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reproduzido ou usado de forma alguma sem autorização expressa da autora, por
escrito, exceto pelo uso de citações breves em uma resenha do ebook.
Primeira edição, 2022
@autora_karinevidal
Caro leitor,
Os acontecimentos deste livro se passam dez anos antes da história de
Escola dos Mortos original. É altamente remendável que leia a duologia
Escola dos Mortos antes de ler esse livro. Você pode encontrá-los bem aqui,
na Amazon!
Com amor,
Karine Vidal.
Não obstante, queria fazer diferente dessa vez. Ter uma vida
universitária normal e até ser minimamente feliz. Seria pedir
demais?
Verbalizei a dúvida.
– Hum.
– Exatamente.
– Ah.
Fiquei instantaneamente insegura. A russa era estilosa,
radiante e ensolarada, e eu...
– E aí, nerdzinha.
– Oi. – Sorri.
– Oi, queridas.
– Ah... – Yulia abriu um sorriso brilhante. – Aí está uma das
poucas pessoas que eu gosto neste lugar. Como está a nossa
adorável bebezinha?
Amélia pousou uma mão sobre a barriga.
– Tudo bem.
Ela riu.
– Não precisa ir para a balada para fazer amigos. Deixe-me
apresentá-la a alguns conhecidos. Tenho vários amigos na cidade.
Podemos ir para bares, parques e programas mais leves. Talvez
você até conheça alguém especial. Gosta de meninos ou meninas?
Ou dos dois?
Revirei os olhos.
– Meninos. Mas não vá se animando demais.
– Meio tarde, já estou animada. Tenho vários amigos para te
apresentar, mas primeiro precisamos mudar este seu estilo
deprimente. – Correu para o armário. Começou a revirar as próprias
roupas, arremessando-as sobre a cama. – Eu tenho várias peças
que ficarão perfeitas em você!
– Não precisa me dar nada...
– Ei, relaxe. Acaso me pareço com a sua tia bizarra? Não faço
caridade, eu crio tendências. E você é o meu novo projeto pessoal.
– Yulia...
– Se aceitar as minhas roupas, juro que vou tentar aceitar
melhor as regras desse internato. Eu cedo um pouquinho e você
cede também.
– Nada de sensual!
– Podemos concordar em discordar.
– Yulia!
E assim seguimos.
No fim das contas, ela conseguiu me convencer a aceitar
várias peças. As mais discretas do seu guarda-roupa, é claro.
– Yulia!
– Morte?
– Lamento. Serão vocês ou a minha filha. Adeus. – E fechou a
porta com brusquidão.
Talan exalou.
– Essa maluca nos trancafiou aqui dentro?
– Não vou.
Um momento depois, o gás nos atingiu.
Mais gritos.
Valentina vociferou:
– Eu quero uma explicação agora!
– Que pena para você, garota, porque eu não sou pago para
ser babá. Me sigam, ou não. – Virou as costas e começou a andar,
manco. – Sinceramente, eu não estou nem aí.
Yulia ajudou-me a sair do caixão. Nós seguimos o Sr. Field
túnel afora.
Talan bufou.
Valentina bufou.
– Não faz sentido. Por que estou aqui? Só pode ter sido um
erro. – Eu fui um equívoco, um ponto fora da curva. Provavelmente,
nem devia estar naquela câmara de gás.
Caí na real.
“Agora tudo faz sentido! Por isso meus pais não apoiaram a
minha carreira de cantora! Eles se apavoravam toda vez que eu
desenvolvia um talento ou me destacava. Eles não estavam
tentando atrapalhar os meus sonhos...”
Yulia considerou:
Ergui o rosto.
– Como você sabe?
– Eu fui a primeira a acordar nos caixões. Esse foi meu
primeiro questionamento. Queria saber por que diabos a minha
família me enviaria para a morte. O senhor Field esclareceu. Quem
vai para a Sotrom e sai de lá vivo não pode contar o segredo. Os
outros membros da família não sabem sobre essa maldição.
– Mas por que não tentaram nos salvar? Ok, a minha família
não liga para mim, mas e as de vocês?
Foi David quem respondeu:
– Ah, claro – Sr. Field empurrou uma sacola para ela. – Vista
isso e eu convocarei uma reunião com a própria Morte. Você e ela
podem tomar um chazinho da tarde. Que tal?
Valentina empalideceu, fechando a boca.
Pudesse machucá-lo.
– F-fenton.
Fenton o lançou um olhar gelado. Sua voz era baixa e
autoritária.
Valentina questionou:
– Você irá nos explicar como será a nossa rotina aqui? Porque
eu...
Ele a cortou com um olhar mortífero.
– Yulia.
Eles se conheciam?!
– Melhores amigos.
Madeleine, dizia.
Mordi o lábio. Todos conversavam, menos nós.
Privilégio.
Esse era um lugar para poucos. Tão exclusivo que precisava-
se morrer para chegar.
Os alunos enlouqueceram.
Markova finalizou:
Estranho.
Yulia e eu entramos no nosso quarto. Era a mesma mobília da
Sotrom. Nossas malas estavam lá, além do livro de regras e o
horário de aulas. Também concederam dois uniformes extras.
Esse lugar não foi feito para pessoas como eu. Eu não me
encaixava em nenhum maldito aspecto. Eu queria estar aqui, só não
devia estar.
Essa vaga na Escola da Noite não era minha. Minha morte foi
um engano.
PARTE II
ELE NÃO É MEU AMIGO
Yulia teve uma noite difícil e chorou muito.
Eu a consolei. Diferente de mim, ela deixou família e amigos
no mundo real. Demoraria até processar essa dor.
Sorri fracamente.
– Me ensine um pouco da sua autoestima.
Revirou os olhos.
– Vou tentar, mas vai ser difícil.
Ela gargalhou.
– Não viaja.
“Vejam! Aquela ali tem vitiligo. Nunca vi uma aluna com essa
condição por aqui.”
Aisha entendeu.
– Ah, claro, ele é norte-americano. Que coincidência vocês
dois se encontrarem aqui.
Yulia riu.
– Pirou? Ainda não temos contatos. Acabamos de chegar.
Nós dois conversamos. Contei para ele sobre o meu amor por
Literatura, e ele me indicou alguns livros que gostava. De antemão,
percebi que ele seria um dos meus professores favoritos.
Posteriormente, fomos para uma aula de música. Nela,
Camille brilhou. Cantava como um anjo.
A terceira aula foi excêntrica e interessante. Um estudo sobre
Ufologia.
Niko se espantou.
– Isso é você sendo simpática? Você foi possuída?
Camille se espantou.
– Esta é literalmente a primeira vez em que eu te vejo de bom
humor. Tanto na vida, quanto na morte.
Talan adendou.
– Porque ela segue a Yulia por aí como um bichinho de
estimação...
Aquilo o calou. Yulia era uma das poucas pessoas que Talan
não ousava rebater.
Lorena olhava de Talan para Yulia, cenho franzido.
– Ok, isso foi estranho. – E se voltou para mim. – Me conte
tudo. Como veio parar aqui?
– No começo da adolescência.
Ela sorriu amavelmente.
E em dez anos nós teríamos outro jovem van Pelt por aqui.
Ela sorriu.
– Essa é a minha garota. Você vai amar a Escola da Noite!
Tem muita diversão! Sinceramente, nem conseguimos nos lembrar
de que estamos mortos. Há muitas coisas acontecendo ao mesmo
tempo. Festas, eventos, campeonatos... – ergueu uma sobrancelha
– e muitos dramas amorosos. Você fica muito envolvida na própria
existência para se lembrar do que ficou para trás.
– Não deixei nada para trás. – Confessei. – Também nunca
tive dramas amorosos. Morta ou não, não acho que isso vá mudar.
Lorena estranhou.
– Hã, que meu namorado é Giuseppe di Pauli.
Valentina se levantou, face horrorizada.
Ela riu.
– Não chegaria a esse nível. Na verdade, eu convidei o Niko
para a festa de amanhã. O convite é feito para pares, e essa foi a
desculpa perfeita.
– Ora, por favor. Eu sei que você quer ir, só não quer convidar
ninguém. É a nossa festa de estreia, não podemos faltar. Se
moraremos neste lugar pelo resto da eternidade, precisaremos de
amigos.
Suspirei. Ela tinha razão. Eu queria ir.
