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AULA 2
CONTEXTUALIZANDO
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passada de olhos rápida e superficial do texto. Portanto, desenvolver a escrita
simples, clara e objetiva é um objetivo que todo estudante deve buscar atingir
em seu processo de aprendizado.
De toda forma, a melhor maneira de se familiarizar com o texto jornalístico
e de se preparar para redigir os mais diversos gêneros que a profissão abarca
é, sem dúvidas, lendo bastante. Portanto, procure ler diariamente e, se possível,
busque uma diversidade de gêneros e veículos.
Abordaremos os seguintes temas:
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literatura, por exemplo. Cada reportagem compete pela atenção do leitor com
diversos outros componentes externos. Por isso o texto jornalístico busca ser
leve e direto, de forma que as informações básicas possam ser encontradas e
reencontradas em caso de distração. Ao mesmo tempo, é preciso que a escrita
seja elegante o suficiente para que a atenção seja capturada. Afinal, o objetivo
de todo jornal é que os artigos sejam lidos na íntegra.
Um projeto gráfico atraente e o uso de imagens (como discutiremos mais
à frente) são muito importantes. Mas prender o leitor implica, em primeiro lugar,
a escolha dos temas que serão abordados em cada edição. Claro, é preciso que
se equilibrem pautas de “interesse do público”, aquelas que atraem leitores
pelo apelo intrínseco ao tema (temas da moda, celebridades etc.), e pautas de
“interesse público”, aquelas que abordam questões sensíveis para o estado de
direito democrático.
A apresentação visual e o tema são responsáveis por atrair o leitor para a
matéria, mas é a articulação do texto que irá garantir a sua permanência na
página, questão ainda mais importante na era do jornalismo digital. A quantidade
de cliques segue como a questão central para definir o sucesso de um site, mas
apenas se vier associada a uma taxa de rejeição baixa, o que se define pela
qualidade do texto.
A escrita jornalística precisa ser simples e direta, sem ser simplista,
evitando o didatismo que pode infantilizar o leitor. Afinal, ninguém gosta de se
sentir menosprezado. Isso não quer dizer que o texto deverá ter apenas frases
curtas em ordem direta (sujeito-verbo-predicado), mas que, ao se optar por uma
construção mais complexa, se considere, primeiro, se esta é a melhor forma de
expressar determinada ideia e, segundo, se a pontuação está bem colocada,
evitando sentidos diferentes dos pretendidos originalmente.
Palavras homógrafas – com sentidos diferentes, mas com a mesma grafia
– são problemáticas. Erbolato (2008) menciona o seguinte exemplo: “Um navio
brasileiro entrava no porto um navio português”. Você conseguiu entender?
Entrava pode ser lido como a conjugação do verbo entrar ou como a do verbo
entravar, esta última, a pretendida por quem escreveu. Em casos como esse, a
leitura fica prejudicada, mas é possível encontrar o sentido pretendido. O
problema é que há uma interrupção no fluxo de leitura, o que é um pecado grave
no texto jornalístico – corre-se o risco de perder a atenção do leitor.
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Outro problema a ser evitado: a cacofonia. Trata-se do caso em que o
final de uma palavra se junta com o começo da próxima, produzindo o som de
uma outra construção, em geral criando um sentido engraçado. Um dos mais
famosos entre estudantes é a expressão o bum da comunicação, que cria,
quando lida, o sinônimo chulo de glúteos. Para não cair nessa armadilha,
recomenda-se reler os textos em voz alta, buscando identificar o efeito
cacofônico. Mais exemplos: “ela tinha” = é latinha; “vez passada” = vespa
assada; “vi ela” = viela.
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Por fim, gostaríamos de mencionar um aspecto importante relacionado ao
processo de leitura de forma geral. Do ponto de vista cognitivo, a leitura se dá a
partir de um processo de encaixe entre o texto e a mente do leitor (como já
mencionamos). Ou seja, deve haver pontos de contato entre o que o leitor já
sabe sobre o mundo e as novas informações trazidas pelo texto. Imagine um
leitor que não sabe absolutamente nada sobre política brasileira – alguém que
morava em outro país e não tinha internet, por exemplo. Esse leitor, ao se
deparar com a manchete “O que esperar da Lava-Jato em 2016”, saberá do que
se trata? Certamente não, pois não é possível inferir o significado da expressão
lava-jato apenas a partir do título. Imagine, por exemplo, que você recebesse um
texto com o seguinte título: “Aspectos práticos das descobertas de drogas para
moléculas pequenas – a interface entre biologia, química e farmacologia”. Seria
uma leitura fácil para você? Haveria muitos pontos de contato entre o seu
conhecimento de mundo e as informações que o texto traz? Acredito que não.
