Você está na página 1de 4

REFERÊNCIA: O DISCURSO do Rei. Direção: Tom Hooper.

Inglaterra: See Saw Films,


Bedlam Productions, 2010. 1 vídeo (118 min.).

O filme retrata a superação do problema da gagueira, da timidez e da fobia social de um

indivíduo no contexto da realeza britânica pouco antes do início da segunda guerra mundial. O

drama mostra as dificuldades do rei George VI, que é obrigado a assumir tal posto, tão

importante na sociedade, mesmo com suas limitações na fala. A história, baseada em fatos reais,

mostra a influência de eventos negativos passados na vida de uma pessoa, mesmo depois de

adulta. Isso traz a reflexão sobre as formas que os traumas podem se apresentar na vida de

alguém, mas também deixa a visão de que com acompanhamento profissional eles podem ser

superados. A produção aclamada pela crítica e vencedora de prêmios do cinema, aborda também

a relação de amizade que foi construída entre o fonoaudiólogo e o rei durante o tratamento, além

de reforçar um problema de muitos profissionais, a dificuldade em se comunicar. Sabe-se que

muitas pessoas são boas em desempenhar as funções as quais têm conhecimento, porém têm

bastante dificuldade em se comunicar em diversos contextos. O filme é uma história que motiva e

inspira superação.

George (Colin Firth) tem problemas com a fala desde quando pode se lembrar, isso poderia não

ser um problema tão grande se ele não fosse o Duque de York, filho do Rei George V, e se não

tivesse que fazer discursos para uma nação inteira. No seu primeiro discurso, ainda como Duque

de York, George não consegue êxito, devido ao seu problema, o que o faz, mais uma vez,

procurar um novo profissional.

Depois de várias tentativas frustradas, a sua esposa Elizabeth (Helena Bonham Carter) encontra

Lionel Logue (Geoffrey Rush), um profissional excêntrico com métodos de tratamento nada

convencionais. Lionel, desde o começo do tratamento tenta criar um vínculo com George,
2

entendendo que assim conseguiria resolver o problema. O tratamento começa a surtir efeito, mas

tem altos e baixos, visto a personalidade forte dos dois e o Duque acaba desistindo.

Com a morte do seu pai, o Rei George V, o seu irmão David (Guy Pearce) assume o trono como

Rei Eduardo VIII, mas sem tato nem vocação para o posto e apaixonado por uma mulher já

divorciada e a caminho de um segundo divórcio, abdica do trono. George se vê obrigado a

assumir o trono em um momento de iminência da segunda guerra mundial. Com o não só

importante, mas necessário discurso para preparar a nação para a guerra, o Rei se vê na posição

mais difícil e temida da sua vida, tendo que discursar para todo o seu povo.

Nessa intempérie, o Rei volta a se consultar com Lionel e a relação deles progride, juntamente

com a dicção e a confiança de George. O preparo para o discurso é intenso e bem encaminhado,

Lionel trabalha com o Rei de forma não convencional não só os aspectos técnicos, mas também

os psicológicos.

George o faz junto com Lionel em uma sala preparada para ele, para que dessa forma as pressões

e fatores externos não consigam interferir. Ele fala sendo a todo o momento orientado por Lionel

e o discurso é um sucesso. Logo após o discurso ele é aclamado pelo seu povo.

"Eu não acho que isso seja para mim". Um trecho que nos permite profundas reflexões, ainda nos

primeiros trinta minutos de filme, onde Lionel pede para que George leia um trecho do livro de

Shakespeare com fones no ouvido tocando uma música bem alta. Contrariado, ele acaba lendo,

mas logo desiste, interrompendo o exercício, desacreditando mais uma vez em si mesmo. Em

seguida, o excêntrico terapeuta presenteia o príncipe com o disco de vinil contendo a gravação de

sua voz. À noite, no palácio, George escuta a gravação e se surpreende por ter conseguido falar

sem gaguejar, voltando a procurar o “doutor” pouco convencional, no dia seguinte.


3

Além disso, o histórico de maus-tratos sofridos durante a infância, juntamente com o

autoritarismo do pai e a incompreensão da família revelam a potencialidade dada à dificuldade do

personagem principal em lidar com o problema de comunicação. Nossos traumas quando

alimentados se tornam crenças limitantes. Em vários momentos do filme, George era duro

consigo mesmo, não se achando capaz, se auto depreciando, abrindo mão facilmente dos seus

próprios interesses por medo. Trazendo para nossa realidade, o que nos faz “paralisar” diante de

uma apresentação em público?

Em “O Discurso do Rei” percebemos a importância de saber se expressar bem. Na tentativa de

acalmar os ânimos, a boa oratória do Rei George VI, diante da forte ameaça de Hitler na Segunda

Guerra Mundial, conquistou a população inglesa justamente por ter sido uma fala direta, clara e

objetiva. O apoio da esposa Elizabeth e de seu novo amigo Lionel foi muito importante para esta

evolução. Ou seja, para passar credibilidade aos receptores da mensagem é necessário, sobretudo,

estar confiante consigo mesmo e seguro das informações que se pretende passar. Outra lição

valiosa que o filme nos traz é que precisamos nos conhecer profundamente para então podermos

vencer nossos medos e conseguirmos embarcar em novos desafios.

“A nação acredita que quando falo, eu falo por eles, mas eu nem consigo falar”. Esta frase

marcante do personagem principal reflete a relação de poder que o mesmo tem com um povo em

contraponto à sua incapacidade de comunicar a sua autoridade e responsabilidade e de cumprir

com o que esperam dele.

Outra fala importante reflete como ele enxergava a autoridade e sucesso nos discursos do ditador

Adolf Hitler. Quando questionado pela sua filha sobre o que o ditador falava em um discurso, ele

disse: “Eu não sei, mas parece estar dizendo muito bem”. O que mostra que, apesar dos discursos
4

de ódio, ele tinha uma oratória que prendia os seus seguidores. O rei, mesmo não entendendo o

idioma naquele discurso, percebeu o poder naquela fala que incluía elementos não-verbais como

a postura e também a entonação.

Um exemplo de oratória interessante e referência até hoje foi o discurso de Martin Luther King,

“Eu tenho um sonho”, que misturou esses elementos, mas para o bem, ao contrário do primeiro

exemplo. Tanto o discurso final do filme, quanto o de Martin Luther King servem de inspiração e

superação para todos. Histórias como estas não devem ser esquecidas e, sim, usadas para reforçar

o poder da comunicação e o quanto a mesma é instrumento de mobilização social, bem como

rompe com barreiras do preconceito e da intolerância.

Você também pode gostar