“Clarissa!”
Olhei para o lado, reconhecendo a voz.
– Então, mascotinha...
– Ei, como sabe o meu apelido?
Santiago riu.
Ri.
– Claro que quer.
“Argh.”
“Deus me livre...”
Amy desdenhou.
– Isso não é problema para o Santiago. Ele ganha de
qualquer um. – Virou-se para o amigo. – Por que não a convida para
a festa de hoje?
Ele se desanimou.
Camille opinou:
– Deixe-o, Amy. Meu irmão sabe o que é melhor para ele. A
Yulia é maravilhosa, mas já está com o coração em outra pessoa.
Santiago bufou.
– Quando eu preciso daquele idiota, ele não aparece.
Valentina questionou:
– Como assim, gente? O que o Fenton tem a ver com a
história?
Lorena explicou:
– Santiago e Travis são colegas de quarto. Nos seus primeiros
meses aqui, o Fenton fazia parte do time de futebol, e era
completamente diferente. Divertido, esportista e muito sociável. Ele
e Santiago se deram bem de cara. Mas, então... Ele mudou do
nada.
Irritei-me.
– Não acho. Não assinei nenhum contrato.
Amy rebateu:
– Não, não é. É uma aposta real. Vamos ver se a mascotinha
irá se acovardar.
Senti um incêndio por dentro. Trinquei os dentes, encarando-
a.
– Tudo bem. Eu aceito o desafio. Mas você terá que me dar
algo em troca.
– O que quiser.
Vamos, Clarissa. Faça algo que você jamais faria. Algo que
ninguém faria.
– Pensando em?
– Sim.
Ergui o rosto para ele.
– O que disse?
– Sim. – Ele estava muito sério. – Eu quero ir com você.
Franzi a testa.
– Eu sei o que é uma festa, van Pelt. Não sou imbecil. E, sim,
eu topo ser o seu par.
Meu queixo caiu. Eu esperava levar um fora épico. A
reviravolta me mortificou.
Pigarrei.
– Ok.
– Isso me anima.
Se o Fenton me desse um fora, aquilo seria meu consolo.
Ele.
Fenton não usava prata. Usava roupas pretas caríssimas e
descoladas. Relógio no pulso, um fino colar de ouro e o cabelo
penteado para o lado.
– Eu faço questão.
Yulia comunicou:
– Eu vou indo na frente, pessoal. Ainda preciso achar o meu
par. Encontro vocês na festa. – E saiu às pressas.
Sorri tristemente.
– Fica à vontade porque eu não te intimido.
Ri baixinho. Bem-feito.
Fenton reparou:
– Por quê?
Abri a boca para falar, mas não tive coragem.
Ele suspirou.
– Escuta, van Pelt, eu sei por que estamos aqui. Isso é uma
aposta com Santiago D’Ávila e o séquito dele.
– Você sabe? – espantei-me.
– Nada acontece nesta escola sem que eu saiba. Você
dificilmente vai me surpreender.
– Então por que aceitou mesmo assim?
– Pode ser.
Tivemos que atravessar a pista. Fenton atraía todos os
olhares. Primeiramente, por ser uma cabeça mais alto que todos;
segundamente, por estar de preto num mar de pessoas com roupas
claras. Ele feria o código de vestimenta e não estava nem aí para
isso. Ninguém ousaria contestá-lo.
Avistei David, Niko e Yulia num canto. Graças aos céus.
– Oi, gente.
“Oi, mascotinha”, cumprimentaram-me.
“E aí.”
Caímos num silêncio constrangedor. Ninguém tinha coragem
de conversar na frente do Fenton.
Travis se manifestou:
– Como consigo uma bebida por aqui?
– É, amigo.
Lancei-a um olhar cortante:
– Yulia.
De repente, Fenton voltou. Numa mão, trazia um copo de
uísque, e na outra, uma garrafa de cerveja.
– Toma.
– Basicamente.
Naquele momento, o pior aconteceu.
Amy e Valentina se aproximaram de braços dados. Yulia foi a
primeira a vê-las.
– Valentina, Amy, oi!
– Amy Turnage.
– Eu sei quem você é. Você é o par do meu amigo, Talan.
Como está sendo a noite de vocês, falando nisso? – Yulia
claramente se divertia.
– Está... Excepcional.
– Novos amigos.
Todo mundo segurava a risada. Amy percebeu que estava
sendo troçada e mudou de assunto. Virou-se para Fenton.
– Travis, você veio. Que surpresa.
Ele ergueu o copo sem sorrir.
– Turnage.
– Já faz um tempo que não nos falamos.
Engoli seco.
– Hum, acho que sim.
– Pode.
Ele colocou as mãos em meus quadris e me puxou para perto;
capturou meu pulso e pousou minha mão em seu ombro. Em
seguida, começou a se mover no ritmo da música.
– Então relaxe.
Sem querer, lancei um olhar para o canto da pista. Amy e
Valentina nos observavam, analíticas.
– Eu percebi.
– As duas acham que a Valentina devia estar no meu lugar.
– Como assim?
– Aqui, dançando com você.
– Pois é.
– O que acha que as duas fariam se pensassem que somos
mais que amigos?
Arregalei os olhos.
Fiquei gelada.
– Mas o quê...?
– Relaxa. – Ele se inclinou para baixo. Plantou um beijo no
meu rosto, bem perto da boca. Logo após, sussurrou ao pé do meu
ouvido. – É só um beijo entre amigos.
– Algo assim.
Ele olhou para frente, indecifrável.
– Interessante.
– O quê?
– A forma como você pensa. Você se dá tão pouco crédito,
mas ainda assim está aqui, num dos lugares mais exclusivos do
mundo.
– E daí?
Engoli seco.
– Elabore.
– Valeu.
Ele mexeu no MP3, passando as músicas. Perguntou sem
olhar para mim:
– Horário livre?
– Matando aula.
– Artes?
– Teatro.
– Gostou?
Abri os olhos.
– Pode me passar?
Ele a transferiu para mim via bluetooth. Enquanto o fazia,
olhava para o meu MP3 com a testa franzida.
– O quê? – perguntei.
– Seu aparelho é um fóssil de dinossauro. E olha que eu
estou morto há mais tempo que você.
– Ah. É um aparelho velho da minha prima.
– Seria mais fácil para mim se você fosse má. – Ele suspirou.
– Eu não gosto de sentir compaixão, van Pelt. Aliás, eu não gosto
de sentir nada.
Senti um aperto na garganta.
– Não quero a sua compaixão.
– Até mais.
O quê?
Não pude reagir. Ele simplesmente falou aquilo e foi embora.
Evidentemente, meus amigos o viram se levantando da mesa,
e me encheram de perguntas.
Você e o Fenton andam juntos agora? Teremos que nos
acostumar a ter ele por perto?
Tentei me esquivar das respostas. A verdade era que eu não
sabia o que dizer. O comportamento de Travis era imprevisível.
– Que diabos...?
Foi quando olhei para baixo e vi algo no chão. Uma caixinha
preta e reluzente, com um laço prateado. Sem qualquer cartão.
Ela mandou:
– Me atualize sobre o andamento do plano.
– Sim?
– Eu não tenho mais certeza sobre esse plano.
Porém, aconteceu.
E isso foderia completamente seus planos. Um predador não
poderia sentir carinho por sua vítima...
Poderia?
Na noite seguinte, frequentei as aulas.
Travis não apareceu. No outro dia, também não, e assim por
diante.
Passou-se uma semana. Tentei não ficar aflita, mas... Fiquei.
Lorena contou que Travis sumia de vez em quando. Ele não se
explicava, e ninguém ousava perguntar o porquê. Era um mistério.
– Oi.
Assustei-me.
– É, eu sei.
– Você sumiu por dias.
Sorriu, diabólico.
– A pasta “Lilian que se foda” é a minha preferida.
Ri.
– Foi a minha também. Aliás, trouxe uma coisa para você. –
Peguei algo da minha mochila. Era um CD de uma banda brasileira.
– É rock do Brasil. Pelo seu estilo de músicas, achei que poderia
gostar.
Ele pegou o CD. Analisou a capa, interessado.
– Valeu. Vou ouvir e te falo o que achei amanhã.
Encarei-o, escandalizada.
– Você? Quando?
– Posso ver?
