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'0 que agora está provado foi uma vez apenas

imaginado."
WILLIAM BLAKE

A descoberta da tectônica de placas 47


tente da Terra - é fragmentada em cerca de 12
O mosaico de placas 51 Alitosfera
placas, - a deslizam,
que camada mais externa, ou
convergem rígida e resis-
se separam
Velocidade das placas e história dos umas em relação às outras à medida que se movem sobre
movimentos 58 a astenosfera, menos resistente e dúctil. As placas são
criadas onde se separam e recicladas onde convergem, em
A grande reconstrução 64 um processo contínuo de criação e destruição. Os conti-
Convecção do manto: o mecanismo nentes, encravados na litosfera, migram junto com as pla-
cas em movimento. A teoria da tectônica de placas des-
motor da tectônica de placas 68 creve o movimento das placas e as forças atuantes entre
A teoria da tectônica de placas e o elas. Explica também a distribuição de muitas feições
método científico 71 geológicas de grandes proporções que resultam do movi-
mento ao longo dos limites de placa, como: cadeias de
montanhas, associações de rochas, estruturas no fundo do
mar, vulcões e terremotos. A tectônica de placas fornece
uma base conceitual para grande parte deste livro e, na verdade, também da Geologia.
Este capítulo apresentará a teoria da tectônica de placas e examinará como as for-
ças que controlam o movimento das placas estão relacionadas com o sistema de
convecção do manto.

Ii-~~~;-'
J~~escoberta da tectônica de placas
Na década de 1960, uma grande revolução no pensamento sacudiu o mundo da Geo-
logia. Por quase 200 anos, os geólogos desenvolveram diversas teorias tectônicas (do
grego tekton, "construtor") - o termo geral que eles usaram para descrever a formação
de montanhas, o vulcanismo e outros processos que formam feições geológicas na su-
perfície da Terra. No entanto, até a descoberta da tectônica de placas, nenhuma teoria
conseguia, isoladamente, explicar de modo satisfatório toda a variedade de processos
geológicos. A tectônica de placas não é apenas abrangente, mas também elegante:
muitas observações podem ser explicadas por alguns poucos princípios simples. Na
história da ciência, as teorias simples que explicam muitas observações geralmente se
48 Para Entender a Terra

mostram mais duradouras. A Física teve uma revolução compa-


rá\"el no início do século XX, quando a teoria da relatividade
unificou as leis físicas que governam o espaço, o tempo, a mas-
sa e o movimento. A Biologia também teve uma revolução
comparável na metade do mesmo século, quando a descoberta
do DNA permitiu aos biólogos explicar como os organismos
transmitem as informações que controlam seu crescimento, de-
senvolvimento e funcionamento de geração a geração.
As idéias básicas da tectônica de placas foram reunidas
como uma teoria unificada da Geologia há menos de 40 anos.
A síntese científica que conduziu a essa teoria, no entanto, co-
meçou muito antes, ainda no século XX, com o reconheci-
mento das evidências da deriva continental.

A deriva continental
Tais mudanças nas partes superficiais do globo pareciam, para
mim, improváveis de acontecer se a Terrafosse sólida até o centro.
Desse modo, imaginei que as partes internas poderiam ser um
fluido mais denso e de densidade específica maior que qualquer
outro sólido que conhecemos, que assim poderia nadar no ou sobre
aquele fluido. Desse modo, a superfície da Terra seria uma casca
capaz de ser quebrada e desordenada pelos movimentos violentos
do fluido sobre o qual repousa.
(Benjamin Frank:lin, 1782, em uma carta para o
ge61ogo Francês Abbé 1. L. Giraud-Soulavie)

o conceito de deriva continental - movimentos de gran-


de proporção sobre o globo - existe há muito tempo. No final
do século XVI e no século XVII, cientistas europeus notaram
o encaixe do quebra-cabeça das linhas costeiras em ambos os
lados do Atlântico, como se as Américas, a Europa e li África
tivessem estado juntas em uma determinada época e, depois,
se afastado por deriva. Ao final do século XIX, o geólogo aus-
Figura 2.1 Os encaixes do quebra-cabeça dos continentes que
tríaco Eduard Suess encaixou algumas das peças do quebra- bordejam o Oceano Atlântico construídos com base na teoria da
cabeça e postulou que o conjunto dos continentes meridionais
deriva continental de Alfred Wegener. Em seu livro The Origin of
atuais formara, certa vez, um único continente gigante, cha- Continents and Oceans, Wegener citou como evidência adicional a
mado Terra de Gondwana (ou Gondwana). Em 1915, Alfred similaridade de feições geológicas nos lados opostos do
Wegener, um meteorologista alemão que estava se recuperan- Atlântico. O encaixe de rochas cristalinas muito antigas é
do de ferimentos sofridos na Primeira Guerra Mundial, escre- mostrado em regiões adjacentes da América do Sul e da África, e
veu um livro sobre a fragmentação e deriva dos continentes. da América do Norte e da Europa. [Encaixe geográfico a partir
Nele, apresentou as similaridades marcantes entre as rochas, dos dados de E. C. Bullard; dados geológicos de P.M. Hurley]
as estruturas geológicas e os fósseis dos lados opostos do
Atlântico. Nos anos seguintes, Wegener postulou um super-
continente, que denominou de PangéiaI (do grego "todas as
terras"), que se fragmentou nos continentes como os conhece- Os defensores da hipótese da deriva mostraram não apenas
mos hoje (Figura 2.1). o encaixe geográfico, mas também as similaridades geológicas
Embora Wegener estivesse correto em afirmar que os conti- das idades das rochas e das orientações das estruturas geológi-
nentes tinham se afastado por deriva, sua hipótese acerca de cas nos lados opostos do Atlântico (ver Figura 2.1). Eles tam-
quão rápido eles se moviam e quais forças os empurravam na bém apresentaram argumentos, aceitos até hoje como boas evi-
uperfície terrestre mostrou-se errônea, o que reduziu sua cre- dências da deriva, baseados em fósseis e dados climatológicos.
dibilidade entre outros cientistas. Após cerca de uma década de Fósseis idênticos a um réptil de 300 milhões de anos, por exem-
\"igoroso debate, os físicos convenceram os geólogos de que as plo, foram encontrados apenas na África e na América do Sul,
amadas externas da Terra eram muito rígidas para que a deri- sugerindo que os dois continentes estavam juntos naquele tem-
\-a continental ocorresse, o que fez com que e as idéias de We- po (Figura 2.2). Os animais e as plantas dos diferentes conti-
gener caíssem em descrédito, exceto entre uns poucos geólogos nentes mostraram similaridades na evolução até o tempo postu-
na Europa, na África do Sul e na Austrália. lado para a fragmentação. Após isso, seguiram caminhos evolu-
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

\
ÁFRICA
~~~
) AMÉRICA~
L DO SUL Fósseis de Mesosaurus
foram encontrados
na América do Sul e
na África.

Figura 2.2 Fósseis do réptil Mesosaurus, com idade de 300 milhões de anos, foram
encontrados apenas na América do Sul e na África. Se o Mesosaurus pudesse atravessar o
Oceano Atlântico Sul nadando, ele poderia ter cruzado outros oceanos e se espalhado
mais amplamente. O fato de ele não ter se espalhado sugere que a América do Sul e a
África estavam conectadas naquele tempo. [Fonte: A. Hallam, "Continental Drift and the
Fossil Record", Seientifie American (November 1972): 57 -66]

à\'os divergentes, presumivelmente devido ao isolamento e às Holmes admitiu que "idéias puramente especulativas desse ti-
mudanças ambientais das massas continentais em separação. po, especialmente inventadas para atender certas postulações,
Além disso, depósitos associados com geleiras que existiam há podem não ter valor científico até que adquiram o suporte de
.::ercade 300 milhões de anos estão agora distribuídos na Amé- evidências independentes" .
;:i a do Sul, na África, na Índia e na Austrália. Se os continentes As evidências convincentes começaram a emergir como um
tlleridionais fossem reunidos para formar a Terra de Gondwana resultado da intensa exploração do fundo oceânico ocorrida após
?Ióximo ao Pólo Sul, uma única geleira poderia explicar todos a Segunda Guerra Mundial. O mapeamento da Dorsal3 Mesoa-
- depósitos glaciais. tlântica submarina e a descoberta do vale profundo na forma de
fenda, ou rifte,4 estendendo-se ao longo de seu centro, desperta-
ram muitas especulações (Figura 2.3). Os geólogos descobriram
Expansão do assoa lho oceânico2
que quase todos os terremotos no Oceano Atlântico ocorreram
.-\ evidência geológica não convenceu os céticos, os quais man- próximos a esse vale em rifte. Uma vez que a maioria dos terre-
jyeram que a deriva continental era fisicamente impossível. motos é gerada por falhamento tectônico, esses resultados indi-
_-inguém havia proposto, ainda, uma força motora plausível caram que o rifte era uma feição tectonicamente ativa. Outras
ue pudesse ter fragmentado a Pangéia e separado os continen- dorsais mesoceânicas5 com formas e atividade sísmica similares
:es. Wegener, por exemplo, pensava que os continentes flutua- foram encontradas nos oceanos Pacífico e Índico.
\'am como barcos sobre a crosta oceânica sólida, arrastados pe- No início da década de 1960, Harry Hess, da Universidade
forças das marés, do sol e da lua! de Princeton, e Robert Dietz, da Instituição Scripps de Oceano-
A ruptura veio quando os cientistas deram-se conta de que grafia,6 propuseram que a crosta separa-se ao longo de riftes
a convecção do manto da Terra (discutida no Capítulo 1) pode- nas dorsais mesoceânicas e que o novo fundo oceânico forma-
ria empurrar e puxar os continentes à parte, formando uma no- se pela ascensão de uma nova crosta quente nessas fraturas. O
ya crosta oceânica, por meio do processo de expansão do as- novo assoalho oceânico - na verdade, o topo da nova litosfera
oalho oceânico. Em 1928, o geólogo britânico Arthur Holmes criada - expande-se lateralmente a partir do rifte e é substituí-
~ teve perto de expressar as noções modernas da deriva conti- do por uma crosta ainda mais nova, num processo contínuo de
ental e da expansão do assoalho oceânico, quando propôs que formação de placa.
correntes de convecção "arrastaram as duas metades do con-
tinente original à parte, com conseqüente formação de monta-
nhas na borda onde as correntes estão descendo e desenvolvi- A grande síntese: 1963 - 1968
mento de assoalho oceânico no lugar da abertura, onde as cor- A hipótese de expansão do assoalho oceânico apresentada por
~ntes estão ascendendo". Considerando os argumentos dos fí- Hess e Dietz em 1962 explicou como os continentes poderiam
si os de que a crosta e o manto da Terra são rígidos e imóveis, separar-se por meio da criação de uma nova litosfera em riftes
(
5 O Para Entender a Terra

.,

AMÉRICA DO NORTE' , '.'

'. ÁFRICA

Figura 2.3 O assoa lho oceânico do Atlântico Norte, mostrando os vales em rifte em forma
de fendas ao longo do centro da Dorsal Mesoatlântica e os terremotos associados (pontos
pretos).

