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Pré-história

Luiz Carlos Luz Marques


REVISÃO UNICAP DIGITAL
Msc. Fernando Castim Rua do Príncipe, 526 - Bloco C - Salas 303 a 305
PROJETO GRÁFICO Boa Vista - Recife-PE - Cep: 50050-900
Msc. Flávio Santos Telefone +55 81 2119.4335
DIAGRAMAÇÃO
Msc. Flávio Santos

1ª Edição
Copyright © 2022 de Universidade Católica de Pernambuco
Copyright © 20212de UNICAP DIGITAL
Sumário
Unidade 1 5
Objetivos da Unidade 6
1. Parte 1: Introdução à disciplina e seus instrumentos, suas questões teóricas
e metodológicas; suas fontes bibliográficas 7
1.1 Introdução à disciplina e seus instrumentos 7
1.2 A disciplina e suas questões teóricas e metodológicas 10
1.3 A disciplina e suas fontes bibliográficas 10
2. Parte 2: Traçar o quadro atual das conclusões científicas sobre a evolução da
vida na Terra 13
3. Parte 3: Situar a evolução da espécie humana no quadro evolutivo global
das espécies 19
Síntese da unidade 23
Referências 24

Unidade 2 26
Objetivos da unidade 28
1. Parte 1: ocupando a África 29
1.1 Com quais instrumentos científicos? 31
1.2 Com quais fontes de pesquisa 41
2. Parte 2: da África para o resto do mundo 44
2.1 A África foi o local de nascimento do Homo sapiens e nela foram achadas
as primeiras evidências de comportamento simbólico e tecnologias complexas 45
2.2 O florescimento precoce, mas bem atestado, dessas características, foi em
uma zona de refúgio glacial na costa Sul de 100 a 60 mil anos atrás
(especialmente nas Cavernas de Blombos e Sibudu) 47
Síntese da unidade 51
Referências 52

Unidade 3 54
Objetivos da unidade 55
1. Parte 1: O “motor” da dispersão do gênero humano 56
2. Parte 2: os sinais materiais da saída dos sapiens da África em direção ao resto
do mundo 60
2.1 Cronologia, localização dos temas e sítios arqueológicos e visão geral das
prováveis migrações 60
2.2 O “cenário” da dispersão a partir do Sul (do Leste da África para a
Península arábica) 61
2.3 O Hominídeo de Denisova, Sibéria e Baishiya Karst, Tibet 61
2.4 O encontro/desencontro com o Homo de Neandertal 62
2.5 A teoria da catástrofe ambiental provocada pela explosão do vulcão Toba 63
2.6 As pinturas rupestres mais antigas do mundo, na Indonésia 63
2.7 Fazendo roupas na Idade da Pedra 64
2.8 As Cavernas de Chauvet, na França e Altamira, na Espanha 65
2.9 Venus de Willendorf, Áustria 66
2.10 Dolní Věstonice, na Europa Central 66
2.11 Estruturas circulares feita de ossos de mamutes 67
2.12 Primeiras estruturas em pedra, em Boncuklu Tarla e Göbekli Tepe, na Turquia 68
3. Parte 3: sugestões de leitura e aprofundamento 69
3.1 Biogeography and evolution of the genus Homo 69
3.2 Cognición y conducta de neandertales y humanos modernos 69
3.3 Origen del lenguaje: un enfoque multidisciplinar 69
3.4 Culture and Causal Cognition 70
3.5 The history behind the mosaic of the Americas 70
3.6 Origens do homem nas Américas: fósseis x molécula? 70
3.7 A genética: seu uso na determinação da origem do homem americano 71
3.8 A Serra da Capivara e os primeiros povoamentos sul-americanos: uma revisão
bibliográfica, publicado no DOSSIÊ CENÁRIOS E PROCESSOS DAS PRIMEIRAS
OCUPAÇÕES HUMANAS NO BRASIL: O PAPEL DA PESQUISA ARQUEOLÓGICA,
do Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi. Ciências Humanas. 71
Síntese da unidade 71
Referências 72

Unidade 4 74
Objetivos da unidade 75
1. Parte 1: a ocupação das “Américas” 76
1.1 América do Norte 79
1.1.1 20 a 18 mil anos AP – USA – Sítio arqueológico de Cactus Hill, na Virgínia 79
1.1.2 13,2 a 12,6 mil AP – USA/México – Cultura Clóvis, sul dos USA e norte do México 79
1.1.3 13 mil AP – USA - Homem de Arlington Springs, Califórnia 80
1.1.4 13 a 9 mil AP – USA – Caverna de Fort Rock, Oregon 80
1.1.5 7 mil a 6,9 mil anos AP – USA – O homem de Kennewick, rio Columbia,
Washington 81
1.1.6 4,5 mil a 3,5 mil anos AP – Canadá – Sítio arqueológico de Áísínai’pi, Vale do
Rio Milk 82
1.1.7 1,2 a 550 anos AP – USA – Cahokia Mounds, Illinois 82
2. México e América Central 83
2.1 15 mil anos AP – México – Sites de caça aos mamutes 83
3. América do Sul 83
3.1 19,5 - 12,5 mil anos AP - Colômbia - Abrigos de rocha de Chiribiquete 83
3.2 18,5 a 14,4 mil AP Sítio arqueológico de Monte Verde, Chile 84
3.3 14,5 mil AP Sítio arqueológico de Huaca Prieta, província de La Libertad, Peru 85
3.4 12,5 a 7 mil AP Sítios arqueológicos de Los Toldos e Cueva de las Manos,
Santa Cruz, Patagônia, Argentina 86
4. Parte 2: A arqueologia e a musealização dos vestígios humanos 86
5. Parte 3: Os Museus de Pernambuco e do Recife 96
Síntese da Unidade 96
Referências 97
Unidade 1
SAPIENS, a evolução improvável

Neste momento da história, em 2020, quase todas as semanas nos trazem novas
descobertas em relação à pré-história de nossa espécie, o homo sapiens.

Vejam, quem está lendo essa palavras pela primeira vez percebe que, talvez, nem
todas tenham a clareza necessária. Assim, para começar, podemos perguntar, por
exemplo: o que é história? Por que, neste momento? Por que, em 2020? O que é
pré-história?

E essas tais descobertas? Quem as faz? Que métodos usa? Como as divulga? Como
separar as informações sérias, produzidas pelas ciências, divulgadas em livros e revistas
científicas ou traduzidas para nós pelo jornalismo científico, daquelas do jornalismo
sensacionalista ou pior, das fake news, hoje dominantes na internet? Afinal, o que é a
ciência e quais as ciências estudam a pré-história? Finalmente, por que somos
chamados de homo e sapiens? Que fatores e desde quando, provocaram o
desenvolvimento de nossa mente, fazendo-nos ser quem somos?

Construir esse conhecimento com vocês, através dessa aula, de leituras e vídeos
cuidadosamente selecionados, de pesquisas dirigidas e de avaliações coletivas dos
resultados, seguindo os métodos de pesquisa e produção de textos científicos, é nossa
primeira preocupação. Após anos de experiência acredito poder oferecer a vocês não só
um material de qualidade, nas páginas seguintes, mas um mergulho em um amplo e
seguro panorama de nossas origens, que nos ajudem a entender nosso presente e as
forças sociais e culturais nele atuantes e vislumbrar pistas do futuro que se abre.

Como vocês já perceberam, existem palavras com notas de rodapé. São conceitos-
chave e esses precisam ser bem compreendidos, assimilados. Nesse livro tais palavras
abrirão hiperlinks de aprofundamento. Essa é uma das vantagens das ferramentas
tecnológicas desenvolvidas nas últimas décadas. Aproveitem-se disso. Leiam e reflitam
sobre os textos como um todo, depois explorem os hiperlinks. Retornem ao texto,
releiam-no e vejam como adquire uma nova dimensão. Participem dos fóruns de debate.
Organizem-se para trabalhar e grupos e produzir “produtos didático-pedagógicos”
cientificamente equilibrados e cuja narrativa fale aos jovens de hoje, a serviço dos quais
vocês escolheram fazer essa licenciatura. Bem-vindos e boa sorte!

Objetivos da unidade

• Introduzir-se na disciplina e seus instrumentos. Focar as questões teóricas e


metodológicas. Conhecer as fontes bibliográficas.
• Traçar o quadro atual das conclusões científicas sobre a evolução da vida na Terra.
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Pré-história

1. Parte 1: Introdução à disciplina e seus instrumentos, suas


questões teóricas e metodológicas; suas fontes bibliográficas

1.1 Introdução à disciplina e seus instrumentos

Cada um de nós tem um pai e uma mãe, quatro avós, oito bisavós e daí em diante.
Você já pensou no “aí em diante”? Pois um famoso astrônomo e divulgador científico,
Carl Sagan, pensou e refletiu sobre isso, no capítulo 2 do livro Bilhões e bilhões. O
problema é que, voltando apenas 8 gerações atrás, lá por volta de 1820 (calculando-se
um intervalo de 25 anos entre cada uma delas), cada um de nós teria 128
antepassados, voltando 20 gerações, em 1520, teria 524.288, voltando ao ano 20 da
chamada Era Cristã, ou seja, 80 gerações atrás, teria 604.462.909.807.314.587.353.088
antepassados. Pode?

Figura 1: O início, a partir de cada um de nós, da árvore genealógica de qualquer um de nós

Não pode! E Sagan concluiu: “Se retrocedermos o bastante, quaisquer duas pessoas
sobre a Terra têm um ancestral comum” (SAGAN, 2008, p. 16). Entre as muitas
ciências que colaboram com reconstrução científica da pré-história, isto é, daquela
parte maior da história da humanidade e de antes dela, que só podemos reconstruir
a partir de indícios materiais (restos fósseis, fogueiras, outros restos materiais mais
elaborados do agir humano, como machadinhos e pontas de lanças de pedra,
pinturas em paredes, em furnas e grutas, gravuras e estatuetas de pedra, sobre as
quais falaremos nas próximas aulas e unidades), há uma, a Genética, que estuda,
entre outras coisas,o DNA Mitocondrial.

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Pré-história

Genética: Ciência que se dedica ao estudo da hereditariedade, dos genes, da


transmissão, de pais a filhos, dos caracteres anatômicos, citológicos e funcionais
(DICIO: https://www.dicio.com.br/genetica/).

DNA Mitocondrial, ou DNAmt: é um conceito-chave na nossa disciplina. “Nós,


seres humanos, possuímos dois tipos de DNA dentro de nossas células: o DNA
cromossomal presente no núcleo e herdado metade de nosso pai e metade de
nossa mãe no momento da fertilização; e o DNA mitocondrial (DNAmt),
presente na organela mitocôndria do óvulo materno e que depois é copiado
para as demais células do nosso corpo”. Apesar de estudos recentes indicarem
que, eventualmente, pode ter havido “transmissão paternal”, essa parece “não
ter deixado marcas detectáveis no registro genético humano”. Por que isso é tão
importante? “A herança exclusivamente materna desse material genético é tão
aceita que existe a ideia do Gene da Eva (the Eve gene), na qual todo indivíduo
poderia ser ligado genealogicamente a alguma mãe primitiva de todos os seres
humanos (ver https://profissaobiotec.com.br/dna-mitocondrial-tambem-pode-
vir-de-heranca-paterna/).

Com resultados espetaculares: a mais antiga mulher, da qual todos os seres


humanos vivos hoje, em toda a Terra, descendem, viveu acerca de 200 mil anos atrás,
no continente que, desde a antiguidade, chamamos África. Dela não temos o registro
fóssil, mas uma parte essencial dela continua presente em todos nós, nas nossas
mitocôndrias: seus genes.

Muito bem! Nessa Unidade, intitulada exatamente SAPIENS, a evolução improvável,


iremos percorrer, didaticamente, os 7,5 milhões de anos de nossa provável evolução,
até essa mulher africana, há 200 mil anos, hoje chamada Eva mitocondrial.

Por que 7,5 milhões de anos? Porque um antigo registro fóssil, o crânio de um ser
que foi datado como tendo vivido naquela época remota, o Sahelanthropus
tchadensis, apresenta características que, até hoje, nós humanos conservamos e
que indicam que, como nós, aquele ser andava ereto, em pé, sobre duas pernas.

Figura 2: Sahelantropus tchadensis - crânio

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Pré-história

Registro fóssil: “Os fósseis são restos de formas de vida antigas. A ciência que
estuda os fósseis é a Paleontologia (do grego palaios=antigo, onto=ser,
logos=conhecimento; ‘conhecimento de seres antigos’). A Paleontologia é uma
ciência que se situa em uma interface entre a Biologia e a Geologia, usando
conhecimentos de ambas”. Leia mais em O registro fóssil e a paleontologia, no
portal Darwin – Projeto Evoluindo. Informação útil sobre evolução biológica.
Acesso em 22-06-020: https://www.darwin.bio.br/?p=28.

Ao que tudo indica, a vida em nosso planeta surgiu entre 3,8 e 3,5 bilhões de
anos, com os primeiros organismos. Não vamos percorrer aqui essa longa
história, não daria tempo.

Antes de entramos na história do Sahelanthropus, isto é, de sua descoberta, datação,


interpretação e das consequências desta para a história da evolução da nossa
espécie, precisamos ter claro o seguinte: a pré-história, enquanto ciência, tem a sua
história! Portanto, cada um de seus momentos significativos deve ser
contextualizado. Lembram-se, acima, de uma das competências desta Unidade:
“Examinar sobre os distintos períodos da pré-história e suas características,
contextualizando-as historicamente”.

A pré-história, enquanto ciência, só chegou à descoberta do Sahelanthropus há


apenas 20 anos – e a publicação científica dos resultados foi em 2002. Portanto, até
18 anos atrás, o que sabíamos da pré-história de nossas origens ia “apenas” há uns 3,2
milhões de anos, com a famosa Lucy, a fêmea de Australopithecus afarensis, cujo
registro fóssil, o esqueleto, com partes significativas bem preservadas, fora
descoberto na Etiópia, nos anos 60 do século XX. Portanto, há apenas 60 anos. E por aí
vai. Vamos voltar a isso, com detalhes, mais abaixo, ainda nessa Unidade.

Então, desde 1846, quando Jacques Boucher, publicou seu estudos sobre as
ferramentas de pedra, achadas em 1830, no vale do rio Somme, na França, a história
da pré-história e de nosso conhecimento sobre ela vai crescendo, do presente para
o passado. Vejam, o próprio título de Boucher é significativo: Antiquités celtiques et
antediluviennes, ou seja, na sua “interpretação” Antiguidades celtas, portanto, do
tempo da conquista da Gália por Júlio César ou pouco antes e Antidiluvianas!
Naquela época, no ocidente cristão, seja de cultura católica, seja reformada, quase
todos achavam que o mundo fora criado pelo Deus da Bíblia, entre 5758 e 5881 anos,
portanto uns 4035 anos antes do nascimento de Cristo (KRAUSS, 2006, p. 83). Até os

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Pré-história

nossos 128 antepassados, vivos naquela época, acreditavam nisso! Portanto, datar
seus achados, como antediluvianos, mostra bem o universo cultural eurocêntrico,
cristão, historicamente datado, de Boucher.

Isso nos leva, diretamente, ao segundo ponto dessa introdução à Unidade 1: o fato de
que a disciplina foi construída aos saltos cronológicos, a cada descoberta, e as mais
recentes são as que atingem datas mais antigas. Porque os métodos, as técnicas, a
preparação científica das equipes científicas envolvidas nas pesquisas e
descobertas são sempre maiores. Mas a “narrativa” é feita do passado para o
presente, a partir de um esquema teórico, como se fosse “linear”, lógica, necessária.

Começamos do Sahelanthropus até o sapiens moderno, mas não podemos perder


de vista a luta para adquirir e organizar todo esse conhecimento. Isso, é claro, para
aqueles que, como o professor, acreditam na evolução biológica como chave de
leitura das descobertas.

1.2 A disciplina e suas questões teóricas e metodológicas

Portanto, teorias e métodos. Todo trabalho científico, em qualquer ciência, tem por
trás um quadro teórico, um conjunto de premissas escolhidas pelo pesquisador –
individual ou em equipe – a partir de uma atividade de pesquisa que busca o chamado
status quaestionis, ou seja, o estado da investigação, recolhendo e avaliando –
sistematicamente – tudo o que, de válido, já foi dito sobre um assunto. Ao longo do
Curso de História, em todas as disciplinas, vocês vão ouvir falar disso e serão treinados/
as para fazê-lo. Todo bom livro de metodologia do trabalho acadêmico trabalha isso.

No caso da pré-história em geral, e de nossa disciplina, especificamente, o quadro


teórico é baseado na Teoria da Evolução biológica, proposta originalmente por Charles
Darwin, com a publicação de sua famosa obra A origem das espécies, em 1859.

Depois, são muitas as disciplinas científicas que fornecem instrumentos, teóricos e


práticos, ao pré-historiador: a arqueologia, a paleontologia, a geologia a biologia, a
genética etc. e cada uma delas oferece quadros teóricos e metodológicos próprios.

Quando falamos de método, falamos de organização, da sequência de passos que o


pesquisador deve dar para, partindo de suas premissas, suas suposições, suas
hipóteses, chegar a conclusões bem elaboradas e fundamentadas.

Como apoio ao desenvolvimento acadêmico de vocês, essa disciplina exigirá, na


elaboração de seus exercícios valendo nota, também esse aspecto formal, o
cuidadoso seguimento dos passos indicados pelo professor. Veremos mais, adiante.

1.3 A disciplina e suas fontes bibliográficas

Muitas, muitas mesmo, são as leituras possíveis para um mergulho na pré-história. No


entanto, sugiro aqui para vocês, em função das minhas próprias leituras e anos de

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Pré-história

reflexão, os melhores livros e artigos desse momento, em português. Em todos eles


você encontrará os mesmos elementos formais: uma base teórica, um método de
trabalho, a indicação das premissas, as fontes de pesquisa utilizadas e as conclusões
que respondem às premissas. A leitura dessa obras é fundamental.

Comecemos por aquele cujo título sugeriu-me o desta


primeira Unidade, Sapiens: a evolução improvável. É um
livro recente, de 2018, publicado no Brasil em 2019, que
traz uma perspectiva surpreendente. O autor, William
von Hippel, não é um paleontólogo, um biólogo, um
arqueólogo, mas um psicólogo, nascido no Alasca,
formado em Yale e doutorado naUniversidade de
Michigan. Mudando-se para a Austrália, leciona na
Universidade de Queensland, em Brisbane.

Ele vai às fontes bibliográficas e documentais mais


importantes sobre o homem pré-histórico com uma
pergunta de pesquisa central: qual o papel
desempenhado pela evolução em moldar nossa
psicologia? E como isso pode ter sido dado? Em que
nossos medos e aquilo que nos deixa felizes, realizados,
pode nos ajudar a compreender os problemas e desafios
que nossos antepassados enfrentaram, moldando-nos
assim como somos hoje?

Em suas conclusões, ele reafirma a importância, em


nossa evolução para o que somos, da capacidade de
trabalhar em grupos, dividindo riscos e conquistas. E
resume isso em seus “agradecimentos” finais: “A
cooperação que desenvolvemos na savana não apenas
nos colocou no topo da cadeia alimentar, mas
possibilitou os esforços científicos. Como todos os outros
seres humanos neste planeta, sou produto de muitos
professores, mentores e colaboradores, e este livro
representa uma enorme empreitada cooperativa”.

É, no fundo, a mesma perspectiva de Yuval Noah Harari,


professor do programa de História Mundial, da
Universidade Hebraica de Jerusalém que, com seu
Sapiens: uma breve história da humanidade, publicado
em 2012, traduzido para o português em 2015, tornou-se
um dos autores mais lidos e influentes dessa década.