Tirei o álbum de fotos da minha mochila. Nosso professor de
psicologia nos deu uma tarefa de casa. Teríamos que levar à aula
uma lembrança de infância. Ele não queria que perdêssemos
nossas conexões com o mundo dos vivos.
“Own”, reagiram.
Lá estavam as minhas fotos de bebê e de criança pequena.
Tomando banho na banheira, no parque com meus pais, numa
festinha de aniversário, no colo da minha mãe...
“Você é a cara da sua mãe...”
– Como assim?
– Bom, era natal. Essa foto foi tirada na semana do acidente
dos meus pais, uns dias antes. Depois que eles se foram, eu nunca
mais sorri dessa forma. – Suspirei. – Na verdade... – olhei para
todos. – Essa é a primeira vez em que me sinto pertencendo à uma
família outra vez. Aqui, junto com vocês.
– Sim, você está fazendo demais. Toda essa sua atenção está
me sufocando. Não quero me sentar à sua mesa, nem conhecer
seus amigos. Ter sido gentil com você foi um erro. Pare de andar
atrás de mim.
Meus amigos trincaram os dentes, furiosos.
“Ei, Travis!”
Ele suspirou, impaciente, e se virou para nós de novo.
– Vá em frente.
– Por que você e a Amy são amigas? Vocês são tão
diferentes.
Apontei ao redor:
– Melhor que isso aqui?
Ri, amarga.
– Está se referindo à quando ele me dispensou na frente de
todo o refeitório?
Não contei para a Yulia sobre nosso beijo, e nem contaria. Ela
me arremessaria dos penhascos se soubesse.
Você deu uns amassos com o cretino que te humilhou em
público?
Eu sabia que você também sentia tesão por mim, ele dissera.
Sabia que você me correspondia.
Suas palavras criaram ervas daninhas em minha mente. Que
diabos aquilo significava? Que ele estava atraído por mim?
– Em quê?
– Na festa de hoje.
– Yago?
– É um amigo meu que quer conhecer você.
Não sei por que ele era amigo de Talan ou de Logan. Os três
não se pareciam em nada.
À certa altura, Logan retirou um saquinho plástico do bolso. O
sorrisinho, malandro.
Tive um estalo.
Empurrei-o para longe.
– Quê? Não!
– Eu não sou estúpido. Conheço os efeitos da droga deste
lugar.
Parei imediatamente.
– O quê? Não posso te abraçar?
– Eu vejo nos seus olhos que você está sofrendo por alguma
coisa. Também vejo que você sente a nossa conexão. Por que você
não se abre para mim, Travis? – aproximei-me. Desta vez, ele não
me impediu. Pousei uma mão sobre seu peito musculoso. Não senti
batimentos cardíacos. – Me deixe entrar. – Sussurrei. – Eu não sei
qual trauma você viveu no passado, mas eu não vou te machucar.
Eu sei que você não quer ser tão sozinho. Se abra para mim.
Travis trincou o maxilar. Então, com uma expressão sinistra,
ordenou:
Fenton deve ter ouvido meu choro, mas não abriu a porta.
Meia hora depois, lúcida, sequei as lágrimas. Olhei para a
porta de Fenton uma última vez, e me levantei para ir embora.
Exato.
Fenton se lembrava bem da ocasião. Assim que assumiu o
posto, ele pediu para não sentir mais nada. Apenas assim
conseguiria fazer o trabalho sujo da Morte. Ou se livrava
completamente de suas emoções, ou enlouquecia. A culpa o
mataria por dentro.
Então, a Morte lhe concedeu misericórdia e desligou o seu
senso de empatia.
Ele assumiu:
– Alguma coisa... Mudou.
– Não sabe? Ou talvez você não queira nominar por ser algo
além de mera compaixão? Seria possível que... Não, não me diga. –
Bufou, inclinando a cabeça para um lado. – Você está gostando
dela?
Fenton não respondeu. A Morte sabia detectar mentiras. Ele
podia ser esperto – mas a Morte era mais. Seria estupidez tentar
enganá-la.
– Faz dois anos que eu não sinto nada por ninguém. Então,
por que ela?
Era tão anômalo. A própria Morte havia desligado suas
emoções. Então, como a garota o causava tantas sensações?
A Morte explicou:
– Acho que sei o que está acontecendo. Quando você está
perto dela, suas emoções são reativadas.
– Impossível. Foi a própria Senhora quem desligou minha
capacidade de sentir. Foi o nosso acordo.
A Morte aconselhou:
– Você trabalha para mim, Fenton. É um predador. Não pode
sentir compaixão por suas vítimas. Não permita que a garota mexa
com a sua cabeça. Não sinta empatia, amizade ou respeito por ela.
Se você deixar Clarissa van Pelt tocar o seu coração, no fim das
contas, somente você sairá perdendo.
Falar era mais fácil que fazer.
Clarissa anulava suas defesas. Perto dela, as emoções o
afogavam como tempestades. Todos os sentimentos reprimidos
vinham à tona – e aquilo era assustador.
Travis havia se esquecido de como era sentir. Afinal, foram
dois anos de trevas e solidão.
A Morte proclamou:
– Eu não posso deixar seu estúpido coração ficar no meu
caminho. Resolva isso, Fenton. Não tenho tempo para
sentimentalismos de um funcionário.
– Tem que haver outro substituto viável. Ele deve chegar à
Escola da Noite em algum momento.
– Vai demorar até chegar alguém com uma... Característica
tão excepcional quanto a da van Pelt. Décadas. Talvez até séculos.
Travis se enrijeceu, arrasado.
– Eu posso esperar.
– Mas eu, não. Isso não é uma negociação. Eu sou a sua
chefe e você trabalha para mim. Eu quero Clarissa van Pelt. Faça o
seu trabalho.
Mas sua “amizade” era perigosa para ela. Era melhor manter
distância.
“Conta aí.”
“Não vai”, o tal Yago riu. “A van Pelt foi uma raridade. Você vai
perder a aposta para mim e terá que me dar o seu carro.”
“Certo, certo. Boa sorte dobrando aquela garota. Ela pode ser
ingênua, mas os amigos dela são muito espertos. Você vai ter que
fingir estar apaixonado.”
Tolos imbecis.
Fenton foi se aproximando lentamente. A expressão,
assassina.
Dei de ombros.
– Eu tenho uma prima que é um às da tesoura.
– Aquela de cabelos azuis?
– A própria.
– É um visual louco. Acho que ela veio parar no mundo dos
mortos por causa disso.
Nós rimos.
De soslaio, reparei em Logan. Ele nos lançava olhares
estranhos, como se não aprovasse nossa aproximação.
O’Shea sibilava.
– É uma coisa pessoal. – Fuzilava Yago com o olhar. –
Vamos, cara.
– Não.
Ok, o que eu estava perdendo?
Havia uma tensão no ar entre os dois. Ninguém entendia
nada.
“Briga!”, gritavam.
Mas não era uma briga – era uma agressão. Travis era muito
mais forte. Sentou-se por cima de Yago desferindo soco atrás de
soco. A cada golpe, vociferava:
– Eu-mandei-você-ficar-longe-dela!
A cada soco, Yago revirava os olhos, cuspindo sangue. Sem
chances de defesa.
***
Dez dias se passaram.
Yago ainda estava na ala hospitalar.
***
Na outra noite, tínhamos um evento para ir.
Era um fim de domingo. Alguém organizou um campeonato
amador de basquete, e todo mundo podia jogar. As pessoas só
queriam uma desculpa para se reunirem nas arquibancadas com
música e cerveja.
Eu só fui porque não queria ficar sozinha no quarto.
As quadras ficavam nos fundos do castelo. Eram dispostas
lado a lado e separadas por grades. Em cada quadra acontecia um
jogo.
– Valentina?
Ela olhava para a frente, mal-humorada.
– Oi.
Franzi a testa, sem saber o que fazer.
Eu me preocupei.
A italiana suspirou.
– Na verdade, eu vim falar com você. Estou protelando porque
não sei se quero ouvir a resposta. É sobre o Fenton.
Fiquei na defensiva.
– Você o quê?!
– Eu o convidei para sair.
– Tipo romanticamente?
– Hã, lógico?
Só me restava jogar.
Merda. Eu detestava esportes. Porém até uma bolada na cara
seria melhor que aquela conversinha sobre Valentina e Fenton.
