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Mestre em História Social pela Universidade Estadual de Londrina, sob orientação de Zueleide Casagrande de
Paula, bolsista CAPS.
vontade que se materializa na obra o que também pode remeter ao processo de criação do
arquiteto.
A materialização de uma cidade ocorre dessa forma, pela
produção/apropriação/reprodução dos agentes e suas relações sociais, processo tal que estão
inseridos nas indissociáveis categorias espaçotempo, ou seja, a materialidade urbana é
constituída de uma sociabilidade. Contudo, nós não nos preocuparemos com a sociabilidade
em si, mas com sua manifestação na materialidade urbana.
Sendo assim, traremos, na sequência, imagens que nos auxiliam a pensar
historicamente a organização espacial da cidade de Jacarezinho e sua relação com a arte na
catedral, sobre isso cabe ressaltar que partimos da arte para entendermos a cidade, pois a
cidade é antes de tudo uma experiência visual, a qual, por outro lado, é construída pelos
condicionantes geográficos, pelas decisões e ações de grupos específicos. No caso
jacarezinhense, o núcleo urbano se constitui a partir de patrimônio religioso ou a doação de
terras à Igreja Católica, esta redistribuiu, por aforamento, a datas, termo na atualidade
corresponde a loteamento. Nesse mesmo processo que o traçado urbano recebeu a forma de
tabuleiro e recebeu construções institucionais, a infraestrutura que delinearam a paisagem
urbana.
Concomitantemente, a experiência visual é constituída pelas ações e decisões em
escala micro — na arquitetura e no colorido das residências e prédios comerciais. A cidade é
uma obra artística, como já foi dito, constituída histórica e coletivamente. Em outras palavras,
os agentes sociais constroem a cidade e fazem leituras dessa construção de acordo com suas
subjetividades. Há intenções de manifestar o poder através da materialidade, mas, não
necessariamente todos compartilham dessa experiência uniformemente.
Postas tais considerações, para ficar clara a questão de construção social da
experiência visual de uma cidade e da intenção de quem projetou sua obra, trabalharemos com
duas fotografias aéreas da cidade.
De acordo com Mauad (1996), toda fotografia usada como fonte histórica deve ser
entendida como uma mensagem elaborada através do tempo e que, por isso, informa e
conforma através de uma multiplicidade de códigos sociais entrelaçados e registrados nesse
suporte; pela construção de sentido carregado de informações sobre as formas de ser e agir do
contexto no qual está inserida e é produzida como mensagem não verbal; e por fim, deve
também identificar o processo do investimento de sentido entre o sujeito que olha e a imagem
elaborada.
Além disso, a autora coloca que é preciso entender a confecção de uma imagem
fotográfica como fragmento de uma escolha de registro, bidimensional, de tempoespaço, entre
outras tantas escolhas possíveis e renunciadas, como também é preciso entender que, para
analisá-la, é preciso conceber seu plano de conteúdo e plano de expressão, o primeiro remete
à relação dos elementos contidos no suporte e sua relação com o contexto histórico enquanto
o segundo averigua as opções técnicas e estéticas.
Por essas considerações, ressaltamos que a fotografia é um testemunho e não a
realidade em si, um testemunho que pode ser percebido de incontáveis formas. Não
concebemos, portanto, que aquele que fotografa tenha um olhar inócuo, inclusive,
pressupomos que lidamos com uma fotografia tirada por profissional no intuito de divulgar o
crescimento urbano da cidade, pois além de portar uma câmera fotográfica, os fotógrafos
partiram de ângulos aéreos, práticas nada populares para o contexto histórico da confecção
dessas evidências históricas.
Tanto que isso nos remete ao sonho dos medievalistas ou renascentistas, citados por
Certeau, que “inventavam ao mesmo tempo a visão do alto da cidade e o panorama que ela
possibilitava. Essa ficção já transformava o espectador medieval em olho celeste” (p. 170),
uma sensação experimentada apenas por quem contempla do alto, a qual foi assim descrita
pelo autor sobre quem admira a cidade de Nova Iorque do alto do World Trade Center:
Apreciando-o violentamente, pergunto-me onde se origina o prazer de ‘ver o
conjunto’, de superar, de totalizar o mais desmesurado dos textos humanos. Subir
até o alto do World Trade Center é o mesmo que ser arrebatado até o domínio da
cidade. O corpo não está mais enlaçado pelas ruas que o fazem rodar e girar
segundo uma lei anônima; nem possuído, jogador ou jogado, pelo rumor de tantas
diferenças e pelo nervosismo do tráfego nova-iorquino Aquele que sobe até lá no
alto foge à massa que carrega e tritura em si esma toda identidade de autores ou
espectadores.