mesoceânicos. Poderiam o assoalho oceânico e sua litosfera caracterizou os três tipos básicos de limites onde as placas se-
subjacente ser destruídos e reciclados, retomando ao interior da param-se, aproximam-se ou deslizam lateralmente uma em re-
Terra? Do contrário, a área da superfície terrestre deveria ter lação à outra. Em uma rápida sucessão de descobertas e avan-
aumentado ao longo do tempo, de modo que nosso planeta de- ços teóricos, outros cientistas mostraram que quase todas as de-
veria ter ficado cada vez maior. Por certo tempo, no início da formações tectônÍcas atuais estão concentradas nesses limites.
década de 1960, alguns físicos e geólogos realmente acredita- Eles mediram as taxas e direções dos movimentos tectônicos e
ram nessa idéia de uma Terra em expansão, baseados em uma demonstraram que os mesmos eram matematicamente consis-
modificação atualmente desacreditada da teoria da gravitação tentes com o sistema de placas rígidas movendo-se na superfí-
de Einstein. Outros geólogos reconheceram que o assoalho cie esférica do planeta. Os elementos básicos da teoria da tectô-
oceânico estava na verdade sendo reciclado nas regiões de in- nÍca de placas foram estabelecidos ao final de 1968. Por volta
tensa atividade vulcânica e sísmica ao longo das margens da de 1970, as evidências da tectônÍca de placas tornaram-se tão
bacia do Oceano Pacífico, conhecidas coletivamente como Cír- persuasivas, devido a sua abundância, que quase todos os geo-
culo de Fogo (Figura 2.4). Os detalhes desse processo, todavia, cientistas adotaram-na. Os livros-texto foram revisados e
permaneceram obscuros. muitos especialistas começaram a considerar as implicações do
Em 1965, o geólogo canadense 1. Tuzo Wilson descreveu, novo conceito em seus campos de atuação. Para uma seqüência
pela primeira vez, a tectônica em torno do globo em termos de de eventos marcantes que conduziram à teoria da tectônica de
"placas" rígidas movendo-se sobre a superfície terrestre. Ele placas, consulte o Apêndice 3.
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

Figura 2.4 O Círculo de Fogo do


Pacífico, mostrando os vulcões ativos
(círculos vermelhos grandes) e
terremotos (círculos pretos pequenos).

'\
ções geológicas desenvolvem-se por meio da interação das pla-
\,',osaico de placas cas em seus limites. Os três tipos básicos de limites de placas
são mostrados na Figura 2.5 e discutidos nas próximas páginas.
De acordo com a teoria da tectônica de placas, a litosfera rígida
não é uma capa contínua, mas está fragmentada em um mosai- • Em limites divergentes, as placas afastam-se e uma nova litos-
co de cerca de uma dúzia de grandes placas rígidas que estão fera é criada (a área da placa aumenta).
em movimento sobre a superfície terrestre. Cada placa move-se
• Em limites convergentes, as placas juntam-se e uma delas é re-
como uma unidade rígida distinta, cavalgando sobre a astenos- ciclada, retomando ao manto (a área da placa diminui).
fera, que também está em movimento. As placas maiores e seus
movimentos atuais estão representados na Figura 2.5. A maior • Em limites transformantes, as placas deslizam horizontalmen-
é a Placa Pacífica,7 que compreende a maior parte da bacia do te uma em relação à outra (a área da placa permanece constante).
Oceano Pacífico. Algumas das placas recebem o nome dos con-
Como em muitos modelos da natureza, os três tipos de pla-
tinentes que elas contêm, porém, em nenhum caso uma placa é
cas mostrados na Figura 2.5 são idealizados. Além desses três ti-
idêntica a um continente. A Placa Norte-Americana, por exem-
pos básicos, existem "limites oblíquos" que combinam diver-
plo, estende-se desde a costa oeste da América do Norte até o
gência ou convergência com alguma quantidade de falhamento
meio do Oceano Atlântico, onde se limita com as Placas Eura-
transforrnante. Ainda, o que de fato acontece num limite de pla-
siana e Africana.
ca depende do tipo de litosfera envolvida, porque as litosferas
Além das placas maiores, existe uma série de outras meno- oceânica e continental comportam-se de modo um tanto diferen-
res. Um exemplo é a minúscula Placa de Juan de Fuca, um pe- te. A crosta continental é formada de rochas que são mais leves
daço da litosfera oceânica aprisionado entre as gigantes placas e menos resistentes que a crosta oceânica ou o manto abaixo da
Pacífica e Norte-Americana, na costa noroeste dos Estados crosta. Os capítulos posteriores irão examinar essa diferença
linidos. Outras são fragmentos continentais, como a pequena composicional em mais detalhe, mas, por enquanto, você neces-
Placa Anatoliana, que inclui a maior parte da Turquia. (Nem to- sita apenas ter em mente duas conseqüências: (1) por ser mais
das as placas pequenas são mostradas na Figura 2.5.) leve, a crosta continental não é tão facilmente reciclada como a
Se você quer ver a geologia em ação, visite um limite de crosta oceânica; (2) como a crosta continental é menos resisten-
placa. Dependendo de qual você for ver, encontrará téh'emotos, te, os limites de placa que a envolvem tendem a ser mais espa-
\l1lcões, montanhas, riftes estreitos e longos, etc. Muitas fei- lhados e complicados que os limites das placas oceânicas.
~ Para Entender a Terra

A L1TOSFERA DA TERRA É FEITA DE PLACAS QUE SE MOVEM

20' 40' 60' 80' 100'


)
120' 140' 160' 180' 160' 140'

60'

40'

20'

O'

20'

40'

60'

140'

Em limites de falhas transformantes, Em limites divergentes, as Em limites convergentes, as


as placas deslocam-se horizontalmente placas afastam-se e formam placas colidem e uma delas é
uma em relação à outra. uma nova litosfera. puxada para o manto e reciclada.
CAPíTULO 2 • Tedônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

20"

O"

20"

40"

60"

140" 120" 100" 80" 60" 40" 20" O"

Figura 2.5 A configuração do mosaico atual e dos tipos de limites de placas. Esta vista
cartográfica da Terra e do relevo do fundo do mar mostra os três tipos básicos de limites
de placas: limites divergentes, onde as placas separam-se (~~); limites convergentes,
onde as placas aproximam-se (~~); e limites de falhas transformantes, onde as placas
deslizam uma em relação à outra (~~). As setas mostram em quais direções as placas
estão se movendo em relação às outras e aos seus limites comuns. Os números próximos
a elas indicam as velocidades relativas das placas em mm/ano. [Limite de placas por Peter
Bird, UCLA]
54 ?ara Entender a Terra

'mites divergentes ceânica que exibe vulcanismo ativo, terremotos e rifteamento


0- limites divergentes dentro das bacias oceânicas são riftes es- causados por forças extensionais (estiramento) que estão pu-
xando as duas placas à parte. A Figura 2.6a mostra o que acon-
eito que se aproximam da idealização da tectônica de placas.
tece em um exemplo, a Dorsal Mesoatlântica. Aqui a expansão
_-\diyergência dentro dos continentes geralmente é mais com-
pli ada e distribuída sobre uma área mais larga. Essa diferença do assoalho oceânico está ocorrendo à medida que as placa
é ilustrada na Figura 2.6. Norte-Americana e Eurasiana separam-se e o novo assoalho
oceânico do Atlântico é criado por ascensão do manto. (Um re-
Separação de placas nos oceanos No fundo do mar, o limite trato mais detalhado da Dorsal Mesoatlântica foi mostrado na
entre as placas em separação é marcado por uma dorsal meso- Figura 2.3.) A ilha da Islândia expõe um segmento da Dorsal

o rifteamento e a expansão ao longo de uma


zona estreita criaram a Dorsal Mesoatlãntica,
uma cadeia de montanhas mesoceânicas onde
vulcões e terremotos estão concentrados.

(a)

~ Dorsal Mesoatlântica
y

,l(

No leste da África, um estágio inicial de


rifteamento criou vales paralelos em uma
zona com vulcões e terremotos.

(b)

,l(

Figura 2.6 (a) O rifteamento e a expansão do assoalho oceãnico na Dorsal Mesoatlântica criam uma
cadeia de montanhas vulcanogênicas onde falhamento, terremotos e vulcanismo estão concentrados
ao longo de um estreito centro de expansão mesoceãnico. (b) Estágios iniciais do rifteamento e
separação das placas, agora ocorrendo no leste da África, onde vales em rifte múltiplos e seu
vulcanismo, falhamento e terremotos associados estão distribuídos sobre uma zona mais larga.
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

que o novo assoalho oceânico pudesse ser formado ao longo do


eixo de expansão e os vales em rifte fossem inundados pelo
oceano. Algumas vezes, o fendimento continental pode tomar-
se mais lento ou parar antes de haver a separação do continente
e a abertura de urna nova bacia oceânica. O Vale do Reno, ao
longo da fronteira da Alemanha e da França, é um rifte conti-
nental fracamente ativo que pode ser esse tipo de "centro de ex-
pansão que fracassou". Será que o rifte do Leste Africano vai
continuar a abrir-se, levando a Subplaca Somaliana a separar-se
completamente da África e formar uma nova bacia oceânica,
como aconteceu entre a África e a ilha de Madagascar, ou irá o
espalhamento tornar-se mais lento e finalmente parar, como pa-
rece estar acontecendo no Oeste da Europa? Os geólogos ainda
não conhecem as respostas.

Limites convergentes
As placas cobrem todo o globo, de modo que, se elas se sepa-
ram em certo lugar, deverão convergir em outro, conservando,
assim, a área da superfície terrestre. (Tanto quanto podemos di-
zer, nosso planeta não está se expandindo!) Onde as placas co-
lidem frontalmente, elas fonDam limites convergentes. A profu-
são de eventos geológicos resultantes da colisão de placas tor-
na os limites convergentes os mais complexos observados na
tectônica de placas.

Convergência oceano-oceano Se as duas placas envolvidas


são oceânicas, uma desce abaixo da outra em um processo co-
nhecido como subducção8 (Figura 2.9a). A litosfera oceânica
da placa que está em subducção afunda na astenosfera e é por
fim reciclada pelo sistema de convecção do manto. Esse encur-
vamento para baixo produz uma longa e estreita fossa de mar
Figura 2.7 A Dorsal Mesoatlântica, um limite de placa profundo. Na Fossa das Marianas, no Oeste do Pacífico, o
divergente, aflora acima do nível do mar na Islândia. O vale em oceano atinge sua maior profundidade, de cerca de 10 km -
rifte com forma de fratura preenchido com rochas vulcânicas mais que a altura do Monte Everest. À medida que a placa litos-
novas indica que as placas estão sendo afastadas. (Gudmundur E. férica fria desce, a pressão aumenta; a água aprisionada nas ro-
Sigvaldason, Nordic Volcanologicallnstitute 1
chas da crosta oceânica subduzida é "espremida" e ascende à
astenosfera acima da placa. Esse fluido causa fusão do manto,
produzindo uma cadeia de vulcões, denominada arco de ilhas,9
no fundo oceânico atrás da fossa. A subducção da Placa Pacífi-
YIesoatlântica, que em outras circunstâncias está submersa, for- ca formou as Ilhas Aleutas, a oeste do Alasca, que são vulcani-
camente ativas, bem como os arcos de ilhas abundantes no Oes-
necendo aos geólogos uma oportunidade de observar direta-
mente o processo de separação de placas e expansão do fundo te do Pacífico. Os tenemotos que podem ocorrer em profundi-
oceânico (Figura 2.7). A Dorsal Mesoatlântica é discernÍvel no dades que chegam a até 600 km abaixo desses arcos de ilhas de-
Oceano Ártico, ao norte da Islândia, e conecta-se a um sistema lineiam as placas frias da litosfera à medida que elas se afun-
dam no manto.