Para entrar no jogo, eu precisava de um colete de time. Os
coletes ficavam no galpão atrás das quadras.
Fui até o galpão vazio. Havia cabides e armários nas paredes.
Os cabides tinham coletes com tecidos leves.
– Falando sozinha?
Gelei. A presença arrepiou minha nuca. Reconheci o timbre
traiçoeiro e nem precisei me virar.
– O que está fazendo aqui?
– Óbvio.
– Fiquei sabendo que você foi visitar o seu namoradinho no
hospital. Que coisa linda.
– Sim, eu fui. Alguém tinha que compensá-lo pela merda que
você fez.
Ele se aproximou ameaçador.
– Espere.
– Não temos mais nada a dizer um ao outro.
– O que quiser.
– Quero que você saia completamente da minha vida. Siga
em frente, pare de intimidar meus amigos e de orbitar em torno de
mim. – Usei as palavras de Yago. – Suma da minha memória e da
minha vista. Quero me esquecer que, um dia, eu te conheci.
Ele abaixou os olhos.
“A suspensão já acabou?”
“Como ele ousa aparecer?”
Niko grunhiu:
– Vá embora, Fenton. Ninguém quer você aqui.
Travis ergueu uma sobrancelha.
– Por que você não para de opinar sobre o que não sabe e
passa a bola para cá? – ergueu as mãos. – Eu já mostrei o que
acontece com quem compra briga comigo. Você quer ser o
próximo?
Houve um silêncio absoluto.
– E-eu... É claro.
Travis aquiesceu, totalmente sem emoção.
Não.
A bola entrou na cesta, mas ninguém comemorou. Valentina
cobriu a boca com as mãos, chocada e animada.
Ainda queria seguir em frente, mas não era tão simples assim.
Meus sentimentos não acompanhavam minhas decisões.
Provavelmente, eu precisava dar tempo ao tempo. Abrir-me
para o novo, conhecer pessoas, me apaixonar de novo...
– Amy?
Ela se desencostou da porta, carrancuda.
– Bem que eu queria, van Pelt, mas acho que você é uma
chave central para o que está rolando. Como sabe, a Valentina é
minha boa amiga. Ela me conta tudo sobre esse namoro excêntrico
com Fenton.
– Eu os vejo almoçando juntos. Eles parecem... Bem.
Arrepiei-me.
– Me poupe dos detalhes.
– Não.
– Bom, os dois apostaram sobre quem conseguiria transar
com uma virgem primeiro. O O’Shea apostou sua Bugatti caríssima.
O Yago, um valor considerável da sua conta pessoal. Ou algo
assim. Aparentemente, você era a virgem sob a mira do tal Yago.
Fiquei pálida.
– Como... Como você sabe sobre isso?
Deu de ombros.
– O Santiago me confidenciou. Ele faz parte do time de futebol
junto com o O’Shea. O O’Shea contou para um amigo, que contou
para Ian Armostrong, que contou para Santiago. Parece que Yago
estava apostando a sua virgindade, e o Fenton ficou sabendo.
Ameaçou o brasileiro e o intimidou. Quando Yago não aceitou dar
um fim à aposta, Fenton surtou. Agora o O’Shea está se borrando
de medo de ser o próximo alvo do Fenton, e por isso cortou relações
com o brasileiro.
Eu me levantei, escandalizada.
Céus.
Nenhum dos meus amigos homens fazia parte do time de
futebol. Se não fosse por Amy, eu jamais saberia.
A loura estranhou:
– Você não ficou sabendo até agora? Que bizarro. Você foi o
ponto catalisador do caos.
***
Na outra noite, a festa aconteceu.
Aisha se aproximou.
– Oi. – Parou ao meu lado. – O que está achando da noite?
– Sucesso total.
Ela olhou para a pista fervente e abriu um sorriso.
– Concordo. Nós conseguimos.
– Para mim?
Eu recebi três matchs. Aisha entregou-me os cartões, e cada
um continha um nome. Eu teria que dançar com três pretendentes.
Eu ri.
– Sua cretina engraçadinha.
Dançar com William foi legal. Ele era simpático e até bonito.
Todavia, eu estava com a cabeça em outro lugar. Nervosa demais
para aproveitar o momento.
Maldito Fenton.
A dança acabou. William queria me procurar mais tarde para
tomarmos um drinque juntos. Aceitei. Depois da dança com Travis,
certamente precisaria beber.
Revirei os olhos.
– Eu avisei para não se apaixonar por mim.
– Eu bem que tentei. Mas depilar o seu buço acabou sendo
muito sensual.
Suspirei, confessando.
– Tenho que te contar uma coisa. Fenton me mandou um
cartão de dança.
Resposta estranha.
– Por que me chamou para dançar, Fenton? Eu fui bem clara
em nosso último encontro. Não quero mais contato com você.
– Eu não chamei. Estou ciente do quanto despreza a minha
presença. Foi Amy Turnage quem colocou meu nome no seu cartão.
Ela está querendo provar algum ponto para a Valentina.
– E você topou?!
– Eu também quero provar um ponto para a Valentina.
– Que seria...?
Seus olhos violetas desceram para mim. Potentes, sombrios.
– Não te interessa.
– Que ótimo.
– Não é? Nós dois estamos apaixonados e felizes.
Tocar sua pele, olhar em seus olhos, ouvir sua voz... Tudo me
desencadeava uma torrente de emoções.
E saber que ele voltaria para o quarto com Valentina?
Não, era uma tortura. Eu não aguentaria ficar ali para ver.
Desvencilhei-me subitamente.
– Acho que já dançamos o suficiente.
– Que droga?
Yulia tinha sua própria chave...
Estalei a língua.
– A Valentina.
Ela suspirou.
– A Amy é justamente o meu problema.
– Que despropósito.
– Não é? Eu disse isso a elas. Você garantiu que foi só uma
amizade, e eu acredito cem por cento em você. Não há por que
você mentir.
Engoli seco.
– Pois é.
Desesperei-me.
– Quer saber? Vamos mudar de assunto. Hoje o foco não sou
eu. É você.
Yulia foi viajar com Niko. Talan conseguiu arrastar David para
um acampamento. Já Camille viajou com a turma de Santiago.
Eles iriam para uma praia em Bournemouth – região litorânea
próxima a Londres.
Antes de ir, Camille passou no meu quarto e me convidou.
– Entendo.
– Tem uma vaga no carro do Ian. Tem certeza de que não
quer ir?
Pisquei.
– O que disse?
Ela me empurrou, entrando no quarto à força. Berrou:
– Cadê aquele maldito?! Travis, eu sei que você está aqui! –
Ela correu para o meu banheiro e abriu a porta, completamente
alucinada. Depois, escancarou a porta do meu armário e se
ajoelhou para ver debaixo das camas. – Apareça, seu merda!
Corri por meia hora. Por fim, apertei o botão e a esteira parou.
Não consegui aliviar meus pensamentos.
Congelei.
– Fenton?
Ele não respondeu. Só se ouvia o som da água do chuveiro.
Mas eu sabia que era ele. A presença arrepiante era inconfundível.
– Eu sei.
Engoli seco.
– Pode entrar.
Escutei-o ofegar do outro lado. Então, ouvi o barulho de
sapatos e camisa sendo tirados.
– Muito.
– Quer sentir o meu pau dentro de você?
– Quero.
– Sim.
– Ótimo. Agora, vou te foder do jeito que eu sempre sonhei. –
Travis saiu de dentro de mim. Ficou de pé e me virou de costas.
– Eu te amo, Travis.
– Céus. – Ele virou meu rosto e me beijou furiosamente. Logo
após, murmurou contra meus lábios. – Eu te amo mais do que já
amei qualquer coisa.
– Você e a Valentina...?
– Terminamos.
– Você a amou?
– Por quê?
Ele franziu a testa.
– Ninguém.
– Então... Tudo bem.
Aproximei-me, tímida.
– Oi.
– Oi.
– Desculpe o atraso. Não sabia o que colocar na mala.
– Maldita reputação.
Ele colocou nossas mochilas no porta-malas. Em seguida,
abriu a porta do carona cavalheirescamente.
Comecei a entrar. Mas, então, repensei.
– Não posso revelar tudo. Estou sob certas... Regras que não
são minhas.
– Tudo bem. Responda-me o que puder. Avise-me quando
atingir o limite das regras.
