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O DIREITO PENAL DO INIMIGO COMO MECANISMO NO COMBATE ÀS

DROGAS NO BRASIL

Gabrielle Artemísia Lobo Cordeiro Muniz1


Noemi da Silva2

RESUMO: O Direito Penal do Inimigo surgiu na Alemanha, com a visão de Gunther


Jakobs, como alternativa para prevenir a ocorrência de certos crimes, uma vez que
considera determinadas pessoas “inimigas da sociedade”, de forma que estas não recebem
as mesmas garantias e tem um endurecimento das penas, em relação àqueles considerados
cidadãos pelo Direito Penal. A Lei 11.343/2006 (Lei Antidrogas) estabelece as políticas
públicas para a repressão à produção e ao tráfico ilícito de substâncias entorpecentes e
para o enfrentamento dos crimes relacionados a essas atividades. Neste estudo, dois
princípios serão apontados e avaliados, a saber: o Princípio da Igualdade, que foi
consagrado pela Constituição brasileira, no artigo 5°, I, e estabelece que todos os seres
humanos nascem iguais e, desta forma, devem possuir as mesmas oportunidades de
tratamento; e o Princípio da Proporcionalidade, que assenta a ideia de que as sanções
devem ser proporcionais à gravidade dos delitos praticados. Dentro desse contexto, este
trabalho propõe-se a analisar o Direito Penal do Inimigo na ótica da lei 11.343/2006, bem
como, a vigência das normas em estudo.

Palavras-chave: Direito penal do inimigo. Lei de drogas. Usuário. Tráfico.

ABSTRACT: The Criminal Law of the Enemy emerged in Germany, with the vision of
Gunther Jakobs, as an alternative to prevent the occurrence of certain crimes, since it
considers certain people to be “enemies of society”, so that they do not receive the same

1
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA.

2
Graduanda em Direito pelo Centro Universitário UNA.
guarantees and have a hardening of the sentences, in relation to those considered citizens
by the Criminal Law. Law 11.343/2006 (Anti-Drug Law) establishes public policies for
the repression of the production and illicit trafficking of narcotic substances and for the
confrontation of crimes related to these activities. In this study, two principles will be
pointed out and evaluated, namely: the Principle of Equality, which was enshrined in the
Brazilian Constitution, in article 5, I, and establishes that all human beings are born equal
and, therefore, must have the same treatment opportunities; and the Principle of
Proportionality, which is based on the idea that sanctions must be proportional to the
seriousness of the crimes committed. Within this context, this work proposes to analyze
the Criminal Law of the Enemy from the perspective of law 11.343/2006, as well as the
validity of the rules under study.

Keywords: Criminal law of the enemy. Drug law. User. Traffic.

SUMÁRIO: 1) Considerações Iniciais. 2) Direito Penal do Inimigo. 3) Princípios


Constitucionais na diferenciação do “cidadão” e o “inimigo”. 3.1) Princípio da Igualdade.
3.2) Princípio da Proporcionalidade. 4) Análise em síntese, do usuário e o traficante da
LEI Nº 11.343/2006. 5) Reflexos do Direito Penal do Inimigo na Lei de Drogas. 5.1)
Aplicação do Direito Penal do Inimigo na Lei de Drogas. 6) Conclusão. 7) Referências
Bibliográficas.

1) Considerações iniciais

O presente trabalho tem como objetivo analisar a teoria do Direito Penal do Inimigo e a
Lei nº 11.343/2006 (Lei Antidrogas), como mecanismo no combate às drogas no Brasil.

Será analisada a teoria proposta, os princípios da igualdade e proporcionalidade, e como


estes têm aplicabilidade no direito penal do inimigo. Far-se-á breve síntese da Lei
Antidrogas, visto à guerra das drogas no Brasil, e a aplicação do Direito Penal do Inimigo
com a Lei Antidrogas.
Para tanto, será utilizado o método dedutivo, visto que a pesquisa será baseada em
conhecimentos teóricos já existentes para embasar a análise da conclusão. O
procedimento será bibliográfico e documental, pois além de métodos científicos utilizará
fontes de jornais, reportagem e internet.

2) Direito penal do inimigo

O conceito do direito penal do inimigo foi introduzido, pela primeira vez, no ano de 1985,
pelo jurista alemão Gunther Jakobs. Os debates foram retomados após os atentados de:
11 de setembro de 2001, ocorrido em Nova York; 11 de março de 2004, ocorrido no metrô
de Madrid; e 07 de julho de 2005, ocorrido em Londres. (HABIB, 2019). Entretanto,
somente em 2003, na obra “Direito Penal do Inimigo – noções e críticas”, Jakobs
desenvolveu a tese afirmativa e legitimadora, sustentando a possibilidade do direito penal
do inimigo como parte do sistema jurídico penal. (PILATI, 2021)

Nesse sentido, de acordo com Zaffaroni:

Jakobs utilizou pela primeira vez a expressão para criticar o


endurecimento legislativo das últimas décadas, mas, a partir de 1999,
diante do ameaçador avanço dessa tendência, passou a defender a
mencionada necessidade de sua legitimação parcial como modo de
deter o crescimento do próprio direito penal do inimigo. Esta mudança
de fachada foi uma das causas da singular acidez do debate em torno
do tema. ( ZAFFARONI, 2007, p 156.)

