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Resumo
Introdução
No âmbito católico, duas falas do Papa Francisco, Jorge Mario Bergoglio, ditas em
outubro deste ano, 2020, e contidas no documentário Francesco, de Evgeny Afineevsky
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44º Encontro Anual da ANPOCS: GT36 – Religião, política, direitos humanos: reconhecimento e intolerâncias
em perspectiva.
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ganharam repercussão midiática: “Os homossexuais têm direito a formar uma família” e “Eles
são filhos de Deus e têm direito a uma família. Ninguém deve ser excluído ou forçado a ser
infeliz por isso” (BBC, 2020). Tais falas reafirmam a opinião do Papa sobre as uniões civis
homossexuais já expressadas anteriormente, como em 2013, durante o vôo de volta ao
Vaticano após a 28ª Jornada Mundial da Juventude no Rio de Janeiro ao responder uma
pergunta sobre o possível lobby gay promovido por Battista Ricca, monsenhor indicado por
ele ao cargo de prelado do IOR – Instituto para as Obras Religiosas, mais conhecido como
banco do Vaticano, depois da prisão do monsenhor Nunzio Scarano:
“Se uma pessoa é gay e busca a Deus e tem boa vontade, quem sou eu para julgá-la?
O catecismo da Igreja Católica explica isso muito bem. Diz que eles não devem ser
discriminados por causa disso, mas integrados na sociedade. O problema não é ter
essa tendência. Não! Devemos ser como irmãos. O problema é o lobby dessa
tendência” (MAISONNAVE, 2013 – grifo meu).
Já em 2018, disse: “Deus te fez assim, te ama assim, a mim não importa” (G1, 2018 -
grifo meu) a Juan Carlos Cruz, uma das vítimas, quando criança, de abuso sexual do padre
Fernando Karadima, acobertado pelo bispo Juan Barros, ao se assumir gay perante o Papa.
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Eu diria em frase muito breve, que é um momento de alucinação psicológica da
sociedade. [...] A doutrina nos ensina, e para os jovens, eu direi que há uma ética,
liberdade, o sexo é livre. Livre sim. Mas ele não tem a liberdade de indignificar a
sociedade, poderemos sim exercer o sexo, é uma função do corpo e também da
alma, mas com respeito e com a presença do amor. Portanto, a teoria de gênero,
jamé (DIVALDO, 2018 – grifo meu).
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reconhecimento do fiel pela instituição. Já no espiritismo não existe um rito, que de maneira
análoga marque o pertencimento e a integração do fiel a comunidade religiosa, tampouco
instância responsável por reconhecer tal pertencimento.
Situações desse tipo são mais complexas no âmbito espírita devido à ausência de
núcleo regulador e sua organização em sistema federativo. Além disso, outra especificidade
do espiritismo – se apresentar ao mesmo tempo enquanto filosofia, ciência e religião –
confere maior dinamismo em sua produção teórico-doutrinária. Como idealizado por Allan
Kardec, codificador da doutrina espírita, a dimensão científica revelaria as verdades sobre o
funcionamento das relações entre mundo material e espiritual, possibilitando novas
concepções religiosas no espiritismo (KARDEC, 2013). A relação entre religião e ciência
resulta na adoção de diversas posturas dos intelectuais espíritas, desde quem acredita que o
progresso científico confirmaria a doutrina, até aqueles que acreditam que os avanços
científicos levariam a reconsideração doutrinária do espiritismo (SIGNATES, 2014). Desse
modo, a legitimidade atribuída a essas novas concepções doutrinárias dependem do prestígio
de seus autores e do trabalho exercido por eles dentro das instituições espíritas. Como aponta
Célia Arribas (2017), a legitimidade é fruto da posição desses indivíduos no campo espírita,
como médiuns, dirigentes institucionais ou intelectuais.
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Cristo, a importância da caridade e estudo do Novo Testamento (SOUZA, ARRIBAS e
SIMÕES, 2020), este considera o sexo de maneira diversa de outras vertentes cristãs. Na
doutrina espírita a energia sexual é positiva, concebida como a capacidade genésica, força
presente em toda criação humana e não apenas na reprodução, sendo por isso, condição da
vida. Em termos de importância, apenas o amor é superior a essa força, razão pela qual a
energia sexual, por conseguinte, o sexo, se submete a lógica do amor (MOREIRA, 2016).