– Sim.
– Você irá me machucar?
– Não. Nunca.
– Você é o assassino da Sotrom?
– Exato.
Ele não confirmou – mas também não negou.
– Por que você me evitou por todo este tempo? Por que foi
tão perverso?
– Bom, eu me aproximei de você com intenções cruéis.
Porém, ao conhecê-la melhor, decidi que não queria mais lhe fazer
mal. Entretanto, a minha amizade continuava sendo um risco para
você.
– Por isso foi tão mau no refeitório?
– Sim. Eu percebi que, enquanto você me desse abertura, eu
não conseguiria me afastar. Estava me viciando nos sentimentos
que você me causava. Nosso rompimento precisava partir de você.
Então, desliguei os meus sentimentos e fiz o que sabia fazer de
melhor... Ser um canalha. O plano surtiu o efeito desejado. Você
ficou com nojo de mim e se afastou. Entretanto, não se engane... Eu
sofri profundamente em cada um daqueles dias.
Passei alguns segundos processando tudo. Após um tempo,
murmurei:
– Nada de bom.
– Isso parece triste.
– E é. Estar com você me lembrou de como era ser humano
de novo. E, cacete, isso foi muito precioso. Não quero deixar essa
sensação escapar.
– Como é a sensação? Descreva-a para mim?
Ele suspirou.
Estalei a língua.
– Deve ter sido o seu corpo sensacional.
Confessei:
– Às vezes, eu sinto que tudo neste mundo dos mortos é uma
grande mentira. E você é a única verdade.
– Então não me deixe escapar, van Pelt.
– Não deixarei.
Hesitante, ele pousou uma mão sobre a minha perna. A
palma, voltada para cima. Entrelacei meus dedos nos seus, e
trocamos um olhar íntimo.
Ele falou:
– Você é tudo o que importa no meu mundo agora.
Entretanto, precisávamos falar sobre os assuntos incômodos.
– Feito.
– Valentina me procurou algumas vezes. Ela parecia
interessada em mim. Ou, melhor, na popularidade do meu nome.
Ela me chamou para sair insistentemente, mas eu a ignorei. Como
eu disse, não sou capaz de sentir nada por ninguém. Nem mesmo
atração. – Franziu a testa. – Na verdade, tudo o que eu senti pela
Valentina foi pura irritação.
– Irritação é um sentimento.
– Eu sei. Sou capaz de sentir fúria, tédio, nojo, e todos os
sentimentos ruins. Eles são úteis para a minha... Função.
Infelizmente, sou incapaz de sentir as coisas boas. As coisas pelas
quais vale a pena viver.
– Menos quando está comigo?
– É claro.
– Como foi o namoro de vocês dois? Juro que vou perguntar
apenas uma vez.
O lugar do passado era no passado. Eu só queria tirar aquele
peso do meu coração.
– Bem, depois que você me mandou seguir em frente, eu
resolvi entrar numa relação qualquer. Era para ser apenas uma
fachada. A Valentina foi uma presença conveniente. Ela estava
disponível na hora e no lugar certo.
– E meio louca.
– Sim. O perigo parece a excitar.
Argh.
– Falando em excitação...
– Sim?
– Nós estamos namorando?
Ele me olhou, enigmático.
– É uma boa descrição. Sei que eles não têm motivos para
gostarem de mim, mas, em algum momento, precisarão saber sobre
nós.
– E é isso o que me preocupa.
– Fique tranquila. Eu não vou te colocar em uma situação
delicada.
Inquiri:
– Como foi parar na Sotrom?
– Eu jogava futebol americano. Estava em vias de conseguir
uma bolsa de estudos na Universidade da Califórnia. Mas por uma
fatalidade machuquei o braço na véspera da inscrição. Não havia
me inscrito para nenhuma outra universidade, já que a bolsa era
certeira. Após a lesão, fiquei sem opções. Foi quando recebi uma
carta da Sotrom, uma misteriosa universidade inglesa muito bem
renomada. Pensei em estudar lá até me recuperar de lesão, e então
pedir uma transferência de volta para os EUA. É claro que não achei
que morreria no processo.
Desviei os olhos.
– Nenhum de nós.
– E você? Por que entrou na Sotrom?
– Imagino.
– E as suas festas preferidas?
– Festa Junina. É uma comemoração típica do Brasil.
– E o Natal?
– Nunca gostei de Natal. Odiava a minha família adotiva. Em
todas as reuniões familiares, eles me tratavam como a prima
esquisita que a tia Marisa teve a bondade de acolher.
Arregalei os olhos.
Ele me acalmou:
– Espere e verá.
Travis estacionou na porta de uma casa de dois andares.
Ostentava tijolos avermelhados, grandes janelas e paredes com
lindas heras. Uma casa charmosa e familiar.
Exalei.
– Você é louco.
– Já somos família.
Por último, Travis apontou para a mais nova.
Travis continuou:
– Clarissa é uma pessoa muito importante para mim, e vocês
também são. Queria muito que se conhecessem. Nós dois podemos
passar um tempo com vocês?
Ele resumiu:
– Nós nos conhecemos na Escola da Noite, viramos amigos,
brigamos e depois nos apaixonamos. Hoje é o nosso primeiro dia
como casal.
Kate pediu:
– Conte-nos sobre você, Clarissa. Estamos intrigadas para
saber quem é a garota que fisgou o coração do nosso Travis.
Espantei-me:
– Você estudou na Escola da Noite?
Scarlet conjecturou:
– Iremos para onde as outras almas que não estão sob o
efeito da maldição vão. Ou, até mesmo, para lugar nenhum. As
religiões debatem o que existe após a morte faz milênios. Ninguém
sabe ao certo. É uma crença particular.
Entristeci-me.
– Não entendo... Por que vocês escolheriam esse destino? O
mundo dos mortos pode dar tantas alegrias...
Kate suspirou.
– Sim, pode. Mas após dois séculos, isso aqui perde a graça.
Queríamos uma existência com contexto. Existir para sempre pode
ser um fardo.
Scarlet observou:
– Mas você é jovem demais para pensar nisso, Clarissa.
Aproveite seus primeiros anos nesse mundo de fantasia incrível.
Serão os melhores.
Travis adicionou.
Ficamos sozinhos.
Travis se sentava ao meu lado. Passou o braço sobre meus
ombros.
– Nem um pouco.
Eu estava numa viagem com Travis Fenton. Dormir poderia
esperar.
– Ótimo. Eu quero que conheça um lugar nesta casa. –
Levantou-se, levando-me com ele.
Descemos para o porão. Estava escuro.
– Topa um desafio?
A proposta me interessou.
Gemi.
– Isso é jogo baixo. Havíamos combinado de conversar.
– Está.
Eu segurava seus cabelos. Não precisávamos respirar, mas
ainda assim ofegávamos. Aquele momento era tão íntimo e tão
humano que tirava nossos fôlegos.
Era delicioso senti-lo dentro de mim. Não acredito que eu
tenho um namorado secreto.
– Me ensine como você gosta.
***
Não precisamos de dois quartos. Dormimos no mesmo.
Descemos.
Suas tias nos esperavam à mesa da sala de refeições. Elas
nos abraçaram fervorosamente, sempre reiterando o quanto
estavam felizes com nossas presenças.
– Seria ótimo.
– Maravilha. Quero passar um tempo com vocês, e vocês
conhecem cada canto dessa cidade. – Olhou para mim. – O que
acha?
– Acho perfeito – respondi. – Eu nunca fiz turismo por
Londres. No mundo dos vivos, fui do aeroporto para a escola. Só vi
a cidade através da janela do carro do Sr. Field.
Emily se chocou.
– O Sr. Field ainda trabalha lá?!
Eu ri.
– Em carne e osso. Todos supõem que ele tem um acordo
com a Morte. Trabalha para ela para não morrer.
– Meu Deus. – Emily ficou estupefata. – Sr. Field vai viver
eternamente só para insultar os alunos da Escola da Noite.
Devia ter algo a ver com o trabalho. Não perguntei, pois sabia
que ele não poderia responder.
Olhei o relógio de cabeceira. Eram uma da “tarde.”
Cutuquei o ombro de Travis.
– Ei, acorde.
– Hum... – ele se mexeu. – O que você fez comigo, van Pelt?
– É claro.
Nos sentamos nos sofás da sala para ler.