Vamos usá-lo muito na Unidade 2, Sapiens, trabalhador


e gregário. Recomendo sua compra, seja nas versões
impressas seja como e-book. Deve fazer parte da

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Pré-história

biblioteca de qualquer candidato a professor de história / historiador que queira ser


levado a sério.

Outra obra importante, porque trabalha, em outra perspectiva, o mesmo órgão cuja
evolução foi trabalhado acima, por William von Hippel, o cérebro humano, é Pré-
história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência, de Steven
Mithen, publicado originalmente em 1996, traduzido para o português em 1998.
Começa afirmando: “Para encontrar as origens da mente humana moderna temos que
mergulhar na escuridão da pré-história. Nosso ponto de partida para uma pré-história
da mente não pode retroceder menos que seis milhões de anos... ao ancestral
comum...”, que, em 1996, como ele mesmo afirma, não tinha sido encontrado (o
Sahelanthropus, acima citado só foi descoberto 4 anos depois). “Não apenas ancestral
comum, mas também elo perdido. É a espécie que nos conecta com os símios atuais –
e continua ausente nos testemunhos fósseis” (MITHEN, 1998, p. 29).

Finalmente, um livro extraordinário, seja pelo conteúdo científico, a linguagem clara e


por ser um genuíno produto nacional. Trata-se de O povo de Luzia: em busca dos
primeiros americanos, do Prof. Walter Neves, que o escreveu com o Prof. Luís
Beethoven Piló.

“A partir da narrativa de achados paleontológicos


espetaculares feitos por brasileiros (entre os quais um
dos autores) em Lagoa Santa, MG, narra de modo claro e
instigante não apenas a saga dos primeiros americanos,
como a saga correlata dos embates científicos
envolvidos”. Seus autores, segundo o que escreveram em
seus currículos Lattes têm: Walter Neves - “Graduação
em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo
(1981), estágio sanduíche pré-doutorado nas
Universidades de Stanford e Berkeley (1982), doutorado
em Ciências Biológicas pela Universidade de São Paulo
(1984), pós-doutorado pelo Center for American
Archeology, Northwestern University (1985) e pelo
Departamento de Antropologia da USP (1991-92), Livre
Docência em Evolução Humana pelo Departamento de Genética e Biologia Evolutiva
da Universidade de São Paulo (2000). Atualmente, é Professor Titular do
Departamento de Genética e Biologia Evolutiva da Universidade de São Paulo, onde
fundou e coordena o Laboratório de Estudos Evolutivos Humanos, único do gênero
da América Latina. Tem produção científica e orientação a graduandos e pós-
graduandos nas áreas de Antropologia Biológica, Antropologia Ecológica,
Arqueologia Pré-Histórica, Ecologia Humana, Psicologia Evolutiva e Paleontologia de
Megamamíferos. No momento, seu interesse e projeto de pesquisa principais
referem-se à origem do homem na América. Foi responsável pelo estudo de ‘Luzia’, o
esqueleto humano mais antigo das Américas. Dedica-se também com intensidade à
divulgação científica para o grande público, principalmente através de exposições
museográficas, livros e artigos. A partir de 2013, implantou na Jordânia o projeto

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Pré-história

‘Evolução biocultural hominínia no Vale do rio Zarqa, Jordânia: uma abordagem


paleoantropológica’, que tem como objetivo estudar os primeiros representantes do
gênero Homo que deixaram a África por volta de 2 milhões de anos) (Link Lattes:
http://lattes.cnpq.br/4940507980201276). Luís Beethoven Piló, “possui graduação em
Geogra-fia pela Universidade Federal de Minas Gerais (1989), doutorado em Geo-grafia
(Geografia Física) pela Universidade de São Paulo (1998) e Pós-doutoramento no Instituto
de Biociências da USP (2003). Atua como pesquisador e consultor nas áreas de
espeleologia, geoarqueologia e geomorfologia cárstica”. É professor, desde 2018, da UFPE
(Link Lattes: http://lattes.cnpq.br/7484340191880676). Recomendo a leitura de uma
Resenha sobre o livro. A de Hilton P. Silva, publicada em Amazônica 1 (2): 566-572,
2009 (ver https://periodicos.ufpa.br/index.php/amazonica/article/view/292) e de um
artigo científico intitulado Lagoa Santa: em busca dos primeiros americanos, através
desse link: http://dx.doi.org/10.21800/2317-66602016000400017.

Currículo Lattes, do CNPQ (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e


Tecnológico). Ainda durante o semestre você, se não tem o seu próprio, será
orientado em como fazê-lo. Estar inscritos no Lattes, ter o Orcid iD e publicar no
Academia.edu devem ser objetivos para todos os que querem frutificar ao
máximo seu curso.

O Prof. Walter Neves, será nosso frequente “convidado”, nas próximas páginas.

2. Parte 2: Traçar o quadro atual das conclusões científicas


sobre a evolução da vida na Terra

O Prof. Fabrício Rodrigues dos Santos, do Instituto de Ciências Biológicas da UFMG, em


artigo publicado em 2014, intitulado “A grande árvore genealógica humana”, escreveu as
palavras que resumem, perfeitamente, o conteúdo desta Parte 2: “A história evolutiva nos
revela os primeiros 3,5 bilhões de vida neste planeta sem qualquer espécie que
poderíamos reconhecer como ‘inteligente’ até o aparecimento do Homo sapiens. Há
pelo menos 6 milhões de anos, uma população de primatas do noroeste da África se
dividiu em duas linhagens que passaram a evoluir independentemente: a primeira
continuou no ambiente da floresta tropical e originou os chimpanzés de hoje, divididos
em dois ramos: os Pan paniscus e os Pan troglodites, e a segunda se adaptou a outros
ambientes mais abertos, nas savanas do leste africano, e resultou, há 200 mil anos, na
espécie Homo sapiens (Jobling et al., 2013). Esta antiga população africana deu origem
a todos os povos atuais” (destaques do professor). De 2014 a 2020, pequenas, médias e
grandes descoberta se sucedem e uma das mais importantes, como veremos abaixo, foi
do próprio Prof. Walter Neves e sua equipe.

Em síntese, as conclusões são essas:

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

1. Há pelo menos 6 milhões de anos, hoje se propõem 7 ou 7,5 milhões de anos,


uma população de primatas do noroeste da África se dividiu em duas linhagens.
Dessa população, chamada de “ancestral comum”, evoluíram, muito lentamente,
dois grupos. Por isso Walter Neves afirma: não somos “descendentes” de
macaco, “NÓS SOMOS MACACOS”. Macacos muito evoluídos, que “se acham”,
mas sempre macacos!
2. Para entender e afirmar isso com segurança, o estudo acerca da evolução
humana exige uma série de conhecimentos: paleoantropologia, biologia evolutiva,
arqueologia, antropologia sociocultural e o estudo dos chamados
“Monos” (grandes símios - chimpanzés, gorilas e orangotangos).
3. Nós, Homo sapiens e os Pan paniscus e Pan troglodites compartilhamos cerca de
98% dos nossos genes, o que faz deles nossos “primos” mais próximos. Já tivemos
outros, convivendo conosco nos últimos 100 mil anos, os Homo erectus, os Homo
neandertalenses e os Homo floresienses mas esses já se extinguiram.

O que temos em comum, com esses “primos” e também com parentes muito mais
distantes, os gorila (Gorillagorilla) e os orangotango (Pongo pygmaeus)? Somos
todos primatas, possuímos 5 dedos, nas mãos e pés e, especialmente o polegar
oponível aos demais dedos (no nosso caso, só nas mãos). Temos unhas, em lugar de
garras. Temos uma maior capacidade craniana, comparados aos demais mamíferos e,
fundamental, temos visão estereoscópica, isto é, tridimensional. Também vemos
todos as cores, o que não é comum nos seres vivos. Finalmente, nossas “crias” (filhos)
nascem muito dependentes, possuindo assim, uma infância mais prolongada.

Pan paniscus e Pan troglodites, Homo sapiens, Gorillagorilla e Pongo pygmaeus


Figura 3: Últimas etapas de nossa família evolutiva

Assista aqui, antes de seguir adiante, essa maravilhosa live do Prof. Walter Neves

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

“Há sete milhões de anos, provavelmente na África, viveu um


ancestral comum aos chimpanzés e a nós, humanos. Nesta
primeira conversa sobre a evolução do Homo sapiens, Walter
Neves afirma: Somos macacos! e conta o porquê”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 1 Chimpanzés e


humanos (2017 11:55). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=xT3oBWXPyYI

Passemos, agora, ao que nos difere, especialmente nos nossos crânios e o que eles
contêm, o cérebro. Em síntese:

1. Nós, seres humanos, somos bípedes. Já nossos “primos” desenvolveram um modo


de locomoção que os cientistas chamam de “nodopedalia”, isto é, andar
apoiando-se nos dos dedos das mãos.
2. Comparando nossos crânios, percebemos facilmente que os chimpanzés têm a
face projetada para a frente, enquanto a nossa é vertical.

Neurocrânio Faces Neurocrânio

Figura 4: Caixas cranianas de chimpanzés e humanos

3. Em função disso, a arcada dentária dos chimpanzés é estreita e longa, em forma


de um “U”, com caninos extremamente grandes e pontiagudos, que se alojam em
cavidades especais, chamadas “diastemas”. O desgaste destes dentes, então, é
lateral, um roca sobre o outro. Outro detalhe essencial, para distinguir, mesmo há
7 milhões de anos, as duas linhas evolutivas: no caso dos “Monos”, os nervos da
coluna vertebral entram por um orifício na parte posterior do crânio, o “foramen
magnum”, enquanto os de nossa linha evolutiva entram por baixo. Finalmente, os
“Monos” possuem uma nítida barra óssea sobre a face, o “toro supraorbital”.

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4. Já no caso dos humanos, a face não é projetada, fica abaixo do neurocrânio (a


parte do crânio que contém o cérebro); isso permite uma arcada dentária em
forma de parábola, sem caninos que se projetem, e sem o “toro supraorbital”, com
os nervos da coluna entrando por baixo do crânio. O Prof. Walter Neves explica
tudo isso nessa segunda aula, dando ênfase aos detalhes que permitem aos
especialistas decifrar os fósseis.

“Nesta segunda aula, Walter Neves apresenta as características


que diferenciam o crânio dos chimpanzés dos nossos. O
professor também mostra porque detalhes são cruciais para
decifrar fósseis”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 2 Chimpanzés e


humanos, II (2017 15:36). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=_3ESKqxuCFY

Sempre seguindo o Prof. Walter Neves, demos um passo adiante. É preciso recordar
que as características evolutivas que herdamos de nossos antepassados não ocorreram
ao mesmo tempo: andar mais bípede + canino menor + face mais curta + cérebro
maior + fabricação de ferramentas etc. Ao longo dos milênios “foram e voltaram”.

A fabricação de ferramentas, por exemplo, ANTECEDE o aparecimento de cérebros


maiores: as primeiras ferramentas apareceram entre os homo habilis, há cerca de 2,6
milhões de anos. Descobertas recentes, no Quênia, podem “aumentar” esse espaço
de tempo para 3,3 milhões de anos! Já cérebros maiores tiveram que “esperar” o
surgimento dos homo erectus, há cerca de 1,9 milhões de anos.

Portanto, pasmem-se, não foi necessário um aumento significativo do cérebro para


haver a fabricação das primeiras ferramentas. É isso que Walter Neves chama de
“evolução em mosaico”, isto é, composta de inúmeras “pecinhas”, e não, linear, como
a “marcha batida” de uma parada militar.

Muitos resultados poderiam ser esperados, mas... hoje, restou apenas uma espécie de
hominínio no planeta: o Homo sapiens. Basta recuar uns 30 mil anos, existiam,
contemporaneamente, 4 ou 5 espécies de hominínios diferentes, na Terra: Homo
erectus, Homo neandertalensis, Homo denisovanos, Homo floresiensis e Homo
sapiens. Por quê? Voltaremos a isso.

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Hominínios, antigamente chamados de hominídeos, que poderão ser


chamados, futuramente de Hominína: grupo do qual fazem parte os seres
humanos e nossos ancestrais.

Resumindo: entre 7 e 4 milhões de anos, não tínhamos muitas espécies de


hominínios vivendo ao mesmo tempo. A partir de 4,5 ou 4 milhões de anos, até 2
milhões de anos, tivemos várias linhagens de hominínios vivendo, paralelamente, na
Terra: autralopitécus afarensis, parântropus boisei e o homo habilis. Todos vivendo
no continente que chamamos África.

Em um dado momento o homo habilis pôs-se a viajar. Saiu da África, pelo que hoje
chamamos Oriente Médio, atingiu o Cáucaso. Os novos desafios, os novos ambientes,
levaram alguns grupos de habilis a evoluir e deles surgem, por volta de 2 milhões de
anos, na África ou fora dela, grupos de um novo ser, o homo erectus, que se espalham.

O homo erectus – também chamado ergaster – foi o organismo mais resistente, de


nossa macro espécie, durou 2 milhões de anos e seus últimos representantes
desapareceram nos últimos 50 mil anos. Resistente, bem adaptado, avantajado.
Restos fósseis indicam que chegavam a ter 1,80 m de altura, enquanto os demais,
acima citados, não passavam de 1,20 m. Dele evoluíram os Homo heidelbergensis,
que deram origem, na África, aos Sapiens e na Europa, aos Neandertais.

Por volta de uns 70 mil anos, houve uma grande erupção vulcânica, na Indonésia, de
um supervulcão, chamado Toba, que causou um “inverno nuclear” por cinco anos,
reduzindo drasticamente nossa espécie para uns 10.000 indivíduos, apenas. É o que a
ciência chama de “gargalo de garrafa”, ou seja, um evento que, em si, quase causou a
extinção de nossa espécie. Isso foi descoberto constatando a pouca variabilidade
genética presente, atualmente, na humanidade.

“A saga evolutiva da humanidade não aconteceu linearmente e


sim em mosaico – a linearidade é um dos mitos desmentidos
nesta terceira aula do curso do bioantropólogo Walter Neves,
no Canal USP”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 3 Evolução em


mosaico (2017 12:11). Disponível em:
https://www.youtube.com/watch?v=nYb4kbYwANE

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Pré-história

Vejam, com atenção, o quadro abaixo, em que essa sequência de espécies está
organizada pelas características cladísticas e pela datação provável de sua existência,
enquanto espécie – a datação é feita a partir dos primeiros e dos últimos indícios
fósseis até o momento identificados e datados.

Cladísticas é a Ciência baseada no princípio filogenético, que agrupa espécies


ou táxons em grupos naturais em função de um ancestral comum, proposta
pelo entomólogo alemão Willi Hennig, em 1950 (ver figura, no texto).

Figura 5: 05 Cronologia da ocorrência de espécies aparentadas à linhagem humana. Fonte: Composição do


autor, a partir de figuras usadas em SANTOS, 2014, p. 96.

Figura 6: Exemplo de sequência filogenética, proposto pela cladística. Fonte: adaptação de um cladograma clássico

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3. Parte 3: Situar a evolução da espécie humana no quadro


evolutivo global das espécies

Se a vida surgiu na Terra há 3,8 bilhões de anos, como vários indícios fósseis
presentes nas rochas formadas naquela época permitem supor, aquele específico
ramo da árvore da vida ao qual pertencemos, o dos mamíferos, primeiro, dos
primatas, em meio, e dos homos, até chegar a nós sapiens, teve seu primeiro indício
fóssil descoberto em 2001, e foi datado como tendo vivido há 195 milhões de anos, na
Era Jurássica (SCIENCE, 2001, p. 1535-1540).

Figura 8: Hadrocodium, 195 milhões de anos, China. Fonte: combinação de imagens, com a figura da capa da
Scienze (vol. 292, Issue 5521)

Este simpático bichinho, aqui reconstruído em tamanho natural por Mark A. Klingler,
do Carnegie Museum of Natural History – medindo pouco mais de 32 milímetros,
pesando 2 gramas –, do qual os pesquisadores acharam só a parte superior do crânio
(círculo vermelho) é o mais antigo mamífero até agora identificado. A identificação
de seu crânio é exemplar, para o tipo de ciência que pretendemos seguir: eu, ou você,
se tivéssemos topado, encravado em uma rocha, com um craniozinho como esse,
teríamos sequer nos dado conta do que tínhamos em mão? Provavelmente, não!

Seria preciso um olho treinado, que tivesse por trás um modelo teórico composto de
vários itens básicos: primeiro, conhecimento da teoria da evolução biológica das espécies;
segundo, conhecimento da teoria cladística, terceiro, conhecimento das “características
ósseas que hoje definem um mamífero: quatro tipos de dentes diferenciados funcional e
anatomicamente [incisivos, caninos, pré-molares e molares], ouvido médio com três
ossículos condutores de som e crânio avantajado” (PIVETTA, 2002).

O próximo indício fóssil, na longa evolução dos mamíferos, que aponta para os
primatas, foi achado em 2013, na China, e data de 55 milhões de anos. Foi chamado

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de Archicebus achilles e chamou atenção dos especialistas porque, mesmo tendo


uma longa cauda, tinha já calcanhares semelhantes aos nossos (NATURE, 2013, p. 60-
64). Outro achado fóssil importante foi o do Darwinius masillae, datado de 47
milhões de anos, achado na Alemanha, em 1983, mas só estudado a partir de 2006
(PLOSONE, 2009, e5723). Tão perfeitamente conservado, na rocha, que é possível ver
indícios da pelagem e de sua última refeição. Ele já tinha unhas, e não garras!

Para ler mais, sobre esses seres, em português, abram:

https://www.bbc.com/portuguese/ciencia/
2009/05/090519_eloperdido_primatasrc ou

https://m.folha.uol.com.br/ciencia/2009/05/568658-fossil-de-47-
milhoes-de-anos-da-pista-sobre-ancestral-dos-primatas.shtml.

Figura 9: À esquerda, o Archicebus achilles, e seus calcanhares. À direita, o Darwinius masillae

Em algum momento os primatas migraram para a África, em torno de 18


milhões de anos. Registros fósseis de 4 diferentes espécies, chamadas
genericamente de Proconsul, foram encontrados e nova característica delas é
que não tinham mais cauda.

Hoje sobrevivem 281 espécies de antropoides. Dessas, 274 são as dos chamados
macacos do Velho e do Novo Mundo (em inglês monkeys). As demais 7 sete espécies

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dividem, com o Homo sapiens, um ancestral comum: os Monos (em inglês Apes),
com duas espécies básicas de orangotangos, duas de gorilas, duas de chimpanzés e
nós, os Homo sapiens.

Sempre à escuta de um dos maiores cientistas brasileiros das últimas três décadas, o
Prof. Walter Neves, vamos seguir a sequência de suas explicações sobre as principais
espécies que podem fazer parte de nossa árvore evolutiva.

Prestem atenção aos vídeos, mantenham à mão material para anotar as principais
ideias. Se estão assistindo no computador, abram o arquivo “Bloco de Notas” e já
salvem o arquivo “.txt” com a indicação do Vídeo (por exemplo: Aula 4
Sahelanthropus). Se assistindo no smartphone, talvez seja melhor usar um caderno
de anotações.

Vou propor alguns exercícios, valendo nota, a partir dessas atividades de visualização.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 4 Sahelanthropus


tchadensis (2017 11:40)
https://www.youtube.com/watch?v=cMFsWc8tl94
“Nesta aula, o bioantropólogo Walter Neves mostra o crânio
de um antiquíssimo homíninio -- o Sahelanthropus
tchadensis, de 7 milhões de anos. O fóssil é tão antigo que
poderia até ser o chamado ‘elo perdido’ entre chimpanzés e
humanos. E já era bípede”!

