Trabalho Final da Disciplina Teoria das Representações Sociais (TRS)
A representação social do estresse
A TRS consolida o estudo dos processos de subjetivação da vida social e, com
suas peculiaridades de estudo da subjetividade em relação a psicologia clássica de Sigmund Freud e Burrhus Frederic Skinner. A subjetividade ficou mais presente nas discussões do campo social, pois constrói-se o conhecimento de que a representação social é organização simbólica sobre a qual se desenvolvem as diferentes práticas e relações sociais dos membros dos grupos, instituições e comunidades humanas, que nada mais é do que a produção subjetiva em estado puro. Nesses parágrafos iniciais é importante deixar claro que alguns feitos da TRS, como o fato dela ter subsidiado a saída do social da crescente exclusividade do caráter objetivo e externo das análises dos sujeitos envolvidos nas diferentes práticas sociais, para o campo de análise estes sujeitos passam a serem analisados pelos seus processos de ancoragem e objetificação, que irão construir núcleos centrais e sistemas periféricos de compreender o mundo a partir do senso comum. O fato do senso comum ser resgatado pela TRS, dar segurança e estabilidade ao mundo homem comum, aquele que tem pouco contato com as teorias físicas e químicas da ciência dura, para compreender seu dia a dia. Em seu livro “Representações sociais: investigações em psicologia social”, Moscovici (2003) nos diz que o medo do que é estranho é profundamente arraigado na existência humana. O que poderia ser muito bem dialogado com “ A Condição Humana” que Hannah Arendt (2016): o trabalho, a obra ou fabricação e a ação, e agora o medo do desconhecido. Guardada suas devidas proporções de teorias e campos de análises, isso se deve ao fato de que a ameaça de perder os marcos referenciais, o contato com o que propicia sentido de continuidade de compreensão mútua, é uma ameaça insuportável ao humano. O conhecimento do senso comum proporciona esse sentido de continuidade de compreensão mútua em nossas vidas cotidianas, na mais justo que ele ocupe lugar central na TRS. Alguns podem discordar, mas o queria de uma nova teoria de não houve resistência a ela? Por muito tempo o conceito de ciência enveredou para a perspectiva de conhecer as realidades não conhecidas do homem, mas podemos nos indagar: e a realidade já supostamente conhecida, o que fazemos com ela? A realidade conhecida é capaz ainda de explicar e produzir conhecimento? A TRS afirmam categoricamente ao resgatar a centralidade do conhecimento do senso comum, de que as realidades supostamente já conhecidas de fato pouco foram exploradas pelas ciências exatas e da natureza, e que se constitui o núcleo da produção subjetiva. O conceito de representação social; que é o processo de intervenção subjetiva sobre o real de forma afetiva, cognitiva e socialmente; significa dizer que há a perspectiva construída e subjetiva da realidade social que campo infinito de conhecimento. Ao pegamos todos esses pressupostos e operacionalizarmos na representação do estresse, percebemos que é possível analisar a realidade cotidiana por meio da TRS. Os últimos dois anos em que vivemos a pandemia de Covid-19, polarização política nas eleições, copa do mundo e guerras em solo europeu fomentaram reestruturações nas representações das pessoas, e por consequência ou causa tem-se as mudanças nas subjetividades no campo econômico, político, social e da saúde. Os aspectos subjetivos do estresse têm sido estudados a partir de diferentes perspectivas, mas em dúvida com destaque a psicologia cognitiva norte-americana com Folkman e Lazarus. O que sabe da psicologia cognitiva, no novo continente, é que se tem a visão mais centrada na falha dos processos de enfrentamento, de natureza cognitiva, que facilitam o desenvolvimento das emoções estressantes associadas à doença. Também se sabe que essas definições clássicas começam a ser questionadas pelos autores que lhes deram origem. Especificamente Folkman (2011) em seu último livro “Th e Oxford Handbook of Stress, Health, and Coping”, um