de dorsais mesoceânicas que quase circunda o globo e serpen-
leia através dos oceanos Índico e Pacífico, terminando ao longo
Convergência oceano-continente Se uma placa tem uma
da costa oeste da América do Norte. Esses centros de expan-
borda continental, ela cavalga a placa oceânica, porque a cros-
são originaram os milhões de quilômetros quadrados de crosta
ta continental é mais leve e subduz mais dificilmente que a
oceânica que são atualmente o assoalho de todos oceanos.
crosta oceânica (Figura 2.9b). A borda continental fica enru-
Separação de placas nos continentes Os estágios iniciais da gada e é soerguida num cinturão de montanhas aproximada-
eparação de placas, como o grande vale em rifte do Leste mente paralelo à fossa de mar profundo. As enormes forças de
.Uricano (Figura 2.6b), podem ser encontrados em alguns con- colisão e subducção produzem grandes terremotos ao longo
tinentes. Esses limites divergentes são caracterizados por vales da interface de subducção. Ao longo do tempo, materiais são
em rifte, atividade vulcânica e terremotos distribuídos sobre raspados da placa descendente e incorporados nas montanhas
uma zona mais larga que a dos centros de expansão oceânicos. adjacentes, deixando aos geólogos um complexo (e freqüen-
O Mar Vermelho e o Golfo da Califórnia são riftes que se en- temente confuso) registro do processo de subducção. Como
ontram num estágio mais avançado de expansão (Figura 2.8). no caso da convergência oceano-oceano, a água carregada pa-
_ esses casos, os continentes já se separaram o suficiente para ra baixo pela placa oceânica mergulhante causa a fusão da cu-
56 Para Entender a Terra

(a)

Figura 2.8 (a) O Mar Vermelho (direita, abaixo) divide-se para Mediterrâneo (topo). [Earth Satellite Corporation] (b) O Golfo da
formar o Golfo de Suez, à esquerda, e o Golfo de 'Aqaba, 10 à Califórnia, um oceano em processo de abertura resultante do
direita. A Península Arábica, à direita, ao separar-se da África, à movimento da placa, marca um rifte que está sendo alargado
esquerda, abriu esses grandes riftes, que agora foram inundados entre a Baixa Califórnia e o México. [Worldsat
pelo mar. O Rio Nilo (extrema esquerda) flui para o norte no Mar International/Photo Researchers]

nha do manto e a formação de vulcões nos cinturões de mon- gicas desse tipo de colisão são consideráveis. A colisão das pla-
tanhas atrás da fossa. cas Indiana e Eurasiana, ambas com continentes em sua borda
A costa oeste da América do Sul, onde a Placa Sul-Ameri- frontal, fornece o melhor exemplo. A Placa Eurasiana cavalga a
cana colide com a Placa de Nazca, de natureza oceânica, é uma Placa Indiana, mas a Índia e a Ásia mantêm-se flutuantes,
zona de subducção desse tipo. Uma grande cadeia de altas criando uma espessura dupla da crosta e formando a cordilhei-
montanhas, os Andes, eleva-se no lado continental do limite co- ra de montanhas mais alta do mundo, o Himalaia, bem como o
lidente e uma fossa de mar profundo situa-se próximo à costa. vasto e alto Planalto do Tibete. Nessa e em outras zonas de co-
Os vulcões aqui são ativos e mortais. Um deles, o Nevado deI lisão continente-continente, ocorrem terremotos violentos na
Ruiz, na Colômbia, matou 25 mil pessoas por ocasião de uma crosta que está sofrendo enrugamento.
erupção em 1985. Alguns dos maiores terremotos do mundo
também foram registrados ao longo desse limite. Outro exem- Limites de falhas transformantes
plo ocorre onde a pequena Placa de Juan de Fuca está subdu-
zindo a Placa Norte-Americana ao longo da costa oeste da Em limites onde as placas deslizam uma em relação à outra, a
litosfera não é nem criada nem destruída. Esses limites são fa-
América do orte. Esse limite convergente deu origem aos pe-
lhas transformantes: fraturas ao longo das quais ocorre um
rigo o vulcões da Cadeia Casca~e, II que produziu a erupção
de 1980 do Monte Santa Helena. A medida que cresce o enten- deslocamento relativo à medida que o deslizamento horizontal
dimento da zona de subducção de Cascadia, os cientistas tor- acontece entre blocos adjacentes. Os limites de falhas transfor-
nam-se mais preocupados com a possibilidade de ocorrência de mantes são tipicamente encontrados ao longo de dorsais meso-
um grande terremoto nessa região, o que causaria dano consi- ceânicas, onde o limite divergente tem sua continuidade que-
derável ao longo das costas dos estados de Oregon, Washington brada, sendo deslocado num padrão semelhante a um escalona-
e Colúmbia Britânica. mento. A Falha de Santo André na Califórnia, onde a Placa Pa-
cífica desliza em relação à Placa Norte-Americana, é um ótimo
Convergência continente-continente Onde a convergência exemplo de uma falha transformante em continente, como mos-
de placas envolve dois continentes (Figura 2.9c), a subducção trado na Figura 2.10. Pelo fato de as placas terem se deslocado
do tipo oceânica não pode acontecer. As conseqüências geoló- umas em relação às outras durante milhões de anos, as rochas
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

uando duas placas oceânicas convergem,


<ormam uma fossa de mar profundo
e um arco de ilhas vulcânico. Ilhas Japonesas

-i..;r•.::
j';>"'"",4~ / . (arco de i1:a~

,.;~. -. ~/ Fossa do Japâo


'!Í

Quando uma placa oceânica encontra uma placa continental,


a placa oceânica entra em subducçâo e um cinturâo de monta- Cordilheira dos Andes
nhas vulcânico é formado na margem da placa continental.

Quando duas placas continentais colidem, a


crosta é amassada e espessada, formando
altas montanhas e um amplo planalto.

c)

tgUra 2.9 Três tipos de limites convergentes. (a) Subducção de uma placa oceânica
- outra placa oceânica, formando uma fossa profunda e um arco de ilha vulcãnico. (b)
=_3ducção de uma placa oceãnica em uma margem continental, formando um cinturão de
tanhas vulcãnico na margem deformada do continente em vez de um arco de ilha. (c)
a colisão de placa continente-continente, que amassa e espessa a crosta continental,
I ando altas montanhas e um amplo planalto.
58 Para Entender a Terra

o À medida que as placas


Pacífica e Norte-Americana
movem-se uma em relação à
outra em direções opostas ...

o ... o canal de um riacho que


atravessa a falha vai sendo
deslocado.

Figura 2.10 Uma vista para o noroeste ao longo da Falha de deslizante entre a Placa Pacífica, à esquerda, e a Placa Norte-
Santo André na Planície de Carrizo, na Califórnia Central. Santo Americana, à direita. Note como o movimento da falha deslocou os
André é uma falha transformante, formando uma parte do limite canais dos riachos que correm ao longo da mesma. [John SheltonJ

it

contíguas nos dois lados da falha são de tipos e idades diferen- I'
teso Grandes terremotos, como o que destruiu a cidade de San
. ;\1 cidade das placas e história
Francisco em 1906, podem ocorrer nos limites de placas trans- , s movimentos
formantes. Existe muita preocupação de que um repentino des-
locamento possa ocorrer ao longo da falha de Santo André ou Quão rápido as placas se movem? Algumas movem-se mais rá-
de outras falhas relacionadas próximas a Los Angeles e San pido que outras, por quê? As velocidades atuais dos movimen-
Francisco dentro de, aproximadamente, 25 anos, resultando tos das placas são as mesmas que no passado geológico? Os
num terremoto extremamente destrutivo. geólogos têm desenvolvido métodos engenhosos para respon-
As falhas transformantes também podem conectar limites der essas questões e, desse modo, entender melhor a tectônica
de placas. Nesta seção, examinaremos três desses métodos.
de placas divergentes com limites convergentes e limites con-
vergentes com outros limites convergentes. Você poderia en-
contrar outros exemplos de tipos de limites de falhas transfor- o
fundo oceânico como um
mantes na Figura 2.5?
gravador magnético
Durante a Segunda Guerra Mundial, foram desenvolvidos ins-
Combinação de limites de placas trumentos extremamente sensíveis para detectar submarinos a
Cada placa é limitada por uma combinação de limites transfor- partir dos campos magnéticos emanados por suas couraças de
mantes, convergentes e divergentes. Como pode ser observado aço. Os geólogos modificaram ligeiramente esses instrumentos
e rebocaram-nos atrás de navios de pesquisas para medir o
na Figura 2.5, a Placa de Nazca, no Pacífico, tem três lados li-
campo magnético local criado por rochas magnetizadas no fun-
mitados por zonas divergentes, onde uma nova litosfera é ge-
do do mar. Cruzando os oceanos repetidas vezes, os cientistas
rada ao longo de segmentos da dorsal mesoceânica, os quais
marinhos descobriram supreendentes padrões regulares na in-
são deslocados segundo um padrão escalo nado pelas falhas
tensidade do campo magnético local. Em muitas áreas, o cam-
transformantes. O outro lado é limitado pela zona de subduc- po magnético alternava entre valores altos e baixos dispostos
ção do Peru-Chile, onde a litosfera é consumida numa fossa em bandas longas e estreitas chamadas de anomalias magnéti-
oceânica profunda. A Placa Norte-Americana é limitada a les- cas, que eram paralelas e quase perfeitamente simétricas à cris-
te pela Dorsal Mesoatlântica, que é uma zona de divergência; ta da dorsal mesoceânica. Um exemplo é mostrado na Figura
a oeste. pela falha de Santo André e outros limites transfor- panorâmica 2.11. A detecção desses padrões foi uma dentre as
mantes; e, a noroeste, por zonas de subducção e limites trans- grandes descobertas que confirmaram a expansão do assoalho
formantes que se estendem desde o estado de Oregon (EUA) oceânico e levaram à teoria da tectônica de placas. A detecção
até a Cadeia das Aleutas. desses padrões também permitiu aos geólogos medir os movi-

Figura panorâmica 2.11 Um levantamento oceanográfico termos de duas teorias: (1) de que o campo magnético da Terra
sobre a Cadeia de Reykjanes, parte da Dorsal Mesoatlântica, a reverte a sua direção em intervalos de dezenas a milhares de
sudoeste da Islândia, mostrou um padrão de campos de anos, e (2) de que a expansão do assoa lho oceânico move
anomalias magnéticas (direita, acima). Esta figura ilustra como gradualmente a crosta recentemente magnetizada para longe da
os cientistas descobriram a explicação para esse padrão em crista da dorsal.
CAPíTULO 2 • Tedônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

o MAPEAMENTO MAGNÉTICO PODE MEDIR A TAXA DE EXPANSÃO DO ASSOALHO OCEÃNICO

Um navio rebocando um
sensível magnetõmetro
registrou as anomalias
magnéticas ...

As bandas mostraram-se

--- aproximadamente simétricas


ambos os lados da Dorsal
Mesoatlântica. Mas qual é o
em

significado dessas anomalias?


Os vulcões forneceriam uma dica.

Os cientistas, estudando lavas O campo magnético ter- As camadas "lembram" o campo


vulcânicas, também observaram restre reverte sua dire- magnético (magnetizaçâo
anomalias magnéticas. çâo em intervalos de de- termorremanescente ).
zenas a milhares de anos.
Quando a lava rica em ferro
resfria-se, torna-se As camadas mais antigas (mais profundas)
preservam a direçâo do campo magné-
magnetizada de acordo com
tico na época do resfriamento: um re-
a direçâo do campo
gistro magnético congelado no tempo.
magnético da Terra.