Isso quer dizer que o jornalista deve ter em mente, quando escreve um
texto, qual o volume de “novidade” a colocar diante do leitor. As informações
apresentadas são suficientes para a compreensão do texto? O vocabulário exige
conhecimento contextual que não está explícito na matéria? Naturalmente, os
textos já partem do princípio de que os leitores sabem alguma coisa sobre o
assunto. Quem escreve sobre o campeonato brasileiro de futebol não precisará
explicar ao leitor o que é Flamengo, certo? Mas ainda assim é importante ter em
mente essa característica fundamental do processo de leitura, pois do contrário
você poderá escrever textos que deixarão lacunas de compreensão.
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Para Borges Neto (2012), esse conceito se refere a uma forma particular
de olhar para o que ele chama de enunciado linguístico real. Grosso modo, se a
semântica vai se deter sobre as significações de um texto dentro do escopo da
linguagem, a pragmática se interessa por todo o processo que circunda esse
mesmo texto, processo determinante para a sua compreensão. Nesse sentido,
a pragmática está ligada ao “processo de encaixe” sobre o qual falamos
anteriormente: o conteúdo de um texto deve ter pontos de contato com o
conhecimento de mundo do leitor, assim como suas interações sociais.
Isso quer dizer que a pragmática considera não apenas o texto em si, mas
também seu contexto e as intenções do enunciador. O texto é colocado em
perspectiva, como parte de um processo sociopolítico-cultural, e não fechado em
si mesmo, como seria a lógica da semântica.
Um mesmo objeto pode ser visto por diferentes ângulos, revelando
diversas possibilidades interpretativas. A ideia de colocar o texto como parte de
um processo maior, que envolve o seu contexto de produção e recepção, é o
que nos interessa quando estudamos o jornalismo.
Saiba mais
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TEMA 3 – TEXTO E OBJETIVIDADE
A.
B.
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Há uma clara diferença de construção entre as duas opções, não é
mesmo? Enquanto na opção A as informações estão todas escritas em frases
curtas, em ordem direta, e sem o uso de adjetivos que emitem um julgamento
sobre elas, na opção B o que acontece é o oposto. A comparação entre essas
duas versões do mesmo texto deixa muito claro o que significa ser objetivo do
ponto de vista linguístico, o que apenas o texto A consegue fazer.
O outro aspecto sob o qual podemos pensar a noção de objetividade é o
conceitual, ou seja, a objetividade como abordagem do assunto a partir de um
ponto de vista equilibrado, sem tendências ou paixões. Aqui estamos falando
mais das decisões do jornalista antes mesmo de escrever o texto do que do
próprio texto em si, ainda que, naturalmente, a questão da postura se reflita nele.
O conceito de objetividade jornalística surge a partir da compreensão de
que seria possível fazer a apreensão “dos fatos do mundo” por meio de um relato
narrativo preciso. De certa forma, é uma herança do positivismo de Auguste
Comte, que pregava a observação de fenômenos socais e a produção de
verdades científicas. Nessa perspectiva, o jornalismo seria capaz de produzir um
relato que não sofresse qualquer tipo de interferência cultural, simbólica ou
ideológica de quem o produz, como se fosse possível atingir a “verdade” por
meio de um método de observação testado e aprovado. Hoje sabemos que não
é bem assim. Todos nós falamos a partir de um ponto de vista pessoal que
carrega nossas crenças, nossos desejos e nossa história particular, e que
qualquer apreensão da “realidade” é, ao menos de certa forma, parcial.
O princípio da objetividade impacta desde a escolha do que será noticiado
até a noção de hierarquização das informações dentro de uma matéria (pirâmide
invertida, noção que será abordada mais adiante, nas próximas aulas), passando
pelas relações de poder entre jornalistas e fontes.
Há uma confusão natural no jornalismo que coloca a objetividade em pé
de igualdade com a imparcialidade. Ou, ainda, o entendimento de que uma
decorre da outra, diretamente. O conceito surgiria, então, como um pacto entre
o jornalista e o leitor, que pode acreditar no que está publicado em um jornal
porque o jornalista não tem interesse no assunto, sendo imparcial, portanto. Isso,
em tese, gera um relato objetivo da realidade.
Mas esse “pacto da objetividade” pode, na verdade, ser usado para
enganar o leitor. Os jornalistas podem empregar recursos e estratégias
linguísticas com o objetivo de dar a impressão de que o texto foi escrito de forma
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isenta, quando, na verdade, fizeram escolhas claramente tendenciosas. O leitor
estaria, então, sendo levado a acreditar que a “verdade dos fatos” estaria
representada nas publicações. A objetividade seria, dessa forma, um
instrumento de manipulação dos veículos que empurrariam quase
subliminarmente a sua própria interpretação dos fatos para os leitores.