Ainda, conforme Zaffaroni:

Para Jakobs, a pena cumpre a função de reafirmar a vigência da norma,


e essa função continuaria a ser cumprida no direito penal do cidadão,
enquanto no direito penal do inimigo deveria operar como um puro
impedimento físico. Não obstante, o autor reconhece que ambas as
funções estão sempre presentes na reação penal, pois, quando ao
terrorista, a contenção também serviria para reafirmar a vigência da
norma, ao passo que no caso do ladrão comum, como esta reafirmação
se traduz numa privação de liberdade, importa também um
impedimento para uma eventual reiteração do comportamento durante
o tempo de prisão. (ZAFFARONI, 2007. p 156.)

Assim, Jakobs divide o Direito Penal em: “o Direito Penal do cidadão” e “o Direito Penal
do Inimigo”. De acordo com tal divisão, o cidadão é a pessoa “comum” no âmbito do
direito, já o “inimigo” seria o delinquente habitual, com evidente periculosidade. Nessa
seara, Jakobs introduz sua teoria sustentando que o delinquente que infringir a norma se
torna inimigo do Estado, portanto, não deve ter os mesmos direitos resguardados, como
cidadão e como ser humano (Habib,2019).

Na visão de Jakobs, o direito penal do inimigo tem como base o funcionalismo, que tem
por finalidade proteger a vigência da norma jurídica e não o bem jurídico. Na sua
percepção, a sanção é um meio de coação, que tem por intuito restabelecer a vigência da
norma. (Habib,2019)

As normas são a estrutura da sociedade, ao qual o bem jurídico deve ser representado
como uma expectativa de garantia. Ao infringir a norma, causa um desequilíbrio entre a
solidez normativa e a expectativa da norma. Portanto, a sanção não serve para recompor
o bem jurídico, ou reparar os danos, mas serve como precaução de futuras lesões. Assim,
ao garantir as expectativas das normas, o bem jurídico é tutelado. (Habib,2019)

Segundo Rachel Cardoso, para Jakobs, os fundamentos jus filosóficos da sua teoria teriam
como base os autores contratualistas Rousseau, Fichte, Hobbes e Kant. Esses juristas
tinham como teses, “o delinqüente que infringe o contrato social não pode usufruir dos
benefícios do Estado”. Desse modo, Rachel Cardoso, faz uma distinção que:

Rousseau e Fichte, porém, entendem que qualquer indivíduo que


infringe a lei deixa de fazer parte do Estado, enquanto para Hobbes e
Kant apenas os autores de crimes graves devem ser excluídos. Jakobs
observa que seu pensamento assemelha-se mais com o entendimento
destes dois últimos filósofos: “Hobbes e Kant conhecem um direito
penal do cidadão – contra pessoas que não delinqüem de modo
persistente por princípio – e um direito penal do inimigo contra quem
se desvia por princípio. (CARDOSO,2011, p 34,35)

Desse modo, Jakobs conduz sua teoria que o delinquente, classificado para ele como
“inimigo”, ao infringir a norma se torna “inimigo” do Estado, não sendo por esse,
garantidor dos seus direitos. O Estado, por sua vez, puniria o “inimigo” de forma a
preservar a norma e, consequentemente, o bem jurídico tutelado.

Segundo ZAFFARONI, para Jakobs, as restrições de direito do “inimigo” deve se dar


antes da prática delituosa, visto o seu princípio de periculosidade. Seria uma contenção
imposta pelo o Estado de Direito, visto a quebra de confiança, a futura prática delituosa,
tendo em vista seu grau de periculosidade, conforme explica:

Jakobs argumenta que, “embora o tratamento com o inimigo seja a


guerra, trata-se de uma guerra rigorosamente delimitada”, em que só se
priva o inimigo do estritamente necessário para neutralizar seu perigo,
mas se deixa aberta a porta para seu retorno ou incorporação, mantendo
todos os seus demais direitos...propõe encerrar o direito penal do
inimigo num compartimento estanque para salvar o resto do direito
penal (do cidadão), ele também limitar o caráter de não pessoa do
inimigo quanto à intensidade da despersonalização.
(ZAFFARONI,2007, p 161)

Ademais, ZAFFARONI refuta essa contenção por negação de teóricos e práticos, que
“ninguém pode prever exatamente o que qualquer um de nós fará no futuro” e, ainda, “a
incerteza do futuro mantém em aberto o juízo de periculosidade até o momento em que
quem tem o poder de decisão deixe de considerá-lo inimigo”. Isto é, não se pode prever
o ato antes dele existir.