Os cientistas concluíram que as camadas


de lava eram o registro do campo
magnético da Terra congelado no tempo.

5,0 Ma Presente
Dorsal mesoceânica

Milhões de \
y
Época reversa Época normal Época reversa Época normal
de Gilbert de Gauss de Matuyama de Brunhes
~
I A partir de muitos registros As épocas magnéticas sâo
desses eventos em lavas, as grandes períodos de cerca de
reversões magnéticas podem ser meio milhão de anos, mas
determinadas de modo a criar-se podem ser interrompidas por
uma linha de tempo magnético. eventos reversos curtos.

___ 2,0
Dados de tempo magnético obtidos a partir de derrames
de lavas foram usados para datar anomalias magnéticas
do assoa lho oceânico.

Os cientistas concluíram que as bandas de anomalias


no fundo marinho eram um registro da expansâo do ~ 2,5
, 3',3
assoa lho oceânico, que age como um gravador. oceânica atual 1

2,5
O cálculo da velocidade de expansão do assoa lho
oceânico pode ser feito (velocidade = distância/tempo).
~= =-~- er 2 Tem

- Ia as ao longo do tempo geológico. Para entender mal e reverso. Ou seja, quando o navio de pesquisa estivesse so-
,0-. pre isamos olhar mais detidamente como as ro- bre rochas magnetizadas na direção normal, ele registraria um
::-----w;:nam- magnetizadas. campo magnético localmente mais forte, ou uma anomalia
magnética positiva, e quando estivesse sobre rochas magnetiza-
o registro rochoso das reversões magnéticas da Terra Há das na direção reversa, registraria um campo localmente mais
'":: -e -!DO anos. os cientistas sabem que uma agulha de uma fraco, ou uma anomalia magnética negativa .
. , --ola aponta para o pólo magnético norte (próximo ao Pólo Essa idéia forneceu um poderoso teste para a hipótese da
_-one geográfico) devido ao campo magnético da Terra. Imagi- expansão do assoalho oceânico, que postula que o fundo sub-
;}~m quão estupefatos eles ficaram há poucas décadas quando marino novo é formado ao longo dos riftes de uma crista da
en ontraram evidências no registro geológico de que, ao longo
dorsal mesoceânica, à medida que as placas se separam (ver Fi-
do tempo, o campo magnético freqüentemente se reverte - ou gura panorâmica 2.11). O magma fluindo do interior solidifica-
eja. troca o pólo magnético norte pelo pólo magnético sul. Du-
se nas fraturas e toma-se magnetizado na direção do campo
rante cerca de metade do tempo geológico, a agulha de uma
magnético terrestre da época. À medida que o assoalho oceâni-
bússola apontaria para o sul!
co separa-se e afasta-se da crista, aproximadamente metade do
o início da década de 1960, os geólogos descobriram que o material magnetizado num certo momento move-se para um la-
registro preciso desse comportamento peculiar pode ser obtido a do, e metade para o outro, formando duas bandas magnetizadas
panir de derrames acamados de lava vulcânica. Quando lavas ri- simétricas. Um novo material preenche as fraturas, continuan-
cas em ferro resfriam-se em presença do campo magnético ter- do o processo. Desse modo, o assoalho submarino funciona co-
restre, tomam-se levemente magnetizadas segundo a direção
mo um gravador que codifica a história de abertura dos oceanos
desse campo. Tal fenômeno é chamado de magnetização termor-
por meio da impressão magnética das reversões do can1po mag-
remanescente, porque a rocha "recorda-se" da magnetização nético da Terra.
muito depois de o campo magnetizador existente ao tempo de
Passados alguns anos, os cientistas marinhos foram capazes
sua formação ter sido mudado. (Como as rochas tomam-se mag-
de mostrar que esse modelo fornecia uma explicação consisten-
netizadas será discutido mais detalhadamente no Capítulo 21.)
te para os padrões simétricos das anomalias magnéticas do as-
Em derrames de lávas acamados, cada camada de rocha do soalho oceânico encontrados nas dorsais mesoceânicas em to-
rapo para a base da seqüência representa um período de tempo
do o mundo. Além disso, esse modelo forneceu-lhes uma ferra-
geológico mais antigo, e a idade de cada camada pode ser deter-
minada por métodos de datação precisa (descritos no Capítulo menta precisa para medir as taxas de expansão do assoalho
oceânico atuais e do passado geológico. Essa evidência contri-
10). As medições da magnetização termorremanescente de
amostras de rocha de cada camada fornecem a direção do cam- buiu substancialmente para a descoberta e a confirmação da
tectônica de placas.
po magnético terrestre nelas congelada quando de seu res-
friamento (ver Figura panorâmica 2.11). Por meio da repetição Inferindo as idades do fnndo oceânico e as velocidades rela·
dessas medidas vários de lugares no mundo, os geólogos des-
tivas das placas Por meio do uso das idades das reversões que
vendaram a história detalhada das reversões magnéticas ao lon-
foram determinadas a partir de lavas magnetizadas nos conti-
go do tempo geológico. A escala de tempo magnético dos últi-
nentes, os geólogos puderam indicar idades para as bandas de
mos 5 milhões de anos é apresentada na Figura panorâmica 2.11. rochas magnetizadas no fundo oceânico. Eles puderam calcu-
Cerca de metade de todas as rochas estudadas mostrou-se
lar, então, quão rápido os oceanos se abriram, usando a fórmu-
magnetizada numa direção oposta ao campo magnético terrestre la velocidade = distância/tempo, sendo que a distância foi me-
atual. Aparentemente, o campo inverteu-se muitas vezes no tem-
dida a partir do eixo da dorsal e o tempo, igualado à idade do
po geológico, e campos nOlmais (os mesmos de agora) e reversos fundo oceânico. Por exemplo: o padrão de anomalia magnética
(opostos ao de agora) são igualmente prováveis. Os períodos
da Figura panorâmica 2.11 mostrou que o limite entre a época
mais longos do campo normal ou reverso são chamados de épo- nOlmal de Gauss e a época reversa de Gilbert, que foram data-
cas maonéticas; elas parecem durar cerca de meio milhão de
das a partir de derrames de lavas em 3,3 milhões de anos, esta-
anos. embora o padrão de reversão, quando retrocedemos no
va localizado a cerca de 30 km da crista da Cadeia de Reykja-
tempo geológico, tome-se altamente irregular. Superpostas às
nes. Aqui, a expansão do fundo oceânico separou as placas
épocas maiores, estão as reversões curtas e transicionais do cam-
Norte-Americana e Eurasiana por cerca de 60 km em 3,3 mi-
po. onhecidas como eventos magnéticos, que podem durar des-
lhões de anos, fornecendo uma taxa de expansão de 18 km por
de algun milhares até 200 mil anos. milhão de ano ou, de outro modo, 18 mm/ano.
Padrões de anomalias magnéticas no assoalho oceânico Os Num limite divergente de placas, a combinação da taxa de
peculiares padrões magnéticos bandados localizados no fundo expansão e da direção de expansão fornece a velocidade rela-
do oceano ( er Figura panorâmica 2.11) deixaram os cientistas tiva da placa: a velocidade com que uma placa move-se relati-
curiosos até 1963, quando dois ingleses, F. 1. Vine e D. H. Ma- vamente a outra.
thews - e, independentemente, dois canadenses, L. Morley e A. Se você olhar a Figura 2.5, vai ver que a taxa de expansão
Larochelle - formularam uma proposta surpreendente. Com para a Dorsal Mesoatlântica ao sul da Islândia é exageradamen-
base em novas evidências para as reversões magnéticas coleta- te baixa quando comparada com a de muitos outros lugares
das por geólogos em derrames de lavas no continente, eles argu- dessa mesma dorsal. O recorde de velocidade de expansão po-
mentaram que as bandas magnéticas altas e baixas correspon- de ser encontrado na Dorsal do Pacífico Oriental12 somente no
diam a bandas de rochas do fundo submarino que foram magne- sul do equador, onde as placas Pacífica e de Nazca estão se se-
tizadas durante episódios ancestrais do campo magnético nor- parando a uma taxa de 150 mm/ano - uma ordem de magnitu-
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria UnifícadoR 61

- ;nais rápida que a taxa do Atlântico Norte. Uma média esti- A simplicidade e a elegância da magnetização do fundo
-n para as dorsais mesoceânicas do mundo é de cerca de 50 oceânico tornaram-na uma ferramenta muito efetiva. Mas ela é
'ano. Isso é aproximadamente a taxa de crescimento de um método indireto ou de sensoriamento remoto, pois as ro-
unhas, e mostra que, em termos de geologia, tais taxas chas não foram recuperadas do fundo oceânico e, portanto, suas
:.--e:xpansão fornecem dados importantes para o estudo do sis- idades não foram diretamente determinadas em laboratólio.
-=:na de convecção do manto, tópico a que retomaremos mais Uma evidência direta da expansão do fundo oceânico e do mo-
:!.:iante neste capítulo. vimento de placas ainda se fazia necessária para convencer al-
Podemos seguir a escala de tempo magnético a partir das guns poucos céticos remanescentes. A perfuração do fundo do
- 'ras reversões do campo magnético terrestre. As bandas mar veio suprir essas evidências que faltavam.
- _ éticas correspondentes no assoalho oceânico, que podem
-"'r pensadas como bandas de idades, têm sido mapeadas em Perfuração de mar profundo
- r.alhe a partir das cristas das dorsais mesoceânicas das várias Em 1968, um programa de perfurações do fundo dos oceanos
- :as oceânicas, cobrindo um intervalo de tempo que excede a foi lançado como um projeto integrado pelas maiores institui-
milhões de anos.
ções oceanográficas e a Fundação Nacional de Ciência13 (Re-
O poder e a conveniência de usar a magnetização do assoalho portagem 2.1). Mais tarde, outras nações juntaram-se a esse es-
cinico para descobrir a história das bacias oceânicas não po- forço. Esse experimento global tinha por objetivo perfurar, re-
-an er sobreenfatizados. Os geólogos calcularam as idades de cuperar e estudar as rochas do fundo oceânico de muitos luga-
: -as regiões do fundo oceânico sem sequer examinar amostras res do mundo. Usando perfuratrizes rotativas, os cientistas trou-
-' rochas. Eles simplesmente cruzaram os oceanos, medindo os xeram testemunhos contendo secções de rochas do assoalho
_:mlPOS magnéticos das rochas do fundo submalino, e correla- oceânico; em alguns casos, a perfuração penetrou milhares de
_ naram os padrões de reversão com as seqüências de tempo es- metros abaixo da superfície do fundo oceânico. Assim, os geó-
lecidas pelos métodos anteriormente descritos. Na verdade, Jogos tiveram a oportunidade de desvendar a história das bacias
~-~ aprenderam como "tocar a fita novamente". oceânicas a partir de evidências diretas.

2.1 Perfurando em mar profundo

Onavio
tem 143jQIDES comprimento.que No
m de Reso/uiion, perfura
meio, em mar profundo,
carrega uma torre
de perfuração de 61 m de altura. Ele é o único navio de sua es-
pécie com capacidade de perfurar até o oceano mais profun-
do. Ele pode baixar canos de perfuração por milhares de me-
tros até atingir o fundo submarino e, depois, perfurar os sedi-
mentos e a crosta basáltica subjacente por outros milhares de
metros.
