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FACULDADE DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS DE CASCAVEL


UNIVEL – União Educacional de Cascavel

EDUARDO TINOCO

ESTUDO COMPARADO SOBRE GARANTISMO PENAL E DIREITO PENAL DO


INIMIGO

CASCAVEL – PR
2016
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EDUARDO TINOCO

ESTUDO COMPARADO SOBRE GARANTISMO PENAL E DIREITO PENAL DO


INIMIGO

Trabalho apresentado à disciplina Direito


Processual Penal: Ação Penal e Teoria das
Provas, da Faculdade de Ciências Sociais
Aplicadas de Cascavel – UNIVEL, com finalidade
de composição da nota.

Orientador: Eduardo Biavatti Lazarini

CASCAVEL – PR
2016
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1.Introdução

O presente trabalho tem objetivo traçar um comparativo e estabelecer as


características principais sobre o Garantismo Penal (Luigi Ferrajoli), e Direito Penal
do Inimigo (Gunter Jakobs).
A Teoria do Direito Penal do Inimigo de Gunter Jakobs é conhecida por sua
posição dura contra indivíduos que cometem crimes, não oferecendo qualquer
benefício processual ou material, tal radicalidade é plenamente observada quando a
teoria defende a ideia da exclusão dos delinquentes da sociedade.
Já a Constituição Federal Brasileira adere a posição de defesa da dignidade
da pessoa humana, até mesmo aos que cometem crimes, assegurando a todos
ampla defesa, contraditório entre outras garantias de dignidade mínima para
existência.
Sendo assim, busca-se apresentar um estudo paralelo sobre os assuntos
supramencionados, abordando seus parâmetros e estruturas. Os presentes temas
são alvos de críticas e estudos, portanto merecem um estudo detalhado.
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2. O Direito Penal do Inimigo segundo Gunter Jakobs e O Garantismo


Penal para Luigi Ferrajoli

O professor Gunter Jakobs, alemão, criou a teoria do Direito Penal do


Inimigo em meados de 1980, propondo a inclusão de um direito penal radical,
diferenciando o direito penal dos cidadãos comuns e do inimigo.
Primeiramente, é importante expor um breve conceito acerca do Direito
Penal do Inimigo, de Luis Grecco, publicado em seu artigo sobre tal assunto, “de um
ponto de vista semântico, sim: o direito penal do inimigo é o tipo ideal de um direito
penal que não respeita o autor como pessoa, mas que almeja neutralizá-lo como
fonte de perigo. Mas se o conceito é claro do ponto de vista semântico, permanece
ele deveras obscuro no que diz respeito ao seu significado pragmático, isto é, às
finalidades ou funções que se tentam alcançar com sua utilização no discurso
científico.”1
O cidadão comum para Jakobs, segue a vida perante a obediência das leis e
o ordenamento jurídico, e diferente dos delinquentes poderiam até ser reeducados e
reiterados à sociedade mesmo depois de ter cometido um crime, teriam ainda o
direito ao julgamento dentro do ordenamento jurídico estabelecido, já os chamados
“inimigos” não são passíveis a tal regeneração, não podem aproveitar de benefícios
aplicados aos demais cidadãos, diante da periculosidade das condutas praticadas.
O inimigo, não considerado um cidadão como os demais, não é capaz de
adaptar-se às regras de uma sociedade, e insiste na reincidência da prática de
crimes, alguém que cometeu uma conduta que fere a existência do estado não pode
usufruir das mesmas garantias legais de um cidadão de bem, e deve sim ser tratado
como uma ameaça ao estado e a sociedade.
O termo “inimigo” já foi tratado por grandes filósofos como Hobbes e Kant,
tais conceitos serviram como base para a teoria de Gunter Jakobs, por exemplo,
levando em consideração a teoria de Kant onde o estado de natureza do homem é o
estado de guerra, e só poderá ser a paz através do estado, que garante segurança a
todos, o homem ao permanecer no estado de natureza é considerado inimigo, por
causar ameaça ao estado e a segurança dos demais.

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LUIS GRECO, Sobre o chamado Direito Penal do Inimigo. Artigo publicado na Revista da

Faculdade de Direito de Campos. Ano VI, nº 7, 2005.