Ainda, segundo Kárita Souza, uma das críticas de Zaffaroni ao Direito Penal do Inimigo,
aduz que:

O tratamento de inimigo, dispensado aos seres humanos privados da


concepção de pessoas, provoca uma contradição entre a doutrina penal
e o conjunto de princípios do Estado constitucional de direito, visto que,
esse último não admite a despersonalização dos seres humanos nem
mesmo em estados de guerra. Esse posicionamento de aceitação do
conceito de inimigo pelo Estado de direito levaria a sua autodestruição,
pois implicaria em abandonar sua defesa pelos direitos individuais e a
sua regressão ao Estado de polícia e, por conseguinte, ao Estado
absoluto. Ao Estado seria permitida a privação ao direito de cidadania
do inimigo, porém essa permissão não sugere, ou pelo menos não
deveria sugerir, que lhe seja subtraída a condição de pessoa.
(SOUZA,2012, p 24)

Assim, entrando na ceara dos conceitos constitucionais e princípios, o tratamento ao


indivíduo deve se basear-se nos limites impostos por esses. A diferenciação do cidadão
e “inimigo” requer fundamentos no caso concreto, e não em um conceito abstrato, uma
vez que “dentro de um Estado de direito não será possível determinar quem são os
inimigos sem com isso reduzir as garantias de todos os cidadãos. ” Sendo que, “o
tratamento diferenciado com o objetivo de identificar os hostis ao Estado tem que ser
dirigido a todos, dado que não sabemos a princípio quem é o inimigo. ” (SOUZA, 2012,
p 27)

3) Princípios Constitucionais na diferenciação do “cidadão” e o “inimigo”

Primeiramente, é importante ressaltar que os princípios constitucionais são o ponto mais


importante do Ordenamento Jurídico, uma vez que tudo que lhes segue deve estar em
conformidade com seus preceitos. Ou seja, os princípios condicionam a interpretação das
outras normas jurídicas em geral.

Nesse sentido, ensina ATALIBA: "[...] princípios são linhas mestras, os grandes nortes,
as diretrizes magnas do sistema jurídico, apontam os rumos a serem seguidos por toda a
sociedade e obrigatoriamente a perseguidos pelos órgãos do governo (poderes
constituídos)". (ATALIBA, 2001, p 6-7)

A constituição da República Federativa do Brasil de 1988 traz alguns princípios, dentre


eles os princípios da igualdade e proporcionalidade. Observa-se a importância dos
princípios mencionados no ramo do Direito Penal, mais em especifico na aplicação na
Lei 11.343/2006, conforme, será analisado nos próximos subtítulos.

3.1) Princípio da igualdade

No que se refere ao princípio da igualdade, no direito penal Andrade aduz que “o princípio
da igualdade constitui um dos pilares do direito penal do Estado de Direito ou, se preferir,
do direito penal liberal, carreando valores fundamentais da Democracia. ” (ANDRADE,
2017)
No artigo 5°, caput, a Constituição brasileira de 1988 dispõe que todos são iguais perante
a lei, sem distinção de qualquer natureza. Esse princípio visa, além de assegurar a
igualdade de aptidões dos cidadãos perante a lei, limitar a atuação do legislador e do
aplicador da lei.

A Declaração Universal dos Direitos Humanos também estabeleceu em seu artigo 1º que
os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos.
Embora o princípio da igualdade vise assegurar a isonomia dos cidadãos perante a lei,
discriminações terão que haver, uma vez que as normas sempre farão distinção entre
pessoas e situações.

Para Fernando Capez:

As partes devem ter, em juízo, as mesmas oportunidades de fazer valer


suas razões, e ser tratadas igualitariamente, na medida de suas
igualdades, e desigualmente, na proporção de suas desigualdades. Na
execução penal e no processo penal, o princípio sofre alguma atenuação
pelo, também constitucional, princípio favor rei, postulado segundo o
qual o interesse do acusado goza de alguma prevalência em contraste
com a pretensão punitiva. (CAPEZ, 2008, P 19)

Neste contexto, em “análise do artigo 28 da Lei de Drogas em consonância com o referido


princípio. A Lei n. º 11.343/2006 prevê a figura típica do crime de adquirir drogas para
consumo pessoal, sedimentando quais as substâncias são consideradas ilícitas por
intermédio da Portaria do Ministério da Saúde. ” (ANDRADE,2017)

A Portaria Nº 344, de 12 de maio, de 1998, traz uma relação de substâncias e


medicamentos sujeitas a controle especiais, ou seja, substâncias consideradas lícitas. Ao
passo que aduz as substancias ilícitas, e as prejudicais a saúde, porém podem ser
adquiridas de forma lícitas, dentro dos requisitos da lei. Também aduz, algumas
substancias de uso prescrito no Brasil, ou seja, “determinam-se quais as drogas que são
permitidas para consumo e as proibidas, em outras palavras, o que é lícito ou ilícito,
quando ambas possuem potencialidade lesiva ao consumidor. ” (ANDRADE,2017)

Dark Andrade, menciona a citação de Saulo de Carvalho, que discorre “a ofensa ao


princípio da igualdade estaria exposta no momento em que se estabelece distinção de
tratamento penal (drogas ilícitas) e não-penal (drogas lícitas) para usuários de diferentes
substâncias, tendo ambas potencialidades de determinar dependência física ou psíquica.
A variabilidade da natureza do ilícito tornaria, portanto, a opção criminalizadora
essencialmente moral. ” (ANDRADE,2017)

Por outro lado, tem-se no princípio da igualdade, a máxima: “tratar os iguais como iguais
e os desiguais na medida de suas desigualdades”. Observa-se a leitura do art. 44 da Lei
de Droga, que “os crimes previstos nos arts. 33, caput, e §1º, e 34 a 37 desta Lei são
inafiançáveis e insuscetíveis de sursis, graça, indulto, anistia e liberdade provisória,
vedada a conversão de suas penas em restritivas de direitos”. (DIAS, 2013, p 63)

