CUNHA, Manuela Carneiro da (org.). História dos índios no Brasil.
São Paulo: Companhia das Letras, Secretaria Municipal de Cultura, FAPESP, 1992.
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“ Ao chegarem às costas Essa citação destaca a
brasileiras, os navegadores percepção dos portugueses pensaram que haviam atingido o assim que chegaram no p.9 paraíso terreal: uma região de território brasileiro, referente eterna primavera, onde se vivia à ideia de paraíso terreal. comumente por mais de cem anos em perpétua inocência.”
“A cada lugar, o nome do santo Essa citação mostra que os
do dia: Todos os Santos, São portugueses exerciam uma Sebastião, Monte Pascoal. Antes espécie de "poder" sobre o p. 9 de se batizarem os gentios, Brasil, nomeados por sua batizou-se a terra encontrada. visão religiosa e De certa maneira, desta forma, o eurocentrista. Brasil foi simbolicamente criado.”
“[...] a história da metrópole não Após 1492 irá mudar
p. 9 é mais a mesma após 1492.” completamente a relação cultural e social existente naquele lugar.
“Sabe-se que entre de uns 35 As condições do nível do
mil a cerca de uns 12 mil anos mar podem ter influenciado atrás, uma glaciação teria, por as migrações humanas entre intervalos, feito o mar descer a a Ásia e a América no uns 50 m abaixo do nível atual. período pré-colombiano. p. 10 A faixa de terra chamada Beríngia teria assim aflorado em vários momentos deste período e permitido a passagem a pé da Ásia para a América.”
“Sabe-se pouco da história Há uma falta de
indígena: nem a origem, nem as conhecimento sobre a cifras de população são seguras, história dos indígenas, muito menos o que realmente revelando que, apesar dos aconteceu. Mas progrediu-se, no avanços dos estudos, ainda entanto: hoje está mais clara, existem muitas lacunas a p. 11 pelo menos, a extensão do que serem preenchidas. A autora não se sabe. Os estudos de destaca fragmentos para casos contidos neste volume são compreender essa história. fragmentos de conhecimento que permitem imaginar mas não preencher as lacunas de um quadro que gostaríamos fosse global.” “A maior dessas armadilhas é Enxergavam as sociedades talvez a ilusão de primitivismo. indígenas como primitivas Na segunda metade do século ou preservadas no tempo, XIX, essa época de triunfo do refletindo uma perspectiva p.11 evolucionismo, prosperou a ideia eurocêntrica e evolucionista de que certas sociedades teriam predominante no século XIX. ficado na estaca zero da evolução [...]”
“Povos e povos indígenas O desaparecimento da
desapareceram da face da terra população indígena foi como consequência do que hoje resultado do contato entre se chama, num eufemismo as sociedades do antigo e envergonhada "o encontro" de novo mundo, como por sociedades do Antigo e do Novo exemplo a passagem das Mundo. Esse morticínio nunca doenças dos europeus para p. 12 visto foi fruto de um processo os indígenas. Além disso, complexo cujos agentes foram ocorreu a exploração por homens e microorganismos mas meio do capitalismo cujos motores últimos poderiam mercantil. ser reduzidos a dois: ganância e ambição, formas culturais da expansão do que se convencionou chamar o capitalismo mercantil.”
“As epidemias são normalmente Nesse trecho destaca a
tidas como o principal agente da importância das epidemias depopulação indígena [...] como o principal fator epidemiológica era, com efeito responsável pela diminuição p. 12 favorável aos europeus, na da população indígena. América, e era-lhes desfavoráveis na África, os europeus morriam como moscas; aqui eram índios que morriam [...]”