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 5 Ardipithecus


ramidus (2017 11:26)
https://www.youtube.com/watch?v=UeDRKbSTYxg
“Nesta quinta aula, conheça o Ardipithecus ramidus, um dos
nossos ancestrais, que viveu na África, há quatro milhões e
meio de anos. Os arqueólogos encontraram quase um
esqueleto inteiro do ramidus, o que permite saber, segundo
Neves, que a espécie tinha características de bípede e de
primata que vivia em árvores”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 6


Australophitecus afarensis (2017 8:37)
https://www.youtube.com/watch?v=cRSMtAk9oF0
“O centro desta aula é o Australopithecus afarensis - espécie
descrita a partir da localização, na Etiópia, nos anos 1960, da
famosa “Lucy”. O afarensis viveu há 3,2 milhões de anos”.

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Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 7 Homo habilis


(2017 11:32)
https://www.youtube.com/watch?v=l5GHKjdoiqU
“Finalmente, chegamos ao gênero Homo! O bioantropólogo
Walter Neves apresenta o Homo habilis, espécie com
capacidade craniana maior que a dos chimpanzés”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 8 Homo erectus


(2017 9:28)
https://www.youtube.com/watch?v=b14-4nGYCNs
“O Homo erectus foi o primeiro homíninio a deixar a África, e o
primeiro bípede terrestre. Há 1,8 milhões de anos, a espécie já
estava no Cáucaso e dali para outras partes da Ásia. Mas por
que ele não chegou à Europa? pergunta o bioantrópologo
Walter Neves”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 9 Homo


heidelbergensis (2017 7:02)
https://www.youtube.com/watch?v=knTZzX957LM
“O bioantropólogo Walter Neves apresenta, nesta aula, os
primeiros cabeçudos -- os crânios do H. heidelbergensis têm
quase a capacidade do crânio dos Homo sapiens”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 10 Homo


neanderthalensis (2017 15:28)
https://www.youtube.com/watch?v=_XWwZoYKKbQ
“O primeiro fóssil de um neandertal data da metade do século
XIX -- uma calota craniana foi descoberta e a espécie foi
descrita. Em 1908, apareceu um crânio inteiro na França”.

Walter Neves. A Saga da Humanidade - Aula 11 Homo sapiens


(2017 16:52)
https://www.youtube.com/watch?v=AwAq2xCqXDo
“Chegou a nossa vez! O centro desta aula é o Homo sapiens,
um descendente dos H. heidelbergensis, há 200 mil anos. É
quando surgem as perguntas sobre o sentido da vida”.

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Walter Neves. A Saga da Humanidade - Observações Finais


(2017 12:57)
https://www.youtube.com/watch?v=lHL6NpmC57k
“Quer saber mais? O bioantropólogo Walter Neves recomenda
livros e exposições. E fala o que pensa sobre religião e ciência.”

Síntese da unidade

Chegamos ao final de nossa primeira Unidade, intitulada SAPIENS, a evolução


improvável. Percorremos, didaticamente, os 7,5 milhões de anos de nossa provável
evolução, até aquela mulher africana, hoje chamada Eva mitocondrial.

Verificamos como, sendo obrigado a sair da proteção das florestas, em função das
mudanças climáticas, nossos ancestrais – que já eram capazes de caminhar sobre os
pés –, diante dos desafios da sobrevivência, foram empurrados para percursos
evolutivos que privilegiaram aqueles e aquelas cujos genes os inclinavam à
cooperação, seja nas atividades de coleta de alimentos, raízes, frutas, carniça (=
trabalho), seja nas de defesa do grupo contra os grandes predadores (=
proatividade) , o que canalizou – através da sobrevivência dos mais aptos e mais
capazes de gerar prole, em função desses comportamentos – à geração de um
prole sempre mais cooperativa, comunicante, baseada em grupos solidários.

Milhões de anos de evolução, e convivência social intensa, propiciaram a


sobrevivência dos que tinham cérebros maiores e novidades foram surgindo: as
primeiras ferramentas de pedra lascada, o uso do fogo, a capacidade de adaptação a
ambientes diferentes.

Agora, passaremos à segunda Unidade, intitulada SAPIENS, trabalhador e gregário,


quando vamos percorrer os últimos 200 mil anos, passando (1) pelas tentativas de
saída da África, há cerca de 130 mil anos, (2) pela chamada Revolução criativa, há
cerca de 70 ou 60 mil anos, quando, dentro de nossas cabeças, o “tico e o teco”
começaram a “falar” entre si – como o fazem hoje – e nos tornamos, definitivamente,
humanos, e (3) por uma crise muito grave: em função de tremendas mudanças
climáticas, fomos reduzidos a cerca de 10.000 homens e mulheres em todo o mundo.
Tudo isso baseado em dados fornecidos por inúmeras ciências, como a arqueologia, a
paleontologia, a geologia, biologia, a genética, entre outras, como iremos informando,
passo a passo, a partir das fontes mais seguras.

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Pré-história

Referências

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sex, 31 ago 2018. (Acesso em 03-07-2020: https://www.unicamp.br/unicamp/ju/noticias/2018/08/31/cinco-visoes-
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CAMPS, Gabriel. Preistoria. In: BURGUIÈRE, André (a cura di). Dizionario di Scienze Storiche. Edizione italiana
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DICIO, Dicionário Online de Português, definições e significados de mais de 400 mil palavras. Todas as
palavras de A a Z. (Vários acessos: https://www.dicio.com.br).

HARTOG, Fraçois. Erodoto. In: BURGUIÈRE, André (a cura di). Dizionario di Scienze Storiche. Edizione italiana
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JOBLING, Mark. et al. Human Evolutionary Genetics. Ed. Garland Science, New York, EUA, 2013.

KRAUSS, Heinrich. O Paraíso: de Adão e Eva às utopias cnotemporâneas. Tradução de Mário Eduardo Viaro.
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LANGER, Johnni. Ruínas e mitos: a arqueologia no Brasil imperial. Tese de doutorado, UFPE, 2001. 240p.

LE GOFF, Jacques. São Luís. Tradução de Marcos de Castro. Rio de Janeiro: Record, 1999. 862p.

MITHEN, Steven. Pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência. São Paulo:
Fundação Editora da UNESP, 1998.

NATURE, 2013: NI, X.; GEBO, DL; DAGOSTO, M.; MENG. J., TAFFOREAU, P.; FLYNN, JJ. e BEARD, KC. The oldest
known primate skeleton and early haplorhine evolution. Nature, p. 60-64 (2013). (Acesso em 28-06-2020,
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NEVES, Walter A.; PILÓ, Luís Beethoven. O povo de Luzia: em busca dos primeiros americanos. São Paulo:
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NEVES, Walter A.; Lagoa Santa: em busca dos primeiros americanos. In: Ciência e Cultura vol.68 no.4 São
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PIVETTA, Marcos. A origem dos mamíferos: Fósseis de pequenas espécies descobertas no Rio Grande do Sul
podem ser os ancestrais mais próximos dos maiores animais de hoje. In: Revista FAPESP, ed. 76, 2002 (Acesso
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Pré-história

SCIENCE, 2001: LUO, Zhe-Xi; CROMPTON, Alfred W.; SUN, Ai-Lin. A New Mammaliaform from the Early
Jurassic and Evolution of Mammalian Characteristics. In: Science, vol. 292, Issue 5521, p. 1535-1540 (2001).
(Acesso em 28-06-2020, https://science.sciencemag.org/content/292/5521/1535).

SILVA, Hilton P. Resenha de O povo de Luzia: em busca dos primeiros americanos, de Walter A. Neves e Luís
B. Piló. In: Amazônica, Revista de Antropologia 1 (2): 566-572, 2009 (Acesso em 29-06-2020: https://
periodicos.ufpa.br/index.php/amazonica/article/view/292).

WILSON, John. Pensar com Conceitos. São Paulo: Martins Fontes, 2005. 184p.

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Unidade 2
SAPIENS, trabalhador e gregário

Na unidade anterior nós percorremos, didaticamente, os 7,5 milhões de anos de


nossa provável evolução, até “a mais antiga mulher, da qual todos os seres humanos
vivos hoje, em toda a Terra”, descenderiam, e que teria vivido a “cerca de 200 mil anos
atrás, no continente que, desde a antiguidade, chamamos África”.

Desta mulher, “não temos o registro fóssil, mas uma parte essencial dela continua
presente em todos nós, nas nossas mitocôndrias”: os genes de seu mtDNA.

Além desses genes, transmitidos integralmente pela mulher à sua prole, há o DNA
do núcleo de nossas células. Formado durante a fecundação do óvulo pelo
espermatozoide, tem 44 cromossomos autossômicos mais os cromossomos sexual
XY, transmitido pelo homem, e os XX, transmitido pela mulher. Esta composição é a
responsável por quem somos, enquanto indivíduos mais ou menos aptos a enfrentar
os desafios que nos cercam. Os 44 autossômicos, carregam o patrimônio genético
das duas famílias, a paterna e a materna.

Verificamos, também, que “sendo obrigado a sair da proteção das florestas” os nossos
ancestrais, “diante dos desafios da sobrevivência, foram empurrados para percursos
evolutivos que selecionaram aqueles e aquelas cujos genes os inclinavam à
cooperação, seja nas atividades de coleta de alimentos, raízes, frutas, carniça (=
trabalho), seja nas de defesa do grupo contra os grandes predadores (=
proatividade)”, o que os levou, “através da sobrevivência dos mais aptos e mais
capazes de gerar prole, em função desses comportamentos” à formação de uma
“prole sempre mais cooperativa, comunicante, baseada em grupos solidários”.

Terminamos a Unidade 1 afirmando que “milhões de anos de evolução, e convivência


social intensa, propiciaram a sobrevivência dos que tinham cérebros maiores”. As
novidades foram muitas: “as primeiras ferramentas de pedra lascada, o uso do fogo, a
capacidade de adaptação a ambientes diferentes”.

Agora, passaremos à segunda Unidade, intitulada SAPIENS, trabalhador e gregário,


na qual vamos percorrer a primeira parte dos últimos 200 mil anos, em que, através
dos sites africanos, vamos acompanhar a evolução de nosso espécie até a chamada
Revolução criativa, há cerca de 70 ou 60 mil anos. Vamos perceber que todos os
elementos desse salto cognitivo já estavam presentes nas diversas linhas genéticas
dos sapiens africanos e foram por eles levados para o resto do ecúmeno terrestre,
depois da saída da África, há cerca de 70 mil anos antes do presente e da superações
de um momento em que nossa espécie quase desapareceu, em função de uma crise
ambiental muito grave, que provocou tremendas mudanças climáticas e fomos
reduzidos a cerca de 10.000 homens e mulheres em todo o mundo. Tudo isso
baseado em dados fornecidos por inúmeras ciências, como a arqueologia, a
paleontologia, a geologia, biologia, a genética, entre outras, como iremos informando,
passo a passo, a partir das fontes mais seguras.
Objetivos da unidade

• Descrever as técnicas que permitem aos arqueólogos e pré-historiadores fazer


afirmações seguras sobre o passado remoto da espécie humana a partir dos
registros materiais do trabalho humano, no tempo.
• Relacionar as características dos grandes períodos da pré-história (Paleolítico e
Neolítico), com os registros materiais do trabalho humano. As indústrias líticas.
• Discutir o trabalho humano, como expressão de sociabilidade e construtor de
cultura. Seus registros materiais.
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Pré-história

1. Parte 1: ocupando a África

Retornemos, por um momento, à nossa possível “tata...tata...tataravó” comum, a


chamada Eva Mitocondrial. Dela não temos nenhum registro fóssil, nenhum resto
ósseo que tenha se transformado em pedra e, no entanto, temos certeza de sua
existência porque parte viva dela continua presente em nós, em nosso DNA
Mitocondrial (mtDNA), que passa de mãe para filha. Mas essa antepassada não surgiu
do nada...

Vejam essa figura, propositalmente semelhante àquela da Unidade I

Figura 1: Árvore do mtDNA antes e depois da Eva Mitocondrial


Fonte: Composição do autor

É importante compreender bem isso: a nossa antepassada, a Eva Mitocondrial, fez


parte de um dos tantos grupos de sapiens que foram ocupando diferentes locais da
África. Ela teve pais, avós, bisavós, irmãos e irmãs, primos e primas, que geraram filhos
e filhas. Ela, também, gerou filhos e filhas. Das filhas, que geram netas, que geram
filhas, que geram netas, e assim por diante, seu DNA Mitocondrial foi sendo passado.

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Pré-história

As mais recentes descobertas fósseis indicam a presença do homo sapiens


arcaico desde há cerca de 334.000 anos, na África, no sítio arqueológico de
Jebel Irhoud, no atual Marrocos (Richter, D., Grün, R., Joannes-Boyau, R. et al.,
2017, p. 293–296).

O importante é entender que, segundo o estado atual dos estudos científicos, dela, e
apenas dela, por um processo aleatório, sua herança genética chegou até nós.

Observem com atenção o mapa abaixo, um dos tantos possíveis:

Figura 2: Mapa da expansão do homo sapiens, através do DNA Mit


Fonte: National Geographic Education. Resource library

Os grupos sapiens, vivendo e lutando pela sobrevivência, foram se espalhando,


ocupando vários territórios, no continente que hoje chamamos África. Evidências
genéticas propõem que três linhas de DNA Mitocondrial ficaram na África, duas
saíram, através de caminhos diferentes e ocuparam os demais ecúmenos do
globo terrestre.

Se às linhas genéticas do mtDNA acrescentamos as linhas genéticas dos


cromossomos Y, transmitidos pelos homens, teremos um quadro muito mais
complexo. Não vamos insistir nele, mas fica o desafio, para os que se interessam
por isso.

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Pré-história

Figura 3: Mapa das migrações humanas a partir dos marcadores genéticos


Fonte: National Geographic Education. Resource library

Neste segundo mapa vemos, em laranja, as linhas do mtDNA – que herdamos de


nossa ancestral comum do sexo feminino e, em azul, as do cromossomo Y, que
herdamos do nosso ancestral comum do sexo masculino. Não significa que eles
tenham diretamente convivido e gerado prole, mas com o passar dos milênios, essas
são as linhas sobreviventes.

Para sobreviver, gerar prole, ocupar territórios, todos precisavam “ganhar o pão de
cada dia”, através da caça, da coleta de frutas e raízes, da pesca... Todas elas,
atividades cooperativas que foram deixando indícios materiais, como restos fósseis de
fogueiras, de seus ossos e dos ossos de suas caças, de seus outros alimentos e das
ferramentas usadas para cortar madeira, caçar, esfolar animais, preparar peles, abrir
ossos para chegar aos tutanos, criar objetos de adorno e por aí vai, com criações cada
vez mais sofisticadas, como, finalmente, pinturas e gravuras rupestres.

Vamos atrás desses indícios.

1.1 Com quais instrumentos científicos?

Partamos da pergunta, contida no primeiro objetivo dessa Unidade: quais são as


“técnicas que permitem aos arqueólogos e pré-historiadores fazer afirmações
seguras sobre o passado remoto da espécie humana a partir dos registros materiais
do trabalho humano, no tempo”?

Porque muitos desafios apresentam-se ao pesquisador: 1) como identificar um


“registro material” de uma atividade humana? 2) como datar esse registro? e 3) como
identificar, em um “registro material”, expressões de sociabilidade e, portanto, de
construção de cultura?

31
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Pré-história

Vamos começar a responder essas questões a partir de um caso concreto, que vocês
vão poder visitar e pesquisar, tanto através da internet, como pessoalmente. Depois, a
partir dessas repostas, poderemos retornar à saga dos nossos antepassados, desde a
Eva Mitocondrial até nós mesmos, nesse momento da história.

Nossa Universidade, a Católica de Pernambuco, abriga, desde 1982, como “fiel


depositária” um riquíssimo acervo de material paleo-arqueológico. Para isso, criou,
a seu tempo, um Laboratório – e depois – um Museu, hoje reunidos no Museu de
Arqueologia e Ciências Naturais da Universidade Católica de Pernambuco. Você
pode visitá-lo a partir do seu Portal explorando as alternativas do menu,
especialmente o do Tour Virtual.

Figura 4: Menu de opções do Museu da UNICAP


Fonte: Print do Portal, em janeiro de 2021 (https://museu.unicap.br/).

Tudo começou quando a Profa. Jeannette Maria Dias de Lima (1939-2002), então
professora do Curso de Licenciatura em Biologia, iniciou seu mestrado em História,
na Universidade Federal de Pernambuco, no início dos anos 80 do século XX. Tinha,
como projeto, o “Salvamento Arqueológico – Valorização e Ampliação dos Atrativos
Arqueológicos do Município do Brejo da Madre de Deus (PE)”. Ela pretendia fazer
um “inventários dos sítios de arte rupestre” do Brejo, para contribuir com o turismo
local, já alavancado, desde 1968, pelo espetáculo da Paixão de Cristo, durante a
Semana Santa.

A presença de pinturas em rochas, na região, já era conhecida, mas o trabalho da


Profa. Jeanette trouxe outros resultados espetaculares. Nós vamos voltar a esse
assunto, em detalhes, na Unidade IV, mas desde já algumas reflexões vão no ajudar a
entender como trabalham, tal como outros especialistas, os arqueólogos,
paleontólogos e pré-historiadores.

Primeira informação importante: a Profa. Jeanette tinha uma paixão e um projeto de


pesquisa. Sua paixão pela pré-história a levou ao mestrado. O projeto nascia de
informações que ela recebera, seja porque conhecia o Município do Brejo, seja
porque, no mestrado da UFPE, teve contato com professores e professoras que
tinham informações sobre isso. Ter uma paixão e um projeto, na vida, fazem a
diferença (vamos voltar a isso).

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

Uma bioblibliografia da Profa. Jeannette Maria Dias de Lima foi


publicada na Revista Clio Arqueológica, v. 15, em 2002, sob o
título “In memoriam” (clique aqui para ir direto à revista Clio v.
15 2002). Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/clioarqueologica/article/view/
247004/35895

Ela estava, inicialmente, preocupada em fazer um inventários de locais com traços de


pinturas em rochas, dos quais o Município do Brejo é rico. Foi levada, por pessoas do
local, a todos os lugares onde se sabia da existência de pinturas. Um desses locais,
conhecido como “Pedra do Letreiro”, aos pés da Serra da Boa Vista, ou do Estrago
(Figura 5), continha a figura antropomórfica que se tornou o símbolo da Pré-história
de Pernambuco e do Museu de Arqueologia da UNICAP (Figura 9, abaixo).

Figura 6: Detalhe de conjunto de rochas que


formam o "Abrigo-sob-rocha", conhecido como
Figura 5: Vista geral da Serra da Boa Vista Furna do Estrago. Fonte: FUNDARPE, 2008.
Fonte: Foto do autor, 2012

Para chegar ao local onde essas e outras pinturas podiam ser claramente vistas, era
preciso, partindo da estrada que do município do Brejo porta ao município de Jatobá,
a hoje asfaltada rodovia PE-145, andar 1 Km e entrar, à esquerda, em um terreno
particular, cuja propriedade é de descendentes da família Tavares de Souza, há
muitas gerações.

A área arqueológica propriamente dita foi desapropriada pela Prefeitura


Municipal do Brejo pelo Decreto Lei n. 16, de 2003 (ALBUQUERQUE LIMA, 2006,
p. 146). Ao governo do Estado tal tombamento foi pedido pela UNICAP já em
1985, tendo sido finalmente concedido, 33 anos depois, pelo Decreto n.
46.150/2018, de 13 de junho de 2018 (DOE - Poder Executivo, em 14/06/2018, na
página 6, coluna 2).

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Pré-história

Figura 7: Entrada do "Abrigo-sob-rocha" conhecido como Furna do Estrago


Fonte: FUNDARPE, 2008.

Figura 8: Trilha para a Pedra do Letreiro


Fonte: FUNDARPE, 2008.