Ademais, mesmo aqueles cujas penas sejam compatíveis com as restritivas de direito não
será aplicado o benefício da conversão. Pela leitura do artigo 44 da Lei de Drogas “ao
indivíduo condenado pelo crime de tráfico é adotado um tratamento diferenciado, dotado
de generalidade e abstração. ” O que violaria o princípio da igualdade, visto que, deveria
ser analisado no caso concreto, “a pena que vai dar a concretude da gravidade do ato
praticado pelo agente e o tratamento a ser adotado pelo Estado”. (DIAS,2013 p 63,64)

Neste sentido, Mariah Dias trouxe uma decisão onde: “a Defensoria Pública da União,
em setembro de 2010, entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade contra as
restrições contidas no artigo 44 e §4º do artigo 33, da Lei 11.343/2006. Em decisão e por
votação de 6 a 4, os ministros do Supremo Tribunal Federal decidiram pela
inconstitucionalidade dos dispositivos, admitindo, portanto, ser passível de penas
alternativas os condenados por crime de tráfico, “caindo por terra a exclusiva aplicação
da pena privativa de liberdade e a previsão do regime prisional totalmente fechado”.
(DIAS,2013 p 64,65)

Portanto, o princípio da igualdade no direito penal, seria uma igualdade material, ou seja,
ser observado na máxima de iguais os iguais e desiguais os desiguais. “Quando as
situações são iguais, deve ser dado um tratamento igual, mas quando as situações são
diferentes é importante que haja um tratamento diferenciado. ” (DIAS, 2018)

3.2) Princípio da Proporcionalidade

O princípio da proporcionalidade tem como objetivo a busca pelo equilíbrio dos direitos
individuais no cunho social. Segundo Dirley da Cunha Júnior, a proporcionalidade “é um
importante princípio constitucional que limita a atuação e a discricionariedade dos
poderes públicos e, em especial, veda que a Administração Pública aja com excesso ou
valendo-se de atos inúteis, desvantajosos, desarrazoados e desproporcionais”. Ou seja, o
princípio regula a atuação do legislador e do aplicador da lei, em relação ao fato ou ato.
De acordo com Adriana Cortopassi, o princípio da proporcionalidade “se manifesta em
três máximas, ou subprincípios, quais sejam, adequação (ou idoneidade), necessidade e
proporcionalidade em sentido estrito. ” (CORTOPASSI, 2018, P 105). O subprincípio da
adequação (ou idoneidade) diz respeito à aptidão do Direito Penal para a proteção do bem
jurídico e se as medidas por ele adotadas, tanto na determinação das penas quanto nas
medidas de segurança impostas, são apropriadas para a consecução da finalidade
pretendida (CORREA, 1999).

Ainda, segundo Adriana Cortopassi, o subprincípio da necessidade diz respeito “a


determinação de que a constrição do direito ou bem constitucionalmente protegido que
tal medida entende indispensável será realmente necessário (CORTOPASSI, 2018, P
108).

O princípio da proporcionalidade em sentido estrito “impõe ao juízo de proporcionalidade


entre o delito praticado (ou injusto penal) e a definição da pena em abstrato pelo legislador
(em primeiro momento) e também entre o injusto e a aplicação da pena pelo juiz quando
da aplicação da norma penal estabelecida (em um segundo momento) (MIR PUIG, 2009).

No que se refere à aplicação do princípio da proporcionalidade, Mariah Dias indaga sobre


a violação desse na lei 11.343/2006, onde: “o legislador, no ímpeto repressivo, estipulou
a pena para aquele que financia ou custeia o crime de tráfico num patamar mínimo de oito
anos de reclusão (Brasil, 2006), conforme o artigo 36 da referida lei, sendo este superior
ao estipulado ao crime de homicídio, que afere seis anos. (BRASIL, 1940, art., 121) ”
(DIAS, 2013, p 63)

Outra referência a proporcionalidade aplicada pelo legislador foi a diferença à qual tratar
consumidor e traficante, na Lei 11.343/2006. Para Kárita Souza, “sobre os traficantes
passou a incidir o discurso político-jurídico do qual surge o “estereótipo do criminoso
corruptor da moral e da saúde pública”. Quanto ao consumidor recaiu o discurso médico-
psiquiátrico baseado no controle sanitarista, que ganhou ênfase na década de 50, e
difundiu o “estereótipo da dependência. ” (SOUZA, 2012, p 40)

Assim, no referente princípio, a aplicação da Lei 11.343/2006 deve observar a


proporcionalidade em sentido estrito, a fim de harmonizar ao caso, como na diferença de
usuário e traficante. Em relação aos demais crimes a proporcionalidade será aplicada no
grau de suas gravidades.

4) Análise em síntese, do usuário e o traficante da Lei nº 11.343/2006

A Lei nº 11.343, de 23 de agosto de 2006, também chamada de “Lei de Drogas ou Lei


Antidrogas”, dispõe sobre a instituição do “Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre
Drogas - Sisnad; prescreve medidas para prevenção do uso indevido, atenção e reinserção
social de usuários e dependentes de drogas; estabelece normas para repressão à produção
não autorizada e ao tráfico ilícito de drogas; define crimes e dá outras providências”
(Planalto).

