mais exigidos o
monitoramento da doença e práticas de controle. Apesar das facilidades para
sua dispersão, também é provável que existam locais menos favoráveis ao
desenvolvimento do patógeno, onde lavouras poderiam ser conduzidas com
menores riscos e sem as exigências atuais de uso de fungicidas, atualmente o
principal método de manejo em cultivares suscetíveis.
A ocorrência da alta variabilidade fisiológica do patógeno torna mais difícil
o seu manejo nas diferentes regiões produtoras e inviabiliza o uso de cultivares
resistentes isoladamente como medida de controle. Historicamente, há tentati-
vas desde a década de 70 de se orientar o melhoramento para resistência à
doença conforme a diversidade da virulência de P. griseola, demonstrada a
partir da seleção do primeiro conjunto de cultivares diferenciadoras do patógeno
(ALVAREZ-AYALA; SCHWARTZ, 1979). O uso de diferentes diferenciadoras,
não padronizadas, por diferentes grupos de pesquisa impediu grandes avanços
sobre assunto até a década de 90, quando este conjunto foi atualizado com 16
genótipos (CIAT, 1993). Porém, há limitações metodológicas que persistem
nesta abordagem, com relatos de isolados do Brasil, Argentina e países da
América Central produzindo sintomas em todas as diferenciadoras (PASTOR-
CORRALES et al., 2015), limitando a obtenção de novas cultivares resisten-
tes. Mas há um concenso neste assunto: a diversidade de P. griseola segue a
diversidade de P. vulgaris, que é dividida em pools gênicos meso-americano e
andino, sugerindo a co-evolução do patógeno e sua hospedeira.
Os isolados classificados em um mesmo patótipo podem diferir em
agressividade (PEREIRA et al., 2015). Na ausência de diferenciadoras para
identificação de patótipos, persistem demandas por consenso sobre limia-
res de resistência/suscetibilidade, nomenclatura de patótipos, momento ade-
quado para avaliação da doença e os possíveis efeitos do estágio fenológico
das plantas sobre o desenvolvimento da doença (LIEBENBERG;
PRETORIUS, 1997). O melhoramento genético assistido por marcadores
moleculares parece ser uma alternativa promissora para sobrepor estas li-
mitações e facilitar a obtenção de genótipos resistentes (NAY et al., 2019).

7. Manejo integrado
O uso de cultivares resistentes é uma das estratégias mais importantes no
manejo integrado das doenças na cultura do feijão, e tem sido um tema ampla-
mente explorado (SARTORATO, 2005). Porém, poucos materiais comerciais
apresentam resistência ampla e durável à mancha angular. A ocorrência da alta
Mancha angular do feijoeiro comum 397

variabilidade do patógeno torna mais difícil o seu controle nas diferentes regi-
ões produtoras o que inviabiliza o uso de cultivares isoladamente como medida
de controle (SCHWARTZ et al., 2005; WENDLAND et al., 2016).
Para manejar a doença e minimizar seus prejuízos, os agricultores tem
buscado alternativas como práticas culturais, uso de cultivares resistentes e
também o controle químico. O emprego de cultivares resistentes é a forma
mais prática e econômica de manejo, entretanto a alta variabilidade do
patógeno dificulta a obtenção de cultivares com resistência ampla e durável
pelos programas de melhoramento. Devido a dificuldade no manejo da doen-
ça no campo empregando-se somente cultivares resistentes, o produtor não
tem outra alternativa a não ser empregar fungicidas. (SARTORATO, 2006).
Para se obter os melhores resultados no manejo das doenças em plantas, é
fundamental entender a sua epidemiologia, que está relacionada com a
interação entre três fatores: o patógeno, o hospedeiro e o ambiente, que apre-
sentam papel essencial nos patossistemas. Vários métodos culturais para o
manejo integrado da mancha angular tem sido recomendados por diversos
autores (HALL; NASSER, 1996; KIMATI, 1997; SCHWARTZ et al., 2005),
com atuação em um ou mais componentes deste patossistema. Eles compre-
endem técnicas como resistência genética, rotação de culturas, controle quí-
mico, uso de sementes sadias, consórcio de culturas, drenagem do terreno,
eliminação de restos culturais, isolamento de culturas e escolha da época de
plantio. Todavia, a tomada de decisões para condução dos plantios pelos pro-
dutores frequentemente segue mais critérios econômicos do que técnicos e,
em consequência, se observa alto custo com uso de fungicidas ou perdas de
rendimento quando as práticas recomendadas não são adotadas.
Em áreas de agricultura familiar, práticas agrícolas inadequadas como a
uso de grãos salvos com baixo vigor, a monocultura devido ao tamanho
reduzido da propriedade ou à baixa distribuição de chuvas e desconheci-
mento de boas práticas agrícolas são comuns entre os pequenos produtores
de feijão, e contribuem para a prevalência da mancha angular no Brasil e
em outras regiões (KIJANA et al., 2017).
A intensificação de plantios e a tomada de decisões baseada em critérios
econômicos geram problemas incompatíveis com a demanda por alimentos
saudáveis, segurança alimentar e sustentabilidade da agricultura. Este con-
flito traz novas demandas para o manejo fitossanitário do feijoeiro comum,
especialmente no que se refere ao uso excessivo de fungicidas. Além disso,
o ambiente exerce papel fundamental preponderante sobre os patossistemas,
398 Mancha angular do feijoeiro comum