A Profa. Jeanette foi guiada nessa aventura por moradores do local. Uma área
impérvia, escondida por exuberante vegetação. Nada “limpinho”, como agora vemos
nas fotos acima.

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

Figura 9: A “Pedra do Letreiro”.


Em baixo, à esquerda, visão geral. No centro, detalhe da “Figura símbolo”
Fonte: fotos do autor, 2005

Pronto. Os objetivos do projeto inicial pareciam cumpridos. Mas a professora, curiosa


e atenta, voltou sobre seus passos e entrou naquele estreito espaço, que a ciência
chama de “abrigo-sob-rocha”, para diferenciá-lo de uma “gruta” e de uma “caverna”.
Da importância de “abrigos-sob-rocha”, “grutas” e “cavernas”, para o conhecimento
da pré-história, vamos falar mais, adiante, aqui e nas Unidades III e IV.

Segunda informação importante: seu olhar atento percebeu vários sinais de possível
uso humano, recente e talvez antigo, seja no solo, seja no “teto” do abrigo, onde uma
mancha escura, à direita, chamava a atenção. Em uma antiga foto (Figura 10), essa
mancha é bem visível. Não parecia ser sinal de alguma fogueira recente, estava e está
até hoje, profundamente entranhada no “teto” de pedra do abrigo.

Jeanette seguiu sua intuição e decidiu-se a cavar. Ela relatou: “Em outubro de 1982,
foi realizada uma sondagem nesse abrigo, com a abertura de um corte quadrado,
com 1,5 m de lado”, dentro do qual, logo abaixo da superfície encontrou-se “restos
desarticulados de esqueletos humanos, (...) restos alimentares e material
lítico...” (LIMA, 1984, p. 91).

Terceira informação importante: a pesquisadora não continuou cavando a torto e a


direito. Antes de mais nada, segundo a legislação federal, era preciso que uma

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Pré-história

instituição – universidade, museu ou instituto de pesquisa – assumisse a guarda de


qualquer material que pudesse pertencer ao passado dos grupos humanos que
povoaram o Brasil. A Universidade Católica aceitou o encargo, criando o seu
Laboratório de Arqueologia e assumindo a responsabilidade pela custódia do que
fosse encontrado.

A primeira legislação federal específica sobre Arqueologia é a


Lei nº 3.924 de 26 de julho de 1961, que dispõe sobre os
monumentos arqueológicos e pré-históricos. Esta legislação
define o que são bens arqueológicos, estabelece a sua
propriedade pela União e proíbe seu aproveitamento
econômico (compra e venda) e sua destruição.

Outro aspecto muito importante desta Lei é a regulamentação


das autorizações de pesquisa e registro de sítios pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN). Todas as
pesquisas arqueológicas precisam ser previamente aprovadas
e autorizadas pelo IPHAN e seu resultado deve ser também
objeto de registro no Instituto, que mantém o Cadastro
Nacional de Sítios Arqueológicos (CNSA). Todos os sítios
arqueológicos reconhecidos pelo poder público devem fazer
parte deste Cadastro, por exemplo, a ficha de cadastro do sítio
da Furna do Estrago pode ser visualizada aqui:
http://portal.iphan.gov.br/sgpa/cnsa_detalhes.php?6577.

Todos os achados arqueológicos, provenientes de pesquisa ou


mesmo os achados fortuitos, são propriedade da União e
ficam sob a custódia de instituições devidamente autorizadas
pelo IPHAN, como universidades, museus ou outras
instituições de pesquisa.

O conjunto dessas ações de controle e fiscalização estão


consolidadas no Sistema de Gerenciamento do Patrimônio
Arqueológico (SGPA) que é administrado pelo IPHAN até os
dias atuais.

Da parte sua, a pesquisadora replanejou tudo – principalmente a equipe e os


recursos necessários – e em maio de 1983, continuou a investigação, ampliando a
escavação “na direção do fundo do abrigo, com a abertura de um segundo corte
estratigráfico, também quadrado, com 1,5 m de lado” (LIMA, 1984, p. 91) (Figura 11).

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Pré-história

Figura 10: teto do abrigo sobre rocha


Fonte: JHANDOFFER 1

Figura 11: O 2º e 4º cortes estratigráficos


Fonte: JHANDOFFER 2

Exploremos o conceito de corte estratigráfico. Faz parte de nossa experiência


pessoal que qualquer superfície, se não é limpa, vai acumulando poeira, com o passar
dos anos. No caso de superfícies externas, não só poeira, mas terra, pedras, areia,
detritos vegetais e animais. Com o tempo, acumulam-se camadas muito espessas.
Vejam essa foto:

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

Figura 12: Exemplo de como a deposição de detritos pode elevar, e muito, o nível da superfície
Fonte: imagens da Wikipédia e do Google Street View

É da Basílica paleocristã dedicada aos Santos Vital, Valéria, Gervásio e Protásio, hoje
acessível pela via Nazionale, em Roma (a basílica, construída em fins do Século IV, foi
consagrada pelo Papa Inocêncio I, há 1619 anos, em 28 de abril de 402 d. C.). Anos atrás,
em 1992, descendo pela avenida que liga a praça da República à praça Veneza, pela
primeira vez dei-me conta de como o tempo, e a atividade humana, acumulam camadas
após camadas.

Mas aqui, no Recife, temos o mesmo fenômeno. Vocês saberiam me dizer onde
podemos ver o quanto o nível da cidade subiu? Voltaremos a isso na Unidade IV.

Esse fenômeno cria as camadas estratigráficas. Antes das descobertas dos atuais
métodos de datação, sobre os quais falaremos abaixo, ter o registro cuidadoso da
posição relativa de cada achado já era essencial para estabelecer a datação relativa:
quanto mais à superfície, provavelmente mais recente (neo = recente). Quanto mais
profundo, mais antigo (paleo = antigo). Claro, desde que o terreno não apresentasse
sinais de ter sido remexido, seja por ações tectônicas (terremotos etc.), seja por
aquelas provocadas por animais cavadores, seja pela ação do homem, situações que
complicam, mas não impedem, tentativas de datações.

Os novos métodos de datação, ditos absolutos, criados a partir de 1952, como o do


“Carbono-14”, que permite calcular a idade de material biológico (= que contém
carbono), e o da “Termoluminescência” (e outros menos difundidos “Luminescência
opticamente estimulada”, “Ressonância paramagnética nuclear etc.”), que permitem
calcular a idade de minerais e rochas, possibilitam chegar a resultados – sempre
dentro de uma margem de erro – mais precisos. Neste caso, a datação absoluta de
um vestígio cuja posição relativa tenha sido bem documentada, permite atribuir
datações semelhantes aos demais vestígios daquela mesma camada. De fato, a Profa.
Jeanette usou uma combinação desses dois métodos.

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

Sobre o Carbono-14 ou C14e seu uso para a datação de indícios


orgânicos. Disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Carbono-14

Sobre a Termoluminescência e seu uso para a datação de


indícios minerais, leia o artigo disponível em:
https://pt.wikipedia.org/wiki/Termoluminesc%C3%AAncia.

Um artigo antigo, mas muito bom, encontra-se na Revista


ComCiência, da SBPC/JabJor: BELISÁRIO, Roberto. Carbono-14
não é único método de datação. ComCiência, n. 47, setembro
2003. Disponível em:
https://www.comciencia.br/dossies-1-72/reportagens/
arqueologia/arq06.shtml

Ela escreveu na Clio Arqueológica, citando um dos seus Relatório de Pesquisa,


publicado na Revista Symposium: “Do relatório constou, entre outros itens, a
localização e descrição do sítio Furna do Estrago, sua estratigrafia, descrição dos
sepultamentos e a metodologia adotada” (LIMA, 1985, p. 97).

Em relação à possível datação absoluta, relatou: “Em outubro de 1983 algumas


amostras de carvão coletadas em diversos níveis dos Cortes 2 e 4 da Furna do Estrago
foram encaminhadas...” para a Smithosian Institution [sic], nos Estados Unidos, tendo
fornecido datações pelo C14 “entre 1.040 +- 50 AP” (para carvão granulado achado a 25
cm de profundidade) e “11.060 +-90 AP” (para carvão retirado de uma fresta, entre
rochas, a 230 cm de profundidade) (LIMA, 1985, p. 97).

Figura 13. Fonte: ALVIM; SOUZA, 1984, p. 97

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

Em um relato anterior encontramos, também, menção às camadas de sedimentos e


ao material nelas encontrado. Descrevendo a escavação, ela anota que

desde a camada II de sedimento resistente, avermelhado, pouco espessa, até a camada


IV de sedimento castanho-escuro solto, de espessura variando entre 36 cm e 70 cm e
com profundidade máxima de 144 cm, onde ocorreram os sepultamentos,
encontraram-se dentro e fora das fossas funerárias muitas lascas de quartzo e do sílex
vulgarmente conhecido como pedra de fogo... (LIMA, 1984, p. 94).

Relata também que o “sepultamento 4”, de “um homem adulto” encontrado no


fundo da fossa – portanto no nível 4 –, esqueleto que depois tornou-se famoso,
continha entre os braços “um instrumento musical, espécie de flauta...” (LIMA, 1984, p.
93). Por isso ficou conhecido como “o flautista”. Vamos explorar tudo isso, melhor, na
Unidade IV, mas são informações-chave nessa Unidade, também.

No caso do “sepultamento 4”, as duas especialistas que trabalharam com Jeanette, as


doutoras Marília Alvim e Sheila de Souza, assim falam do “indivíduo” cujo esqueleto
de cerca de 2000 anos foi encontrado e que chamou a atenção “pela robustez e
grande capacidade craniana”: “no estudo paleopatológico observou-se lesões de tipo
degenerativo na pelve, e sinais de lesões traumáticas antigas atingindo o rádio
esquerdo e a coluna lombar (ALVIM; SOUZA, 1984, p. 94-95).

Para fechar o raciocínio sobre o que queremos ensinar, nesse momento, é preciso
transcrever outros dois trechinhos: “Entre os sepultamentos 4 e 5 (do homem e da
mulher), havia um trançado vegetal, espécie de cestaria, embrulhando restos
alimentares: fragmentos de caramujos e ossos de pequenas aves”. Isso lhe permite
uma primeira conclusão: “Os dados obtidos ainda são escassos para uma
interpretação, mas sugerem tratar-se de uma cultura cuja economia estaria baseada
na caça e coleta...” (LIMA, 1984, p. 93).

Nós podemos arriscar mais... Estamos buscando entender como os artefatos


encontrados em uma exploração arqueológica, se estudados a fundo, podem ser
interpretados como “registros materiais do trabalho humano” e, portanto, sinais de
“sociabilidade” e de “de construção de cultura”. Então, Furna do Estrago nos oferece
vários indícios:

1. Sinais de fogueiras com mais de 10 mil anos.


2. Sinais de ocupação humana ao longo de milênios.
3. Sepultamentos de 2 mil anos com o uso de “cuidados simbólicos”.
4. Restos – não casuais – de alimentos.
5. Cestaria e objetos de adorno.
6. Flautas e pinturas rupestres.
7. Sinais de cuidados comunitários aos vivos eventualmente acidentados e
imobilizados por longo período.

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Pré-história

Para desenvolver a Competência de "Reconhecer a importância do trabalho humano,


a partir de registros sobre as formas de sua organização nos diferentes contextos pré-
históricos", vamos refletir:

1. Se fosse uma fogueira ao ar livre, mesmo “redonda”, poderia ser resultado de um


fenômeno natural: um raio, em uma árvore seca, por exemplo... No fundo de um
“abrigo”, como o de Furna, muito mais difícil. A presença de restos de fogueiras,
em ambientes protegidos, é um forte indício da presença humana, em atividades
da vida cotidiana, especialmente a preparação de alimentos. Em outros
paleoambientais pode indicar proteção contra o frio e contra predadores ou, como
o caso de Furna, parte do ritual de sepultamento chamado secundário.
2. A continuidade implica um uso sapiente de um local, mesmo por populações
sapiens sem nenhuma ligação direta entre elas. Por uso sapiente entendo não
apenas ocasional, ou eventual, mas feito em função de uma análise das vantagens
do local. Vamos explorar isso nas Unidades III e IV: a Furna, a esplanada diante da
Furna, a lagoa pré-histórica, toda a área até hoje chamada de “Brejo”.
3. Nos sepultamentos, o uso de “cuidados simbólicos”, tais como “posição fetal”, face voltada
para o nascente, uso de enfeites, alimentos e objetos de uso pessoal são sinais importantes
da cultura do grupo humano a que pertencem.
4. Os sinais de uma alimentação rica e variada indicam presença no local por
períodos significativos de tempo. Se você sai para uma temporada de caça, por
exemplo, não carrega alimentos, apenas recolhe o essencial... Abriga-se em uma
gruta ou abrigo, mas de passagem.
5. As atividades de tecer esteiras e cestas são atividades sedentárias que, implicando um
uso significativo de “trabalho no tempo”, retirado da mera luta pela sobrevivência,
indicam, com boa probabilidade, uma sociedade culturalmente evoluída. A fabricação
de objetos de adorno, que também implicam em um uso sofisticado do tempo,
reforçam essa percepção. Usar tais produtos para honrar os mortos acrescenta ainda
mais significados.
6. A presença de “instrumentos” capazes de produzir sons modulados e a presença
de representações artísticas nas rochas em torno à Furna e em outros locais do
Brejo, são sinais indicativos de sensibilidades sofisticadas e podem indicar diversos
usos simbólicos.
7. Finalmente, um grupo humano capaz de manter em vida um de seus membros
acidentados, necessitado de imobilização e longo tempo de convalescência”, até
que se restabeleça e volte ao trabalho comunitário, como parecem indicar os
indícios encontrados no esqueleto do “flautista, parece demonstrar um sofisticado
grau de cultura.

1.2 Com quais fontes de pesquisa

Tendo isso em mente, como vamos voltar ao passado de nossa espécie, recuperando
os mais importantes indícios arqueológicos de nossa caminhada, até nosso presente?

Na UNIDADE 1 foram sugeridos vários livros, lembram-se? Entre eles:

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

• Sapiens: uma breve história da humanidade, de Yuval Noah Harari;


• O povo de Luzia: em busca dos primeiros americanos, de Walter A. Neves e Luís
Beethoven Piló e
• A pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência, de
Steven Mithen. Vamos continuar a usá-los.

Mas, agora, quero propor quatro importantes Portais da Internet, que têm, sobre
os livros físicos e mesmo os e-books, a vantagem de estarem sempre em
atualização. Sugiro:

1. A Wikipédia (https://pt.wikipedia.org/wiki/).
2. A Smithsonian Institution (https://www.si.edu/).
3. A Bradshaw Foundation (http://www.bradshawfoundation.com/index.php).
4. O Google Acadêmico (https://scholar.google.com.br/?hl=pt).

PROFESSOR!!! O senhor sugerindo a Wikipédia! Sim. Ela está se tornando o maior


repositório de informações jamais criado. Tem um controle, cada vez mais sofisticado,
da qualidade científica do que oferece. Aceita contribuições. Tem, é claro, seus limites,
mas está consciente deles. Nós vamos aprofundar, em aula, esses aspectos. Desde já,
sugiro que entre na Wikipédia sempre pelo link acima. Depois, à direita, em cima, use
“Pesquisar na Wikipédia”, para procurar qualquer resposta.

Figura 14: Portal da Wikipédia


Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/

Outra sugestão importante: aberta um página específica, verifique, clicando na


coluna à esquerda, como essa página se apresenta em outros idiomas, especialmente
o inglês e o espanhol. Você verá que, normalmente, são textos muito mais
sofisticados, trazendo não só muito mais notas (referências) como sugestões
bibliográficas. Experimente buscando “pré-historia”. Nesse caso específico você verá
que a versão em espanhol é, de longe, a mais completa.

O segundo Portal, o da Smithsonian Institution, para que tem um mínimo de


experiência no uso da língua inglesa (ou sabe usar um bom programa de tradução),
abre para o mundo das ciências e da história do passado do espécie humana, das
sociedades atuais e muito, muito mais! A Fundação que o mantém o apresenta como
“o maior complexo de museus, educação e pesquisa do mundo”, como “comunidade
de aprendizagem” e de “abridores de portas”. O Portal permite o "download", a partilha
e o reuso de mais de 3 milhões de itens digitais em 2D e 3D, das coleções do Museu
(minhas traduções). Como futuros professores, frequentem e se inscrevam.

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Pré-história

Figura 15: Portal da Smithsonian Institution


Fonte: https://www.si.edu/

O terceiro Portal, o da Bradshaw Foundation, nos oferece várias opções, sempre para
que tem um mínimo de experiência no uso da língua inglesa (ou sabe usar um bom
programa de tradução). Na sequência dessa Unidade e na Unidade III, vamos
aproveitar especialmente o link que leva ao Rock Art Network ( = Rede da arte em
rochas http://www.bradshawfoundation.com/rockartnetwork/index.php).

Figura 16: Portal da Bradshaw Foundation


Fonte: http://www.bradshawfoundation.com/index.php

Porque nos permite visualizar a expansão do homo sapiens na superfície do globo


terrestre através de um indício específico de sua presença, as pinturas e as gravuras
feitas nas superfícies rochosas, e às pesquisas em cada um desses locais.

É possível afirmar que esses registros nos permitem descrever inúmeras pequenas
sociedades caçadoras-coletoras, usando ferramentas e, nos últimos 75 mil anos,
exprimindo-se através de pinturas e gravuras rupestres, deixando registrada para a
posteridade a riqueza de sua percepção da natureza que as cercava.

Finalmente, o Google Acadêmico, a versão em nosso idioma do Google Scholar


original. Para encontrar artigos científicos sobre quaisquer assuntos específicos, é

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Pré-história

mais seguro do que usar o Google normal. O importante, sempre, é verificar a qual
link as respostas encaminham. Façam o teste colocando “Furna do Estrago” na linha
de pesquisa. Vejam um dos resultados:

Figura 17: Google Acadêmico - um dos resultados


Fonte: Google Acadêmico, janeiro de 2021

Ao longo da disciplina, como um treinamento para todos que querem ir a fundo, seja
como professores e professoras, seja como pesquisadores e pesquisadoras, vamos
explorar bem esse instrumento.

2. Parte 2: da África para o resto do mundo

Tendo isso em mente, voltemos ao passado de nossa espécie, recuperando os mais


importantes indícios arqueológicos de nossa caminhada, até nosso presente, entre 200
mil e 70 mil anos antes do presente.

Vamos nos concentrar no continente africano, porque nele a nossa espécie, os sapiens,
espalhou-se e evoluiu, segundo a maioria dos indícios fósseis até hoje identificados.
Antes de 130 mil anos – sempre mais ou menos – não há indícios significativos de um
sapiens fora do território africano.

Fazendo uma síntese, a partir de um artigo recente e bem documentado, destacamos:

1. A África foi o local de nascimento do Homo sapiens e nela foram achadas, seja ao
Sul, ao Leste e ao Norte, as primeiras evidências de comportamento simbólico e
tecnologias complexas.
2. O florescimento precoce, mas bem atestado, dessas características, foi em uma
zona de refúgio glacial na costa sul de 100 a 70 mil anos atrás (especialmente nas
Cavernas de Blombos e Sibudu).
3. No entanto, foi da África oriental (ou Leste) e não da África do Sul, que partiu a
primeira grande expansão demográfica documentada, entre 70 e 60 mil anos, que
levou ao povoamento do resto do mundo.
4. Uma possível explicação do item 3 é que traços culturais importantes foram
transmitidos do Sul para o Leste, nessa época. Há um sinal mitocondrial de
tal dispersão, logo após 70 mil anos, na única vez, nos últimos 200.000 anos,
em que as condições de clima úmido abrangeram tanto o Sul quanto a
Áf rica tropical.
5. Esta dispersão precedeu de poucos milênios as expansões para fora da África,

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Pré-história

potencialmente fornecendo o gatilho para essas expansões ao transmitir


elementos culturais significativos do refúgio glacial da África austral.