A Lei Antidrogas traz uma diferenciação entre usuário, dependente e traficante, ao qual
não havia diferenciação na lei anterior, Lei nº 6.368/1976. O autor César Dario, faz uma
crítica que, embora a lei não seja perfeita, tem o mérito de trazer um novo sistema ao
estabelecer medidas e sanções diferentes para usuário, dependente e traficante, sendo que
as penas também serão diferenciadas do pequeno traficante, o eventual e o profissional
do tráfico.

Ainda, César Dário dispõe que:

É certo que apenas leis mais severas não inibem o tráfico de drogas,
problema não só do Brasil, mas de praticamente todos os países.
Somente com políticas públicas, voltadas para o social, principalmente
para a educação, é que o fenômeno do narcotráfico poderá ser reduzido.
Por outro lado, leis amenas incentivam a criminalidade, principalmente
a organizada, que acredita na impunidade. (DARIO, 2016, P 14)

Em síntese, a Lei Antidrogas tem seu bem jurídico difuso, que é a coletividade, ou seja,
não se pode mensurar o número de vítimas. Tipificado por crime comum, sendo norma
penal em branco, recepciona outra lei e portarias. Em suas disposições, expressa em seus
títulos, seu objeto é a prevenção e repressão ao uso indevido e ao tráfico de drogas ilícitas.
(BIDOIA,2019)

O art. 28 da Lei Antidrogas dispõe a figura do usuário, nos verbos: Adquirir, guardar, ter,
transportar e trazer, para uso pessoal de drogas ilícitas. Incorre nas penas de advertência,
prestação serviço à comunidade e medida socioeducativa. Caso seja descumprida essas,
a pena será admoestação verbal e multa. O Supremo Tribunal Federal (STF) já se
posicionou em entendimento, que as penas previstas no artigo supracitado seria uma
despenalização. (BIDOIA, 2019)

Como é o caso do Recurso Extraordinário n. 635.659, que teve início de julgamento em


agosto de 2015, no qual se discute a constitucionalidade do art. 28 da Lei de Droga,
propondo a descriminalização do referido artigo. “Até o momento já proferiram voto no
recurso três ministros do Supremo: Gilmar Mendes (relator), Edson Fachin e Luís
Roberto Barroso. O Ministro relator votou pela inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei
de Drogas e a favor da aplicação de punições administrativas para os usuários”. No qual
dispõe:

A incongruência entre a criminalização das condutas circunscritas ao


consumo pessoal de drogas e os objetivos estabelecidos pelo legislador
em relação aos usuários e dependentes, potencializada pela falta de
critérios de distinção entre o usuário e o traficante, evidencia a clara
inadequação da norma impugnada (art. 28) e a manifesta violação ao
princípio da proporcionalidade. (MARTINS, 2020)

Já para o ministro Luiz Edson Fachin, em seu voto dispõe:

Que não se insere na atribuição do Poder Judiciário a definição de


parâmetros para distinguir o usuário do traficante, pois se o legislador
editou a lei para tipificar como crime o tráfico, ao Poder Legislativo, no
exercício de suas definições, cabe definir parâmetros objetivos de
natureza e quantidade de drogas que devem ser levados em conta para
a diferenciação entre o uso e o tráfico. (MARTINS,2020)

Neste sentido, o voto de ministro Luís Roberto Barroso:

O consumo de pequena quantidade de maconha (droga apreendida com


o autor dos fatos) deve ser descriminalizado. Por isso, propôs a fixação
de um critério quantitativo de 25 gramas, destacando, na oportunidade,
que “o que se está estabelecendo é uma presunção de que quem esteja
portando até 25 gramas de maconha é usuário e não traficante.
(MARTINS,2020)

Portanto, é possível observar que embora ainda não tenha um posicionamento firmado, o
entendimento é que o usuário deve ser diferenciado do traficante, seja pela quantidade ou
natureza. De certo que, a descriminalização do porte para usuário dependerá dessa clara
distinção. Que segundo Martins, o Supremo Tribunal Federal possui forte tendência em
declarar a inconstitucionalidade do artigo 28 da Lei n. 11.343/2006, que criminaliza o
porte de drogas para consumo pessoal, estabelecendo um critério, a fim de diminuir a
discricionariedade judicial e uniformizar a aplicação da lei.

Já o art. 33 da Lei Antidrogas, refere às condutas ilícitas, o tráfico de drogas e equiparado,


mesmo que de forma gratuita, que “consiste em importar, exportar, remeter, preparar,
produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar,
trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas,
ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou
regulamentar. ” (MARIANO, 2016 p 73). As penas previstas são de 5 (cinco) à 15
(quinze) anos de reclusão e pagamento de 500 (quinhentos) à 1.500 (mil e quinhentos)
dias-multa.