cabedal de 486p que precisei de mais de um ano para ler, reconhece as limitações do conceito de estresse pela ausência da teoria psicológica das emoções. Que ficar mais compreensível quando explicado desse modo: “limitação pela ausência da teoria psicológica que explique o afeto, cognitivo e social que envolve o estresse”. Aqui é possível fazer importante crítica, não necessariamente fundada na TRS, mas que se interliga a ela por ter a ver com seu resgaste do conhecimento do senso comum. As questões teóricas e metodológicas que sustentam o desenvolvimento da psicologia, afetam também os estudos sobre as doenças crônicas, pois são seus objetos no campo da saúde. Aqui está o ponto de crise, pois na construção desses estudos faz-se questão de se excluir historicamente o saber do senso comum em uma fragmentação do saber psicológico com a tendência de colocar os dados objetivos como o santo grau das análises da produção subjetiva. Perde-se de vista que o estresse está no dia a dia das pessoas, e estas mesmas pessoas se orientam e existem fundamentalmente pelo seu conhecimento do senso comum sobre o estresse, e assim constroem seus mecanismos de defesas. Ao se analisar o estresse por meio da TRS se operacionaliza a análise de integração de campos da psicologia social e da psicologia da saúde para se compreender os processos de subjetivação das representações que se constitui em torno desse fenômeno. A TRS já é muito utilizada no campo da saúde para análise de aspectos do cuidado, como na análise da loucura. Não é nada de extraordinário em utiliza-la apara análise do estresse. Em geral quando recebemos o diagnóstico ou até mesmo a hipótese diagnóstica, principalmente se estiver relacionado a morte iminente, temos diversões processos que irão acontecer em resposta a esse evento, entre os principais estar o processo de ancoragem e objetivação. A ancoragem relacionado ao processo de tornar familiar aquilo que se acabar de tomar ciência com alguma coisa já vivida por nós mesmo ou por alguém que conhecemos, e objetificação ligada ao processo de objetificação no mundo real, a linguagem médica foi processada cognitivamente e ligou-se a algum afeto que nós tínhamos a doença e foi representada no mundo concreto. Esses dois processos são essenciais a condição humana, pois nos sentimos ameaçados ao perdermos os marcos referenciais que propicia sentido de continuidade e compreensão mútua do que vivemos. Isso pode ser resumido na frase que comumente chamamos de “imaginário social”, mas que nada mais é do que a representação social produzindo subjetividade. Os adoecimentos quebram não só a segurança e estabilidade do bem-estar subjetivo, mas a temporalidade do fazer humano: “trabalho hoje, para desfrutar amanhã”. Se eu não consigo trabalhar hoje, como poderei desfrutar no amanhã? Esse amanhã geralmente demora mais de 35 anos de trabalho, logo, e longo período de possibilidade de adoecimento. Diferentemente do diagnóstico do câncer terminal, o estresse ele está presente no humano desde o nascimento, e é até mesmo essencial para a sobrevivência da espécie como diz Hans Selye (1965) em seu livro “Stress a tensão da vida”. Ou seja, o estresse é definido como Síndrome de Adaptação Geral (SAG), que é a resposta natural de defesa do organismo a situações adversas. O que se popularizou no senso comum foram duas principais “verdades”: que o estresse é sempre ruim e os adoecimentos laborais são decorrentes do estresse. Ao analisarmos o estresse de fato constata-se que há sua dimensão tida como patológica denominada distresse, estado em que há excesso ou carência de adaptação, em que expressasse respostas inadequadas. Mas há também a dimensão positiva que chamamos de eustresse, na qual o indivíduo é mais produtivo e criativo em suas reações adaptativas. Podemos lançar mão da hipótese que o fato das pessoas cotidianamente associarem o estresse a algo ruim ao bem-estar dar-se pelo processo de ancoragem. Neste conceito TRS tem-se uma estrutura cognitiva funcionado, em que há um núcleo denominado de figurativo que depositamos o que tem