Encontrei um artigo, de 2019, na Nature, sobre isso. Intitulado


“Fósseis da Caverna de Apidima oferecem as mais antigas
evidências do Homo sapiens na Eurásia” (trad. do autor), de 210
mil AP (in https://doi.org/10.1038/s41586-019-1376-z), atualizado
em 01/2021. Mas são indícios muito frágeis.

Veja também em Sci Rep (Scientific Reports), também de 2019,


o artigo “A dispersão do Homo sapiens da região Sul para a
Leste da África precedem de pouco a migração para fora da
África” (in https://doi.org/10.1038/s41598-019-41176-3), atualizado
em 01/2021.

2.1 A África foi o local de nascimento do Homo sapiens e nela foram


achadas as primeiras evidências de comportamento simbólico e
tecnologias complexas

De uma maneira geral, se comparados aos hominínios anteriores (homo habilis,


homo erectus ou ergaster, homo antecessor), os caçadores-coletores sapiens
africanos caçavam mamíferos maiores e dependiam de uma variedade de plantas
comestíveis, tanto nas pastagens que agora são o deserto do Saara quanto nas
florestas tropicais da África Central. Os povos costeiros também subsistiam de frutos
do mar e vários sambaquis indicam sua dieta. Os dois mapas abaixo permitem
compreender quanto mudou o continente, nos últimos 100 mil anos, e o porquê de
encontrarmos fósseis em áreas que são, hoje, imensos desertos.

Figura 18: Continente africano há 100 mil Figura 18: Continente africano há 100 mil anos AP
anos AP Fonte: Wikimedia Commons Fonte: Wikimedia Commons

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Pré-história

Do ponto de vista do desenvolvimento tecnológico, por exemplo, existem evidências


de que o tratamento térmico sistemático da pedra chamada “silcrete” começou há
cerca de 164 mil anos atrás, no local sul-africano hoje chamado de Pinnacle Point,
para aumentar sua capacidade de lascar para fins de fabricação de ferramentas.

A Silcrete é uma forma de crosta terrestre endurecida (resiste a lascamento ou


pulverização) formada quando a areia e o cascalho da superfície são
cimentados por sílica dissolvida.

No norte da África os sapiens desenvolveram outro método avançado de


fabricação de ferramentas de sílex, hoje conhecida como indústria Ateriana (figura
20), caracterizada por uma protuberância na parte oposta à ponta, envolvendo
lascas de um núcleo preparado. Isso permitiu mais controle sobre o tamanho e a
forma da ferramenta acabada e levou ao desenvolvimento de ferramentas
compostas, pontas de projéteis e raspadores, que podiam ser colocados em
lanças, flechas ou cabos, de ossos ou de madeira (os sítios da Cultura Ateriana têm
datações entre 175 mil e 40 mil AP).

Figura 20: Mapa da localização de Pinnacle Point Figura 21: Escavações em 2011
Fonte das figuras acima e ao lado: Wikipédia em Italiano (https://
it.wikipedia.org/wiki/Pinnacle_Point)

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Pré-história

Figura 22: Imagem da ponta de flexa Ateriana Figura 23: Localização do sítio de Bir El Ater
Fonte: Wikipédia Fonte: Wikipédia

É importante notar que as primeiras armas de projétil, isto é, que poderiam ser
lançadas à distância, tipo dardos ou lanças de arremesso, dotadas de ponta de pedra
(uma ferramenta que é característica do Homo sapiens), foram descobertas em 2013,
no sítio etíope de Gademotta, e datam de cerca de 279 mil anos atrás.

Figura 24: Instrumentos de pedra de Gademotta


Fonte: Wikipédia, composição do autor

2.2 O florescimento precoce, mas bem atestado, dessas características,


foi em uma zona de refúgio glacial na costa Sul de 100 a 60 mil anos
atrás (especialmente nas Cavernas de Blombos e Sibudu)

Quando falamos em “idade da pedra” e em “homem das cavernas” as imagens que


nos vêm à mente são de seres primitivos enrolados em peles, dormindo sobre areia,
cascalhos, pedras, reunidos em torno a uma fogueira. Mas não é bem assim. Os

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Pré-história

sítios de Blombos e Sibudu vão nos dar uma antevisão diferente de como viveram
nossos antepassados genéticos, quando ainda abitavam o território que hoje
chamamos África.

Figura 25: Ferramentas ósseas do nível estratigráfico “Still Bay”, em Blombos, com cerca de 75 mil anos AP e
do nível “Howiesons Poort”, em Sibudu, com cerca de 61 mil anos AP

Fonte: BRADFIELD; CHOYKE, 2016. Os quatro primeiros (da esquerda para a direita) são “furadores”, de
Blombos. Os dois centrais, já foram interpretados como pontas de projétil, assim como a ponta óssea à
direita, que vem de um nível estratigráfico com cerca 61 mil AP, em Sibudu. Imagens fornecidas aos autores
do estudo, como cortesia de Christopher Henshilwood, Francesco d'Errico e Lucinda Backwell.

Embora ainda fossem caçadores-coletores, há evidências de que os sapiens africanos,


por volta de 100 mil anos, não só colhiam, mas administravam ativamente os recursos
alimentares de origem vegetal.

Existem também os primeiros sinais de arte aparecendo através do uso do ocre como uma
decoração corporal e pintura, e rituais de enterro podem ter sido praticados também.

Há evidências arqueológicas de uma variedade de comportamentos indicativos de


modernidade comportamental, datados do que é chamada a Idade da Pedra Média
Africana, associadas ao Homo sapiens arcaico.

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Pré-história

A capacidade de conceber e criar imagens abstratas, sinais de estratégias de


subsistência ampliadas e outros comportamentos “modernos” foram descobertos
nesse período na África, seja na África do Sul, seja na do Norte e do Leste.

O local da Caverna de Blombos, na África do Sul, por exemplo, é famoso.

Figura 27: Mapa da localização da Caverna de Blombos, na África do Sul


Fonte: Wikipédia

Nele foram achadas as primeiras placas retangulares de ocre, gravadas com desenhos
geométricos. E a transformação de conchas em objetos, que eventualmente poderiam
ser ligados por um fio e usados como adorno.

Figura 28: Blombos, traçados de ocre sobre pedra; pedra gravada


Fonte: Wikipédia

Figura 29: Conchas perfuradas


Fonte: Wikipédia

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Pré-história

Usando várias técnicas de datação, o local parece ter sido


habitado entre 100 e 75 mil anos AP (antes do presente). Sugiro
a visita, e leitura, da versão em espanhol da Wikipédia, sobre o
sítio arqueológico, em:
https://es.wikipedia.org/wiki/Cueva_de_Blombos,

Em 2008, uma verdadeira oficina de processamento de ocre, provavelmente para a


produção de tintas, foi descoberta na Caverna de Blombos, datando de cerca de 100
mil anos AP. A análise mostra que uma mistura rica em pigmento liquefeito foi
produzida e armazenada nas duas conchas de abalone, e que ocre, osso, carvão,
rebolos e martelos também formavam uma parte composta dos kits de ferramentas.

“A descoberta e o reconhecimento dessas ferramentas forçaram os cientistas que


lidam com a evolução cognitiva e comportamental humana a apreciar toda a
complexidade do repertório tecnológico dos primeiros Homo sapiens
africanos” (MELLARS et al., 2007 apud BRADFIELD; CHOYKE, 2016).

Contas e outras ornamentações pessoais foram encontradas no Marrocos, e podem


ter até 130.000 anos. Arpões de osso foram encontrados na região centro-africana de
Katanda, datando de cerca de 90 mil AP. A Caverna de Lareiras na África do Sul
rendeu um número de contas que datam de muito antes de 50 mil anos atrás.
Recipientes feitos de casca de ovo de avestruz, provavelmente usados como
recipientes de água a serem levados pelos caçadores e, além disso, gravados com
desenhos geométricos, datados de 60 mil anos atrás, foram encontrados em
Diepkloof, África do Sul.

Mas é a Caverna de Sibudu (Sibudu Cave), com datações entre 70 e 60 mil anos AP, que,
como a de Blondos, nos traz uma longa lista de avanços tecnológico.

Vários exemplos da tecnologia humana primitiva foram encontrados, conforme nos


indica o site específico da Wikipédia em português (in https://pt.qaz.wiki/wiki/
Sibudu_Cave):

1. Uma ponta de osso, uma possível ponta de flecha, que empurra a origem da
tecnologia de arco e flecha de osso para 61.000 anos atrás, pelo menos 20.000
anos além do primeiro exemplo anterior.
2. A primeira agulha de osso conhecida, datada de 61.000 anos atrás, com
desgaste semelhante ao encontrado em agulhas de osso usadas para perfurar
couro animal.
3. O exemplo mais antigo de uma cola composta (goma de planta e ocre vermelho),
usada para unir pontas de pedra em cabos de madeira para criar lanças - datado
de não mais de 71.000 anos atrás.

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Pré-história

4. Contas de concha, embora de uma data mais recente do que as encontradas na


caverna de Blombos (71 mil anos atrás para as contas de Sibudu, contra 75 mil
para as de Blombos).
5. Um exemplo do uso de cama, que data de aproximadamente 77.000 anos atrás,
com o folhas do “louro do cabo” sendo usadas por cima, provavelmente por suas
propriedades inseticidas.
6. O uso mais antigo de leite (caseína) como aglutinante de tinta em uma mistura
de leite com ocre (49 mil anos atrás).
7. Frutos secos, sementes carbonizadas e não carbonizadas.

Últimos exemplos desses avanços tecnológicos e comportamentais:

A expansão das estratégias de subsistência para além da caça grossa e a


consequente diversidade de tipos de ferramentas tem sido observada como sinais de
modernidade comportamental. Vários sítios sul-africanos demonstraram uma
dependência precoce dos recursos aquáticos, desde peixes a crustáceos. O Pinnacle
Point, em particular, mostra a exploração dos recursos marinhos já em 120.000 anos
atrás, talvez em resposta às condições mais áridas do interior.

Estabelecer uma dependência de depósitos previsíveis de moluscos, por exemplo,


poderia reduzir a mobilidade e facilitar sistemas sociais complexos e comportamento
simbólico. Novamente a Caverna de Blombos e o Local 440, no Sudão, também
mostram evidências de pesca. Mudanças tafonômicas em esqueletos de peixes em
Blombos foram interpretadas como captura de peixes vivos, claramente um
comportamento humano intencional.

Síntese da unidade

Chegamos ao final de nossa segunda Unidade, intitulada SAPIENS, trabalhador e


gregário, na qual percorremos a primeira parte dos últimos 200 mil anos, em que,
através dos mais espetaculares sites arqueológicos africanos, acompanhamos a
evolução de nosso espécie até a chamada Revolução criativa, há cerca de 70 ou 60
mil anos.

Aprofundamos a questão da Eva Mitocondrial e dos marcadores genéticos que nos


permitem entender como nossos antepassados sapiens se espalharam pelo mundo.

Discutimos, usando o exemplo das escavações de Jeannette Maria Dias de Lima,


professora da UNICAP, em Furna do Estrago, como identificar um “registro material”
de uma atividade humana, como datar esse registro e como identificar, em um
“registro material”, expressões de sociabilidade e, portanto, de construção de cultura.

Falamos das novas fontes de pesquisa que foram usadas nessa Unidade e serão
usadas nas Unidades III e IV. Finalmente recuperamos elementos significativos dos
processos de evolução dos sapiens entre 200 mil e 70 mil anos antes do presente,
para perceber que todos os elementos do salto cognitivo – os avanços tecnológicos,

51
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Pré-história

as expressões de sociabilidade e de comunicação, o aprimoramento da qualidade de


vida –, já estavam presentes nas diversas linhas genéticas dos sapiens africanos.

Como pudemos notar, a questão do “trabalho humano”, produtor de cultura e


sociabilidade, a partir da identificação de seus registros materiais e das possíveis
formas de sua organização, foi o fio condutor dessa Unidade!

Na próxima unidade, intitulada SAPIENS, viajador e desbravador, vamos estudar a


saída da África e a ocupação dos ecúmenos que portaram, há quarenta mil anos, a
uma fase de desenfreada criatividade, até à invenção da escrita, há cerca de 5200 AP,
em Uruk, na Suméria.

Referências

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Estrago, Brejo da Madre de Deus - PE. Dissertação de Mestrado. UFPE, 2006, in: https://repositorio.ufpe.br/
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Deus, Pernambuco estudos morfológicos e patológicos. Clio Arqueológica, n. 01 1984 p. 95-97, in: https://
periodicos.ufpe.br/revistas/clioarqueologica/article/view/247257, acesso em 12/2020.

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BRADFIELD, Justin; CHOYKE, Alice M. Bone Technology in Africa. In: Helaine Selin. Encyclopaedia of the
History of Science, Technology, and Medicine in Non-Western Cultures. Springer Science and Business
Media. Springer, Dordrecht, 2016. https://doi.org/10.1007/978-94-007-3934-5_8476-2, acesso em 01/2021.

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GIUSTI, Donizeti. Fundamentos de Geologia e Geoquímica. USP sites.poli.usp.br. In: http://


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HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Porto Alegre: L&PM, 2015.

HARVATI, K., RÖDING, C., BOSMAN, A.M. et al. Apidima Cave fossils provide earliest evidence of Homo
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File:Brejo_Sitio_arqueologico_2.jpg, acesso 12/2021.

JHANDOFFER 2 - Obra do próprio, CC BY-SA 4.0, in: https://commons.wikimedia.org/wiki/


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LEITE, M. N. CASTRO, V. M. de; CISNEIROS, D. Furna do Estrago, Brejo da Madre de Deus, PE. Reflexões Sobre
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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

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periodicos.ufpe.br/revistas/clioarqueologica/article/view/247241, acesso 12/2021.

LIMA, J. M. D. DE. Arqueologia do Brejo da Madre de Deus. Clio Arqueológica, n. 01 1984, p. 91-94, in: https://
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MENDES, Eduardo B. Levantamento Planialtimétrico do Conjunto Arqueológico Pré-histórico dos Sítios


Furna do Estrago e Pedra do Letreiro. Relatório Consolidado. Fundarpe, 2008 (imagem digitalizada da
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MITHEN, Steven. Pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência. São Paulo:
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Wikimedia Commons in https://commons.wikimedia.org/wiki/Portada, conferido em 01/2021.

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Unidade 3
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Pré-história

SAPIENS, viajador e desbravador

Na unidade anterior, nós percorremos, o mais didaticamente possível, a primeira


parte dos últimos 200 mil anos da história da nossa espécie. Assim, através do acesso
virtual a alguns dos mais espetaculares sítios arqueológicos africanos,
acompanhamos a evolução de nossos avoengos até a chamada Revolução Criativa,
há cerca de 70 ou 60 mil anos.

Aprofundamos a questão da Eva Mitocondrial e dos marcadores genéticos que nos


permitem entender como nossos antepassados sapiens se espalharam pelo mundo.
E como o desafio de “ganhar o pão cotidiano” marcou nosso desenvolvimento social,
cultural e tecnológico.

Falamos das novas fontes de pesquisa, que serão usadas nesta Unidade e na Unidade IV
e de como todos os elementos ligados ao trabalho humano, produtor de cultura e
sociabilidade, já estavam presentes nas diversas linhas genéticas dos sapiens africanos.

Nesta nova Unidade, intitulada SAPIENS, viajador e desbravador, vamos estudar a


saída da África e a ocupação dos ecúmenos que portaram, há quarenta mil anos, a
uma fase de desenfreada criatividade que culminou na invenção da escrita, há cerca
de 5200 AP, em Uruk, na Suméria. Vamos acompanhar a chegada de grupos
humanos ao continente americano e sua dispersão, no atual território brasileiro, até
as primeiras evidências arqueológicas pré-históricas em Pernambuco.

Objetivos da unidade

• Acompanhar expansão do Sapiens sapiens, sua saída da África e sua progressiva


penetração em áreas habitadas pelo Homo Erectus e o Homo de Neandertal.
• Acompanhar a chegada e ocupação dos territórios hoje chamados Américas, Brasil
e Pernambuco.
• Traçar o quadro das principais sociedades que se desenvolveram a partir da
chamada revolução agrícola e definir suas características.

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

1. Parte 1: O “motor” da dispersão do gênero humano

Como podemos notar, a questão da expansão dos sapiens, sua ocupação de novos e
radicalmente diferentes territórios, como a Oceania, seu encontro com outros homos
ainda dominantes, na Ásia e na Europa, como os Erectus e os Neandertais, e os
“misteriosos” Denisovanos, sua passagem para as Américas e sua chegada ao que
hoje é o território brasileiro, é o fio condutor dessa Unidade, sempre a partir da
identificação de seus registros materiais e das suas possíveis formas de organização.

Como primeiro passo, nesse novo percurso, retornemos ao conceito-chave de


Revolução criativa, ou cognitiva. Já explicamos esse conceito em nossa primeira
Unidade, mas, só para recordar, ele é a maneira de nossa disciplina indicar aquele
momento, “há cerca de 70 ou 60 mil anos, quando, dentro de nossas cabeças, o ‘tico e
o teco’ começaram a ‘falar’ entre si – como o fazem hoje – e nos tornamos,
definitivamente, humanos” (Unidade I, p. 28).

Segundo Yuval Harari, em Sapiens,

três importantes revoluções definiram o curso da história. A Revolução Cognitiva deu


início à história, há cerca de 70 mil anos. A Revolução Agrícola a acelerou, por volta de 12
mil anos atrás. A Revolução Científica, que começou há apenas 500 anos, pode muito
bem colocar um fim à história e dar início a algo completamente diferente... A maioria
dos pesquisadores acredita que essas conquistas sem precedentes foram produto de
uma revolução nas habilidades cognitivas dos sapiens (2015. No e-book, Parte I, A
Revolução Cognitiva, Item 1).

São várias as suposições científicas (não dizemos hipóteses, porque hipóteses são
partes dos processos cognitivos das ciências “duras”, devem ser comprovadas em
laboratório), que buscam explicar o primeiro desses saltos qualitativos, a partir dos
indícios fósseis da atividade sapiens e dos resultados, sempre mais precisos, das
análises de nossos DNAs.

Os dados que vêm à tona, dia após dia, a partir das descobertas nos sites da pré-
história indicam que “novas formas de pensar e se comunicar”, que começaram a
ficar registradas quando ainda nossos antepassados sapiens estavam no continente
que desde a antiguidade passou a ser conhecido como África, e se reproduzem nos
registros Out of Africa (=fora da África) entre 70 mil e 30 mil anos atrás, constituíram
a Revolução cognitiva. Talvez mutações genéticas acidentais, que alteraram as
sinapses do cérebro dos sapiens, “possibilitando que pensassem de uma maneira
sem precedentes e se comunicassem usando um tipo de linguagem totalmente
novo” (HARARI, 2015).

A grande questão é: o que houve de tão revolucionário nas novas formas de


linguagem dos sapiens africanos, que nós herdamos e que nos permitiu conquistar o
mundo e, talvez, acabar com ele, em um próximo futuro?

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Pré-história

Walter Neves, que conhecemos nas Unidades I e II, escrevendo dez anos antes de
Harari e, portanto, antes de várias descobertas significativas, disse:

tal mudança explosiva tem sido denominada na literatura de Revolução Criativa do


Paleolítico Superior e se caracteriza, antes de tudo, pela injeção de uma criatividade
ilimitada em todos os setores da vida. É a partir dela que surgiram também, pela
primeira vez no planeta, evidências incontestes de expressão simbólica. Em síntese, foi só
a partir do Paleolítico Superior que nos tornamos seres conscientes, capazes de
representar o mundo exterior e a nós mesmos (NEVES; PILÓ, 2008, p. 54).