São 18 (dezoito) verbos que tipificam a conduta do tráfico, fora os equiparados no


parágrafo 1º do artigo 33 da Lei 11 343/2006, que incorrerão na mesma pena do caput,
aqueles que:

I - importa, exporta, remete, produz, fabrica, adquire, vende, expõe à


venda, oferece, fornece, tem em depósito, transporta, traz consigo ou
guarda, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com
determinação legal ou regulamentar, matéria-prima, insumo ou produto
químico destinado à preparação de drogas;
II - semeia, cultiva ou faz a colheita, sem autorização ou em desacordo
com determinação legal ou regulamentar, de plantas que se constituam
em matéria-prima para a preparação de drogas;
III - utiliza local ou bem de qualquer natureza de que tem a propriedade,
posse, administração, guarda ou vigilância, ou consente que outrem
dele se utilize, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em
desacordo com determinação legal ou regulamentar, para o tráfico
ilícito de drogas.
IV - vende ou entrega drogas ou matéria-prima, insumo ou produto
químico destinado à preparação de drogas, sem autorização ou em
desacordo com a determinação legal ou regulamentar, a agente policial
disfarçado, quando presentes elementos probatórios razoáveis de
conduta criminal preexistente. (Incluído pela Lei nº 13.964, de 2019)

Verifica-se então que o tráfico de drogas é crime de ação múltipla, motivo pelo qual a
prática de qualquer dos verbos previstos no artigo mencionado, como exportar, remeter,
produzir, fabricar, adquirir, semear, cultivar, plantar, dentre outros, é suficiente para a
consumação da infração.
5) Reflexos do Direito Penal do Inimigo na Lei de Drogas

A “guerra às drogas” é um assunto recorrente no mundo e no Brasil não é diferente. As


políticas públicas em torno do tema se intensificam com o crescimento de usuário-doente
e tráfico de substancias ilícitas (drogas). O Brasil aderiu de forma definitiva “à política
criminal de drogas internacional – dando origem ao que Nilo Batista chama de “modelo
belicista” 188 de controle de drogas – começa após o Golpe de 1964 e a instauração da
Ditadura Militar, vale dizer, a partir da aprovação da Convenção Única de Entorpecentes
de 1961, pelo Decreto 54.216 de 27 de agosto de 1964.” (CARDOSO,2011, p 70). Desde
então, as discussões, em relação às teses político-jurídico e médico-jurídico, se tornaram
temas relevantes, até os dias de hoje. (CARDOSO, 2011)

Nesse âmbito, o Brasil adotou a ideia de “inimigo interno” ao se referir o traficante, como
estratégia ao combate as drogas. Segundo Rachel Cardoso:

A doutrina da segurança nacional foi assimilada pelo sistema de


segurança pública no Brasil, o qual passou a operar com um modelo
militarizado, que tem como base a ideia de eliminação do “inimigo
interno”. Essa doutrina e sua estratégia de guerra ao “inimigo interno”
ultrapassaram o período ditatorial, trazendo para o sistema penal e para
a política criminal de drogas seus conceitos, que sustentam o modelo de
repressão às drogas e ao traficante. (CARDOSO, 2011, p 77,78)

Nesse sentido, a Lei 5.726/71 renova a composição do art. 281 do código penal de 1940,
que tratava da matéria. Para Carvalho, “a real diferenciação concerne à graduação das
penas e à produção de novo modelo político-criminal, com novos estereótipos e nova
legitimação repressiva”. Contudo, “é com a Lei 6.368/76 que o discurso jurídico-político
toma dimensões especificas no país”, afirma Carvalho.

No que concerne ao plano político-criminal, mantém-se discursos


médico-jurídico, com a diferenciação básica entre dependente e
criminoso e a manutenção dos estereótipos consumidor-doente e
trafícante-delinqüente, instaurando-se, gradualmente, o discurso
jurídico-político (plano da segurança) onde surgirá a figura do inimigo,
igualmente encarnada no traficante. (CARVALHO, 2011, p 40)
Pode-se observar que a construção de políticas para a prevenção e repressão ao uso
indevido e tráfico de substâncias ilícitas ganharam espaço e, aos poucos, a diferenciação
entre usuário, dependente, pequeno e o grande traficante de drogas se tornou mais claras,
até chegamos na Lei 11.343/2006, a chamada Lei Antidrogas, em vigor desde 2006.

A Lei 6.368/76 trazia a figura do usuário em seu art. 16 com pena de detenção de 6 meses
a 2 anos. Já o traficante estava tipificado no art. 12 com pena de 3 a 15 anos de reclusão.
Apesar da Lei 11.343/2006 não trazer mudanças significativas, “continuou reproduzindo
os dispositivos criminalizadores recomendados pela Convenção de Viena de 1988, bem
como os discursos médico-jurídico e político-jurídico da lei anterior”, como afirma
CARDOSO. Com a Lei Antidrogas, houve uma alteração: a pena prevista por tráfico de
drogas, que foi aumentada. A pena mínima, que era de 3 (três) anos foi majorada para 5
(cinco) anos, mantendo a máxima de 15 (quinze) anos de reclusão. E o usuário tipificado
no art. 28 da lei supracitada, tem as penas de advertência, prestação serviço à comunidade
e medida socioeducativa.

