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Editor Executivo Glaucio Marafon
Coordenadora Administrativa Elisete Cantuária
Coordenadora Editorial Silvia Nóbrega
Assistente Editorial Thiago Braz
Coordenador de Produção Mauro Siqueira
Supervisor de Revisão Elmar Aquino
Revisão João Martorelli e Iris Figueiredo
Capa Júlio Nogueira
Projeto e Diagramação Angel Cabeza
CATALOGAÇÃONA FONTE
UERJ/REDE SIRIUS/NPROTEC
ISBN 978-85-7511-463-6
aos índios Canociros, diz a autora que "ao longo de todo oséculo XIX
recusaram-se a receber missionários ouse converteremeresistiram atodas
astentativas de conquista, continuando a atacar e matar colonos" (1998, n
400).Recusarse areceber um missionário significava negar apossibilidade
da "converso" aos principios do Cristianismo, àquela época visto como
porta de acesso à civilização. Era insistir em permanecer "pagão',seguindo
sua própria orientaço religiosa domundo. Mais do que recusar o contato,os
CanoeiroS atacavame matavam colonos,partiam para a ofensiva.Ora, o que
justificaria essa atitude dos Canoeiros se não a vontade de afirmar sua pró
pria leitura do mundo diante dos arautos da civilização? Tão ativos eram os
indios em suas ofensivas que "...] por algum tempo, parecia que os índios, e
não os goianos, iriam reivindicar Goiás aos portugueses, especialmente no
norte" (1998, p. 401), afirma Karasch.
Em artigo anterior (Henrique, 2010), relatei fato curioso narrado pelo
general Coutode Magalhães em sua obra Viagem ao Araguaia, envolvendo estes
mesmos índios. Conta ele que na década de 1840, o povo de Amaro Leite, em
Goiás, costumava se reunir na igreja matriz do povoadocom seu pároco. Certo
dia, os devotos perceberam que enquanto rezavam a ladainha dentro da igre
ja, ouviam-se vozes respondendo de fora o "ora pro nobis!". Mais espantados
ficaram quando, ao olhar fora da igreja, a fim de descobrir que vozes eram
aquelas, perceberam que "eram os Canoeiros que depois de haver cercado a
igreja, se divertiam em acudir a reza tirada pelos cristãos" (Couto de Maga
Ihãæs, 1975,p. 112). Para Coutode Magalhães, isto era uma prova do "pouco
caso com que por vezes nos tratam.Neste caso, chanmoatenção para o fato
de que os índios Canoeiros se apropriaram da linguagem dos brancos para
manifestar seu desprezo ou seu "pouco caso" pela religiosidade cristä. Em
outras ocasiões, eles costumavam dirigir "motejos aos viajantes e isso, se não
em português, pelo menosem português inteligível". Por fim, negavamse até
mesmo a pronunciar ou a falar corretamente os vocábulos de sua língua, "vis
toque entre eles écrime capital ensinarnos alingua" (Couto de Magalhäes,
1975, p. 112).
Por atitudes como estas,de ataques fisicos e simbólicos contra os não
indios, os Canoeiros receberam do presidente da provincia de Goiás, por
volta de 1880, o titulo de a gente 'mais feroz da província' (Karasch, 1995,
p. 400). As vozes dos Canoeiros diziam muito mais do que o "ora pro no
bis"; queriam mesmo quebrar o silêncio da oficina etnográfica, afirmando a
Introduço: protagonismo indigena, sem forçar a mão | 21