Como admite o espírito Emmanuel (mentor espiritual do médium Francisco Cândido Xavier),
a energia sexual apesar de não ser negativa, não se abstém do
Inerente a matéria, a energia sexual indica pelo seu uso o grau evolutivo dos espíritos.
De modo breve e sucinto, a doutrina espírita considera que os espíritos são imortais e que
evoluem ao longo de sucessivas encarnações. Ao longo do ciclo reencarnatório, as ações dos
espíritos são submetidas à justiça divina por meio da lei de causa e efeito, impondo aos
espíritos encarnados as consequências de todas as suas ações, seja naquela encarnação ou em
existências pretéritas. Por isso, os acontecimentos da vida são interpretados no espiritismo
como efeito de ações em encarnações passadas e vistos como oportunidade de aprendizado
necessário a evolução espiritual. No emprego moral da energia sexual, desde Kardec, a
monogamia é considerada marco da evolução espiritual, já que o casamento “é um progresso
na marcha da humanidade” (KARDEC, 2013, p. 263). Monogamia é sinônimo de casamento,
e se opõem a poligamia, tanto em Kardec quanto nas obras ditadas pelo espírito Emmanuel,
entendida como pura satisfação do desejo sexual e por isso contrária a monogamia, que se
ancora na afeição, leia-se amor, entre os seres (KARDEC, 2013; EMMANUEL, 2015).
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natureza. É a negatividade sexual que encara o prazer como maléfico e restringe o sexo ao
ambiente matrimonial com uma única finalidade: reprodução (BUSIN, 2011).
O catecismo explica
Título Ano
Catecismo da Igreja Católica 1991
Compêndio da doutrina social da Igreja 2004
Carta sobre o atendimento pastoral das pessoas homossexuais 1986
Algumas reflexões acerca da resposta a propostas legislativas sobre a não- 1992
discriminação das pessoas homossexuais
Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões entre pessoas 2003
homossexuais
Instrução sobre os critérios de discernimento vocacional acerca das pessoas com 2005
tendências homossexuais
Relatório final do Sínodo dos Bispos ao Santo Padre Francisco 2015
Fonte: Acervo do Vaticano. Disponível em: http://www.vatican.va/content/vatican/pt.html
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desordenamento nos anos de publicação nesta lista de documentos. No Catecismo da Igreja
Católica existem três parágrafos dedicados a consideração da homossexualidade, são os
parágrafos 2357, 2358 e 2359, sob o tópico: Castidade e Homossexualidade. De modo
sucinto, o documento reconhece essa atração sexual e afirma não haver explicação de sua
origem psíquica. Além disso, declara que seguindo a tradição bíblica
Que os apresenta como depravações graves, a Tradição sempre declarou que os atos
de homossexualidade são intrinsecamente desordenados. São contrários à lei natural,
fecham o ato sexual ao dom da vida, não procedem duma verdadeira
complementaridade afetiva sexual, não podem, em caso algum, ser aprovados
(CATECISMO, 1991, §2357).
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motivo, a própria inclinação deve ser considerada como objetivamente desordenada.
Aqueles que se encontram em tal condição deveriam, portanto, ser objeto de uma
particular solicitude pastoral, para não serem levados a crer que a realização
concreta de tal tendência nas relações homossexuais seja uma opção moralmente
aceitável (RATZINGER e BOVONE, 1986).
Por fim, o Relatório final do Sínodo dos Bispos ao Santo Padre Francisco é o único
destes documentos produzido durante o papado de Francisco, especificamente, dois anos após
a sua declaração em 2013: “Se uma pessoa é gay e busca a Deus e tem boa vontade, quem sou
eu para julgá-la?” (MAISONNAVE, 2013). Entretanto, o Relatório do Sínodo reafirma a
impossibilidade de equiparação entre matrimônio e união de pessoas do mesmo sexo, citando
inclusive, o documento Considerações sobre os projetos de reconhecimento legal das uniões
entre pessoas homossexuais. Este relatório é o único dos documentos citados que não associa
castidade e homossexualidade, embora seja o primeiro a associar castidade e sexualidade.
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interpretações espíritas sobre o mundo, legitimadas ou rechaçadas com base nos ideias
políticos e opiniões pessoais daqueles que se identificam como espíritas. Por isso, retomo aqui
a produção de alguns médiuns e intelectuais espíritas, situando-os a partir da interpretação que
fazem da homossexualidade com base na doutrina. De modo geral, existem duas posturas: de
reconhecimento e normalização da homossexualidade e de condenação dela.