Para Mariah Dias, “é possível estabelecer relevantes distinções entre a Lei 6.368/76 e a
Lei 11.343/2006, por mais que esta tenha a mesma base ideológica que aquela. Enquanto
no primeiro dispositivo legal esboça uma estrutura mais repressiva independentemente
da conduta do agente, seja ela voltada ao porte para uso ou para o comércio, no segundo
há o aumento da repressão ao comércio ilícito e o abrandamento das sanções aos usuários
e dependentes. ” (DIAS,2013, p 31)

O que se discute ainda são o uso indevido de drogas e o traficante como “inimigo interno”,
figura introduzida pela legislação brasileira na década de setenta. A Doutrina da
Segurança Nacional se utilizou dos discursos médico-jurídico e político-jurídico para
identificar o criminoso como inimigo a ser eliminado. (CARDOSO,2011)

Segundo Rachel Cardoso, o Brasil adotou o discurso político-jurídico e médico-político


para diferenciar o usuário, o dependente e o traficante, vejamos:

A legislação brasileira adequou-se às Convenções da ONU de caráter


proibicionista e passou a estampar os discursos político- jurídico (que
aponta o traficante como o inimigo interno) e médico- jurídico (que
relaciona a droga à dependência, e difunde a “ideologia da
diferenciação”: o consumidor é qualificado como doente, e o traficante
como delinquente). A Constituição Brasileira de 1988 concretizou o
proibicionismo das drogas no país. Suas normas programáticas deram
origem a uma legislação marcada pelo tratamento diferenciado aos
crimes relacionados a drogas ilícitas, violando garantias
constitucionais. (CARDOSO,2011, p 93)

Gunther Jakobs, em sua obra “Direito Penal do Inimigo”, destaca a diferenciação do


cidadão “comum” e “inimigo” do Estado. Tendo como “inimigo” o cidadão que
descumpre o pacto social, a norma a ele imposta, de forma reiterada com habitualidade.
Esse cidadão não mereceria ser tratado com um cidadão “comum”. Sendo dele, retirado
algumas garantias fundamentais. Para Rachel Cardoso, Jakobs “propõe a supressão de
direitos e garantia de alguns indivíduos, autores de crimes graves, os quais, em razão de
suposta “periculosidade”, seriam “não-pessoas”, inimigos.

Apesar da teoria do Direito Penal do Inimigo, de Jakobs, fazer uma referência ao inimigo
externo, como relata Rachel Cardoso que, “os inimigos de que trata a proposta de Gunther
Jakobs são os que ameaçam os países centrais, isto é, os inimigos externos, personificados
na figura do traficante, do terrorista e do imigrante”, diferente da figura ideológica do
traficante como “inimigo” interno no Brasil. O contexto utilizado na criação de políticas
de prevenção e repressão ao uso indevido e o tráfico ilícito de drogas, tem um viés trazido
pela teoria do “Direito Penal do Inimigo”, ainda Rachel Cardoso diz:

Seguindo o referencial teórico de Salo de Carvalho, mostrou-se que no


Brasil a adequação da legislação interna às Convenções internacionais
da ONU, seguindo as disposições desses documentos, deu-se desde o
Decreto-Lei n. 159/1967 até a Lei 11.343/2006. As leis brasileiras
passaram a prever dispositivos legais que violam garantias
constitucionais, bem como reproduzem os discursos médico-jurídico e
político-jurídico, sedimentando um modelo de política criminal que se
utiliza dos estereótipos do “usuário-doente” e do “traficante-
delinquente-inimigo. (CARDOSO,2011, p 149)

A esta diferenciação dar-se outro tópico, ao qual se utiliza os preceitos e fundamentos do


Direito Penal do Inimigo, como mecanizamos de endurecer as penas, visando combater a
chamada “guerras a drogas”.

5.1) Aplicação do Direito Penal do Inimigo na Lei de drogas


Com a referida Lei de drogas 11.343/2006 surgem alguns parâmetros de comparação na
aplicação do Direito Penal do Inimigo, e a constitucionalidade de alguns artigos. Para
Kárita Souza, “o traficante ao contrário do considerado como usuário ou dependente
recebe tratamento de extirpação de direitos e garantias”. Ainda, dispôs que “a melhor
doutrina tem se posicionado no sentido de considerar a lei de drogas como uma expressão
da aplicação do direito penal do inimigo no Brasil. A vedação à liberdade provisória
expressa na lei em seu artigo 44, suscitou em doutrinadores o posicionamento pela
inconstitucionalidade da restrição. ” (SOUZA, 2012, p 38)

Já para Mariah Dias, “a Lei 11.343/2006 revela a presença de negações de direitos


fundamentais, em outras palavras, contém indícios de supressões de direitos e garantias
resguardadas por leis infraconstitucionais e, também, princípios fundamentais
constitucionais basilares de um Estado Democrático de Direito. ” Ao qual, pode observar
“um ponto relevante que demonstra uma característica de estado totalitário e rígido foi o
significativo aumento das penas cominadas aos autores das condutas que tipificam o
“tráfico” de drogas, em contraponto ao que estipulava a revogada Lei 6.368/76. ”
(DIAS,2013, p 60)