Harari explica, em “A árvore do conhecimento”, capítulo 2 de seu Sapiens:

lendas, mitos, deuses e religiões apareceram pela primeira vez com a Revolução
Cognitiva. Antes disso, muitas espécies animais e humanas foram capazes de dizer:
‘Cuidado! Um leão!’. Graças à Revolução Cognitiva o Homo sapiens adquiriu a
capacidade de dizer: ‘O leão é o espírito guardião da nossa tribo’. Essa capacidade de
falar sobre ficções é a característica mais singular da linguagem dos sapiens
(HARARI, 2015).

E explica, a partir de vários achados pré-históricos, como o da estatueta conhecida


como o homem/mulher leão da caverna de Stadel, como funciona a linguagem
simbólica e como sua conquista libertou os sapiens da limitação socioantropológica
de até 150 indivíduos por grupo. Ele mostra como isso continua funcionando para
nós, no hoje da história, através de um trecho de seu capítulo que ele intitula “A lenda
da Peugeot”:

após a Revolução Cognitiva, a fofoca ajudou o Homo sapiens a formar bandos maiores
e mais estáveis. Mas até mesmo a fofoca tem seus limites. Pesquisas sociológicas
demonstraram que o tamanho máximo ‘natural’ de um grupo unido por fofoca é de
cerca de 150 indivíduos... Ainda hoje, um limite crítico nas organizações humanas fica
próximo desse número mágico (HARARI, 2015).

Harari pergunta-se, então: “como o Homo sapiens conseguiu ultrapassar esse limite
crítico, fundando cidades com dezenas de milhares de habitantes e impérios que
governam centenas de milhões?” e sugere que

o segredo foi provavelmente o surgimento da ficção. Um grande número de estranhos


pode cooperar de maneira eficaz se acreditar nos mesmos mitos. Toda cooperação
humana em grande escala – seja um Estado moderno, uma igreja medieval, uma
cidade antiga ou uma tribo arcaica – se baseia em mitos partilhados que só existem na
imaginação coletiva das pessoas (HARARI, 2015).

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Pré-história

Figura 1: o homem/mulher leão da caverna de Stadel, a deusa egípcia Sekhmet e o símbolo da Peugeot.
Fontes: commons.wikimedia.org

Para entender bem essas afirmações e suas consequências, vamos rediscuti-las e


aprofundar os 5 pontos abaixo, já destacadas na Unidade II:

2 O florescimento precoce mais bem atestado dessas características distintas do


sapiens africano foi constatado em uma zona de refúgio glacial na costa sul da
África, de 100 a 70 mil anos atrás (especialmente na Caverna de Blombos).

Tudo indica que a orla oceânica, meridional ou austral, ao Sul do continente


africano, tornou-se, durante a última grande glaciação, entre 100 e 70 mil anos AP,
um dos poucos refúgios dos sapiens africanos em fuga dos desertos.

Figura 2: pedra com possível gravura intencional, achada em Blombos, que indicaria um salto
cognitivo, em direção ao pensamento simbólico. Fonte: Wikipédia

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Pré-história

Os especialistas propõem 5 grandes períodos glaciais, nos últimos 2 milhões de


anos, o último dos quais, entre 110 mil e 12 mil AP, na parte final do Pleistoceno. É
chamado, segundo as áreas geográficas atingidas, de Glaciação Wisconsin (pelos
cientistas norte-americanos), Würms e Vístula (pelos europeus), Mérida
(Venezuela), Llanquihue (Chile), Otago (Nova Zelândia) e Lauricocha (Perú). Para
quem se interessar, recomendo o artigo em espanhol da Wikipédia (“Glaciación”).

2 No entanto, foi da África oriental (ou Leste) e não da África do Sul, que partiu a
primeira grande expansão demográfica documentada, entre 70 e 60 mil anos, que
levou ao povoamento do resto do mundo.

Vocês recordam o Mapa da expansão do homo sapiens, através do DNA Mit (Figura
2 da Unidade II)? Vamos estudar melhor, agora, só a parte africana dele:

3
4

Figura 3: mapas da expansão do homo sapiens na África, através do DNA Mit e Mapa político atual da África
oriental. Fonte: National Geographic Education. Resource library (detalhe)

O círculo indica a área do possível início da nossa espécie, há 200 mil anos. As
diversas linhas L0, L1 e L2, as migrações internas dos sapiens, entre 200 e 100 mil
anos AP, partem dessa área inicial. Também a linha L3, que vai rumo ao Norte e sai
da África em duas diferentes ondas migratórias, a “N” e a “M”, parte dali.

O que os estudos propõem é que a L3 recolheu os traços culturais desenvolvidos


no Sul e retornados ao Leste, como afirmado abaixo. Porque é somente o sinal
mitocondrial L3 que, aparentemente, sai da África, até os tempos históricos, e que
carrega consigo os avanços culturais do L0.

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Pré-história

2. Parte 2: os sinais materiais da saída dos sapiens da África


em direção ao resto do mundo

2.1 Cronologia, localização dos temas e sítios arqueológicos e visão geral


das prováveis migrações, segundo o DNAMit, que vamos apresentar:

Datação
Sítio e localização
aproximada
O “cenário” da dispersão a partir do Sul (do Leste da África para a Pen
70-50 mil AP
ínsula arábica)

70-30 mil AP O Hominídeo de Denisova, Sibéria e Baishiya Karst, Tibet

O encontro/desencontro com o Homo de Neandertal, no Oriente


70-27 mil AP
médio e Europa
A teoria da catástrofe ambiental provocada pela explosão do vulcão
75-65 mil AP
Toba, Indonésia

45-43,9 mil AP As pinturas rupestres mais antigas do mundo, Indonésia

40 mil AP Fazendo roupas na Idade da Pedra, Alemanha

33-15 mil AP As Cavernas de Chauvet, na França e Altamira, na Espanha

30 mil AP Vênus de Willendorf, Áustria

Dolní Věstonice, na Europa Central

22-13 mil AP Estruturas circulares feitas de ossos de mamutes


Primeiras estruturas em pedra, em Boncuklu Tarla e Göbekli Tepe,
12-11 mil AP
na Turquia

Figura 5: mapa mundi indicando as prováveis migrações, segundo o DNAMit.


Fonte: commons.wikimedia.org

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Pré-história

2.2 O “cenário” da dispersão a partir do Sul (do Leste da África para a


Península arábica)

No contexto da origem africana recente dos humanos modernos, o cenário da


Dispersão do Sul (também, a migração costeira ou hipótese de grande migração
costeira) refere-se à migração precoce ao longo da costa sul da Ásia, da península
Arábica via Pérsia e Índia para o Sudeste Asiático e Oceania. Nomes alternativos
incluem a “rota costeira do sul” ou “assentamento costeiro rápido”, com
descendentes posteriores dessas migrações colonizando o resto da Eurásia (incluindo
a Europa), o restante da Oceania e as Américas.

A teoria da rota costeira é usada principalmente para descrever o povoamento


inicial da Ásia Ocidental, Índia, Sudeste Asiático, Nova Guiné, Austrália, Perto da
Oceania e leste da Ásia costeira começando entre aproximadamente 70.000 e
50.000 anos atrás.

Ela está ligada à presença e dispersão do haplogrupo M do mtDNA e do haplogrupo


N, bem como aos padrões de distribuição específicos do haplogrupo F do Y-DNA, [9]
haplogrupo C e haplogrupo D, nessas regiões.

A teoria propõe que os primeiros humanos modernos, alguns dos portadores do


haplogrupo mitocondrial L3, chegaram à península Arábica cerca de 70.000-50.000
anos atrás, cruzando a África Oriental através do estreito de Bab-el-Mandeb. Estima-
se que de uma população de 2.000 a 5.000 indivíduos na África, apenas um pequeno
grupo, possivelmente de 150 a 1.000 pessoas, cruzou o Mar Vermelho. [12] O grupo
teria viajado ao longo da rota costeira ao redor da Arábia e da Pérsia até a Índia com
relativa rapidez, dentro de alguns milhares de anos. Da Índia, eles teriam se
espalhado para o sudeste da Ásia ("Sundaland") e Oceania ("Sahul").

2.3 O Hominídeo de Denisova, Sibéria e Baishiya Karst, Tibet

Figura 6: a caverna de Denisova, na Sibéria e de Baishiva Karst, no Tibete.


Fonte: commons.wikimedia.org

A descoberta e as investigações em torno da Caverna de Denisova, na atual Sibéria,


trouxeram à luz vários resultados espetaculares:

Primeiro, os hominínios que ali viveram não pertenciam à nossa espécie! Também,
não eram neandertais.

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Pré-história

Segundo, eram bastante evoluídos, em torno de 30 a 50 mil anos AP.

Vamos ler o artigo “A primeira mandíbula fóssil de denisovanos finalmente dá uma cara
aos esquivos parentes humanos” (https://www.sciencemag.org/news/2019/05/first-
fossil-jaw-denisovans-finally-puts-face-elusive-human-relatives) para entender o valor
desta descoberta.

Terceiro, alguns de seus genes característicos estão presentes no DNA de todos os


sapiens que evoluíram fora da África.

Vamos aprofundar em aula. Para saber mais, visite o site: http://


www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Lion-figurine-discovered-
in-Denisova-Cave, no qual podemos ver um vídeo, em 3D, com a figura estilizada de
um leão, achado na gruta.

2.4 O encontro/desencontro com o Homo de Neandertal

Cada vez mais, a pesquisa científica descobre novos aspectos desses parentes
distantes do sapiens africano, que evoluíram fora da África e ocupavam o atual
Oriente Médio, parte da Ásia e toda a Europa, ao longo de três grandes Eras glaciais.

Adaptados ao frio, medindo cerca de 1,65m e conseguindo fabricar objetos de pedra.


Também, enterravam seus mortos, caçavam de maneira organizada e conviveram,
durante muito tempo, com o sapiens moderno.

Figura 7: imagens de Neandertais segundo a pesquisa científica atual.


Fonte: composição com fontes diversas, citadas abaixo.

Para sabermos mais sobre eles e como estão as últimas descobertas, vamos visitar e
conversar a partir de alguns sites:

Ferramentas neandertais encontradas em ilha dinamarquesa:


http://www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Neanderthal-
tools-found-on-Danish-island.

Neandertais, os humanos solitários, publicado no Portal brasileiro do jornal espanhol


El País:
https://brasil.elpais.com/ciencia/2021-02-14/neandertais-os-humanos-solitarios.html.

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Pré-história

Neanderthal child's skeleton buried 41,000 years ago may solve long-standing Mystery:
https://edition.cnn.com/2021/01/05/europe/neanderthal-burials-skeleton-study-scn/
index.html.

Na bibliografia da disciplina está indicado 1 livro muito interessante: ARSUAGA, J.L. O


colar de Neandertal: em busca dos primeiros pensadores. São Paulo: Globo, 2006.

Outro, muito mais recente, é Neandertal, nosso irmão: uma breve história do
homem, escrito em parceria pela cientista Silvana Condemi e o jornalista François
Savatier (2018, 240p.).

2.5 A teoria da catástrofe ambiental provocada pela explosão do


vulcão Toba

Na Indonésia existe um lago chamado Toba. Resultado de uma imensa cratera


vulcânica, que a água ocupou. Os vulcanólogos, estudando-a, chegaram à conclusão
que na área, ao longo de milhões de anos, quatro vulcões surgiram e terminaram
explodindo.

A explosão do último, ocorrida há cerca de 75 mil anos AP, foi uma das mais violenta
explosões cujos traços a ciência encontra, hoje, sobre a Terra. Teria provocado um
inverno vulcânico global de seis a dez anos e, possivelmente, resfriado toda Terra por
uns 1.000 anos.

Em 1993, a jornalista científica Ann Gibbons sugeriu que a possibilidade de um


“gargalo populacional”, que teria ocorrido em nossa evolução, a cerca de 70.000 anos
atrás, poderia ter sido causado pela erupção.

Figura 8: o atual lago Toba e sua localização. Fonte: commons.wikimedia.org.

2.6 As pinturas rupestres mais antigas do mundo, na Indonésia

Em dezembro de 2017, um homem chamado Pak Hamrullah descobriu a entrada de


uma caverna desconhecida em um penhasco da ilha de Sulawesi (também
conhecida como Celebes), Indonésia. Subiu por uma figueira até alcançá-la e ao

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Pré-história

chegar ao fundo avistou uma cena de caça pintada em uma tela de rocha de mais de
quatro metros de largura. Após dois anos de estudos, a equipe de arqueólogos que
acompanhava Hamrullah, naquele dia, afirma que essa é a obra de arte figurativa
mais antiga do mundo.

Vamos conhecer essa Gruta (https://brasil.elpais.com/ciencia/2019-12-12/obra-de-


arte-mais-antiga-da-humanidade-e-descoberta-na-indonesia.html).

Figura 9: pintura na Caverna de Sulawesi, nas ilhas Celebes, Indonésia.


Fonte: commons.wikimedia.org

2.7 Fazendo roupas na Idade da Pedra

Tecelagem de corda na Idade da Pedra


(http://www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Stone-Age-rope-
weaving)

Vamos ler o artigo de Robin McKie, editor de ciência do The Guardian, no qual relata a
descoberta da ferramenta que nossos ancestrais da idade da pedra usaram para
fabricar barbante. Este foi um marco no desenvolvimento tecnológico.

Figura 10: instrumento de osso com furos e fendas.


Fonte: Fotografia: Universidade de Tübingen.

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Pré-história

Os fragmentos encontrados na caverna Hohle Fels na Alemanha, que os cientistas


agora reconhecem como uma ferramenta para fazer cordas de 40.000 anos atrás.

2.8 As Cavernas de Chauvet, na França e Altamira, na Espanha

Figura 11: pinturas da caverna de Chauvet. Fonte: commons.wikimedia.org

Vamos visitar o site oficial dessa importante gruta, cujo acesso é vedado a todos,
exceto a alguns pesquisadores, desde sua descoberta.

Link: https://archeologie.culture.fr/chauvet/fr

Dezesseis anos depois da descoberta da caverna, o diretor alemão Werner Herzog


escreveu, dirigiu e narrou o filme A caverna dos sonhos perdidos.

Em abril de 2015, foi inaugurada uma cópia em tamanho real da caverna. No espaço,
criado graças ao trabalho de arquitetos, pintores, escultores e outros artistas, podem
ser admiradas réplicas das pinturas rupestres. A caverna original nunca foi aberta ao
público, para evitar sua degradação.

Figura 12: caverna de Altamira e a imagem de um bisão.


Fonte: commons.wikimedia.org

Já a caverna de Altamira, na Espanha, foi descoberta e explorada no final do


século XIX. É outra extraordinária amostra da criatividade artística dos sapiens.

Vamos explorar a versão espanhola do texto da Wikipédia em https://es.wikipedia.org/


wiki/Cueva_de_Altamira e o site oficial da caverna em http://
www.culturaydeporte.gob.es/mnaltamira/home.html.

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Pré-história

2.9 Venus de Willendorf, Áustria

Figura 13: Vênus de Willendorf.


Fonte: MatthiasKabel - Obra do próprio, CC BY 2.5, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=1526553

Conservada no Museu de História Natural de Viena, na Áustria, a estatueta foi


encontrada em 1908, durante uma escavação em Willendorf II, um sítio arqueológico
na Áustria ao longo do rio Danúbio, perto de Viena.

É uma das 200 imagens femininas, impropriamente chamadas de “Vênus”, achadas


na Europa.

Baixa, gorda e com quase 30.000 anos, Vênus de Willendorf é o ícone feminino da
Idade do Gelo. A estatueta de dez centímetros de altura tem seios, nádegas, barriga e
lábios vaginais pronunciados, mas não tem pés ou características faciais. Tranças, ou
talvez um boné de tricô, cobrem sua cabeça, e manchas de pigmento sugerem que o
artefato de calcário bronzeado já foi pintado de vermelho.

2.10 Dolní Věstonice, na Europa Central

O que é onde está Dolní Věstonice?

Figura 14: reconstrução da aldeia e de um funeral No centro, a famosa estatueta da Vênus de Dolní
Věstonice. Fontes: sites abaixo

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Pré-história

Jill Cook, guardiã da seção Grã-Bretanha, Europa e Pré-história, no Museu Britânico e


curadora da exposição de 2013 “Arte da Idade do Gelo: chegada da mente moderna”,
lança luz sobre a arqueologia do Paleolítico da Europa Central e Oriental.

Segundo ela, a paisagem ondulante, dentro do corredor natural conhecido como


Portão da Morávia, que conecta a planície do Norte da Europa ao vale do Danúbio,
tornou-se uma área significativa de atividade humana por ser uma rota migratória
para animais, especialmente rebanhos de mamutes.

A escavação dos enormes acampamentos ao ar livre começou no final do século XIX


em torno de Brno, Morávia, na República Tcheca, revelando assentamentos construídos
por comunidades de pessoas que dependiam dos mamutes para alimentação e
matéria-prima. Esses assentamentos contêm estruturas usadas como moradias, bem
como lareiras, fossas, espessas camadas de cinzas de ossos queimados e os restos de
numerosos mamutes às vezes empilhados em pilhas separadas por peças anatômicas.

Nestes acampamentos, ferramentas de pedra e osso, objetos decorados, esculturas


de marfim e modelos de cerâmica são numerosos. Vários relatórios no Illustrated
London News, entre 1929 e 1937, intitularam as descobertas como “tão maravilhosas
quanto a de Tutancâmon” e, em seguida, anunciaram “um Paleolítico incrível de
Pompeia”, “o nascimento da escultura” e o “retrato humano mais antigo”.

Vamos conferir através do site da Bradshaw Foundation:


http://www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Doln---V--stonice-
in-Central-Europe

Site oficial: https://www.obecdolnivestonice.cz/uvod/


Home page: https://www.donsmaps.com/dolni.html

2.11 Estruturas circulares feita de ossos de mamutes

Figura 16: estrutura circular de ossos de mamutes, Rússia. Fonte: bradshawfoundation.com

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Pré-história

Vamos ler e refletir sobre um artigo de Nicholas St. Fleur, publicado no New York
Times, descrevendo uma antiga e misteriosa estrutura circular, feita de crânios,
esqueletos e presas de mais de 60 mamutes peludos, executada por caçadores-
coletores da Idade do Gelo. O anel de crânios, esqueletos, presas e outros ossos era
grande demais para um telhado, dizem os cientistas. Então, para que foi isso?

Os arqueólogos descobriram cerca de 70 estruturas ósseas de mamute em toda a


Europa Oriental. Mas este é o mais antigo na planície russa, pensado por humanos
modernos. A maioria das estruturas identificadas anteriormente era pequena,
levando os pesquisadores a concluir que eram provavelmente usadas como moradias
de inverno em uma paisagem quase sem árvores.

2.12 Primeiras estruturas em pedra, em Boncuklu Tarla e Göbekli Tepe,


na Turquia

Vamos visitar os indícios de um povoado neolítico descoberto na Turquia, em


Boncuklu Tarla.

Figura 17: primeiras estruturas em pedra, em Boncuklu Tarla.


Fonte: bradshawfoundation.com

E visitar Göbekli Tepe, também na Turquia

Figura 18: Göbekli Tepe, Turquia.


Fonte: http://www.bradshawfoundation.com/news/world_heritage.php?id=Neolithic-Gathering-and-Feasting-
at-Gobekli-Tepe e http://www.bradshawfoundation.com/news/world_heritage.php?id=Debating-Gobekli-Tepe.

