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AULA 8 – ESTÉTICA DA MÚSICA

Para um modelo diferente de historicidade


- Além de ser arte temporal e móvel (extrapolando limites cronológicos e geográficos), a música
é feita de mensagens enigmáticas, de significados mais abertos do que outras artes; muitas vezes
unicamente sensoriais.

*A teoria da recepção
- Mais recentemente, criaram-se linhas de estudo voltadas à recepção da música (aceitação ou
recolhimento daquilo que ela oferece a quem a ouve); experiência diante do fenômeno musical
(apreciação, percepção, cognição) envolvendo psicologia, sociologia e teoria da informação.
- Nestes casos, interessa ao pesquisador o momento em que a música é interpretada, executada, e
os modos de audição. Não interessam, portanto, os processos composicionais fincados num
passado remoto ou mais recente. A obra musical, além de existir como documento de época,
projeta-se e se recria no futuro sempre que é tocada e ouvida (“ressignificada”).
*- A relação obra-intérprete-ouvinte é, portanto, constitutiva da própria vida e essência da
música.
- Essa consciência e abordagem da música é evidente na contemporaneidade mediante a
valorização (geralmente exagerada) do intérprete, a abertura ao aleatório e à participação do
ouvinte no ato criativo.
*- O desdém pelos direitos autorais, a livre manipulação de fonogramas e as versões e
interpretações “alternativas” incisivamente criativas são, hoje, realidades incontestáveis que
adicionam mais “problemas” e possibilidades num cenário cada vez mais complexo. Instrumentos
de época, execuções “históricas”, ou liberação geral? O que significa autenticidade em música se
esta é, por definição, fluída, imaterial e temporal?

*Instinto e razão na música


- A grande dualidade na música: por um lado há “aspectos instintivos, alógicos, pré-racionais e
pré-linguísticos da natureza humana”. Por outro, há sua natureza física, racionalizável,
matemática, mais que apenas linguagem.
- A série harmônica, presente na natureza terrestre e cósmica como um dado natural, confere à
música esse potencial a-histórico que extrapola épocas e culturas.
- Antes de mero item sociocultural, a música tem esse modo “naturalista” de ser, tocando-nos de
forma imediata e instintiva (citar p. 48-49).
- Outra dualidade paradoxal se encontra no estudo da música. A prática e o conhecimento
musical, sem dúvida, aprimoram a audição, apreciação estética e senso crítico. No entanto,
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pessoas “leigas” em teoria musical podem perfeitamente fruir músicas de modo instintivo e não
menos intenso; da mesma forma, podem tocar um instrumento ou cantar (p. 49).
- A fruição da música seria, portanto, intrínseca a uma parcela de nossa natureza que é pré-lógica;
que evoca “precisamente este fundo obscuro, instintivo, que se encontra na linguagem musical e
que curiosamente não contradiz em nada a sua natureza racional e matemática” (p. 49).
*- Esse “fundo obscuro” talvez se revele, na tradição ocidental, na busca em superar modelos
mediante improvisações abertas ao inconsciente e ao aleatório, como se a própria natureza
indicasse os futuros da música, independentemente da racionalidade humana.

*Interpretação e improvisação
- A música depende de ser executada, “interpretada”, para poder existir. Dava-se unicamente
assim, até fins do século XIX, mas tal circunstância se mantém até hoje, apesar das gravações. O
intérprete faz a música sempre rebrotar de sua natureza intrinsecamente temporal.
*- Surge, então, outra dualidade do fenômeno musical: o intérprete “disputa, às vezes, o mérito da
criatividade com o próprio compositor”. Se a música depende de um intérprete para poder existir,
cabe a este não apenas ter habilidades necessárias para decodificar partituras musicais, mas ter
uma personalidade artística e humana apta para tal recriação e ser musicalmente tão ou mais
capaz do que quem compôs.
- Entra em cena, portanto, e em qualquer execução musical, o ato criativo aliado a doses variáveis
de aleatoriedade e improviso.
- O intérprete “vive” a música como se fosse sua e, em certo sentido, ela de fato é sua, já que se
trata de fenômeno que brota de um substrato físico universal pré-existente, não apenas fruto de
uma pessoa ou cultura.
- Tratando-se de som, a notação musical é sempre precária e aproximativa; incapaz de representar
por meio de símbolos gráficos uma realidade que é sonora. Daí surge a necessidade de haver um
intérprete com habilidade e notoriedade artístico-criativa suficientes para realizar a tarefa.
- Com o século XIX, essa preeminência do intérprete se tornou notória.
- Hoje em dia, mais do que nunca, o executante/cantor está acima do próprio compositor; está, de
fato, acima da própria obra; o intérprete (como meio) se encontra, não raro, acima da própria
“mensagem” (não obstante seu antigo posto de inferioridade na classificação musical).

Definição de termos:
Escansão (verbo escandir): medida, cálculo análise
Filológico (adjetivo referente a filologia): conhecimento que tem por base registros escritos
Hermenêutica: ato de interpretar textos
Historicidade: potencial de algo se tornar historiografia (relato histórico)

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