Ainda destaca que, “a criminalização equiparada de atos preparatórios como o da venda


e produção de drogas, acaba influenciando no sobrecarregamento das instituições
prisionais, pois normalmente, as penas não se mantêm no mínimo legal, diante das
circunstâncias qualificadoras, que também foram ampliadas com a nova lei, presentes no
artigo 40. ” (DIAS,2013, p 60,61)

Nesse sentido, Mariah Dias alude que:

Com a equiparação de meros atos preparatórios (posse, transporte ou


expedição das substâncias ou matérias primas proibidas), com o crime
de tráfico de fato, a Lei 11.343/2006 reafirmou a antecipação do
momento criminalizador transcendendo as barreiras entre a
consumação e a tentativa, pois tanto os atos preparatórios “quanto o
efetivo fornecimento ou venda serão punidos com a mesma pena.
(DIAS, p 61)

Portanto, os simples atos preparatórios seriam punidos com a mesma pena do caput do
art. 33 da lei de drogas, ao qual faz alusão a teoria de Jakobs, ou seja, antes de configurar
a pratica efetiva de tráfico, que “vale frisar que tráfico se define por comércio ou negócio,
um meio de obter vantagem econômica. ” (DIAS,2013, p 63)

Outro ponto a observar, seria o sentido de punição que o Estado busca. Para Mariah Dias,
o ordenamento atual, a lei 11.343/2006 tem um viés “punitivista e eletista, que visa punir
o autor do fato típico pelo que é, e não pelo crime que tenha vindo a cometer”, assim
como, “um dos pilares do Direito Penal do inimigo é justamente essa punição do autor
pelo simples fato de ser quem é, e não pelo ato que cometeu, consagrando assim, a
chamada teoria do direito penal do autor, ou seja, “a pena se associa de modo imediato à
periculosidade do autor. ” Assim, o Estado não pune o ato, que por muitas vezes é
insignificativo, “mas sim repreende o sujeito pela atitude corrompida, já que este
corresponde a um ente perigoso devendo ser neutralizado por representar um perigo à
ordem social”. (DIAS,2013, p 68)

Assim, resume Mariah Dias:

Os inimigos, eleitos pela lei 11.343/2006, seja ele um grande traficante,


ou o sujeito que adquiriu, ou até mesmo o indivíduo que produziu a
matéria prima, serão tratados sem distinção, concorrendo no mesmo
tipo penal, com o mesmo patamar sancionatório de cinco a quinze anos
de reclusão. (IEMINI, 2010). Nota-se, pela leitura do artigo 33, que não
é somente a atividade que caracteriza o tráfico -venda ou comércio- que
são tipificadas, mas sim momentos prévios, como a preparação.
(DIAS,2013, p 68)

Nesse diapasão, entende-se que a teoria Direito Penal do Inimigo, tem um peso mesmo
que implícito na aplicação das normas brasileiras. Seja na diferencia do usuário, ou na
tipificação ampla do tráfico, que inclui como crime os atos preparatórios, uma
característica da teoria consagrada por Jakobs. (DIAS, 2013, p 68)

6) Conclusão

A presente pesquisa apresentou o tema do Direito Penal do Inimigo como mecanismo de


combate às drogas no Brasil, com análise dos aspectos que envolvem o tema principal
com os subtemas. Inicialmente, foi analisada a teoria do Gunther Jakobs, à qual faz uma
diferenciação entre o cidadão comum e o inimigo do Estado, esse último sendo objeto do
estudo como o delinquente que deve ter alguns direitos relativizados para que se
restabeleça a ordem social. Na visão de Jakobs, a norma deve ser resguardada, para que
os demais cidadãos possam cumpri-las, de forma que aquele que tem por princípio
infringir a norma deve ser punido de maneira rigorosa.

Ademais, foram demonstrados os princípios da igualdade e proporcionalidade, no intuito


de examinar os fundamentos que regem tais princípios. Onde, a igualdade deve ser
observada no âmbito do caso concreto, conforme a máxima: “tratar os iguais como iguais,
e os desiguais como desiguais na medida de suas desigualdades”. Assim como, o princípio
da proporcionalidade, que busca mensurar o feito a partir daquilo ao qual foi cometido,
sendo proporcional a conduta praticada.

Ainda, foi estudada a Lei Antidrogas, em síntese os artigos 28 e 33, que traz a figura de
usuário, dependente e traficante, as disposições e políticas da lei, bem como a prevenção
e repressão do uso indevido e o tráfico de substâncias ilícitas de drogas.

Nesse sentido, abordou-se o contexto em que o tráfico e as leis foram estabelecidas no


Brasil, na busca de combater as drogas. Como foi dada essa construção, que para alguns
autores há aplicação do direito penal do inimigo mesmo que de forma implícita, nas
fundamentações e elaboração de algumas normas, ao se tratar a diferenciação entre
usuário, dependente, traficante e a análise da constitucionalidade dos artigos.

Diante ao exposto, depreende-se que a aplicação do Direito Penal do Inimigo, embora


não aconteça na íntegra, faz menção na atual lei Antidrogas, desde a diferenciação do
usuário e do traficante, até na desproporcionalidade de algumas condutas, como a
equiparação de atos preparatórios com a traficância, ou o financiador, descrito no artigo
40 (quarenta) do referido diploma legal. Esse endurecimento das penas seria uma forma
de combater às drogas no Brasil.
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