mais essencial para avaliar e rotular qualquer coisa que já tenhamos vivido. Esse núcleo será utilizado como referencial para ancoramos nossas novas experiencias, e dizermos se são boas ou ruins. Ao pensarmos no fenômeno do estresse, a primeira imagem que conseguimos associar é em uma pessoa adoecida que não consegue mais desempenhar suas atividades, com níveis de sociabilidade baixos, com muitas tarefas para fazer e sem tem hábil para isso e que está quase em colapso nervoso. Ao vermos esses aspectos se repetirem em diversos discursos e quadros clínicos em nosso cotidiano, avaliamos que o estresse é o fenômeno que produz consequências sempre ruins ao bem-estar e passamos a rotulá-lo a partir desse prisma nas novas experiências. Entende-se que se deu um sentido a esse conjunto de características vistas nas experiencias que temos, que é: o estresse faz as pessoas adoecerem. Passamos a instrumentalizar esse saber que o senso comum nos subsidia, ou seja, saber que o “estresse faz as pessoas adoecerem”, a partir de uma “nosologia” que o conhecimento do senso comum permitir construir, se torna funcional, pois as pessoas passam a agir de forma diferente das que adoeceram a fim de que não fiquem estressadas. Por fim, enraíza-se essa forma de perceber o estresse na temporalidade, de geração a geração, e aí temos a sua representação coletiva. Produções de subjetividade a partir de uma representação social de um fenômeno presente em todos os ambientes humanos. Não podemos esquecer também do processo de objetificação que fazemos do estresse. Lembremo-nos de que objetificar é fazer com que uma representação cognitiva se torne concreta, seja visível e tangível no real dentro dos conjuntos dos signos que nós temos contatos. Buscamos objetificar o estresse no processo “nosológico” do senso comum, pois quando visualizamos uma pessoa que não consegue mais desempenhar suas atividades, com níveis de sociabilidade baixos, com muitas tarefas para fazer e sem tem hábil para isso e que está quase em colapso nervoso, decidimos diagnosticá-la com estresse. O conjunto de sentidos e significados podem ser percebidos no mundo concreto agora. Ao analisarmos a segunda construção de verdade, que seria de que todos adoecimentos laborais, ou em sua maioria, são decorrentes do estresse, novamente percebemos as representações sociais presente na produção de subjetividade a partir do conhecimento do senso comum. Aqui é interessante fazer o recorte de análise nos profissionais da saúde principalmente nesse período da pandemia de Covid-19 ou pós- pandemia. O fato de associarmos que a principal origem dos adoecimentos ocupacionais ao estresse está na difusão desse conceito na virada para século XXI, com a consolidação da dimensão psicossocial das doenças do trabalho. Podemos de certo modo precipitado afirmar que o sofrimento no trabalho apresenta a dimensão clínica e sociológica, uma vez que a tensão entre a atividade laboral formal imposta pela instituição geram séries de sentimentos que podem ser positivos ou negativos, e até mesmo ambos no trabalhador, que modulam a relação deste último com o trabalho. Moscovici (1978) em seu interessante texto “A representação social da psicanálise” nos alerta para fato de que a elaboração das representações sociais se dá no campo da dimensão psicológica e a social, pois elas possuem a capacidade de estabelecer relações entre as abstrações do saber e das crenças, ao considerarem a concretude da vida do sujeito no seu processo de subjetivação coletiva. Ao trabalharmos a representação social do estresse em relação ao seu processo de objetificação e ancoragem a partir de determinada nosologia do senso comum que leva ao prognóstico de adoecimento, notarmos que no imaginário social o profissional de saúde está mais propenso ao estressar por está inserido no hospital e ambientes similares, e esses locais potencializarem aspectos de adoecimento. As experiências coletivas criam a representação social da doença, configurada pelos sentidos subjetivos e práticas simbólicas que fazem parte da rotina das pessoas.