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Pré-história

3. Parte 3: sugestões de leitura e aprofundamento

3.1 Biogeography and evolution of the genus Homo

Link: http://www.paleodiversitas.org/PDF/135.pdf

Resumo: o debate sobre as origens do homem moderno tradicionalmente se


concentra em duas visões contrastantes. A evolução multirregional propõe que as
populações atuais em todo o mundo são descendentes da evolução in situ, após uma
dispersão inicial do Homo erectus da África durante o Pleistoceno Inferior. A
alternativa, Out-of-Africa 2, propõe que todas as populações atuais descendem de
um ancestral comum recente que viveu na África Oriental ∼150.000 anos atrás, cuja
população substituiu todas as populações regionais. O peso da evidência agora é a
favor de Out-of-Africa 2, e a discussão agora é dominada pelas causas da dispersão de
humanos modernos para fora da África e o resultado do contato com outras
populações. Abordagens novas, de disciplinas até então periféricas ao debate, como
ecologia evolutiva, assim como novas descobertas, estão desafiando as visões
estabelecidas, particularmente a ideia prevalecente de que humanos modernos
biologicamente superiores foram a causa da morte de todas as outras populações de
Homo em todo o mundo. A mudança ecológica, impulsionada pelo clima, tem sido,
como muitos outros taxam, a força motriz na dinâmica da distribuição geográfica do
gênero Homo.

3.2 Cognición y conducta de neandertales y humanos modernos

Link: http://www.patrimoniocultural.gov.pt/media/uploads/
revistaportuguesadearqueologia/11_1/1/01Cognicionyconducta.pdf

Resumo: no presente trabalho, serão analisadas as diferenças entre as duas populações


humanas que viveram na Europa durante o início do Paleolítico Superior, do ponto de
vista cognitiva e cultural. O objetivo é uma melhor compreensão das capacidades
cognitivas que podem ser deduzidas do comportamento do registro arqueológico. A
síntese destes análise pode esclarecer, com maior poder explicativo, aspectos
importantes sobre sua cultura diferente e o desaparecimento final do Neandertal.

3.3 Origen del lenguaje: un enfoque multidisciplinar

Link: http://ludus-vitalis.org/ojs/index.php/ludus/article/viewFile/277/267

Resumo: diferentes abordagens explicativas sobre as origens e o desenvolvimento da


linguagem, já existem, mas quase em modos contrários. Uma dessas causas pode ser
a atual divisão acadêmica excessiva entre as várias disciplinas que constituem nossa
tradição cultural e geralmente distraem nossa atenção em relação à realidade
humana (biológica, social, histórica, linguística). Uma tentativa de ultrapassar o
problema seria realizar estudos dentro de um âmbito multidisciplinar, a fim de

69
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Pré-história

combinar as informações mais recentes das diferentes ciências que cuidam do


comportamento e da linguagem humana (biologia evolutiva, neurologia, psicologia,
sociologia, linguística, paleontologia e arqueologia). O objetivo seria chegar a um
resumo metodológico com uma amplo base científica e um poder explicativo
superior ao oferecido por cada uma dessas disciplinas isoladamente.

3.4 Culture and Causal Cognition

Link: https://www2.psych.ubc.ca/~ara/Manuscripts/
Norenzayan&Nisbett%20current%20dir.pdf

Resumo: o raciocínio causal das culturas do Leste Asiático e da cultura do


americano médio difere significativamente. Os asiáticos orientais entendem o
comportamento em termos de interações complexas entre disposições da pessoa
ou outro objeto e fatores contextuais, ao passo que os americanos costumam ver o
comportamento social principalmente como o desdobramento direto de
disposições. Essas teorias causais, culturalmente diferentes, parecem estar
enraizadas em mentalidades mais difundidas e específicas da cultura no Leste
Asiático e no Ocidente. A mentalidade ocidental é analítica, focalizando a atenção
no objeto, categorizando-o por referência aos seus atributos e atribuindo
causalidade com base em regras sobre ele. A mentalidade do Leste Asiático é
holística, focalizando a atenção no campo em que o objeto está localizado e
atribuindo causalidade por referência à relação entre o objeto e o campo.

3.5 The history behind the mosaic of the Americas

Link: https://www.semanticscholar.org/paper/The-history-behind-the-mosaic-of-
the-Americas.-Mendes-Alvim/85d4952a8a95f96efaa10ef13b8638fe49d5c42d

Resumo: com foco na literatura publicada em 2018–2020, revisamos inferências sobre:


(i) como o DNA antigo está contribuindo para esclarecer o povoamento das Américas
e a dispersão de seus primeiros habitantes, (ii) como a interação entre o ambiente, a
diversidade e a cultura influenciaram a estrutura genética e a adaptação das
populações andina e amazônica, (iii) como a genética contribuiu para a nossa
compreensão da Pré-Expansão de tupis colombianos no leste da América do Sul, (iv)
as origens subcontinentais e a dinâmica pós-colombiana na mistura das Américas e,
finalmente, (v) episódios de adaptação e seleção natural no continente americano,
particularmente nas altas altitudes dos Andes.

3.6 Origens do homem nas Américas: fósseis x molécula?

Walter Neves – capítulo do livro Nossa Origem (SILVA; RODRIGUES-CARVALHO, 2009,


p. 45-76).

70
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Pré-história

3.7 A genética: seu uso na determinação da origem do homem


americano

Pedro Cabello – capítulo do livro Nossa Origem (SILVA; RODRIGUES-CARVALHO, 2009,


p. 123-134).

3.8 A Serra da Capivara e os primeiros povoamentos sul-americanos:


uma revisão bibliográfica, publicado no DOSSIÊ CENÁRIOS E
PROCESSOS DAS PRIMEIRAS OCUPAÇÕES HUMANAS NO BRASIL: O
PAPEL DA PESQUISA ARQUEOLÓGICA, do Boletim do Museu Paraense
Emílio Goeldi. Ciências Humanas.

Link: https://doi.org/10.1590/1981.81222019000200007

Resumo: a área da Serra da Capivara (Piauí, Brasil) é famosa na comunidade


arqueológica internacional, principalmente pela polêmica ao redor do sítio Pedra
Furada e de suas datas do Pleistoceno superior, fazendo dele um dos sítios mais
antigos das Américas. Os dados oriundos deste sítio contribuem indiscutivelmente
nas discussões e nos conhecimentos sobre os processos de povoamento do
continente. Por outro lado, a concentração das atenções sobre ele e sobre os debates
provocados ofuscaram numerosas pesquisas nesse local que forneceram uma
impressionante quantidade de dados sobre as primeiras ocupações humanas nas
mais variadas áreas de conhecimento. No presente artigo, a partir de uma revisão
bibliográfica, sintetizamos os resultados dessas pesquisas quanto aos contextos e aos
comportamentos dos grupos humanos que ocuparam a região durante o final do
Pleistoceno superior e o Holoceno inicial. Mostramos, assim, como a pré-história da
Serra da Capivara dialoga com os grandes temas sobre o povoamento do continente
americano e traz uma contribuição relevante sobre essas questões, nas escalas
macrorregionais e continentais

Síntese da unidade

Chegamos ao final de nossa terceira Unidade, intitulada SAPIENS, viajador e


desbravador, na qual percorremos os últimos 70 mil anos de nossa história evolutiva,
durante uma fase de desenfreada criatividade, até cerca de 12 mil anos antes do
presente (AP), início da Revolução Agrícola e dos processos de urbanização, que
levaram às sociedades ditas históricas, a partir de Uruk e da invenção da escrita, há
cerca de 5200 AP.

Acompanhamos a expansão dos sapiens, seus encontros e desencontros com os


Erectus, na Ásia e os Neandertais, no Leste europeu e na Europa, com os, até
agora misteriosos denisovanos, cujo DNA marca todos os sapiens não africanos,
até a chegada de grupos humanos ao continente americano e sua dispersão, no
atual território brasileiro, até as primeiras evidencias arqueológicas pré-históricas
em Pernambuco.

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Pré-história

Tudo, como prometido, através dos mais espetaculares sites arqueo-lógicos


espalhados pelos 5 continentes, visitados cronologicamente.

Trouxemos novas fontes de pesquisa que serão também usadas na próxima Unidade,
a IV. Esperamos que tenha ficado claro que todos os elementos do salto cognitivo
que herdamos e nos fazem quem somos hoje, em 2021 – a capacidade de produzir
avanços tecnológicos, as, cada vez mais, sofisticadas expressões de sociabilidade e de
comunicação, o aprimoramento da qualidade de vida –, já estavam presentes nas
diversas linhas genéticas dos nossos avoengos sapiens africanos e foram, por eles,
espalhadas pelo globo terrestre e estão penetrando no espaço exterior.

Como pudemos notar, mantivemos nessa Unidade, como fio condutor, a


identificação dos registros materiais e das possíveis formas de organização dos
humanos em dispersão.

Na próxima unidade, intitulada NOSSO PASSADO SAPIENS, à nossa porta, vamos


estudar com mais detalhes a ocupação dos ecúmenos brasileiros, nordestinos e
pernambucanos, sempre com atenção à luta pela sua preservação, através dos
processos chamados de musealização, e de seu amplo e democrático acesso, tendo
como exemplo central o Museu de Arqueologia e Ciências Naturais da Universidade
Católica de Pernambuco e seu Laboratório.

Referências

ARSUAGA, J.L. O colar de Neandertal: em busca dos primeiros pensadores. São Paulo: Globo, 2006.

CABELLO, Pedro. A genética: seu uso na determinação da origem do homem americano. In: SILVA, Hilton P.;
RODRIGUES-CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O Povoamento das Américas: Visões
Multidisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira e Lent, 2006, p. 123-133.

CONDEMI, Silvana; SAVATIER, François. Neandertal, nosso irmão: Uma breve história do homem. São Paulo:
Vestígio, 2018.

DOMÍNGUEZ, Nuño. Obra de arte mais antiga da humanidade é descoberta na Indonésia. In: El País, dez/
2019 https://brasil.elpais.com/ciencia/2019-12-12/obra-de-arte-mais-antiga-da-humanidade-e-descoberta-na-
indonesia.html, conferido em 12/2020.

GIBBONS, Ann. First fossil jaw of Denisovans finally puts a face on elusive human relatives (A primeira
mandíbula fóssil de denisovanos finalmente dá uma cara aos esquivos parentes humanos). In: Sience, 2021.
https://www.sciencemag.org/news/2019/05/first-fossil-jaw-denisovans-finally-puts-face-elusive-human-
relatives, conferido em 02/2021.

HARARI, Yuval Noah. Homo Deus: uma breve história do amanhã. Companhia das Letras, 2016, 476p.

HARARI, Yuval Noah. Sapiens: uma breve história da humanidade. Porto Alegre: L&PM, 2015.

HARVATI, K., RÖDING, C., BOSMAN, A.M. et al. Apidima Cave fossils provide earliest evidence of Homo sapiens
in Eurasia. Nature 571, 500–504 (2019). https://doi.org/10.1038/s41586-019-1376-z, conferido em 02/2021.

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE PERNAMBUCO
Pré-história

LIESOWSKA, Anna; SKARBO, Svetlana. Lion figurine discovered in Denisova Cave. Bradshaw Foundation
http://www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Lion-figurine-discovered-in-Denisova-Cave,
conferido em 02/2021.

LOURDEAU, Antoine. A Serra da Capivara e os primeiros povoamentos sul-americanos: uma revisão


bibliográfica. In: Boletim do Museu Paraense Emílio Goeldi, agosto de 2019 https://dx.doi.org/
10.1590/1981.81222019000200007, conferido em 12/2020.

MCKIE, Robin. Stone Age rope weaving (Tecelagem de corda na Idade da Pedra). In: http://
www.bradshawfoundation.com/news/archaeology.php?id=Stone-Age-rope-weaving, conferido em 02/2021.

MITHEN, Steven. Pré-história da mente: uma busca das origens da arte, da religião e da ciência. São Paulo:
Fundação Editora da UNESP, 1998.

National Geographic Education. Resource library. Link: https://www.nationalgeographic.org/education/


resource-library/?q=&page=1&per_page=25, conferido em 02/2021.

NEVES, Walter A.; PILÓ, Luís Beethoven. O povo de Luzia: em busca dos primeiros americanos. São Paulo:
Globo, 2008. 334 p.

NEVES, Walter. Origens do homem nas Américas: fósseis x molécula? In: SILVA, Hilton P.; RODRIGUES-
CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O Povoamento das Américas: Visões Multidisciplinares. Rio de
Janeiro: Vieira e Lent, 2006, p. 45-76.

RICHTER, D., GRÜN, R., JOANNES-BOYAU, R. et al. The age of the hominin fossils from Jebel Irhoud, Morocco,
and the origins of the Middle Stone Age. Nature 546, 293–296 (2017), in: https://doi.org/10.1038/nature22335,
conferido em 12/2020.

RITO, T., VIEIRA, D., SILVA, M. et al. A dispersal of Homo sapiens from southern to eastern Africa immediately
preceded the out-of-Africa migration. Sci Rep 9, 4728 (2019). https://doi.org/10.1038/s41598-019-41176-3,
conferido em 12/2020.

SILVA, Hilton P.; RODRIGUES-CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O Povoamento das Américas: Visões
Multidisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira e Lent, 2006, 236p.

Wikimedia Commons in https://commons.wikimedia.org/wiki/Portada, conferido em 12/2020.

73
Unidade 4
NOSSO PASSADO SAPIENS, à nossa porta

Na unidade anterior nós percorremos os últimos 70 mil anos de nossa história


evolutiva, durante uma fase de desenfreada criatividade, até cerca de 12 mil anos
antes do presente (AP), início da Revolução Agrícola e dos processos de urbanização,
que levaram às sociedades ditas históricas, a partir de Uruk e da invenção da escrita,
há cerca de 5200 AP.

Aprofundamos a expansão dos Sapiens, seus encontros e desencontros com os


Erectus, na Ásia e os Neandertais no Leste Europeu e na Europa, com os, até agora,
misteriosos Denisovanos.

Falamos das novas fontes de pesquisa que vamos aproveitar nessa UNIDADE: dois
capítulos do livro Nossa Origem (SILVA; RODRIGUES-CARVALHO, 2009), o de Walter
Neves, intitulado “Origens do homem nas Américas: fósseis x molécula?” e o de Pedro
Cabello, “A genética: seu uso na determinação da origem do homem americano” e o
artigo de Antoine Lourdeau “A Serra da Capivara e os primeiros povoamentos sul-
americanos: uma revisão bibliográfica”, publicado em agosto de 2019 no Boletim do
Museu Paraense Emílio Goeldi, um dos mais importantes museus brasileiros.

Nesta nova Unidade — intitulada NOSSO PASSADO SAPIENS, à nossa porta — vamos
estudar com mais detalhes a ocupação dos ecúmenos americanos, brasileiros,
nordestinos e pernambucanos, sempre com atenção à luta pela sua preservação,
através dos processos chamados de musealização, e de seu amplo e democrático
acesso, tendo como exemplo central o Museu de Arqueologia e Ciências Naturais da
Universidade Católica de Pernambuco e seu Laboratório.

Objetivos da unidade

• Traçar o quadro da ocupação do território brasileiro, pelos grupos humanos, até a


chegada dos europeus.
• Traçar o quadro da ocupação do território nordestino/pernambucano, pelos grupos
humanos, até a chegada dos europeus.
• Conhecer, discutir e avaliar a importância dos acervos culturais relativos à pré-
história em Pernambuco.
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Pré-história

1. Parte 1: a ocupação das “Américas”

Por que “Américas”? Porque esse é um nome moderno, historicamente datado,


como vamos estudar e discutir na disciplina História da América I. Não se chamavam
assim, as hoje três “Américas”, há menos de 500 anos. Cada uma das etnias que nelas
ocupou territórios teve um nome para o “ecúmeno” que passou a habitar, ao qual se
adaptou e modificou gradualmente. Os guiados pelo Inca chamavam o território de
Tawantinsuyu, em sua língua, o quíchua, significando os “quatro cantos”, ou quatro
regiões do mundo. E assim por diante!

No final da Unidade III nós deixamos os sapiens dos “velhos continentes” falando de
Göbekli Tepe, na atual Turquia, no Oriente Médio. Depois de escrever aquela Unidade eu
descobri mais um site sobre o assunto que vale a pena visitar. Sob o título de “Esculturas
antigas em Göbekli Tepe mostram que um cometa atingiu a Terra há 13.000 anos” (https://
ourplnt.com/ancient-carvings-show-a-comet-hit-earth-13000-years-ago/), o artigo tem
um conjunto interessante de imagens, que vale a pena verificar. Por quê?

Se correta a interpretação, os caçadores-coletores que construíram Göbekli Tepe já


tinham um profundo conhecimento de astronomia, o que implica matemática,
característica que os sapiens que migraram para as Américas, ao menos 20 mil anos
antes, saindo da Ásia, também trouxeram.

Então, voltemos ao principal! Como chegaram às Américas os antepassados das


etnias aqui residentes e perfeitamente aclimatadas que os navegadores ibéricos –
depois ocupadores, depois conquistadores e, finalmente, dominadores ferozes – aqui
encontraram, que pensavam o mundo de uma maneira absolutamente diferente da
maneira das culturas ocidentais e médio-orientais?

São várias as suposições – à espera, uma mais, outras menos, de inegáveis achados
materiais –, que comprovem a passagem de grupos sapiens pelos caminhos
propostos. A suposição mais acreditada é da migração pela Beríngia, como é
chamada a imensa camada de gelo que ligou, no extremo norte dos continentes
asiático e americano, as terras que hoje são divididas pelo Estreito de Bering.

Vejam os mapas:

Figura 1: América do Norte, Estreito de Bering, hoje e na última Era Glacial. Fonte: Wikimedia Commons

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Pré-história

Por milênios, uma imensa extensão de gelo ligou firmemente a Ásia à América do
Norte. Algumas “teorias” supõem que grupos humanos significativos ficaram
bloqueados, entre um ponto e outro dessa travessia, eles e suas caças, por milhares
de anos, evoluindo em função dos desafios que a luta pela sobrevivência os
submeteu. Ao conseguirem terminar a travessia, penetraram nos territórios da
América do Norte por vários possíveis caminhos, uns pela costa e outros pelo interior
do continente.

Outros estudiosos propõem que alguns grupos poderiam ter chegado, também,
através das regiões congeladas entre a parte nordeste do continente americano
(através da Islândia e da Groenlândia), vindos do continente europeu. Outros ainda,
propõem a chegada diretamente da África para o litoral brasileiro, pelo Atlântico.
Outros, finalmente, pelo Pacífico. Levando em conta que, na última Era Glacial o nível
dos oceanos estava a cerca de 130 m abaixo do atual, não é impossível travessias de
pequenos grupos, de ilha em ilha, ou atravessando grandes extensões navegando a
favor das correntes e dos ventos. Difícil de comprovar, porque o oceano não conserva
pegadas e muitos sítios costeiros estão cobertos de água, mas... Procurem, na
Wikipédia, o link https://en.wikipedia.org/wiki/Aku_Aku e explorem especialmente o
link que leva ao livro escrito pelo famoso arqueólogo norueguês Thor Heyerdahl
(1914-2002), intitulado Aku-Aku (foi uma das paixões de minha adolescência).

Agora sim, leiam, por favor, os trechos sugeridos dos livros já citados no final da
Unidade III:

• NEVES, Walter A.; PILÓ, Luís Beethoven. O povo de Luzia: em busca dos primeiros
americanos. São Paulo: Globo, 2008. 334 p.
• NEVES, Walter. Origens do homem nas Américas: fósseis x molécula? In: SILVA,
Hilton P.; RODRIGUES-CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O Povoamento
das Américas: Visões Multidisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira e Lent, 2006, p. 45-76.
• SILVA, Hilton P.; RODRIGUES-CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O
Povoamento das Américas: Visões Multidisciplinares. Rio de Janeiro: Vieira e Lent,
2006, 236p.
• LOURDEAU, Antoine. A Serra da Capivara e os primeiros povoamentos sul-
americanos: uma revisão bibliográfica. In: Boletim do Museu Paraense Emílio
Goeldi, agosto de 2019 https://dx.doi.org/10.1590/1981.81222019000200007,
conferido em 12/2020.