Antes de poder alcançar essa façanha, foi necessária uma
descoberta tecnológica. Foi preciso encontrar uma maneira de
mantê-Io estacionário durante o processo de perfuração, inde-
pendentemente das correntes e dos ventos; de outro modo, o
cano de perfuração seria rompido. O problema foi resolvido
graças ao movimento de um artefato de posicionamento que
usa ondas de som transmitidas por sensores acústicos implan-
tados no fundo do mar. Qualquer mudança na posição do na-
vio é detectada por um computador que monitora as mudan-
ças de tempo de chegada dos pulsos sonoros a partir de cada
emissor. O mesmo computador controla a velocidade e o leme
para manter o navio parado.
A perfuração em oceano profundo foi a resposta para
aqueles que diziam, quando a exploração da Lua foi iniciada,
que era "melhor explorar o fundo dos oceanos que o lado es- Os cientistas a bordo de um navio de perfuração tiram
curo da Lua". Nós terminamos por fazer os dois. Q programa amostras de sedimentos recuperados do fundo do mar. Essas
de perfuração em mar profundo, agora conhecido como Pro- amostras podem ser analisadas para revelar a história das
grama de Perfuração Oceãnica, tem mais de 35 anos e tornou- bacias oceânicas e as condições climáticas antigas. [Cortesia
se de escopo internacional. do Programa de Perfuração Oceânica/TAMA]
62?2 =me der a Terra

L::na das coisas mais importantes a ser determinada era a


:h~de ada amostra. Pequenas partículas caindo através da
-~ oceânica - poeira da atmosfera, material orgânico de plan-
animais malinhos - acumulam-se como sedimentos no
fundo do mar à medida que uma nova crosta oceânica vai se
:armando. Desse modo, a idade dos sedimentos mais antigos
do [e temunhos de sondagem, ou seja, daqueles imediatamen-
[e sobre a crosta, forneceu aos geólogos a idade do fundo oceâ-
nico naquele determinado ponto. A idade dos sedimentos é ob-
tida plimeiramente a partir de esqueletos fósseis de minúsculos
animais unicelulares, que vivem no oceano e afundam quando
morrem (ver Capítulo 10). Observou-se que os testemunhos de
sondagem de sedimentos tornavam-se mais antigos com o au-
mento da distância a partir das dorsais mesoceânicas e que as
idades das rochas do ftmdo submarino concordavam quase per-
feitamente com aquelas determinadas a partir dos dados de re-
versão magnética. A concordância validou a datação magnética
do fundo submarino e confirmou o conceito de expansão do
fundo do mar.

Medidas do movimento de placa pela


Geodésia
Em suas publicações em defesa da deriva continental, Alfred
Wegener cometeu um grande erro: ele propôs que a Amélica do
Figura 2.12 Uma das 250 estações GPS de uma rede que
Norte e a Europa estavam afastando-se a uma taxa de aproxi-
coleta observações de satélite ao longo de falhas ao sul da
madamente 30 m/ano - mil vezes mais rápido que a expansão Califórnia. Esses instrumentos usam sinais de satélites GPS
real do assoalho do Atlântico! Essa velocidade inacreditavel-
orbitando a Terra para detectar pequenos deslocamentos na
mente alta foi uma das razões que levaram muitos cientistas a
superfície, a partir dos quais o movimento das placas e as
rejeitar francamente as noções de deriva continental. Wegener deformações de seus limites podem ser calculados. Observações
fez essas estimativas por assumir incorretamente que os conti- desses movimentos podem auxiliar os cientistas a avaliar a
nentes estavam juntos, constituindo a Pangéia, num tempo tão ocorrência de futuros terremotos. [Southern California
recente quanto o da última idade glacial (que ocorreu há apenas Earthquake Center]
20 mil anos). Sua crença em uma rápida taxa também envolveu
certa dose de otimismo. Em particular, ele esperava que a hipó-
tese da deriva pudesse ser confirmada por repetidas medidas
acuradas da distância através do Oceano Atlântico usando o po-
sicionamento astronômico. No entanto, para essa técnica funcionar, as posições relativas
dos postos de observação deveriam ser determinadas de modo
Posicionamento astronômico O posicionamento astronômico suficientemente acurado para medir o movimento. Na época de
- medida da posição das estrelas no céu noturno para determi- Wegener, a acurácia do posicionamento astronômico era pobre;
nar onde você está - é uma técnica da Geodésia, a ciência an- os erros na fixação das distâncias intercontinentais excediam a
cestral de medir a forma da Terra e posicionar pontos na sua su- 100 metros. Desse modo, mesmo as altas taxas de deliva que ele
perfície. Os navegadores utilizaram o posicionamento astronô- estava propondo exigiriam um certo número de anos para serem
mico durante séculos para determinar os limites geográficos observadas. Ele argumentou que duas determinações astronômi-
das [erras e os malinheiros fizeram o mesmo para direcionar cas da distância entre a Europa e a Groelândia (onde trabalhou
eu naYios no mar. Há 4 mil anos, os construtores egípcios como meteorologista), tomadas com um intervalo de seis anos,
usaram es a técnica para posicionar a Grande Pirâmide perfei- suportavam suas altas taxas, mas ele estava equivocado nova-
tamente para o norte. mente. Sabemos hoje que o deslocamento da Dorsal Mesoatlân-
Wegener imaginou que a Geodésia pudesse ser usada para tica entre a medida de um levantamento e o seguinte é de apenas
medir a deriya continental da seguinte maneira. Dois observa- 1/10 de metro, mil vezes menos que o necessmo para ser obser-
dores, um na Europa e o outro na Amélica do Norte, determina- vado pelas técnicas que estavam disponíveis então.
riam simultaneamente as suas posições relativas a estrelas fi- Em função da alta exatidão requerida para observar direta-
xas. A partir dessas posições, eles podeliam calcular a distância mente o movimento das placas, as técnicas geodésicas não exer-
entre os dois pontos de observação em cada instante. Então, re- ceram papel significativo na descoberta da tectônica de placas.
petiriam essas medidas de distância a partir dos mesmos postos Os geólogos tiveram de confiar na evidência da expansão do
de observação algum tempo depois, digamos, após um ano. Se fundo oceânico a partir do registro geológico - as tiras magnéti-
os continentes estivessem à deriva, então a distância develia ter cas e as idades dos fósseis descritas anteliormente. No entanto,
aumentado e o valor do incremento determinaria a velocidade um método de posicionamento astronômico iniciado no final da
da mesma. década de 1970 usou sinais de distantes "fontes de rádio quase
~'2 =- Le der a Terra

das coisa mais importantes a ser determinada era a


e ada amostra. Pequenas partículas caindo através da
- =,...3. eani a - poeira da atmosfera, material orgânico de plan-
- - e animais marinhos - acumulam-se como sedimentos no
fundo do mar à medida que uma nova crosta oceânica vai se
formando. Desse modo, a idade dos sedimentos mais antigos
dos te temunhos de sondagem, ou seja, daqueles imediatamen-
[e sobre a crosta, forneceu aos geólogos a idade do fundo oceâ-
nico naquele determinado ponto. A idade dos sedimentos é ob-
tida primeiramente a partir de esqueletos fósseis de minúsculos
animais unicelulares, que vivem no oceano e afundam quando
morrem (ver Capítulo 10). Observou-se que os testemunhos de
sondagem de sedimentos tornavam-se mais antigos com o au-
mento da distância a partir das dorsais mesoceânicas e que as
idades das rochas do fundo submarino concordavam quase per-
feitamente com aquelas determinadas a partir dos dados de re-
versão magnética. A concordância validou a datação magnética
do fundo submarino e confirmou o conceito de expansão do
fundo do mar.

Medidas do movimento de placa pela


Geodésia
Em suas publicações em defesa da deriva continental, Alfred
Wegener cometeu um grande erro: ele propôs que a América do
Figura 2.12 Uma das 250 estações GPS de uma rede que
Norte e a Europa estavam afastando-se a uma taxa de aproxi-
coleta observações de satélite ao longo de falhas ao sul da
madamente 30 m/ano - mil vezes mais rápido que a expansão Califórnia. Esses instrumentos usam sinais de satélites GPS
real do assoalho do Atlântico! Essa velocidade inacreditavel-
orbitando a Terra para detectar pequenos deslocamentos na
mente alta foi uma das razões que levaram muitos cientistas a
superfície, a partir dos quais o movimento das placas e as
rejeitar francamente as noções de deriva continental. Wegener
deformações de seus limites podem ser calculados. Observações
fez essas estimativas por assumir incorretamente que os conti-
desses movimentos podem auxiliar os cientistas a avaliar a
nentes estavam juntos, constituindo a Pangéia, num tempo tão ocorrência de futuros terremotos. [Southern California
recente quanto o da última idade glacial (que ocorreu há apenas Earthquake Center]
20 mil anos). Sua crença em uma rápida taxa também envolveu
certa dose de otimismo. Em particular, ele esperava que a hipó-
tese da deriva pudesse ser confirmada por repetidas medidas
acuradas da distância através do Oceano Atlântico usando o po-
sicionamento astronômico. No entanto, para essa técnica funcionar, as posições relativas
dos postos de observação deveriam ser determinadas de modo
Posicionamento astronômico O posicionamento astronômico suficientemente acurado para medir o movimento. Na época de
- medida da posição das estrelas no céu noturno para determi- Wegener, a acurácia do posicionamento astronômico era pobre;
nar onde você está - é uma técnica da Geodésia, a ciência an- os erros na fixação das distâncias intercontinentais excediam a
cestral de medir a forma da Terra e posicionar pontos na sua su- 100 metros. Desse modo, mesmo as altas taxas de deriva que ele
perfície. Os navegadores utilizaram o posicionamento astronô- estava propondo exigiriam um certo número de anos para serem
mico durante séculos para determinar os limites geográficos observadas. Ele argumentou que duas determinações astronômi-
das terras e os marinheiros fizeram o mesmo para direcionar cas da distância entre a Europa e a Groelândia (onde trabalhou
seus navios no mar. Há 4 mil anos, os construtores egípcios como meteorologista), tomadas com um intervalo de seis anos,
usaram essa técnica para posicionar a Grande Pirâmide perfei- suportavam suas altas taxas, mas ele estava equivocado nova-
tamente para o norte. mente. Sabemos hoje que o deslocamento da Dorsal Mesoatlân-
Wegener imaginou que a Geodésia pudesse ser usada para tica entre a medida de um levantamento e o seguinte é de apenas
medir a deriva continental da seguinte maneira. Dois observa- 1/10 de metro, mil vezes menos que o necessário para ser obser-
dores, um na Europa e o outro na América do Norte, determina- vado pelas técnicas que estavam disponíveis então.
riam simultaneamente as suas posições relativas a estrelas fi- Em função da alta exatidão requerida para observar direta-
xas. A partir dessas posições, eles poderiam calcular a distância mente o movimento das placas, as técnicas geodésicas não exer-
entre os dois pontos de observação em cada instante. Então, re- ceram papel significativo na descoberta da tectônica de placas.