Naquele momento, Emily chegou. Tinha a maquiagem borrada
e carregava os sapatos nas mãos. Usava as mesmas roupas de
ontem.
Kate estalou a língua.
– Sim.
Saímos sem comer. Mortos não sentiam fome. Após o “chá”
de ontem, fiquei traumatizada.
Fiquei curiosa:
– Para onde estamos indo agora?
– Você os conhece?
– Sim. Eles se reúnem toda segunda-feira neste horário para
jogos amadores.
– Em breve.
O relógio em seu pulso apitou.
– Droga. – Frustrou-se.
– O que foi?
Yulia relatava:
– Os médicos disseram que ela levou vários chutes nas
costelas. Ela tem ossos quebrados e órgãos internos
comprometidos. Também bateram em sua cabeça com algo maciço
diversas vezes. Foi um espancamento brutal. Ela estava sozinha no
castelo, e ninguém sabe quem foi o agressor. Só sabemos que foi
alguém que não viajou no feriado. Sr. Field a encontrou caída no
corredor, desacordada e ensanguentada.
Engoli seco.
– Não disseram.
Fiquei aliviada. As tias não contaram sobre mim.
Yulia se chocou.
– Espera! Então Fenton fez aquilo para proteger a sua honra?
– Quem é você?
A garota não respondeu. Valentina insistiu:
– Por que está usando uma máscara? Que idiotice. Não
existem doenças ou poluição neste mundo.
Ela tinha as mãos atrás das costas. A voz, venenosa.
– Você prejudicou Clarissa van Pelt, e por isso terá que pagar.
– A garota se aproximou balançando o taco ameaçadoramente.
Valentina sentiu medo. Ela não parecia estar brincando.
– O que você pensa que está fazen..?
Foi abrupto.
A ruiva a acertou com o taco com uma força descomunal. O
primeiro golpe atingiu suas costelas. Valentina caiu no chão,
mortificada pela dor.
Apenas entediada.
Eu não queria que Lorena fosse embora, óbvio. Mas quem era
eu para ficar no caminho? Ninguém.
Cada um sabia como curar o próprio coração.
Talan bufou.
– Que cara de pau. Após o fora épico que ele deu nela, nem
devia dar as caras por lá.
Foi abrupto.
Amy desferiu um soco no meu rosto. Cambaleei para trás e
quase caí no chão.
Todos arfaram. Eu ofeguei, segurando o rosto.
– Você a agrediu!
– Eu não machuquei a Valentina, sua perturbada. Eu nem
estava na escola!
– Você, não. Mas alguém fez isso em seu nome! A Valentina
já consegue falar. Ela disse que uma garota a agrediu, uma
desconhecida. Essa garota fez isso para te defender, afirmando que
você era a sua protegida. Aquilo foi um recado. Quem você pagou
para fazer isso? Confesse, vaca!
– Amy, não tenho ideia do que você está falando!
David insistiu:
“Pense bem no que está fazendo, Clarissa. Ele é estranho e
ameaçador. Um cara cheio de segredos.”
Niko corroborou:
– Temos certeza de que ele trabalha para a Morte.
Camille entristeceu-se:
– Não posso apoiar essa relação. Fenton pode não ter errado
na situação do Yago, mas já foi muito grosseiro com você.
Niko resistia:
– Não queremos vê-la envolvida com alguém que pode te
fazer mal. É insanidade. Como poderemos ficar tranquilos?
Defendi-me:
Camille finalizou:
– Tudo bem, nós o daremos uma chance. Mas se ele errar
com você uma única vez, nós a jogaremos num carro e te tiraremos
desta escola.
– Combinado.
Yulia se levantou de supetão.
– Já ouvi o suficiente. Estou saindo. – E foi embora.
Suspirei.
– Ela está muito puta comigo.
Niko opinou:
– Ela só está magoada. Vocês eram melhores amigas. Yulia
nunca pressupôs que você esconderia seus sentimentos por tanto
tempo.
– Você não precisava sofrer sozinha, mascotinha. – Camille
segurou a minha mão. – Estávamos aqui por você. Bastava ser
sincera.
“Sim”, David concordou. “Da próxima vez, não minta para
nós.”
– Oi, linda.
Sentei-me ao seu lado, embaraçada.
– Oi.
– Yulia... – comecei.
– Não. – Ela grunhiu. – Não vou falar nada sobre isso. Vocês
estão namorando. Eu já entendi e aceitei.
– Neste caso, Clarissa, você não tem mais que mentir para
ela. Pode escapulir para dormir comigo.
Aquela foi sua tentativa de provocar Yulia – e funcionou.
Travis relembrou:
– Você também já me bateu, Ivanovick. Se formos colocar na
balança, você já socou mais pessoas que eu. Por que só eu levei a
fama?
– Boa noite.
Ela era uma estadunidense loura chamada Claire. Eu a
conhecia de algumas aulas.
Ela se animou.
– Ah, que maravilha! Não sabíamos se você toparia concorrer.
O comitê vai ficar em êxtase!
“E aí, cara.”
“Boa sorte no concurso, Fenton.”
Ele apenas acenava com a cabeça. O máximo de cortesia que
conseguia transmitir.
Todos arfaram.
– Não. – Exalei.
Meus joelhos tremeram e fui tomada por choque. Absoluto e
completo horror. Minha visão ficou turva, e perdi o controle sobre
meu corpo.
***
Travis retornou para a Escola.
Fenton se arrepiou.
– Morte, é você?
– Não.
– Então vamos negociar, Ceifador. Você quer manter a sua
namoradinha no escuro. A verdade é terrível demais, e ambos
sabemos que descobrir a destruiria. A guardiã a segue por todos os
lados, e ela não conseguiria conviver com isso. Não aguentaria nem
mais um dia nesta escola, e nunca mais teria paz.
Ele suportaria a dor pelos dois. Essa seria a sua prova final de
amor.
Travis entrou no Grande Salão.
Expressão assassina, passos rápidos. Eu me levantei,
chorando. Vê-lo só me fez perceber o quanto eu me sentia
deprimida e sozinha.
– Finalmente.
Céus, eu precisava dele.
Eu comecei a chorar.
– Ah, Travis... – e corri para abraçá-lo.
– Faça o que quiser. Hoje você não terá uma gota da minha
atenção. Este é o momento da Yulia. Não vou sofrer por ninguém
além dela.
Ele ergueu uma sobrancelha.
– Talan?
Talan tampava boca e nariz com seu cachecol. Era difícil
manter os olhos abertos para vê-lo.
Não sabia como ela fazia isso. Nem era da minha conta.
Ao chegarmos, encontramos Niko. Ele estava sentado num
monte de feno, entranhando as mãos nos cabelos.
Ao ver-nos, exalou:
Talan opinou:
– Não temos tempo para lamentar nossas feridas. Vocês
ouviram a Morte. Se quisermos ganhar essa porcaria de caça ao
tesouro, temos que nos concentrar. É o que a Yulia iria querer.
Assinado, Pandora.”
Fiquei lívida.
– Nossa. – Talan observou. – Essa tal Pandora é boca suja.
Parecia... Apaixonado.
E por isso o término abrupto foi tão bizarro.
Parecia... Madeira?
Exalei, limpando o chão. Por debaixo das folhas, foi escondido
um alçapão. Era uma passagem!
– Pessoal! – gritei. – Encontrei alguma coisa!
Eu me assustei.
– Está louco? Pode ser veneno! Não podemos beber uma
solução desconhecida.
Camille discordou.
O’Shea riu.
– Está defendendo seus amiguinhos, Talan? Vejo que vocês
também beberam a poção da primeira fase. Estão doidões.
No alvo.
A porta se abriu sozinha. As dobradiças rangeram, macabras.
Logan soltou um sorriso.
– Você não podia ter tomado essa decisão por mim! Eu não
quero a sua proteção!
Arfei em horror.
– Fique longe da minha amiga.
– Lamento, mas não posso. Yulia será a rainha do baile ao
lado do seu namorado. É só uma questão de tempo para que ela o
roube de você. Não percebe? Os dois são o casal perfeito. Lindos,
populares e magnéticos. Em breve, Fenton perceberá que Yulia é a
garota certa para ele. Eles já foram melhores amigos e têm uma
conexão especial. Não posso permitir que ela seja a rainha do baile
ao lado dele. Fenton é a única conexão que a mantém relevante
nesse castelo, e você não pode perdê-lo. Yulia precisa sair do nosso
caminho. Você é a minha protegida. Se for humilhada, eu também
serei.