Dentre aqueles que a reconhecem como normal é possível citar Francisco Cândido
Xavier com a psicografia dos trabalhos dos espíritos Emmanuel e André Luiz; do próprio
Divaldo Franco, especialmente dos trabalhos ditados pelo espírito Joanna de Ângelis, e
Andrei Moreira. Em contraposição a essas concepções temos os trabalhos de José Herculano
Pires e Jorge Andrea dos Santos.
Diferente de Chico Xavier, que era médium, Andrei Moreira é intelectual espírita,
médico homeopata e presidente da Associação Médico Espírita de Minas Gerais. Em suas
duas obras, Moreira (2016 e 2017) expande as explicações de Chico Xavier sobre a
homossexualidade e as transexualidades ao listar cinco razões para elas: 1) consequência
natural do reflexo mental e emocional condicionada pelas memórias de vida num mesmo tipo
corporal; 2) como condição facilitadora no cumprimento de objetivos nobres; 3) situação de
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prova e expiação resultante de uso descontrolado da energia sexual; 4) resultado de
influências obsessivas; 5) reação decorrente de traumas na infância. Aqui, na segunda
explicação a condição facilitadora por ser entendida como condição que impõe a castidade e
abstenção sexual, pois essas „facilitariam‟ a sublimação da energia sexual na realização de
trabalhos nobres. As duas últimas explicações de Moreira chamam atenção, por relacionar a
homossexualidade a causas externas, dissociando-as dos princípios doutrinários da
imortalidade do espírito e da reencarnação.
Não considerem a ocorrência como uma infelicidade ou punição divina, como era
normal nos redutos onde predominava ou remanesce a desinformação. A
problemática não é de natureza homo ou heterossexual, mas sim moral, colocando
acima da opção a conduta de cada qual na maneira correta de conduzir a existência
(FRANCO, 2015, p. 106).
Concretamente, é possível notar posturas distintas sobre um mesmo assunto, nas obras
de autoria do Divaldo Franco e nas obras psicografados por ele. O mesmo acontece com
outros médiuns espíritas e abre a possibilidade de identificação por parte dos fiéis com o
pensamento e explicações do médium ou apenas com as explicações dos espíritos. O
importante é salientar que mesmo as interpretações destes intelectuais e médiuns que
considerarem a homossexualidade como normal, ainda assim, o sexo homossexual tem de
estar sob o imperativo da moral, ou seja, ser realizado com base no amor, compromisso e de
preferência em relacionamentos monogâmicos. E mesmo assim, ainda aparece nessas
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explicações a possibilidade de se encarar a homossexualidade como oportunidade de prática
da sublimação da energia sexual, por meio da abstenção do sexo.
Por fim, cito as obras de dois eminentes espíritas, conhecidos e homenageados por
seus trabalhos de difusão do espiritismo: Mediunidade2, de José Herculano Pires (1984) e
Forças sexuais da alma3, de Jorge Andrea dos Santos (2012). De forma muito sucinta,
Herculano Pires (1984) admite a possibilidade da homossexualidade ser congênita em alguns
casos, mas reforça a necessidade de entendê-la como efeito de traumas e obsessão de
espíritos, vampiros, como ele denomina. Nas suas explicações sobre a homossexualidade, há
prevalência de causas espirituais externas ao indivíduo. Efeito da ação de espíritos
obsessores, a prescrição aqui não é a sublimação ou castidade, antes a homossexualidade
passa a ser curada por meio de sessões de desobsessão.
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Primeira edição publicada em 1978.
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A primeira edição foi publicada em 1992.
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Atando os nós, algumas considerações finais
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leva a percepção errônea de normalidade dessa sexualidade, pondo em risco o matrimônio, a
família e os valores morais da sociedade. A partir da disjunção entre homossexualidade e
prática sexual, se dribla o combate direto às pessoas homossexuais, que devem ser aceitas sem
serem discriminadas, pois o foco são as práticas sexuais dessas pessoas e os efeitos dos
discursos que as normalizem, leia-se a ideologia de gênero, tem na sociedade como todo.
Nesse caso, em defesa da sociedade, é preciso não apenas negar o lobby gay como também
incentivar o celibato e a abstenção sexual.
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