Esse pensamento levou a uma certa crise da objetividade em decorrência
da constatação de que o relato jornalístico: (1) não dá conta da realidade; (2)
dificilmente é totalmente desprovido de paixões; e (3) fica patente, pela
comparação entre diversos veículos, que há a defesa de interesses
corporativistas por trás dos textos.
Com a crise da objetividade, cabe questionar: sem objetividade, é possível
fazer jornalismo? Não há resposta simples para essa questão. Simplesmente
abraçar a subjetividade intrínseca de cada jornalista e redação de jornal,
deixando claro ao leitor com uma série de ressalvas que o texto pode conter
algum tipo de interferência, não resolve a questão.
A outra possibilidade é demolir a fronteira entre o jornalismo objetivo e o
jornalismo de opinião. Os jornais e as revistas se tornariam uma coleção de
artigos em que os pensamentos de cada autor, articulados ou não com outros
textos ou depoimentos de pessoas, estariam à frente de qualquer conjunto de
normas e práticas de redação.
Muitos jornais vêm adotando essa postura, mesclando artigos escritos
com “objetividade”, como pregam os manuais de jornalismo, com textos de
opinião – alguns desses até escritos por jornalistas cujo nome e conhecimento
em uma determinada área tenham se tornado notórios de alguma forma. Dois
veículos relativamente jovens em nosso país, o El País Brasil e o HuffPost Brasil,
usam essa técnica. Curiosamente, ambos são veículos estrangeiros que vieram
ao nosso país montar novas redações.
Um bom exemplo desse balanço é a coluna de Eliane Brum para o El País
Brasil. A jornalista se tornou notória ao escrever uma série de livros de não
ficção, o que gerou convites para assumir a coluna semanal em que debate
questões ligadas à política e à sociedade brasileira. Seus textos longos misturam
a opinião da autora, embasada pela experiência e pela articulação com
pensamentos de cientistas sociais, com dados estatísticos e depoimentos.
Se essa postura ajuda os veículos como um todo, oferecendo ao leitor
diversos pontos de vista articulados, ainda resta ao jornalista a solução de seu
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dilema. Sem um valor como o da objetividade, a própria prática jornalística corre
o risco de perder sua função social.
Para muitos pesquisadores, a saída está em abraçar a lógica da
intersubjetividade. A função do jornalista seria, então, buscar conciliar diferentes
pontos de vista – diferentes subjetividades – de forma a criar um relato que se
aproxime ao máximo de uma realidade objetiva. O foco na objetividade como um
ideal final a ser alcançado se desloca para o processo de apuração e redação.
Um dos pontos de vista que deverão, invariavelmente, ser articulados é o do
próprio jornalista, que deverá se mostrar consciente de seu papel no processo
de mediação desses diferentes relatos colhidos.
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Planejamento do texto:
Nota 5
Mas não foi apenas o curso de GPI que obteve boas notas: dos 10
primeiros classificados do curso de Pedagogia no Brasil, dentre todas as
instituições e modalidades de ensino, três são alunos de educação a distância
da Uninter – e um deles se classificou com a terceira maior nota do país.
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“É um orgulho saber que nós estamos fazendo um bom trabalho, que os
alunos estão conseguindo entender os conteúdos. A prova não é fácil e traz
todos os conteúdos da grade de Pedagogia, e ver que eles têm condições de
responder uma prova dessas, que eles assimilaram o conteúdo dos quatro anos
do curso, é gratificante”, diz a coordenador do curso de licenciatura
em Pedagogia, Gisele Cordeiro.
Saiba mais
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Depois do lide, o texto deverá trabalhar no sentido de explicar e
contextualizar essas questões iniciais. Então, diferentemente da proposição de
Boaventura, o texto jornalístico não caminha para uma conclusão; ao contrário,
se desenvolve a partir de um postulado. Isso envolve uma questão prática de
outra ordem: a relação com o espaço da página, uma herança do jornalismo
impresso. Dessa forma, uma matéria que precisasse ceder espaço para outra
mais urgente e importante deveria ser cortada. Mas onde cortar? O clichê
jornalístico prega que sempre se deve “cortar pelo pé”, ou seja, os últimos
parágrafos são progressivamente menos importantes.
É quando entra em cena outra técnica clássica do jornalismo: a pirâmide
invertida. Trata-se de uma imagem mental que ajuda a visualizar como o texto
será organizado. No topo, ou seja, no lide, as informações mais importantes e
centrais. A partir dele, são trabalhadas questões que vão caindo em importância
até chegarem ao fim. Por isso, se for necessário cortar, os últimos parágrafos
serão os sacrificados.