petiriam essas medidas de distância a partir dos mesmos postos Os geólogos tiveram de confiar na evidência da expansão do
de observação algum tempo depois, digamos, após um ano. Se fundo oceânico a partir do registro geológico - as tiras magnéti-
os ontinentes estivessem à deriva, então a distância deveria ter cas e as idades dos fósseis descritas anteriormente. No entanto,
aumentado e o valor do incremento determinaria a velocidade um método de posicionamento astronômico iniciado no final da
da me ma. década de 1970 usou sinais de distantes "fontes de rádio quase
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

" (quasares) registrados por enormes antenas em forma da década de 1980, os geólogos têm conseguido tirar vanta-
to. Esse método pode medir distâncias intercontinentais gem de uma nova constelação de 24 satélites orbitadores da
:una exatidão admirável de até 1 mm. Em 1986, um grupo Terra, chamados de Sistema de Po icionamento Global
- _-~ntistas publicou um conjunto de medidas baseadas nessa (GPSI5), para fazer os mesmos tipos de medidas com a mes-
~ -::a que mostrou que as distâncias entre as antenas na Euro- ma impressionante exatidão, usando receptores de rádios por-
-uécia) e na América do Norte (Massachusetts) tinham au- táteis, muito mais baratos e menores que este livro (Figura
- do 19 mm/ano num período de cinco anos, muito próximo 2.12). Os receptores de GPS registram ondas de rádio de alta
~ito por modelos geológicos da tectônica de placas. O so- freqüência sincronizadas com relógios atômicos precisos si-
-- de Wegener de medir a deriva continental diretamente por tuados à bordo dos satélites. A constelação de satélites serve
- - ionamento astronômico foi finalmente realizado! como um sistema de referência externa, do mesmo modo que
_-ata: Hoje, a Grande Pirâmide do Egito não se encontra as estrelas fixas e os quasares fazem em um posicionamento
-5 perfeitamente direcionada para o norte, como afirmado astronômico.
rionnente, mas levemente a nordeste. Será que os astrô- As mudanças da distância entre os receptores de GPS basea-
"TUJS egípcios ancestrais cometeram esse erro ao orientá-Ia dos na superfície terrestre de diferentes placas e registrados ao
séculos atrás ?14 Os arqueólogos pensam que provavel- longo de muitos anos concordam em magnitude e direção com
e não. Durante esse período, a África derivou o sufiGien- aquelas determinadas a partir das anomalias magnéticas do as-
ra girar a pirâmide fora do alinhamento com o verdadei- soalho oceânico. Esses experimentos indicam que os movimen-
arte. tos das placas são notavelmente constantes durante períodos de
tempo que variam de poucos anos a milhões de anos. Os geólo-
ma de posicionamento local As operações geodésicas gos estão agora usando o GPS para medir anualmente os movi-
com grandes radiotelescópios são muito caras e não são mentos das placas em muitas localidades do globo (Figura 2.13).
a ferramenta prática para investigação detalhada do movi- Além de determinar as velocidades das placas, as observa-
-~ to das placas tectônicas em áreas remotas. Desde meados ções por GPS mostraram que a convergência entre as placas de

As velocidades horizontais são deter- As placas estão se movendo


minadas a partir de sinais de satélites muito mais rapidamente
gravados por receptores terrestres. no oeste do Pacífico...

O'

O'

20' 40' 60· 80· 100' 120' 140' 160' 180' 160' 140' 120' 100' 80' 60' 40' 20· O'

Lgura 2.13 O Sistema de Posicionamento Global (GPS) é de estações que registram continuamente os dados de GPS.
....sadopara medir o movimento das placas em muitos locais da [Michael Heflin,JPL/CaITech]
-erra. As velocidades mostradas aqui são determinadas a partir
",,'2 - <:e der a Terra

-\ ';,
. ,{'i\
_-!!L e a ul-.-\mericana pode ser dividida em três partes. Cer-
_ .•~ -WCé e dão por deslizamento, suave e contínuo, entre as
y1ande reconstrução
"?la as. Cerca de 20% ocorrem como deformação ao lon-
go da borda da placa, que causa o soerguimento da Cordilheira
o continente Pangéia era a única grande massa de terras que
existia há 250 milhões de anos. Um dos grandes triunfos da
do- .-\ndes. Cerca de 40% ocorrem em grandes terremotos,
geologia moderna é a reconstrução dos eventos que levamm à
quando a interface entre as duas placas rompe-se e desloca-se
agIutinação da Pangéia e a sua posterior fragmentação nos con-
r pentinamente. Por definição, uma placa rígida não deveria
tinentes que conhecemos hoje. Vamos usar o que aprendemos a
eformar. O que está acontecendo, então? Vamos aprender mais
respeito da tectônica de placas para ver como essa descoberta
a re peito dos processos de deformação das placas quando es-
foi alcança da.
rudarmos os terremotos no Capítulo 19.
ota: Atualmente, os receptores de GPS estão sendo usa-
dos em automóveis como parte de um sistema de navegação
Isócronas do assoalho oceânico
que leva o motorista a endereços específicos nas ruas. É inte- O mapa colorido da Figura 2.14 mostra as idades dos assoa-
ressante que os cientistas que desenvolveram os relógios atô- lhos oceânicos do mundo, as quais foram determinadas a partir
micos usados em GPS o fizeram para pesquisa emfísicafun- dos dados de reversão magnética e de fósseis obtidos nas perfu-
damental, sem ter idéia de que estariam criando uma indús- rações de mar profundo. Cada banda colorida representa um in-
tria de muitos bilhões de dólares. Junto com o transistor, o la- tervalo de tempo correspondente à idade da crosta dentro da-
ser e muitas outras tecnologias, o GPS demonstra a maneira quela banda. Os limites entre as bandas, chamados de isócro-
afortunada pela qual a pesquisa básica dá retorno à socieda- nas, são curvas de contorno que delimitam rochas de mesma
de que afinancia. idade. As isócronas fornecem-nos o tempo que decorreu desde

Cada banda colorida representa um Os limites entre as bandas são


intervalo de tempo correspondente à idade contornos de mesma idade
do segmento da crosta por ela delimitado. chamados de isócronas.

60'

30'

O' O'

30' 30'

60' 60'

O' 30' 60' 90' 120' 150' 180' 210' 240' 270' 300' 330' O'

o 11 20 33 40 48 56 68 84 120 132 148 180


127 140 154
Milhões de anos (Ma)

Figura 2.14 A idade da crosta oceânica. Cada banda colorida indica terra; a cinza-escura, águas rasas sobre plataformas
representa um intervalo de tempo que cobre a idade do continentais. As dorsais mesoceânicas, ao longo das quais um
segmento da crosta por ela delimitado. Os limites entre as novo assoa lho submarino é extrudado, coincidem com o fundo
bandas são linhas de contorno denominadas isócronas. Elas submarino mais jovem (vermelho). Uaurnal af Geaphysical
fornecem a idade do assoalho oceânico em milhões de anos, Research 102 (1997): 3211 -3214. Cortesia de R. Dietmar Müller]
desde sua criação nas dorsais mesoceânicas. A cor cinza-clara
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

-:.-= as rochas crustais foram injetadas como magma em um rif- A fragmentação da Pangéia
.~ illêsoceânico e, desse modo, indicam a quantidade de expan-
Usando esses princípios, os geólogos reconstruíram a abertura
; bavida desde que elas foram geradas. Note como o assoa-
do Oceano Atlântico e a fragmentação da Pangéia. Esse super-
- oceânico toma-se progressivamente mais antigo em ambos continente é mostrado como existiu há 240 milhões de anos na
- lados dos riftes mesoceânicos. Por exemplo, a distância a
Figura 2.1Sa. Ele começou a fragmentar-se com o rifteamento
;~ do eixo da dorsal de uma isócrona de 140 milhões de
da América do Norte, que se separou da Europa há cerca de 200
(limite entre bandas verdes e azuis) corresponde à exten-
milhões de anos (Figura 2.l5b). A abertura do Atlântico Norte
'; do novo assoalho oceânico criado nesse intervalo de tempo.
foi acompanhada pela separação dos continentes do norte (Lau-
-.:::isócronas mais espaçadas (as bandas coloridas mais largas)
rásia), do sul (Terra de Gondwana, ou Gondwana) e pelo riftea-
- Pacífico Oriental indicam taxas de expansão mais rápidas
_-= as do Atlântico. mento de Gondwana ao longo do que é hoje a Costa Leste da
África (Figura 2.l5c). A fragmentação de Gondwana, por sua
Em 1990, após uma busca de 20 anos, os geólogos en-
vez, separou a América do Sul, a África, a Índia e a Antártida,
.muraram as rochas oceânicas mais antigas por meio da per- criando o Atlântico Sul e os oceanos do sul e estreitando o
- ,ão do assoalho do Pacífico Ocidental. Essas rochas ti-
Oceano Tethys16 (Figura 2.l5d). A separação da Austrália a
::-JaIll uma idade de cerca de 200 milhões de anos, o que re-
partir da Antártida e a "martelada" da India na Eurásia fecha-
=e enta apenas 4% da história da Terra. Isso indica o quão ram o Oceano Tethys, formando o mundo como nós o vemos
5=010gicamente jovem é o fundo do oceano, quando compa-
hoje (Figura 2.l5e).
o com os continentes. Em um período de 100 a 200 mi-
Os movimentos das placas não cessaram, é claro, de modo
·-=s de anos, em alguns lugares, e apenas dezenas de mi-
...:iÕe de anos, em outros, a litosfera oc eânica é formada, ex- que a configuração dos continentes vai continuar a evoluir. Um
cenário plausível para a distribuição dos continentes e limites
;<illde-se, resfria-se e mergulha de volta no manto subjacen-
de placas em 50 milhões de anos no futuro é mostrado na Figu-
-=. Diferentemente, as rochas continentais mais antigas têm ra 2.l5f.
_=_ a de 4 bilhões de anos.

~econstruindo a história dos A aglutinação da Pangéia pela


deriva continental
ovimentos das placas
O mapa de isócronas da Figura 2.14 informa-nos de que todo o
_--= placas da Terra comportam-se como corpos rígidos. Ou se- fundo oceânico existente na superfície terrestre foi criado des-
._ a distância entre três pontos na mesma placa rígida - diga- de a fragmentação da Pangéia. No entanto, sabemos a partir dos
.=.os, ova York, Miami e Bermuda, na Placa Norte-Americana
registros geológicos de cinturões de montanhas continentais
- ;:lliomuda muito, independentemente do quão distante a pIa- mais antigos que a tectônica de placas estava operando há bi-
=. -e mova. Mas a distância entre, digamos, Nova York e Lis- lhões de anos antes dessa fragmentação. Evidentemente, a ex-
aumenta porque as duas cidades estão em placas diferentes, pansão do assoalho oceânico ocorria como hoje e existiram epi-
...:.quais estão sendo separadas ao longo de uma zona estreita de sódios prévios de deriva continental e colisão. O assoalho oceâ-
ansão na Dorsal Mesoatlântica. A direção do movimento de nico criado nesses tempos anteriores foi destruído pela subduc-
a placa em relação à outra depende de princípios geométri- ção, retomando ao manto, de modo que são as evidências mais
. - que governam o comportamento de placas rígidas numa su- antigas preservadas nos continentes que possibilitam identificar
.=crfície esférica. Dois princípios primários são: e cartografar o movimento desses "paleocontinentes".