FIGURA 1 Jacarezinho, vista aérea ano de FIGURA 2 Jacarezinho, vista aérea, anos 60.
1946. Acervo Celso Rossi Acervo Celso Rossi.
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Escolhida por ser o documento visual panorâmico mais próximo encontrado, com a data mais próxima ao
período por nós pesquisado.
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Thomaz Aimone foi um educador, com destaque para sua atuação como diretor do Colégio Rui Barbosa,
também fundado na década de 30, em Jacarezinho; tornou-se um apaixonado pela cidade, tanto que escreveu
vários livros que perpassam ou falam sobre a cidade, e criou um museu particular com documentos sobre o
município.
De todas as edificações identificadas na fotografia 02, todavia, a Catedral é
incomparavelmente mais destacada. Isso nos remete à discussão sobre imagens na cidade
estabelecida por Lynch (1999). O autor desenvolve os conceitos, entre outros, de
imaginabilidade, que seria a qualidade física própria de cada objeto que garantiria grandes
probabilidades de evocar uma imagem pujante que depende da aptidão perceptiva dos agentes
sociais de decodificar os valores culturais inerentes à realidade apresentada.
Aliás, os fatores dimensão arquitetônica e localização fazem, a nosso ver, com que a
catedral se configure como um marco na cidade, um tipo de referência, para Lynch (1999), e
que em uma parcela
são distantes, tipicamente vistos de muitos ângulos e distâncias, acima do ponto
mais alto mais alto de elementos menores e usados como referências radiais. Podem
estar dentro da cidade ou a uma distância tal que, para todos os fins práticos,
simbolizam uma direção constante. (p. 53)
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Há aqui uma confusão de nomes por parte do nosso depoente quanto ao bispo de Maringá.
bizarros”), pois não ocupavam cargos de poder na década de 1950, quem sabe até de
prostitutas, visto que ficou nos contos de “causos” sobre o pintor, que este era exímio boêmio
e freqüentador de prostíbulos.
Poderíamos dividir essa imagem em três partes: os celestes e Maria (figura 4), a
população em geral (figura 5) e o clero (figura 5). Considerando que Maria é figura central,
destacamos que o pintor não explicita uma relação de adoração, de contemplação por parte
dos “terrenos”, não identificamos aqui nenhuma figura que claramente se direciona a ela,
possivelmente as crianças, ao centro inferior a ela, se dirigem com o olhar. Possivelmente,
esse comportamento denota o fato de todos os representados se conhecerem, como aponta o
senhor Américo e Gonçalves. Contudo, não podemos afirmar que seja essa explicação para o
fato de os olhares não terem o quadro de Maria como foco. Por outro lado, essa pouca
interação pode ser resultado dos limites da base da pintura, pois o teto é côncavo.
É relevante destacar também as características do vestido da Santa (figura 4), pois
delineia suas curvas e explora seu corpo de mulher. Maria possui um corpo sensual: cintura
bem delineada, grande quadril e busto avantajado, há até um leve decote em seus trajes. E o
caimento do vestido marca suas pernas. Mesmo causando espanto e polêmica, esse teor
sensual no interior de uma Igreja é bom para lembrar que, mesmo na Bíblia, a sensualidade
feminina está presente e não só em forma de repúdio, um exemplo disso é o livro dos
Cânticos, por alguns teólogos classificado como um poema erótico de amor entre Deus e a
humanidade.
ARGAN, Giulio Carlo. História da arte como história da cidade. São Paulo: Martins
Fontes, 2005.
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2000.
DE CERTEAU, Michel de. Caminhadas pela cidade. In: A invenção do cotidiano: 1- Artes
de Fazer. Petrópolis, Rio de Janeiro: Vozes, 1994
LYNCH, Kevin. A imagem na cidade. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
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Rio de Janeiro, Vol. 1, nº2, 1996.
SILVA JÚNIOR, Alfredo Moreira. Catolicismo, poder e tradição: um estudo sobre as
ações do conservadorismo brasileiro durante o Bispado de D. Geraldo Sigaud em
Jacarezinho (1947-1961). 2006. 94 p. Dissertação (Mestrado em História) – Pós Graduação
em História, UNESP, Assis.
FONTES