Retornando ao fio condutor, proposto nas unidades anteriores, o da identificação


dos registros materiais e das possíveis formas de organização, dos humanos em
dispersão, selecionei uma série de sites das três Américas que podem nos ajudar a
ter uma visão de como nossos antepassados sapiens, pelo menos aqueles que
podem se orgulhar de ter, além das raízes africanas as raízes autóctones,
conquistaram esses ecúmenos e criaram aqui grandes civilizações.

Vou apresentá-los rapidamente, do Norte para o Sul geográfico, e dos mais antigos
aos mais recentes.

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Pré-história

Antes, porém, vamos enfrentar a famosa questão da “Teoria do povoamento tardio”


das Américas, que dominou os debates entre os especialistas americanos e os
europeus (aos quais se somaram os especialistas sul-americanos, na medida em que
foram tomando coragem, baseados em achados cada vez mais seguros). Parecia
lógico afirmar que os indícios mais antigos dos sapiens nas Américas deviam estar na
América do Norte, especialmente nos EUA.

Com a descoberta do sítio chamado Clóvis, no Novo México, e sua datação, em torno
de 13 mil AP (os especialistas norte-americanos não aceitavam, por princípio, que
outros sítios pudessem ter datações mais antigas). Walter Neves trabalha muito bem
essa polêmica, que o envolveu pessoalmente, no livro O Povo de Luzia. Um boa
síntese da questão está na Wikipedia, em espanhol (não há uma versão em inglês, só
em francês e em esperanto).

Eis a lista dos escolhidos:

1. América do Norte (Canadá e Estados Unidos).


• 20 a 18 mil anos AP – USA – Sítio arqueológico de Cactus Hill, na Virgínia.
• 13,2 a 12,6 mil AP – USA/México – Cultura Clóvis, sul dos USA e norte do México.
• 13 mil AP – USA - Homem de Arlington Springs, Califórnia.
• 13 a 9 mil AP – USA – Caverna de Fort Rock, Oregon.
• 7 a 6,9 mil anos AP – USA – O homem de Kennewick, rio Columbia, Washington.
• 4,5 mil a 3,5 mil anos AP – Canadá – Sítio arqueológico de Áísínai’pi, vale do rio Milk.
• 1,2 a 550 anos AP (ou de 700 a 1.450 d.C) – USA – Cahokia Mounds, Illinois.

Recordando, AP (ou, em inglês BP) significa “antes do presente”, sendo o


presente o ano de 1952, que marca a descoberta do método de datação pelo
“carbono 14”

2. México e América Central (eu sei que o México faz parte da América do Norte,
mas para fins dessa síntese, preferi colocá-lo aqui, já que é o berço de algumas
grandes civilizações pré-ocupação europeia que serão estudadas em História da
América I).
• 15 mil anos AP – México – Sites de caça aos mamutes.

3. América do Sul, exceto Brasil.


• 19,5 a 12,5 mil anos AP – Colômbia – Abrigos de rocha de Chiribiquete.
• 18 a 14,4 mil AP – Chile – Sítio arqueológico de Monte Verde, Puerto Monte.
• 14,5 mil AP – Peru – Sítio arqueológico de Huaca Prieta, La Libertad.
• 12,5 a 7 mil AP – Argentina – Sítios arqueológicos de Los Toldos e Cueva de las
Manos, Santa Cruz, Patagônia.

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Pré-história

4. Brasil
No caso dos sites pré-históricos brasileiros, preferimos indicar, logo abaixo,
diretamente links dos sites na Wikipédia.
• Clique aqui para saber sobre Luzia, de Lagoa Santa, Minas Gerais.
• Clique aqui, para saber sobre o Boqueirão da Pedra Furada.

1.1 América do Norte

1.1.1 20 a 18 mil anos AP – USA – Sítio arqueológico de Cactus Hill, na


Virgínia.

“Cactus Hill é um dos sítios arqueológicos mais antigos e bem datados das Américas,
com as primeiras ocupações humanas datando de 18.000 a 20.000 anos
atrás” (Encyclopediavirginia.org).

Figura 2: Localização e imagens de Cactus Hill, na Virgínia. Fonte 3: Encyclopediavirginia.org

1.1.2 13,2 a 12,6 mil AP – USA/México – Cultura Clóvis, sul dos USA e norte
do México

Figura 4: Pontas de flexa típicas da cultura Clóvis.


Fonte 5: Wikipedia Commons.

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Pré-história

“A Cultura Clóvis é uma cultura pré-histórica da América que surgiu há cerca de


13.500-13.000 anos, no final da última Idade do Gelo. Chama-se assim por causa dos
artefatos encontrados perto da cidade americana de Clovis (Novo
México)” (Wikipedia.org).

1.1.3 13 mil AP – USA - Homem de Arlington Springs, Califórnia

Figura 6: Localização e escavações em Arlington Springs.


Figura 7: Wikimedia Commons.

O chamado “Homem de Arlington Springs” é composto por dois fêmures


descobertos na Ilha de Santa Rosa e datados de cerca de 13 mil AP. Trata-se dos restos
mortais mais antigos até hoje encontrados na América do Norte. Sua existência
reforça uma famosa afirmação do Prof. Walter Neves, em relação à polêmica do
“povoamento tardio”, de que na América do Norte trabalham muitos especialistas,
com muitos meios ($$$), mas com poucos ossos. Já na América do Sul temos muitos
ossos (basta pensar em Lagoa Santa, MG e Furna do Estrago, PE) e poucos
especialistas, sem meios ($$$).

1.1.4 13 a 9 mil AP – USA – Caverna de Fort Rock, Oregon

Figura 8: Local do sítio arqueológico e o achado mais espetacular: restos de sandálias.


Fonte 9: Wikimedia Commons.

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Pré-história

A caverna de Fort Rock destaca-se por fornecer a mais antiga evidência de habitação
humana entre os sítios norte-americanos: numerosas e bem preservadas sandálias
tecidas com fibras de Artemísia.

1.1.5 7 mil a 6,9 mil anos AP – USA – O homem de Kennewick, rio


Columbia, Washington

Figura 10: Crânio do homem de Kennewick.


Fonte 11: Wikimedia Commons.

“Homem de Kennewick'' é o nome geralmente dado aos restos esqueléticos de um


pré-histórico homem paleoamericano encontrado em um leito do rio Columbia em
Kennewick (Washington), em 28 de julho de 1996. Trata-se de um dos esqueletos
antigos mais completos já encontrados” (Wikipedia.org).

Sua descoberta gerou uma grande discussão, entre os cientistas e os membros da


etnia Umatilla e de outras da área, que querem os restos mortais devolvidos para que
sejam dignamente enterrados segundo as normas da chamada lei NAGPRA (Lei de
Repatriamento e Proteção das Sepulturas dos Nativos Americanos, aprovada pelo
Congresso em 1990).

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Pré-história

1.1.6 4,5 mil a 3,5 mil anos AP – Canadá – Sítio arqueológico de Áísínai’pi,
Vale do Rio Milk

Figura 12: Sítio de Áísínai’pi, Canadá – mapas e imagens.


Fonte 13: Unesco.org

“Os vestígios arqueológicos in situ datados cobrem um período entre cerca de 4,5 e
3,5 mil anos AP até o chamado ‘Período de Contato’” (ou chegada dos europeus). A
área é considerada sagrada para o povo Blackfoot (Pés pretos), nela eles perpetuam
suas tradições milenares.

1.1.7 1,2 a 550 anos AP – USA – Cahokia Mounds, Illinois

Figura 14: Cahokia, situação atual e possível reconstrução.


Fonte 15: site Legends of America.

É o sítio arqueológico da mais sofisticada civilização nativa na América do Norte, ao


longo do Rio Mississipi. Ocupa uma área de aproximadamente 810 hectares. Chegou
a ter cerca de 100 mil habitantes, entre 1.100 e 1.200 de nossa Era.

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Pré-história

2. México e América Central

2.1 15 mil anos AP – México – Sites de caça aos mamutes

Há indícios arqueológicos de ocupação humana no território da atual República


Mexicana desde há mais de 20 mil anos AP. Recentemente, em 2017, foram
encontrados dois sítios espetaculares: dois locais de caça aos mamutes, no norte da
bacia vulcânica onde fica a atual Ciudad de Mexico, antiga Tenochtitlán.

Figura 16: Esqueletos de mamutes efetivamente caçado. Diorama com esqueleto remontado.
Fontes 17: El País, 07/11/2017 e Mammuthus columbi, in the George C. Page Museum at the La Brea Tar Pits,
Los Angeles, California.

• Clique e leia: México encontra restos de 14 mamutes em armadilhas de caçadores


• Para as maravilhas do Museu de Antropologia do México, sugiro esse link, porque o
site oficial do Museu exige a instalação de softwares: Museu Nacional de
Antropologia do México - simplesmente imperdível, de 9 de maio de 2017.

Segundo as evidências encontradas, estes caçadores-coletores alimentavam-se de


mamutes e outros animais.

Também é importante lembrar que os antigos mexicanos começaram a cultura


seletiva de plantas de milho há cerca de 10 mil anos AP. Há evidências de um
crescimento exponencial na produção de cerâmicas há cerca de 4,3 mil anos AP e do
início da agricultura intensiva entre 3,8 e 3,5 mil anos AP.

3. América do Sul

3.1 19,5 - 12,5 mil anos AP - Colômbia - Abrigos de rocha de Chiribiquete

O conjunto de abrigos foi inscrito como Patrimônio Mundial da UNESCO em 2018,


por: “possuir mais de 75.000 pinturas, datadas de 20.000 anos antes de Cristo com
cenas de caça, batalhas, danças e cerimônias. As comunidades indígenas consideram
a região sagrada” (UNESCO World Heritage Centre - World Heritage List).

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Pré-história

Figura 18: Imagens de pinturas de Chiribiquete.


Fontes 19: history.uol.com.br e g1.globo.com, abaixo.

• Parque nacional de Chiribiquete:


https://pt.wikipedia.org/wiki/Parque_Nacional_Chiribiquete.
• Artigos recentes sobre a “Capela Sistina da Pintura Rupestre:
https://history.uol.com.br/noticias/chiribiquete-amazonia-abriga-capela-sistina-
da-pintura-rupestre.
• https://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2020/12/04/exploradores-
descobrem-pinturas-da-era-do-gelo-na-amazonia-colombiana.ghtml.

3.2 18,5 a 14,4 mil AP Sítio arqueológico de Monte Verde, Chile

Link: https://es.wikipedia.org/wiki/Monte_Verde

“Monte Verde é um sítio arqueológico com evidências


de assentamentos humanos do final do Pleistoceno,
localizado no setor de Monte Verde, na comuna de
Puerto Montt, região de Los Lagos, no sul do Chile”.

“É composto por dois depósitos: MV-I e MV-II; no qual


há vestígios datados de 14.500 anos e postula-se que
possivelmente pode atingir a idade de 18.500 anos AP,
sendo o primeiro local com datação reconhecida e
aceita (para a data de 14.500 anos), o que questionou a
teoria do ‘povoamento tardio das américas' que até
aquele momento datava da chegada do homem ao
novo mundo há não mais de 13.000 anos”.

Hoje, para explicar as datações sul-americanas,


supõem-se a migração costeira, através de navegação,
com alimentação tirada do oceano.

“Monte Verde está localizado a 8.000 milhas ao sul do


Estreito de Bering”. “Não era razoável para caminhar a
pé, especialmente no gelo. Além disso, restos de 22
variedades de algas marinhas são referenciados em
relação a esta teoria”.
Figura 19: Mapa do Chile

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Pré-história

Finalmente, “a presença de itens não locais em Monte Verde, como plantas, seixos
rolados na praia, quartzo e alcatrão, indica possíveis redes de comércio e outros locais
de habitação humana de idade semelhante” (trechos tirados da Wikipedia em
espanhol e traduzidos).

3.3 14,5 mil AP Sítio arqueológico de Huaca Prieta, província de La


Libertad, Peru

Link: https://es.wikipedia.org/wiki/Huaca_Prieta

“Huaca Prieta é o local de um assentamento pré-histórico ao lado do Oceano Pacífico,


no Vale Chicama, ao norte de Trujillo, província de La Libertad, Peru. Faz parte do
Complexo Arqueológico El Brujo, que também inclui sítios da Moche” (trecho tirado
da Wikipedia em espanhol e traduzido).

O que destaca este sítio foi o encontro de restos de espigas de milho, que demonstraram
ser as mais antigas, em absoluto, para a América do Sul. “Em 2012, foi relatado que
espigas de milho encontradas em dois locais antigos no Peru (Paredones e Huaca Prieta)
podem datar de 6,7 mil anos AP [...] Isso sugere que Huaca Prieta era um importante
centro de uma grande rede comercial que se estendia até o México, de onde se originou
o milho domesticado” (trechos tirados da Wikipedia em espanhol e traduzidos).

Figura 22: Huaca Prieta - fragmento de tecido de algodão.


Fonte 23: Wikimedia Commons.

Outra descoberta surpreendente: “em 2016, um tecido de algodão tingido de 6.000


anos foi descoberto no sítio Preceramic de Huaca Prieta”. É o mais antigo sinal do uso
do “algodão em todo o mundo”. Some-se a isso o uso de corantes para tingir o

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Pré-história

algodão: “a análise do pigmento usado no pano o identificou como indigotina, um


corante índigoide. Isso marca o primeiro uso registrado do corante índigo até hoje,
1.500 anos do início de seu uso, no Egito da 5ª dinastia” (trechos retirados da
Wikipedia em espanhol e traduzidos).

3.4 12,5 a 7 mil AP Sítios arqueológicos de Los Toldos e Cueva de las


Manos, Santa Cruz, Patagônia, Argentina

Link: Manos https://es.wikipedia.org/wiki/Cueva_de_las_Manos

O sítio arqueológico de Cueva de las Manos é um dos mais espetaculares sítios com
pinturas rupestres em todo o mundo, localizado no profundo cânion do rio Pinturas, a
noroeste da Província de Santa Cruz, Patagônia, Argentina. A caverna tem 20 metros
de profundidade, 10 metros de altura e 15 metros de largura e é de difícil acesso
(trecho tirado, traduzido e adaptado da Wikipedia em espanhol).

Figura 24: Entrada da Cueva e suas pinturas; reconstrução dos habitantes.


Fonte 25: Wikimedia Commons

4. Parte 2: A arqueologia e a musealização dos vestígios


humanos

Com autorização da Profa. Doutoranda Nathalia Cristiny Silva Nogueira (Lattes: http://
lattes.cnpq.br/7031713389899040), transcrevo aqui parte do material que ela
preparou para uma videoaula sobre a musealização dos vestígios humanos, oferecida
às turmas de Pré-história em 2020.1 e 2020.2, e cujo vídeo editado será oferecido no
ambiente Moodle da disciplina.

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Pré-história

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Pré-história

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Pré-história

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Pré-história

Definições:

Os registros gráficos são narrativas de uma memória grupal, a qual a informação


social se perdeu no tempo pretérito, mas os códigos são significantes de uma cultura
material que nos fornece uma rica fonte de dados antropológicos que tem um valor
duplo: a dimensão material e imaterial do registro rupestre (PESSIS,1992).

• Tradição: compreende a representação visual de todo um universo simbólico


primitivo que pode ter sido transmitido durante milênios sem que,
necessariamente, as pinturas de uma tradição pertençam aos mesmos grupos
étnicos (MARTIN, 2013).
Para Prous (1992), a tradição é a categoria mais abrangente entre as unidades
rupestres descritivas, implicando em uma certa permanência de traços distintivos,
geralmente temáticos.
• Subtradição: termo introduzido para definir o grupo desvinculado de uma tradição
e adaptado a um meio geográfico e ecológico diferente, o que implica na presença
de elementos novos.
• Grafismos: designa qualquer desenho unitário no conjunto pictorial rupestre.
Definição utilizada por L. Gourhan, foi introduzido na literatura arqueológica por
Anne-Marie Pessis, que a ampliou criando “categorias” de grafismos, atendendo as
possibilidades identificatórias deles.

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Pré-história

A “tradição São Francisco” apresenta-se do litoral atlântico até a Bolívia.

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Pré-história

A “tradição Planalto” está presente de norte a sul, da Bahia ao Paraná

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Pré-história

A “tradição Agreste” está presente no atual Nordeste.

A “tradição Nordeste” é encontrada do Piauí e do Rio Grande do Norte até o centro da Bahia.

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Pré-história

Passemos às tradições ligadas não à pintura, mas à gravura.

A “tradição Meridional” e a “Litorânea Catarinense” sobrepõem-se em Santa Catarina.

Voltemos ao nosso Nordeste e suas gravuras extraordinárias:

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Pré-história

5. Parte 3: Os Museus de Pernambuco e do Recife

A Wikipédia tem uma página dedicada só aos Museus de Pernambuco. Visite-a aqui.

Síntese da Unidade

Chegamos ao final de nossa última UNIDADE da Disciplina — intitulada NOSSO


PASSADO SAPIENS, à nossa porta — na qual estudamos, com mais detalhes, a
ocupação dos ecúmenos americanos, brasileiros, nordestinos e pernambucanos,
sempre com atenção à luta pela sua preservação, através dos processos chamados
de musealização, e de seu amplo e democrático acesso, tendo como exemplo central
o Museu de Arqueologia e Ciências Naturais da Universidade Católica de
Pernambuco e seu Laboratório.

Acompanhamos a expansão dos sapiens, através da Beríngia e de outras possíveis


rotas, vencendo as imensas paisagens geladas da última era glacial, deixando o
território do que hoje chamamos Ásia, para entrar no que hoje chamamos Américas.

Tudo, como prometido, através da visita virtual de alguns dos mais espetaculares sites
arqueológicos espalhados pelos 3 continentes que formam as Américas, visitados
cronologicamente, isto é, dos mais antigos aos mais recentes, dedicando-nos
especialmente aos sites brasileiros, nordestinos e pernambucanos.

Como pudemos notar, mantivemos nessa Unidade, como fio condutor, a


identificação dos registros materiais e das possíveis formas de organização dos
humanos em dispersão.

A “aventura científica” que, como professor, me propus a conduzir não termina


aqui: todas as demais disciplinas do curso, sejam as ligadas ao núcleo de
conhecimentos históricos, sejam as ligadas às disciplinas que ensinam como

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Pré-história

ensiná-los, vão continuar somando para que vocês terminem a licenciatura como
profissionais integrais, na área da pesquisa, do ensino e da extensão. Até nossos
próximos encontros.

Referências

CABELLO, Pedro. A genética: seu uso na determinação da origem do homem americano. In: SILVA, Hilton P.;
RODRIGUES-CARVALHO, Claudia (Orgs.). Nossa Origem. O Povoamento das Américas: Visões
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CISNEIROS, D. DIAGNÓSTICO DO ESTADO DE CONSERVAÇAO DOS SÍTIOS COM GRAFISMOS RUPESTRES


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CISNEIROS, D. Similaridades e Diferenças nas Pinturas Rupestres Pré-Históricas de Contorno Aberto no


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CORMELATO, F. As Representações Rupestres do Estado de Santa Catarina, Brasil. REVISTA OHUN – Revista
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LINKE, V.; ISNARDIS, Andrei. Arqueologia Pré-Histórica da região de Diamantina (Minas Gerais): perspectivas e
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LINKE, Vanessa; ISNARDIS, Andrei; ALCANTARA, H.; Tobias Júnior, Rogério; Baldoni Raíssa. Do fazer arte
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Pré-história

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Você também pode gostar