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Já para Hobbes no estado de natureza os homens são inimigos uns dos


outros, também caracterizando um estado natural de guerra, sendo assim, para
sanar o problema de não ter leis e não ter base de injustiça ou justiça, os homens se
reuniram em grupos, uma sociedade, criando o Estado, e os que renegam esse
poder são considerados inimigos, assumindo então risco de sofrer as
consequências, além disso Hobbes também defende a ideia da necessidade de dois
tipos de Direito, aos cidadãos comuns e aos inimigos.
Diante da necessidade de “dois Direitos”, Jakobs, diferencia o cidadão que
apesar de cometer um crime, pode ser regenerado, do cidadão que não oferece
garantia de uma reintegração, e assim deve ser punido de acordo com sua
periculosidade. Diferentemente do Garantismo, essa teoria é conhecida como um
direito do autor e não do fato, o inimigo é analisado de acordo com os critérios de
personalidade e não dos atos que ele cometeu.
Medidas radicais como a diminuição das garantias constitucionais, aumento
das penas, limitação das possibilidades de defesa, aumento da antecipação da
tutela penal entre outras, podem valer para os “inimigos”, mais do que isso, os
benefícios podem ser extintos, e servem para cessar o perigo, e assegurar as
garantias penais para os cidadãos.
É possível apontar três enfoques para o Direito Penal, de forma rápida,
Jesús Maria Silva Sanchez, apresenta, “uma primeira velocidade, representada pelo
Direito Penal ‘do cárcere’, em que haveriam de ser mantidos rigidamente os
princípios político-criminais clássicos, as regras de imputação e os princípios
processuais; e uma segunda velocidade, para os casos em que, por não se tratar de
prisão, senão de penas de privação de direitos ou pecuniárias, aqueles princípios e
regras poderiam experimentar uma flexibilização proporcionada a menor intensidade
da sanção.”2
Então o Direito Penal do Inimigo é posto como uma terceira geração,
chamada velocidade híbrida, por aplicar penas privativas de liberdade, característico
da primeira velocidade, e com uma minimização das garantias necessárias a esse
fim, segunda velocidade.
O Garantismo Penal, teoria elaborada pelo professor Luigi Ferrajoli, é uma
herança do iluminismo, e baluarte da proteção das garantias do cidadão,
principalmente a liberdade, em sua obra Direito e Razão, o autor expõe sua teoria
2
SILVA SÁNCHEZ, Jésus-Maria. A expansão do Direito Penal, p. 163.
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diante de três significados, a primeira será transcrita para tomar como base às
outras:

“Garantismo” designa um modelo normativo de


direito:precisamente, no que diz respeito ao direito penal, o
modelo de “estrita legalidade” SG, próprio do Estado de direito,
que sob o plano epistemológico se caracteriza como um
sistema cognitivo ou de poder mínimo, sob o plano político se
caracteriza como uma técnica de tutela idônea a minimizar a
violência e maximizar a liberdade e, sob o plano jurídico, como
um sistema de vínculos impostos à função punitiva do Estado
em garantia dos direitos dos cidadãos. É consequentemente,
“garantista” todo sistema penal que se conforma
normativamente com tal modelo e que o satisfaz
efetivamente.”3

Ao analisar o primeiro significado é possível extrair que o Garantismo Penal


trata-se da segurança dos cidadãos, onde o Estado democrático, baseado em um
ordenamento jurídico (Constituição), deve diminuir o poder punitivo, diferentemente
do Direito Penal do Inimigo, e ainda garantir os direitos e liberdade dos cidadãos.
Nos próximos significados do Garantismo, após uma junção, o conceito da
teoria se mostra como uma política criminal, onde se sobressai a mínima
intervenção do Estado no sistema normativo punitivo, levando o direito e o Estado, o
ônus de buscar a finalidade da norma penal.
De forma clara, se distanciando do Direito Penal do Inimigo, o Garantismo
Penal busca utilizar o poder punitivo como último recurso, e respeitando princípios
reguladores, portanto, a teoria do garantismo forma e da parâmetros à punição
estatal, sempre considerando de forma primordial a liberdade do indivíduo, além dos
outros princípios de defesa da dignidade humana. Para Ferrajoli, é possível apontar
quatro classes de direito, os Direitos Humanos, públicos, civis e políticos.
No Brasil, partindo da ideia de Garantismo penal consagrada pela
Constituição Federal e aplicada pelos julgadores do país, o direito penal do inimigo
preferencialmente é repelido completamente pelos Tribunais por ser contra
princípios constitucionais, principalmente a dignidade da pessoa humana, tendo em
vista que a teoria é reflexo do rigorismo do estado e populismo penal.
É possível converter os principais princípios do Garantismo Penal em dez
axiomas, princípio da retributividade ou da consequencialidade da pena em relação
3
FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010, p. 785-786
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ao delito; princípio da legalidade, no sentido lato ou no sentido estrito; princípio da