Os limites transjormantes indicam as direções de movimentos Os cinturões de montanhas mais antigos, como os Apala-
= ativos da placa. Com poucas exceções, não ocorre sobreposi- ches na América do Norte e os Urais, que separam a Europa da
;:'!o, flambagem ou separação ao longo de limites transformantes Ásia, auxiliam a posicionar colisões ancestrais de paleoconti-
=picos e nos oceanos. As duas placas meramente se deslocam nentes. Em muitos lugares, as rochas revelam episódio ances-
em relação à outra, sem criação ou destruição de material de trais de rifteamento e subducção. Tipos de rochas e fós ei tam-
bas. Procure um limite transformante se quiser deduzir a dire- bém indicam a distribuição de mares ancestrais, geleiras, terras
~ do movimento relativo de uma placa, porque a orientação da baixas, montanhas e climas. O conhecimento dos climas ances-
::"::lhaé a direção na qual uma placa se desloca em relação a ou- trais possibilita aos geólogos posicionarem as latitude nas
_ como mostra a Figura 2.10. quais as rochas continentais foram formadas, o que, por sua
vez, os auxilia a reconstituir o quebra-cabeça do ontinentes
~ .-\5 isócronas do assoa lho oceânico revelam as posições de li- ancestrais. Quando o vulcanismo ou a formação de montanhas
·.es divergentes em tempos anteriores. As isócronas no assoa- produz rochas continentais novas, elas também registram a di-
...:i.O oceânico são grosseiramente paralelas e simétricas com o ei- reção do campo magnético da Terra, da mesma maneira que
~o da dorsal mesoceânica ao longo da qual foram geradas. A Fi- acontece com as rochas oceânicas quando são criadas por ex-
~ 2.14 ilustra essa observação. Devido ao fato de que cada pansão do fundo do mar. Como uma bú sola congelada no tem-
_'-ÓCronacoincidia com o limite de separação da placa num tem- po, o magnetismo fóssil de um fragmento continental registra a
: anterior, aquelas que apresentam a mesma idade, porém em sua orientação e posição ancestrais.
- os opostos de uma dorsal mesoceânica, podem ser reaproxi- A Figura 2.15 mostra um do últimos esforcos para repre-
:ill!.daspara mostrar a posição das placas e a configuração dos sentar a configuração dos continentes antes da Pangéia. É uma
_ ntinentes nelas encravados naquela época anterior. demonstração impressionante e verdadeira de que a ciência
66 Para Entender a Terra

FORMAÇÃO
RODíNIA
DA PANGÉIA
Proterozóico Superior, 750 Ma

o O supercontinente de Rodínia formou-se há cerca


de 1,1 bilhão de anos e começou a se fragmentar há
cerca de 750 milhões de anos.

o Os geólogos têm usado várias


evidências, incluindo paleomagnetismo e
informações sobre climas ancestrais, para
reconstruir o padrão de deriva continental
Pré-Pangéia.

o O supercontinente Pangéia já estava agregado há 237 Ma,


circundado por um superoceano chamado Pantalassa (grego
para "todos os mares"), o Oceano Pacífico ancestral. O Oceano
Tethys, entre a África e a Eurásia, foi o ancestral do Mar
Mediterrâneo.

PANGÉIA
(a) Triássico Inferior, 237 Ma

Figura 2.15 A formação e fragmentação da Pangéia, desde 750 milhões de anos atrás até 50 milhões de anos depois.
[Mapa paleogeográfico por Christopher R. Scotese, 2003. Projeto PALEOMAPA(www.scotese.com)]
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

FRAGMENTAÇÃO
-:JAPANGÉIA (b) jurássico Inferior, 195 Ma D A fragmentação da Pangéia foi assinalada pela abertura
de riftes a partir dos quais lavas extravasaram. Assembléias
de rochas relictuais desse grande evento podem
ser encontradas hoje como rochas vulcãnicas de 200
milhões de anos desde a Nova Escócia até o
Norte da Carolina e nas escarpas das Palisades, ao longo
do Rio Hudson. Essas rochas nos dizem que a
fragmentação e o início da deriva ocorreram há cerca
de 200 Ma.

D Há cerca de 150 Ma, a Pangéia estava


nos seus estágios iniciais de fragmentação. O Oceano
Atlântico abriu-se parcialmente, o Oceano Tethys
contraiu-se e os continentes do Norte (laurásia)
tinham sido todos separados daqueles do Sul.
Gondwana (índia, Antártida e Austrália) começou
a separar-se da África.
(d)

m Há 66 Ma, a costa do Atlântico Sul abriu-se e


alargou-se, Madagascar separou-se da África e a
índia estava no seu caminho em direção ao
Norte e à Ásia. O Tethys estava se fechando de
modo a formar um mar intracontinental, o
Mediterrâneo. Depois de cerca de 135 Ma de
deriva, a configuração moderna dos continentes
tornou-se discernível. Os pontos vermelhos
marcam o local do impacto do bólido que
causou a extinção dos dinossauros e muitas
outras formas de vida.

o MUNDO MODERNO
E FUTURO

D O mundo moderno foi configurado durante os últimos


65 Ma. A índia colidiu com a Ásia, terminando a sua viagem
através do oceano, e ainda está sendo empurrada em direção
ao Norte, na Ásia. A Austrália separou-se da Antártida.

(f) Próximos 50 Ma, no futuro


68 Para Entender a Terra

moderna pode recuperar a geografia desse estranho mundo de que operam na superfície terrestre. No Capítulo 1, descrevemos
-emenas de milhões de anos atrás. A evidência a partir de tipos o manto como um sólido quente capaz de mover-se como um
dp ro has, fósseis, clima e paleomagnetismo permitiu aos cien- fluido viscoso (cera quente ou melado frio, por exemplo). O ca-
ri ta reconstruir um supercontinente anterior, chamado Rodf- lor que escapa do interior da Terra provoca a convecção desse
nia. que se formou há cerca de 1,1 bilhão de anos e começou a material (circulação ascendente e descendente) a velocidades
e fragmentar há cerca de 750 milhões de anos. Eles foram ca- de poucas dezenas de milímetros por ano.
pazes de cartografar os fragmentos desse supercontinente ao Quase todos os cientistas atualmente aceitam que as placas li-
longo dos 500 milhões de anos subseqüentes à medida que de- tosféricas de algum modo participam do fluxo desse sistema de
ri"avam e se rearranjavam no supercontinente Pangéia. Os geó- convecção do manto. No entanto, como é de praxe, "o truque es-
logos estão continuamente descobrindo mais detalhes desse tá nos detalhes". Muitas hipóteses diferentes têm sido propostas
quebra-cabeça complexo, no qual cada fragmento muda de for- com base numa ou noutra peça de evidência, mas ninguém for-
ma no decorrer do tempo geológico. neceu uma teoria satisfatória e abrangente que amarrasse todos
os elementos. A seguir, apresentaremos três questões que reme-
tem ao âmago do assunto e forneceremos nossas opiniões a res-
Implicações da grande reconstrução
peito de suas respostas. Mas você deve ser cuidadoso em não
Dificilmente algum ramo da Geologia passou incólume por essa aceitar essas respostas tentativas como um fato. Nossa com-
grande reconstrução dos continentes. Os geólogos da área de preensão do sistema de convecção do manto permanece como
prospecção usaram o encaixe dos continentes para encontrar de- um trabalho em andamento, o qual, talvez, tenhamos que alterar
pósitos minerais e de petróleo por meio da correlação de forma- à medida que novas evidências estiverem disponíveis. As edições
cões rochosas existentes num continente com suas contra-partes futuras deste livro poderão conter respostas diferentes!
pré-deriva em outro. Os paleontólogos repensaram alguns aspec-
tos da evolução à luz da deriva continental. Os geólogos amplia-
ram seu foco de uma geologia de uma região particular para um Onde se originam as forças que
cenário que abrange o mundo, pois o conceito da tectônica de movem as placas?
placas fornece uma maneira de interpretar, em termos globais, Veja um experimento que você pode fazer em sua cozinha:
processos geológicos como formação de rochas, soerguimento aqueça uma panela com água até que esteja próxima do ponto
de montanhas e mudanças climáticas. de fervura e adicione algumas folhas de chá seco no centro de-
Os oceanógrafos estão reconstruindo as correntes como la. Você vai observar que as folhas de chá movem-se na super-
possam ter existido em oceanos ancestrais para entender me- fície da água, arrastadas pelas correntes de convecção da pane-
lhor a circulação moderna e explicar as variações dos sedimen- la. Será que é desse modo que as placas se movem, passiva-
tos do mar profundo que são afetadas por tais correntes. Os mente arrastadas de um lado para outro nas costas das corren-
cientistas estão "predizendo" para trás no tempo para descrever tes de convecção que ascendem do manto?
temperaturas, ventos, extensão de geleiras continentais e como A resposta parece ser não. A evidência principal vem das ta-
eram os níveis dos mares em tempos anteriores à deriva. Eles xas de movimento das placas discutidas anteriormente neste ca-
esperam aprender com o passado, de modo que possam predi- pítulo. A partir da Figura 2.5, podemos observar que as placas
zer o futuro - um assunto de grande urgência, devido às possi- que estão se movendo mais rápido (as placas Pacífica, de Naz-
bilidades do aquecimento global deflagrado pela atividade hu- ca, de Cocos e Índica) estão em processo de subducção ou sen-
mana. Que testemunho melhor do triunfo dessa hipótese, outro- do consumidas ao longo de uma grande parte de suas bordas.
ra considerada ultrajante, do que sua habilidade para revitalizar Em contraste, as placas que estão se movendo devagar (placas
e lançar luz em tantos tópicos diversos? Norte-Americana, Sul-Americana, Africana, Eurasiana e An-
tártica) não têm porções significativas de lascas descendentes.
Essas observações sugerem que o movimento rápido das placas
é causado pelas forças gravitacionais exercidas pelas lascas
vecção do manto: o mais antigas e frias da litosfera (por isso pesadas). Em outras
, ecanismo motor da palavras, as placas não são arrastadas por correntes de convec-
ção a partir do manto profundo, mas, em vez disso, "caem de
tectônica de placas volta" para o manto sob a ação do seu próprio peso. De acordo
com essa hipótese, a expansão do assoalho oceânico é decor-
Tudo o que foi discutido até agora pode ser denominado de tec- rente de uma ascensão passiva de material do manto onde as
tônica de placas descritiva. Mas dificilmente uma descrição é placas têm sido afastadas pelas forças de subducção.
uma explicação. Não entenderemos totalmente a tectônica de Mas, espere - se a única força importante na tectônica de
placas até que tenhamos uma teoria mais compreensiva que placas é o arraste gravitacional das lascas que estão em proces-
possa explicar por que as placas se movem. Descobrir tal teoria so de subducção, por que então a Pangéia fragmentou-se e o
é um dos mais importantes desafios que confrontam os cientis- Oceano Atlântico foi formado? A única porção da litosfera em
tas que estudam o sistema Terra. Nesta seção, discutiremos di- subducção que atualmente está fixada às placas Norte e Sul-
versos aspectos desse problema que tem sido central para a pes- Americana é encontrada nos pequenos arcos de ilhas que limi-
quisa recente desses cientistas. tam os mares do Caribe e de Scotia, os quais são considerados
Como Arthur Holmes e os outros defensores pioneiros da muito fracos para abrir o Atlântico. Uma possibilidade é a de
deri"a continental perceberam, a convecção do manto é o "mo- que as placas cavalgantes, como as que estão em subducção, se-
ror" que controla os processos tectônicos de grande proporção jam puxadas em direção aos seus limites convergentes. Por
CAPíTULO 2 • Tectônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

A gravidade empurra a placa desli- A lasca litosférica mergulhante


zando a partir da dorsal mesoceânica. puxa a placa oceânica.

mesoceânica
oceânica

Figura 2.16 Secção esquemática das camadas externas da Terra ilustrando todas as
=orças consideradas importantes no controle da tectônica de placas: a força de puxão de
_ma lasca litosférica mergulhante e a força de empurrão de placas operando nas dorsais
esoceânicas. [Adaptada da Figura 1 do artigo de D. Forsyth and S. Uyeda, Geophys.).
ay Astr. Soco 43 (1975):163-200]

=xemplo, à medida que a Placa de Nazca é consumida sob a meio da comparação de observações com modelos computado-
_-\mérica do Sul, ela pode fazer com que o limite de placas ao rizados de detalhe do sistema de convecção mantélica. Alguns
longo da fossa Peru-Chile regrida em direção ao Pacífico, "su- resultados serão discutidos no Capítulo 21.
