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Jacques Derrida - Memórias do Cego
Seleção de fragmentos e tradução de Carlos Fisgativa

- Devo apenas ouvir? ou observar? ou olhar para você em silêncio me mostrando os desenhos?

- Ambos, mais uma vez, ou entre os dois. Farei com que você observe que a leitura não procede de outra forma.
Ela escuta olhando. Eis uma primeira hipótese: o desenho é cego, ou então o artista é cego. Como tal e
no seu próprio tempo, a operação do design teria algo a ver com a cegueira. Segundo esta hipótese
abocular (a cegueira (aveugle) vem de ab oculis: não dos olhos ou através dos olhos, mas sem os olhos),
resta ouvir isto: o cego pode ser um vidente, às vezes tem a vocação de um visionário. Segunda hipótese,
implantação do olho, implantação de um ponto de vista sobre o outro: o desenho de um cego é o
desenho de um cego. Genitivo duplo. Não há aí nenhuma tautologia, mas uma fatalidade do autorretrato.
Cada vez que um cartunista se deixa fascinar pela cegueira, cada vez que faz da cegueira o tema de seus
desenhos, ele projeta, sonha ou alucina a figura de um cartunista ou, às vezes, mais precisamente, de
um cartunista. Mais precisamente, passa a representar uma força de desenho no trabalho, o próprio ato
de desenhar. Invente o desenho. A linha não paralisa então na tautologia que dobra o mesmo no mesmo.
Pelo contrário, ele é atormentado pela alegoria, por esse estranho autorretrato do desenho liberado ao
olhar e olhar do outro. Legenda de todas as cenas de cegueira, então: a origem do desenho (p. 10).

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Veja os cegos de Coypel. Todos trazem as mãos para a frente, o seu gesto oscila no vazio entre o
agarrar, a apreensão, a oração e a súplica (p. 12).
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Um desenhista não pode deixar de estar atento ao dedo e ao olho, especialmente ao que toca o olho, ao
que o dedo procura para finalmente revelar. Às vezes, Jesus cura os cegos com um simples toque, como
se bastasse desenhar no espaço o contorno das suas pálpebras para lhes dar visão (pp. 15-16).

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O cego de Lucas Leyde é menos passivo. Por si mesmo, por sua própria mão, ele terá atraído os olhos,
terá mostrado sua cegueira para Cristo. Se presenta a sí mismo, como si un ciego hiciera su retrato, el
autorretrato de un ciego contando su propia historia en primera persona, habrá indicado, localizado,
circunscrito la invidencia de su mano derecha girada hacia su rostro, señalando con el indice hacia el
olho direito. Virado em direção ao seu olho, o gesto do dedo mostrando, mas não tocando seu próprio
corpo. A uma distância conveniente ou respeitosa, ele desenha uma espécie de autodeitico sombrio,
noturno, mas seguro. Flexão estranha do braço ou reflexo da dobra. Autoafeição silenciosa, retorno a si
mesmo, relacionamento consigo mesmo sem visão e sem contato (p. 16).
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Mas Platão os representa como imóveis. Nunca levantam as mãos para a sombra (skia) ou para a luz
(phos), para as silhuetas ou imagens que se desenham na parede. Na direção dessa fotografia skia-o,
diante dessa escrita de sombra ou de luz, eles não se aventuram, como só o homem de Coyppel, com
as mãos à frente (p. 22).
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Derrida, Jacques (1990) Mémoires d'aveugle. L'autoportrait e outras ruínas. Paris, Editions de la Réunion des Musées
Nationaux.
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Mas o abismo do isolamento também pode permanecer líquido, como a substância do olho, como as
águas de um Narciso que não veria nada além de si mesmo, nada ao seu redor. O isolamento
especular exige então a insularidade da imagem ou ainda, para reflectir sobre o “abandono” do cego
e a sua solidão luto, a imagem da ilha […] (p. 46).
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Dou-lhes o apelido: o transcendental e o sacrificial. A primeira seria a condição invisível de