necessidade ou da economia do direito penal; princípio da lesividade ou da
ofensividade do evento; princípio da materialidade ou da exterioridade da ação;
princípio da culpabilidade ou da responsabilidade pessoal; princípio da
jurisdicionaridade, também no sentido lato e no sentido estrito; princípio acusatório
ou da separação entre juiz e acusação; princípio do ônus da prova ou da verificação;
princípio do contraditório com participação de defesa ou da falseabilidade.
Hoje em dia, existem representantes dessas duas forma de aplicação do
Direito, que mostram facilmente as diferenças apontadas anteriormente, desde
juristas radicais, aplicando o Direito Penal rigoroso, mesmo que isso fere alguns
princípios e direitos individuais, característico do Direito Penal do Inimigo, enquanto
outros defendem um Direito Penal humano, aplicando a pena respeitando critérios
de defesa da dignidade humana, garantindo todos os direitos.
Os temas estudados, despertam debates e até críticas, principalmente o
Direito Penal do Inimigo, por ser rigoroso e não respeitar garantias mínimas para a
vida com dignidade e liberdade, outro fato visado por críticos é a teoria do direito
penal do inimigo buscar a aplicação do direito penal do autor e não do direito penal
do fato, sendo assim, o autor do crime é punido por ser quem é e não pela conduta
cometida. Como dito pelo professor Luis Flavio Gomes, “quem sustenta o chamado
"Direito penal" do inimigo (que é uma espécie de "direito emergencial"), na verdade,
pode ser caracterizado como um grande inimigo do Direito penal garantista, porque
ele representa um tipo de Direito penal excepcional, contrário aos princípios liberais
acolhidos pelo Estado Constitucional e Democrático de Direito.”4
Diferente do Garantismo Penal o Direito Penal do Inimigo é tratado como um
teoria antiquada, um retrocesso aos antigos regimes totalitários, ignorando o fato
das garantias processuais e individuais.

3. Conclusão

Diante do exposto, Gunter Jakobs vê no “inimigo” uma ameaça à sociedade


e à própria soberania estatal, já que como ele mesmo classifica, aquele que age em
desacordo com as normas criadas pelo poder público está ferindo a soberania e
4
Op. cit.. GOMES, Luiz Flávio; BIANCHINI, Alice. p. 32.
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deve ser punido, com rigidez, visando uma punição de acordo com sua
periculosidade, compondo assim uma forma desumana de punir os que cometem
crimes, se opondo a constituição desde o momento que defende a existência de dois
Direitos, julgando de maneira desigual.
A dignidade da pessoa humana sofre extremo respeito a partir do
Garantismo Penal, diferente do Direito Penal de Gunter Jakobs, todos devem ter as
garantias de direitos legais durante sua penalização.
Apesar da adoção do Garantismo Penal no sistema penal brasileiro, existem
decisões pendentes contra as minorias, desfavorecendo muitas vezes o réu por
características ainda preconceituosas, mesmo assim, o Direito Penal do Inimigo não
tem influência no nosso sistema penal, visto que a Constituição Federal resguarda a
igualdade perante todos, sem qualquer descriminação.
Sendo assim, percebe-se que o garantismo penal e o direito penal do
inimigo são completamente antagônicos e não convivem, pois enquanto o primeiro
prioriza a democracia positiva com a preservação das liberdades públicas e
principalmente respeito aos princípios que norteiam a moderna visão de Estado, o
segundo defende a tolerância zero, com o desprezo das garantias inerentes ao ser
humano.

Referências

FERRAJOLI, Luigi. Direito e Razão: teoria do garantismo penal. 2010

SILVA SÁNCHEZ, Jésus-Maria. A expansão do Direito Penal


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LUIS GRECO, Sobre o chamado Direito Penal do Inimigo. Artigo publicado na


Revista da Faculdade de Direito de Campos. Ano VI, nº 7, 2005.

JAKOBS, Günther; CANCIO MELIÁ, Manuel. Direito penal do inimigo: noções e


críticas. 3. ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2008.

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