~do" a Placa Sul-Americana para oeste.
Uma outra possibilidade é a de que a Pangéia comportou-se
Qual é a profundidade em que a reciclagem de
:orno um cobertor de isolamento, impedindo que o calor dei-
xasse o manto da Terra (como geralmente o faz por meio do placas ocorre?
processo de expansão do assoalho oceânico). Esse calor presu- Para que a tectônica de placas funcione, o materiallitosférico
;nivelmente acumulado através do tempo causaria a formação que é consumido na zona de subducção deve ser reciclado no
c!~protuberâncias quentes no manto sob o supercontinente. Es- manto e, por fim, retomar à superfície à medida que a nova li-
protuberâncias soergueram a Pangéia (levemente) e foram tos fera é criada ao longo dos centros de expansão das dorsais
sponsáveis por sua deriva numa espécie de "escorregamento mesoceânicas. Qual a profundidade que esse processo de reci-
do solo" das suas porções situadas no topo. Essas forças gravi- clagem alcança no manto? Ou seja, onde é o limite inferior do
:li ionais continuaram a controlar a expansão do assoalho oceâ- sistema de convecção do manto?
nico à medida que as placas deslizavam morro abaixo a partir A maior profundidade que pode ser alcançada é de cerca de
das cristas da Dorsal Mesoatlântica. Os terremotos que algu- 2.900 km abaixo da superfície externa da Terra, onde um limi-
lias vezes ocorrem no interior das placas mostram evidências te abrupto separa o manto do núcleo. O líquido rico em ferro
diretas da compressão que elas sofrem por ação dessas forças abaixo desse limite núcleo-manto é muito mais den o que a ro-
de "empurrão" da dorsal mesoceânica. chas sólidas do manto, prevenindo qualquer intercâmbio signi-
Como você pode perceber a partir dessa breve discussão, as ficativo de material entre as duas camadas. De se modo, pode-
forças que controlam a tectônica de placas provavelmente en- mos imaginar um sistema de convecção "total do manto" em
'."olvem diversos tipos de interações. Todas são manifestações que todo o material das placas circula por ele. atingindo o limi-
da convecção do manto, no sentido de que envolvem matéria te manto-núcleo (Figura 2.17a).
aquecida que ascende em um local e matéria resfriada que Nos primórdios da teoria da tectônica de placas, no entanto,
afunda em outro (Figura 2.16). Embora muitas questões per- muitos cientistas estavam convencidos de que a reciclagem das
maneçam abertas, podemos ter uma certeza razoável de que: placas oconia nos níveis menos profundo do manto. A evidên-
1) as placas exercem um papel ativo nesse sistema e (2) as for- cia é fornecida pelos tenemotos de foco profundo que marcam
:as associadas com as lascas mergulhantes e as cristas elevadas o consumo de placas litosféricas em zonas de subducção. A
são provavelmente os fatores mais importantes para governar as profundidade máxima desses tenemotos é variável de acordo
raxas de movimento das placas. Os cientistas estão tentando re- com a zona de subducção, dependendo de quão fria estão as
"olver essa e outras questões levantadas nessa discussão por porções mergulhantes da placa, mas os geólogos descobriram
70 ara Entender a Terra

(a) Convecção total do manto (b) Convecção estratificada

Litosfera oceânica

o limite próximo a 700 km separa


os dois sistemas de convecção.
Manto inferior

A convecção do manto envolvida


na tectônica de placas circula em
níveis tão profundos quanto o do
limite núcleo-manto. Núcleo externo
--------------t-------
Convecção do manto inferior mais
lenta que a do manto superior.
Figura 2.17 Modelos e duas hipóteses competidoras para o sistema de convecção do manto.

que nenhum terremoto estava ocorrendo abaixo de aproxi- ir até profundidades tão grandes quanto o limite núcleo-manto.
madamente 700 km. Mais ainda, as propriedades dos terremo- A partir dessa evidência, a maioria dos cientistas concluiu que
tos nessas grandes profundidades indicaram que as lascas mer- a reciclagem das placas OCOITepor meio de convecção que afe-
gulhantes estavam encontrando material mais rígido que dimi- ta o manto inteiro, mais do que convecção estratificada.
nuía e, talvez, até bloqueava a progressão da descida.
Com base nessas e em outras evidências, os cientistas concluí-
Qual é a natureza das correntes de convecção
ram que a convecção pode ser dividida em duas camadas: um sis-
tema do manto superior nos primeiros 700 km de profundidade,
ascendentes?
onde a reciclagem da litosfera ocorre, e um sistema do manto in- A convecção do manto implica que aquilo que desce deve subir.
ferior, de 700 km de profundidade até o limite núcleo-manto, on- Os cientistas aprenderam muito a respeito das COITentesde con-
de a convecção é muito mais lenta. De acordo com essa hipótese, vecção descendentes porque elas são marcadas por estreitas zo-
chamada de "convecção estratificada", a separação entre os dois nas de litosfera fria mergu1hante que pode ser detectada por on-
i temas mantém-se porque o sistema superior é constituído de das de terremoto. E o que se poderia dizer sobre as COITentesde
rochas mais leves que as do inferior e, assim, flutua no topo, da convecção ascendentes de material do manto necessárias para
mesma maneira que o manto flutua no núcleo (Figura 2.17b). equilibrar a subducção? Existem zonas de ascensão de material
A maneira de testar essas duas hipóteses em competição é mantélico em forma de camadas diretamente abaixo das dorsais
procurar por "cemitérios litosféricos" abaixo das zonas conver- mesoceânicas? A maioria dos cientistas que estudam o assunto
gentes. onde placas antigas mergulharam em subducção. A li- pensa que não. Em vez disso, acredita que as correntes ascen-
to fera antiga consumida é mais fria que o manto circundante e, dentes são mais lentas e espalhadas sob regiões mais largas. Es-
de: e modo. pode ser "percebida" com o uso de ondas sísmicas sa visão é consistente com a idéia, discutida antes, de que a ex-
produzidas por terremoto (do mesmo modo que os médicos pansão do assoalho oceânico é um processo mais passivo: pra-
u am onda de ultra-som para examinar nosso corpo). Além ticamente em qualquer lugar onde você afastar as placas, vai ser
dis o. de\"eria ha\"er muitas delas lá embaixo. A partir do conhe- gerado um centro de expansão.
irnento do mo\"irnento das placas no passado, podemos esti- Existe, no entanto, uma grande exceção: um tipo de COITen-
mar que. apenas desde a fragmentação da Pangéia, a 1itosfera te ascendente em forma de jato, chamado de pluma do manto
reciclada de \"olta para o manto totaliza uma área equivalente à (Figura 2.18). A melhor evidência para as plumas do manto
da superfície terrestre. Certamente, os cientistas encontraram vem de regiões de vulcanismo intenso e localizado (chamadas
regiões de material mai frio no manto profundo sob as Améri- de pontos quentes), como o HavaÍ, onde enormes vulcões estão
cas do orte e do Sul, o Leste da Ásia e outros sítios adjacentes sendo formados no meio de placas, distantes de qualquer cen-
aos limites de colisão de placas. Essas zonas ocorrem como ex- tro de expansão. As plumas são entendidas como cilindros fi-
tensões de lascas litosféricas descendentes e algumas parecem nos, de menos de 100 km de diâmetro, de material que ascende
CAPíTULO 2 • Tedônica de Placas: a Teoria Unificadora ~

Plumas finas de material


que ascende rapidamente Figura 2.18 Um modelo da hipótese da
a partir do manto inferior. pluma do manto.

:apidamente, a partir do manto profundo, talvez formado em muitos esforços para falseá-Ia, de modo que os geólogos a tra-
~ões muito quentes próximas do limite núcleo-manto. As tam como fato .
..,Jumas do manto são tão intensas que podem literalmente for- A pergunta que permanece é: por que a tectânica de placas
::nar buracos nas placas e extravasar grandes volumes de lava. não foi descoberta mais cedo? Por que a comunidade científica
_-\5 plumas podem ser responsáveis pelos maciços derrames de demorou tanto para mudar do ceticismo a respeito da deriva
~ya - com milhões de quilômetros cúbicos - encontrados em continental para a aceitação da teoria da tectônica de placas? Os
:ugares como a Sibéria e o Planalto Colúmbia, no leste de Was- cientistas trabalham com diferentes estilos. Suas mentes particu-
::llngton e Oregon (EUA). Alguns desses "derrames" de lavas larmente inquiridoras, desinibidas e sintetizantes fazem com
-"oramtão grandes e ocorreram tão rapidamente que podem ter que, freqüentemente, sejam os primeiros a perceber as grandes
illudado o clima da Terra e aniquilado muitas formas de vida verdades. Embora sua percepção comumente possa mostrar-se
:=ID eventos de extinção em massa (ver Capítulo 1). Veremos o
falsa (pense nos erros que Wegener cometeu na proposição da
,,-ulcanismo de plumas com mais detalhes no Capítulo 6.
deriva continental), esses visionários, na maioria das vezes, são
A hipótese da pluma foi primeiramente proposta por um
os primeiros a enxergar as grandes generalizações da ciência.
dos fundadores da tectônica de placas, W. Jason Morgan, da
Merecidamente, eles são os de que a história se lembra.
Lniversidade de Princeton, em 1970, logo após o estabeleci-
A maioria dos cientistas, no entanto, procede mais cautelo-
mento dessa teoria. Como outros aspectos do sistema de con-
';ecção do manto, no entanto, as observações sobre as correntes samente e espera um lento processo de coleta de evidências que
de convecção ascendentes são indiretas e a hipótese das plumas dêem suporte à teoria. A deriva continental e a expansão do as-
permanece bastante controvertida. soalho oceânico foram lentamente aceitas porque as idéias au-
daciosas foram apresentadas muito antes das firmes evidências.
Os oceanos tiveram de ser explorados, novos instrumentos pre-
cisaram ser desenvolvidos e utilizados e foi necessário que o
oria da tectônica de placas e o mar profundo fosse perfurado para ver o que existia lá antes
etodo científico que a maioria deles pudesse ser convencida. Hoje, muitos cien-
tistas ainda estão esperando ser convencidos da idéias a respei-
to de como o sistema de con 'ecção realmente funciona.
~o capítulo anterior, abordamos o método científico e as ma-
neiras por meio das quais ele guia o trabalho dos geólogos. No
ontexto do método científico, a tectônica de placas não é um
dogma, mas uma teoria confirmada,17 cuja força reside em sua
simplicidade, generalidade e consistência com muitos tipos de I RESUMO
observações. As teorias podem ser sempre revertidas ou modi-
ficadas. Como vimos anteriormente, várias hipóteses competi- o que é a teoria da tectônÍCa de placas? De acordo com a
doras têm sido desenvolvidas acerca do modo como a convec- teoria da tectônica de placas, a litosfera está fragmentada em
ção gera a tectônica de placas. Mas a teoria da tectônica de pla- cerca de 12 placas rígidas que se movimentam. Três tipos de li-
cas - como as teorias da idade da Terra, da evolução da vida e mites de placas são definidos pelo movimento relativo das mes-
da genética - explica muito e tão bem, que tem sobrevivido a mas: divergente, convergente e falha transformante.

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