uma vez que influencia tanto o patógeno quanto o hospedeiro. Por estar
sujeito a incertezas e por não poder ser controlado, conduzir os plantios sob
condições ambientais favoráveis à planta e desfavoráveis à doença se torna
um desafio em particular.
Com a prevalência de cultivares com diferentes graus de suscetibilidade,
dificuldades em se obter genótipos resistentes e adaptação do patógeno às
condições ambientais de muitas regiões brasileiras, o controle químico é
uma ferramenta importante para o manejo integrado da mancha angular.
O controle químico pode viabilizar a obtenção de altas produtividades
de feijoeiro comum, com níveis satisfatórios de controle de doenças. Atual-
mente há 211 fungicidas registrados no MAPA para controle da mancha
angular, sendo estes compostos por 48 ingredientes ativos, destacando-se
os grupos dos benzimidazóis, ditiocarbamatos, inorgânicos (cobre e esta-
nho), estrobilurinas, triazóis e algumas misturas duplas ou triplas entre es-
tes grupos (AGROFIT, 2022).
A efetividade do controle químico está ligada às práticas de manejo de
doenças e de gestão de lavouras, às condições ambientais e também ao
próprio modo de aplicação dos fungicidas. Além disso, também é possível
que este controle seja ineficiente devido à presença de fungos tolerantes a
determinados ingredientes ativos como os fungicidas sistêmicos. O assun-
to “resistência a fungicidas” surgiu na década de 60 com as primeiras difi-
culdades para a proteção de plantas, devido ao aparecimento dos primeiros
de casos de resistência a fungicidas sistêmicos, que até então controlavam
as doenças sem qualquer problema (BRENT; HOLLOMON, 2007b).

8. Conclusões
• A mancha angular encontra condições ambientais para seu desenvolvimen-
to em todas as regiões brasileiras onde o feijoeiro comum é cultivado.
• O patógeno P. griseola tem ampla variabilidade genética, e há dificuldades
metodológicas para se obter cultivares de resistência ampla e durável.
• As perdas na produtividade da cultura causadas pela doença podem atin-
gir 80% da produtividade.
• Medidas de manejo integrado que otimizem a área foliar sadia das plantas,
como uso de sementes sadias e tratadas, cultivares moderadamente resis-
tentes, pulverização de fungicidas e escolha de épocas menos favoráveis à
doença são importantes para minimizar os danos causados pela doença.
Mancha angular do feijoeiro comum 399

Figura 1. Distribuição mundial da mancha angular do feijoeiro comum, causada


por Pseudocercospora griseola.
Fonte: CABI (2022).

Figura 2. Sintomas típicos da mancha angular causada por Pseudocercospora


griseola em folhas, hastes e vagens de feijoeiro comum.
400 Mancha angular do feijoeiro comum

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