“Não foram só os Outros fatores também
microorganismos os contribuíram para os responsáveis pela catástrofe problemas enfrentados demográfica da América. O pelos povos indígenas das exacerbamento da guerra Américas. Diversos indígena provocado pela sede elementos, como a de escravos, as guerras de intensificação das guerras conquista e de apresamento em indígenas motivadas pela que os índios de aldeia eram busca por escravos, as p. 13 e alistados contra os índios ditos guerras de conquista e 14 hostis, as grandes fomes que apresamento que envolviam tradicionalmente acompanham conflitos entre diferentes as guerras, a desestruturação grupos indígenas, as social, a fuga para novas regiões grandes fomes decorrente e das quais se desconheciam os a migração para outras recursos ou se tinha de enfrentar regiões. os habitantes, a exploração do trabalho indígena, tudo isto pesou decisivamente na dizimação dos índios.”
“As estimativas de população O quadro aponta estimativas
aborígine em 1492 ainda são populacionais dos povos assunto de grande controvérsia. indígenas em 1492, p. 14 Para que se tenha uma ideia das ressaltando a variedade de cifras avançadas, adapto aqui cifras propostas por um quadro de Denevan (1976:3), diferentes estudiosos. que por sua vez adapta e completa Steward (1949:656)”
“Diga-se de passagem, sabe-se Embora haja uma
ainda menos da população da quantidade significativa de Europa ou da Ásia na mesma dados e estudos sobre a época: a América é até bem população das Américas servida desde os trabalhos de pré-colombianas, sabemos p. 14 demografia histórica da menos sobre a população chamada escola de Berkeley, da Europa e da Ásia. A cujos expoentes principais foram escassez de informações Cook e Borah. “ sobre outras regiões do mundo na mesma época.
“Durante o primeiro meio-século, Capitalismo mercantil.
os índios foram sobretudo parceiros comerciais dos p. 15 europeus, trocando por foices, machados e facas o pau-brasil para tintura de tecidos e curiosidades exóticas como papagaios e macacos, em feitorias costeiras.”
“Não eram mais parceiros para Perspectiva indígena sobre
escambo que desejavam os a presença e as intenções colonos, mas mão-de-obra para dos colonizadores europeus as empresas coloniais que na América. O que resultou incluíam a própria reprodução da na exploração dos povos p. 15 mão-de-obra, na forma de indígenas. canoeiros e soldados para o apresamento de mais índios: problema estrutural e não de alguma índole ibérica.”
“O resultado paradoxal dessa Com a exploração dos
postura "politicamente correta" índios obteve vítimas do foi somar à eliminação física e sistema mundial, política e p. 18 étnica dos índios e sua de práticas que os eliminação como sujeitos destruíram. históricos.”
“A percepção de uma política e Uma relação entre política e
de uma consciência histórica em consciência histórica. Para que os índios são sujeitos e não os índios é algo comum esta p. 18 apenas vítimas, só é nova visão de mundo e história. eventualmente para nós. Para os índios, ela parece ser costumeira.”
“Assim também a etno-história Destaca-se a maneira de
do contato é amiúde contada como a história do contato como uma iniciativa que parte entre indígenas e dos índios [...] ou até como uma colonizadores. As p. 19 empresa de 'pacificação dos sociedades indígenas brancos’ [...].” pensaram no que ocorria, refez uma história do mundo e em suas escolhas.
“Os nossos livros de história se destaca-se a importância da
iniciam em 1500. Isso não é só memória e da identidade desvantagem: em outros histórica para as sociedades países da América Latina, o indígenas. A autora revela a culto a uma ancestralidade necessidade de reconhecer p. 20 pré-colombiana passa em geral e valorizar o passado sem por uma vasta mistificação, que distorcer sua história. dissolve o passado e portanto a identidade indígena em um magma geral”
“Durante quase cinco séculos, Essa citação reflete uma
os índios foram pensados como mudança significativa na seres efêmeros, em transição: forma como as sociedades transição para a cristandade, a indígenas são percebidas ao civilização, a assimilação, o longo do tempo, buscando desaparecimento. Hoje se sabe uma abordagem mais justa e p. 21 que as sociedades indígenas respeitosa. são parte de nosso futuro e não só de nosso passado. [...] Resta esperar que as relações que com elas se estabeleçam a partir de agora sejam mais justas: e talvez o sexto centenário do descobrimento da América tenha algo a celebrar.”