Tremi de medo.
– Eu não vou deixar que você machuque Yulia, Pandora.
A memória acabou.
– Pare... – murmurei, rosto colado ao chão. – Eu... Já...
Tenho... A sua resposta...
De uma hora para a outra, o gás sumiu. Fomos retirados da
alucinação.
Camille falou sobre como foi perder o irmão gêmeo tão nova.
A pressão que sentia para ser excepcional em tudo, de forma a
“compensar os seus pais” pela perda de Santiago. Em suas
palavras, “o filho preferido.”
David falou sobre como foi difícil nascer mudo. O bullying que
sofreu na escola o fez criar milhares de armaduras em torno do
coração. Por isso ele era tão corajoso. Atacava a vida antes que a
vida pudesse o atacar.
Talan falou como seus pais – exigentes, bem-sucedidos e
cruéis – forjaram sua personalidade desagradável. Seus pais
dividiam o mundo em “vencedores” e “perdedores.” Eram
empresários e políticos influentes, e passavam por cima de qualquer
um para ter o que queriam. Talan era mau porque aprendeu a ser
assim em sua casa. Seus pais exigiam nada menos que a perfeição.
Então, ele se tornou perfeito em tudo o que fazia – pois nunca se
sentiu o suficiente.
Aquilo os convenceu.
– É claro. – Menti.
Na verdade, eu não sabia.
– Vinganç...?
Nem pude terminar de falar. Ela me golpeou violentamente.
Fui atingida nas costelas e caí, arfando.
Valentina berrava.
– Chega de se esconder! Mostre a sua cara, seu mostro!
Um ataque psicótico.
A voz era minha. Senti minha boca se movendo, mas não fui
eu quem deu o comando. Era como se existisse outra pessoa em
minha mente.
Pandora não era uma pessoa. Era meu alter ego, minha outra
identidade. Minha doença!
– Não pode ser... – exalei, andando para trás.
– O que eu te enviei?
Meu Deus.
Sentei-me no chão, segurando a cabeça.
– Eu estou doente?
Isto é...
Encontrou Pandora.
“Clarissa?”, Yulia ficou tão chocada que não pôde lutar. “Por
que está fazendo isso?”
“Porque não podem existir duas abelhas-rainhas no mesmo
lugar”, e empurrou Yulia logo em seguida. Ao ouvir o barulho do
corpo encontrando o fundo do penhasco, sorriu, satisfeita.
Menos uma.
Claro que não. Por que teria? Ela fazia todas as merdas
possíveis, e era eu quem acordava para enfrentar as
consequências.
Simplesmente não.
Aquilo a enfureceu.
– Ninguém se importa com o que você quer! Traga a Pandora!
Ela tem contas a acertar comigo e é com ela que eu quero falar!
– Mostre-a-sua-cara!
Eu apenas fechava os olhos a cada tapa, aceitando a
violência.
– Argh... – Valentina arfava, cansada. – Sem a Pandora, você
é mesmo uma mosca morta. Não é com você que eu quero brigar. –
Olhou para o taco de beisebol no chão, e sorriu vingativamente. – Já
sei como fazer a sua amiguinha aparecer. – Pegou o taco. – Acho
que ela precisa de um incentivo para dar as caras... – andou até
mim. O taco, nas mãos.
Fenton.
Ele simplesmente se materializou no ar. A face, assassina.
– Travis?
– Clarissa, eu te encontrei.
Eu me arrastei para trás, apavorada.
– Você é um Ceifador?!
– Sim. – Ele veio se aproximando lentamente.
– Você vai levar a minha alma? – ou seja lá o que um Ceifador
fazia.
– Não! Eu vim te salvar.
– O quê?!
– Como?
– Ceifadores conversam. Nós vamos retribuir o favor e
enganá-la no próprio Jogo. As Caçadas balançam as estruturas
entre os dois mundos. Vamos usar essa fenda para fugir. Eu sou um
Ceifador, posso esconder nossas almas da Morte. Ela não irá nos
encontrar por um bom tempo. Podemos recomeçar no mundo dos
vivos.
– De que jeito?
– Eu tenho livre acesso ao mundo dos vivos. Posso ir e
simplesmente não voltar nunca mais. Sou muito bom com
esconderijos e tenho muitos contatos. Até a Morte nos encontrar, já
estaremos idosos. Mas há um problema. Você precisará ganhar as
Caçadas para ir comigo. É a única forma de sua alma comum
passar para o mundo dos vivos.
– Nós podemos fazer isso! – Fenton era a pessoa mais
perspicaz deste lugar. Com ele, ganhar os Jogos seria possível. –
Só precisamos descobrir o que é a chave!
A passagem era o espelho. A “chave” deveria ser o tal tesouro
dos Jogos.
– Roubá-la?
Congelei, entendendo.
– Ah, não.
– Sim, mas você terá que confiar em mim. Pandora já nos fez
de idiotas muitas vezes. Chegou a hora de obrigarmos essa vadia a
trabalhar para nós.
***
Eu a chamei. Gritei seu nome, dei permissão para que ela
surgisse, mas...
Pandora simplesmente não apareceu.
– Apareça, Pandora.
– Apareça! – eu gritava.
Ela gritava de volta:
Ri com escárnio.
– Pandora.
– A própria. – Ela ergueu o queixo. – Não encoste em mim
nunca mais. Diferente da Clarissa, eu não amo você.
Pandora bufou.
– Use o da Clarissa.
– Enlouqueceu? Não vou usar roupas escolhidas por aquela
mosca morta. Se preciso vencer beldades como Amy Turnage, a
abelha-rainha, e Aisha Simbovala, a queridinha de todos, precisarei
de artilharia pesada.
– Um assalto, é claro.
Os soldados gaguejaram.
– Agora sim.
Pandora riu.
Travis saiu.
– Que amor.
Ela grunhiu.
Avistamos o salão.
No fundo da mente da Pandora, me horrorizei. O lugar estava
lotado de alunos e...
Outros convidados.
– Vocês dois...?
David se horrorizou.
“Não pode estar falando sério! Está preocupada com a coroa
do baile no meio dos malditos Jogos?”
Camille concordou:
– Sim. Quando viram os cadáveres, vários grupos fortes
desistiram. Nós voltamos a ter uma chance. Pensar em coroa agora
é irrelevante. Temos que descobrir o que a Morte quer de nós nesta
fase, e...
Pandora a cortou:
Niko cuspiu.
– Nem devíamos estar te ouvindo, Fenton.
Ele fez uma cena no velório da Yulia. Ninguém havia o
perdoado.
– Não precisam confiar em mim. Confiem na Clarissa.
Aisha se chocou.
– Você... Roubou?
Pandora gargalhou.
Travis intercedeu.
– Por que vocês duas não conversam mais tarde? Estamos
no meio de uma prova, e você não é do grupo da Clarissa.
– Tudo bem, vou procurar o meu grupo. – Ela olhou para mim,
triste. – Depois que isso tudo acabar, vamos conversar, ok? Não sei
o que deu em você hoje... Mas, seja o que for, eu quero ajudar.
Sabe que pode contar comigo.
Quando ela foi embora, Pandora rosnou.
– Argh. Clarissa e suas amizades melosas. – Correu os olhos
pelo salão e avistou meus amigos. Cada um conversava com um
grupo. – Pelo menos aqueles idiotas estão fazendo o trabalho deles.
Travis se irritou.
Aquilo a enfureceu.
– Eu sou maravilhosa e vou provar. – Olhou para o meio do
salão. – Tive uma ideia. Vamos dançar.
– Em meio aos cadáveres? Isso é bizarro até para você.
– Você pode entender de guerra, mas esse é o meu território.
Apenas faça o que eu mandar. Sei como atrair os holofotes e me
destacar. Ao final da noite, estarei com aquela coroa na cabeça
– Para o bem da sua sobrevivência, é bom que esteja certa.
Falou ao microfone:
“Meus caros alunos, um momento de suas atenções, por
favor...”
O quê?
– Clarissa?