possibilidade do desenho, do próprio artista, do desenho do desenho. Nunca será temático. Não pode
ser colocado ou tomado como objeto representável de um desenho. Para se tornar tema do primeiro,
do segundo, nomeadamente o acontecimento sacrificial, o que acontece aos olhos, a história, o
espetáculo ou a representação do cego, digamos que refletirá essa impossibilidade. Representará
isso irrepresentável. Entre os dois, no rebanho dos dois, um repetindo o outro sem se reduzir a ele, o
acontecimento pode dar origem à palavra da história, ao mito, à profecia, ao messianismo, ao romance
familiar ou à cena da vida quotidiana, dotando assim o desenho dos seus objectos ou espectáculos
temáticos, das suas figuras, dos seus heróis, das suas pinturas de cegos (p. 46).
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O primeiro aspecto, vamos dar esse apelido, eu veria na perspectiva do ato gráfico. No momento do
entalhe original (desgaste), na força de tração do traço, no momento em que a ponta da ponta da mão
(do próprio corpo em geral) avança em direção ao contato com a superfície, a inscrição de o inscritível
não é visto (pp. 48-50).
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Por um lado, então, a anamnese: a anamnese da própria memória. Baudelaire relaciona a invisibilidade
do modelo à memória que este terá trazido. “Traz” a invisibilidade à memória. E o que o poeta diz do
Cego é tão convincente que fala da imagem gráfica, do desenho representativo (p. 50).

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[…] como se ver fosse proibido para desenhar, como se só se desenhasse na condição de não ver,
como se o desenho fosse uma declaração de amor destinada ou dirigida à invisibilidade do outro, ou
pelo menos que seja não nasce de ver o outro roubado pelo ver (p. 54).
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Por outro lado, e na própria anamnese, há a amnésia: o órfão da memória, pois o invisível também
pode perder a memória, como se perde os pais. Seguindo um caminho diferente que possivelmente
retorna à mesma coisa, o desenhista se dedicaria a essa outra invisibilidade, se dedicaria a ela como
um sapateiro se dedica a ela e se tornará uma isca fascinante para a fera encurralada que o olha (p.
56) .
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Vejamos agora o segundo aspecto. Não é um segundo aspecto ou secundário. Aparece ou, sobretudo,
desaparece sem demora. Vou apelidá-lo de retirada ou eclipse, o desaparecimento diferencial da linha.
Viemos do interesse pelo ato de desenhar, pelo tratamento da linha, o que pensar agora da linha uma
vez traçada? Não sobre a sua talha (desgaste) e o percurso inaugural do traçado, mas sobre o que
resta? Um traço não é visto. Não deve ser visto (por isso não dizemos: “não deve ser visto”) na
medida em que o que resta de espessura colorida tende a esgotar-se para marcar a única borda de
um contorno: entre o interior e o exterior de um contorno. figura (pág. 58).

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Um limite linear, aquele de que falo, nada tem, portanto, de ideal nem de inteligível: dividindo-se na
sua elipse, a partir daí afasta-se de si mesmo, não se estabelece em nenhuma identidade ideal (p. 59).
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É como uma ruína que não vem antes da obra, mas permanece produzida, desde a origem até o
advento e a estrutura da obra. No começo houve ruína. Na origem vem a ruína, é o que vem desde o
início, até a origem. Sem promessas de restauração. Esta dimensão do simulacro ruinoso nunca
ameaçou, pelo contrário, a emergência de uma obra (p. 68-69).

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A ruína não surge como um acidente de um monumento que antes estava intacto. Desde o início há
ruína. Ruína é o que vem à imagem aqui à primeira vista. A ruína é o autorretrato, aquele rosto
desfigurado como memória de si mesmo, aquilo que permanece ou retorna como um fantasma, pois
ao primeiro olhar sobre si mesmo uma presença é eclipsada (p. 72).

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