A aproximação ou rejeição a esses modelos dependem da inclinação de
cada jornal e de seu contexto cultural. No final dos anos 1990 os editores não
pensariam duas vezes para cortar uma abertura mais literária em uma matéria
(“nariz de cera”, no jargão). Hoje, é possível que um texto que comece direto no
lide seja devolvido ao jornalista para que ele trabalhe um pouco mais na
apresentação, deixando as informações para o segundo ou terceiro parágrafos,
buscando fisgar o leitor pelo clima de mistério de uma abertura mais policialesca,
por exemplo. De certa forma, é o que vimos no texto analisado neste tema – as
informações que se referem ao título, da nota dos alunos de Pedagogia, só
aparecem no segundo parágrafo, sendo o primeiro usado para criar uma
introdução geral ao assunto.
Portanto, a lógica do lide e a da pirâmide invertida são pontos de partida
para a construção de um texto. Mas não devem ser vistas como regras rígidas.
Diversos modelos surgiram para questionar esses formatos e apresentar outras
possibilidades. Entre elas, estão o jornalismo literário e o New Journalism, que
incorporam elementos da literatura no texto jornalístico.
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TEMA 5 – O PARÁGRAFO
Porém, para mim, a estatística mais reveladora surgiu algum tempo atrás,
quando uma pesquisa sugeriu que 72% dos trabalhadores britânicos acumulam
dez horas extras de trabalho não remunerado por semana. Se eu acredito nos
resultados desse estudo? Não, ele foi realizado pela Travelodge. Mas aí vi outro
estudo realizado pelo ligeiramente mais confiável Trade Union Congress,
segundo o qual o trabalhador britânico médio – tenha isso em mente, o
trabalhador britânico médio – faz sete horas e 18 minutos extras de trabalho não
remunerado toda semana. Essa sim é uma estatística aterrorizante, que sugere
que aceitamos um código secreto de conduta para o trabalho diário: trabalhar
por muito mais tempo do que se deveria, por muito menos, com menos
vantagens – e sendo obrigado a repetir o mantra da empresa.
MARTIN, C. Nossa cultura de trabalho está nos matando. Vice, 02 out. 2015.
Disponível em: <http://www.vice.com/pt_br/read/nossa-cultura-de-trabalho-esta-
nos-matando?utm_source=vicefbbr>. Acesso em: 16 dez. 2019.
Você deve ter percebido que esse parágrafo está no meio do texto, certo?
Desta forma, ele naturalmente retoma informações que já foram mencionadas.
Quando na primeira frase ele diz “a estatística mais reveladora surgiu algum
tempo atrás”, podemos concluir que no parágrafo anterior o texto apresentou
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estatísticas. E que esse parágrafo, como a primeira frase deixa claro,
apresentará outras estatísticas que o autor julga mais relevantes – o centro da
sua exposição. Fica claro que é um texto sobre as relações de trabalho e que os
dados de duas pesquisas diferentes serão comparados para corroborar a
mesma ideia-núcleo: a maioria dos britânicos trabalha quase 10 horas a mais
por semana. Note, ainda, como a última frase busca resumir e contextualizar as
informações expostas. Observemos o parágrafo seguinte:
TROCANDO IDEIAS
NA PRÁTICA
c. “A mãe pediu para o filho dirigir seu carro.” (Carro da mãe ou do filho?)
Respostas:
FINALIZANDO
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preocupação com o leitor. O texto jornalístico precisa ser compreendido mesmo
na mais superficial das leituras.
Em seguida, tivemos contato com duas abordagens possíveis para a
escrita. Ou, ainda, duas posturas a serem adotadas pelo jornalista diante da
produção de um texto: a pragmática e a objetividade. Nenhuma das duas pode
ser tratada como uma diretriz totalizante e fechada em si mesma, mas antes
como possibilidades durante a confecção de um texto.
A pragmática nos leva a refletir sobre o texto como parte de um processo
sociopolítico-cultural muito mais amplo do que a sintaxe, o que é determinante
para um artigo publicado em um veículo. A discussão sobre a objetividade, por
outro lado, evoca a distância radical que há entre um fato e a sua representação,
e que o dever do jornalista é refletir sobre sua própria subjetividade de forma a
ser capaz de produzir um relato que busque a aproximação com o mundo real.
Depois de abordar a escrita de um ponto de vista conceitual, direcionamos
nosso olhar para a estrutura do texto, refletindo sobre como começar, terminar e
o que colocar no meio. E, como qualquer texto moderno é uma coleção de
parágrafos, encerramos essa rota refletindo sobre como se faz um deles.
Todas essas questões acompanharão a vida profissional do jornalista.
Como procuramos deixar claro ao longo desse texto, não há respostas fáceis.
Todavia, ao mesmo tempo, parte da prática jornalística está na busca e no eterno
questionamento do como fazer. Cada novo texto é, em si, um desafio complexo
que demandará escolhas e decisões.
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REFERÊNCIAS
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