***
“Por que não? Valentina irá acordar e contar para todos que
somos a assassina da Yulia. Você não pode mais existir na Escola
da Noite. O seu namorado está morto, e em breve todos os seus
amigos te odiarão. Você não tem mais motivos para existir. Apenas
vá embora. Deixe-me ficar com o controle da sua mente. Eu vou
saber o que fazer.”
Ela não sabia que Travis estava morto de vez. Sua cabeça
estava escondida em meu colo. Ele parecia apenas desmaiado.
– O que é isto?
– A sua primeira missão como governanta. Você chegou no
meio dos Jogos de Caça, um evento importantíssimo para a escola.
Se quiser este emprego, faça exatamente o que eu mandar. Eu sou
uma funcionária do castelo e você está sendo testada.
– Você não deveria fazer isso por si mesma? Acho que eu não
devo me meter nesses jogos. Talvez eu volte na semana que vem...
– Não sei...
– Muito.
– Então não pergunte e me obedeça.
A governanta se foi.
Eu rosnei em resposta:
– Cadê a Clarissa?
Ela estalou a língua.
– Quanto tempo?
– Neste caso, você nunca mais irá vê-la. Quando a sua pena
terminar, você não será mais um Ceifador. Nosso contrato dura
apenas dez anos se não for renovado. Como vai passar para o
mundo dos vivos sem seus poderes? Ganhando os próximos Jogos
de Caça? – Riu. – Eu aprendi a minha lição, Ceifador. Mesmo que
volte para a Escola da Noite como aluno, você estará vetado dos
Jogos para sempre. Quem descumpre as regras uma vez, nunca
mais poderá jogar.
Ele não podia passar dez anos naquela prisão sem saber o
destino do seu amor.
– Não, não preciso. – A Morte estalou a língua. – A ignorância
será o seu castigo. Isso é o que acontece com quem me desafia.
Boa sorte com os anos na prisão, Ceifador. Vejo você em uma
década.
– Como assim?
– A Morte vai ser derrotada. O mundo dos mortos só vai durar
mais uma década. Todas as almas prisioneiras aqui serão
libertadas. Voltaremos ao mundo dos vivos! Inclusive você e a moça
por quem você sofre.
O General explicou:
Maddox continuou:
– A Morte sabe?
– Não. Ela não tem ideia de que o rapaz será a sua ruína. Ela
acaba de trazer para o mundo dos mortos a pessoa que irá destruir
seu governo. Só nos resta confiar na profecia e simplesmente....
Esperar.
Travis se sentou no seu colchão. Colocou a mão sobre o
peito, respirando aliviado. Finalmente poderia descansar.
Sim, dez anos era muito tempo. Mas Travis tinha obstinação e
paciência. Mesmo se Clarissa o esquecesse, ele jamais a
esqueceria. Insistiria e lutaria para reconquistar o seu coração.
Fiquei devastada.
Eu queria morrer naquele acidente. Pandora era um monstro.
Sua existência seria um risco para as pessoas ao meu redor.
– A polícia?!
***
Annastasia esclareceu.
Arfei.
Valentina estava desmaiada na sala do espelho! Quando
meus amigos passaram para o mundo dos vivos, certamente eles a
levaram também! Eles podiam detestá-la, mas jamais a deixariam
para trás.
Contei sobre Valentina e a sala do espelho.
A diretora se animou.
***
E eu fiquei.
Sorri fracamente.
Mas...
– Oi, prima.
Exalei, sorrindo:
Lorena suspirou:
– Nunca saberemos o que realmente aconteceu com eles.
Sabemos que eles ganharam a Caçada, mas não sabemos por que
eles nunca voltaram.
– São dias bons e dias ruins. A dor pela perda dele sempre
vai estar aqui. Mas com a ajuda da terapia e dos remédios, eu
aprendi a conviver com ela.
A dor não me massacrava mais. Como velhas amigas, eu e
minha tristeza demos as mãos. Fizemos as pazes. Eu nunca mais
fugiria do sofrimento. Foi isso o que criou Pandora, afinal.
– Mas você não está sozinha. Você tem a sua família bem
aqui. Eu.
– Qual?
– Bom, um ano se passou. Eu consegui o meu intercâmbio.
Estou estudando numa escola maravilhosa na Finlândia. Tive um
recomeço por lá, e acho que você também pode ter um, longe de
todo o drama da Escola da Noite.
Estreitei os olhos.
Pisquei.
– Um formulário? Já?
10 ANOS DEPOIS
Finlândia
Impossível.
– Que diabos...?
Lorena e eu congelamos.
Meu Deus.
Diferentes.
– Yago?!
Yago, o brasileiro com quem me envolvi dez anos atrás.
– Oi, Clarissa.
Fiquei perplexa. Fazia muitos anos que eu não pensava sobre
ele. Yago parecia ter saído de outra vida.
– Hã, oi. – Pisquei. – Você me seguiu?
Suspirei.
– Sim.
– Definitivamente?
– Não sei. Preciso amparar os meus amigos. Ficarei o tempo
que eles precisarem de mim.
Sinceramente, não queria pensar naquilo agora. Queria me
focar na reabilitação dos meus amigos, e mais nada. O futuro seria
o futuro.
O recém-chegado falou:
– Acabei de chegar. Pode nos deixar a sós, Yago? Eu preciso
conversar com a Clarissa.
Yago concordou:
– S-sim.
Não tinha certeza se era real.
Ele reiterou:
Comecei a chorar.
Ele contou que seu contrato com a Morte expirou. Ele não era
mais um Ceifador. Também contou sobre a terrível prisão da Morte.
A masmorra para almas errantes.
Eu me sentava em seu colo, segurando seu rosto.
Bufei.
– Eu aceito! É claro!
– Travis? – sussurrei.
Fim.
Ela teve uma vida difícil e carregava muitos traumas. Quando criança, foi raptada.
Trancada num porão escuro e deixada para morrer. Entretanto, ela foi resgatada
por um salvador misterioso. Um rapaz sombrio, com vestes de outro tempo – e
olhos verdes que pareciam ter vindo de outro mundo.
Só havia um problema... Aquele garoto não estava vivo. Havia morrido num
incêndio séculos atrás. Era um fantasma!
Dez anos depois, Blanca entrou para a faculdade. Foi quando ela se deparou com
o rei do lugar... O playboy ricaço e atlético Diego Ferraro.
Mortificada, ela percebeu o impossível. Diego era ele! O fantasma que a salvou
uma década atrás!
Blanca descobre que aquele garoto havia morrido em 1890. Então, como ele
estava ali? Andando entre os vivos e se passando por um universitário?
Ciente de ter sido descoberto, Diego declara guerra a ela. O rei do lugar era
misterioso e perigoso. E, para proteger seus segredos, se tornaria o predador da
garota.
Blanca sabia que o garoto-fantasma era uma ameaça real. Então, criou uma
estratégia para se salvar. A única forma de se livrar da perseguição do predatório
e tirano Diego Ferraro era...
@livro_meuduqueproibido
MEU DUQUE PROIBIDO
“O ano é 1813.
O Brasil foi colonizado por visitantes de outro planeta. Estrangeiros. Uma espécie
superior, mais forte e mais avançada. Eles mantêm um reinado justo e pacífico
sobre a comunidade humana.
Alícia de Aragão fez dezessete anos. É uma debutante, e está pronta para o
mercado casamenteiro.
Alícia é filha de barões falidos, e uma piada na sociedade de São Paulo. Suas
chances no hostil mercado são bem tristes.
Um evento absurdo faz com que Alícia descubra um segredo do Duque. Algo que
ele precisa, a todo custo, esconder.
Seu escravo.
E, o mais importante...
"Nos confins do céu, existia uma faculdade secreta para semideuses. Filhos dos
quatro principais deuses hindus.
Quando um novo professor chega ao lugar, ela está determinada a fazer dele seu
mentor.
Aryan Razam é o novo professor. Um mestre legendário entre os guardiões - e
carinhosamente apelidado de "Devorador de Almas." Perigoso, frio e mortal.
Os dois são ódio à primeira vista. Entretanto, com o tempo, a faísca entre eles se
confunde e vai tomando outras formas.
O professor se apaixona loucamente por ela. Mas Kali sabe que ficar com ele
poderá destruir a sua vida.
Aryan sabia que aquela atração pela rival terminaria mal. Mas Kali era o fruto da
árvore proibida para ele. E, para tê-la, ele estava disposto a arriscar tudo.