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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO DE CIÊNCIAS HUMANAS E SOCIAIS


DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS

Direito Penal do Inimigo

Beatriz Paz de Lima


Isabelle Kristine dos Santos Barbosa
Leonardo Rocha Diniz
Maria Eduarda de Souza do Nascimento Pires

Rio de Janeiro
2024
Introdução

A Teoria do Direito Penal do Inimigo é um conceito introduzido em 1985 por Günther


Jakobs, jurista alemão, professor de direito penal e filosofia do direito na Universidade de
Bonn. Apesar de ter surgido em 1985, tal teoria ganhou grande relevância apenas após os
atentados de 11 de setembro 2001 (Torres Gêmeas), principalmente em 2003, quando seu
autor voltou a defender sua tese. . Apesar de ter ganhado relevância no período mencionado,
tal teoria foi fortemente criticada por uma série de autores.
A base filosófica utilizada por Jakobs vem prioritariamente de Jean-Jacques Rousseau,
Immanuel Kant e Thomas Hobbes. Utilizando-se da ideia de que aqueles que agem de forma
contrária ao Estado são inimigos dele, merecendo uma forma diferenciada de tratamento.
Essa teoria sustenta que há duas espécies de direito penal: o direito penal do cidadão e o
direito penal do inimigo. Na qual a segunda, terá como os alicerces: a desproporcionalidade
das penas e relativização ou supressão de certas garantias processuais, antecipação da
punição do inimigo e a criação de leis severas direcionadas à indivíduos dessa específica
engenharia de controle social.

Em primeiro plano, vale a análise da separação entre dois direitos penais (do cidadão e do
inimigo). O direito penal do cidadão é aplicado àqueles indivíduos que cometem crimes e não
apresentam um grande perigo ao Estado, para tais pessoas, deve-se manter asseguradas todas
as garantias processuais e penais. Já o direito penal do inimigo deve ser utilizado nos casos
em que o crime cometido pelo indivíduo o afasta permanentemente do Direito. Tal pessoa
não é mais vista como um cidadão, mas sim um inimigo que representa uma ameaça ao
próprio Estado, colocando em risco a paz social.

O Direito Penal do Inimigo defende que aqueles indivíduos que agem de forma contrária à
lei, pondo em risco o bem-estar e manutenção do Estado, devem perder seu status de cidadão,
e por conseguinte, perder uma série de direitos que um cidadão possui. Essa teoria vai além,
defendendo que esse ser tido como inimigo não deve ser tratado sequer como pessoa, o que
abre precedente para ele não ser considerado sujeito de direito, mas apenas objeto de direito,
o transformando aos olhos da lei em uma não-pessoa. Logo, a partir de toda essa
descaracterização do sujeito, o direito penal pode suprimir uma série de direitos que estariam
garantidos a um cidadão, sem agir de forma contrária à lei.
Em segundo plano, vale se observar que, para essa teoria, o inimigo do Estado deve ser
punido observando o perigo e a ameaça que este representa no futuro, ou seja, deve agir sobre
o indivíduo de forma preventiva, antes que o delito tenha acontecido, visando proteger o
Estado perante a periculosidade potencial desse inimigo. Além dessa atuação preventiva,
Jakobs também defende que é necessário um fortalecimento das penas para esses
não-indivíduos, a fim de ser mais uma maneira de coibir esse tipo de conduta.

Apesar de ao se propor essa teoria dentro do contexto brasileiro, em que o art. 5 da


Constituição Federal impossibilita a aplicabilidade da mesma de forma nítida, vale se
observar que: “[...] cabe ressaltar que não obstante a falta de aplicabilidade plena da teoria em
foco, de uma maneira mais branda do que a teoria prevê, pode se perceber alguns reflexos do
direito penal do inimigo no Brasil como, por exemplo, o Regime Disciplinar Diferenciado
instituído pela Lei n. 10.792, de 31 de Dezembro de 2003”(Buchas, 2009, p.31). Ou seja,
mesmo que ela por si não possa ser aplicada, seus fundamentos podem adentrar até mesmo
em países que a coíbam de forma incisiva em suas constituições.

Dessa maneira, O Direito Penal do Inimigo é uma teoria que propõe punições e uma tutela
jurisdicional mais rápida, punições mais severas e que, após passar por certas etapas na
criminalidade, o delinquente se tornaria um inimigo do Estado. Ademais, prevê a existência
de duas categorias de criminosos, em que em uma o indivíduo permaneceria com o status de
cidadão e seus respectivos direitos, enquanto na outra, as pessoas tidas como inimigo do
Estado teriam um tratamento rígido e diferenciado, perdendo uma série de direitos e garantias
previstas em lei e sofrem punições mais rápidas e rígidas.

Essa teoria apresenta dois fortes entendimentos doutrinários, de um lado, o entendimento


minoritário, com conteúdo favorável à teoria desenvolvida por Jakobs, concordando que para
se instaurar a ordem social, em alguns casos específicos, deve aplicar-se um tratamento
diferenciado a indivíduos criminosos. E do outro, majoritário e contrário à teoria,
representada - entre outros autores - por: Eugenio Raúl Zaffaroni, Luís Greco, Nilo Batista e
Alessandro Baratta os quais serão vistos a seguir.
Desenvolvimento

O importante doutor em Direito Penal e professor Luís Greco, em sua obra “Sobre o
Chamado Direito Penal do Inimigo”, realizou uma análise abrangente da teoria do direito
penal do inimigo, essa teoria ao longo da história do direito penal suscitou consideráveis
estudos e debates no âmbito jurídico e especificamente na criminologia. Segundo Greco, a
teoria do direito penal do inimigo se subdivide em três conceitos: o primeiro enxerga essa
teoria como um instrumento de análise para descrever com mais precisão; o segundo
reconhece como um termo usado para caracterizar e determinar alguns dispositivos legais,
chamada por ele como crítico-denunciadora; o terceiro conceito formula uma teoria de seus
pressupostos de legitimidade. Em vista disso, a teoria pode ser vista e empregada de três
formas diferentes em finalidades diversas.

Conforme analisado pelo autor, o direito penal do inimigo, classificado como um conceito
afirmativo-legitimador, deve ser considerado insustentável, por ser uma abordagem que
valida o uso de medidas mais rigorosas e punitivas contra indivíduos rotulados "inimigos"
pela sociedade ou pelo Estado, o autor afirma que essa atitude pode acarretar na violação dos
direitos individuais, que se traduz como medidas mais severas, como leis mais rígidas, penas
mais duras e restrições aos direitos processuais dos acusados e no enfraquecimento do Estado
de Direito.

Nessa linha de raciocínio, para Greco, o direito penal do inimigo é conflitante com o Direito
Penal, pois em sua interpretação, ele estigmatiza determinados grupos introduzindo uma
lógica punitiva de exclusão social. Portanto, o direito penal do inimigo não apenas
compromete os princípios fundamentais do Estado de Direito, mas também é incompatível
com os preceitos do próprio Direito Penal. A exclusão social usada como uma punição,
segundo Greco, suscita no enfraquecimento do Estado de Direito, por diminuir a
imparcialidade no sistema jurídico.

Além disso, ao estigmatizar algumas parcelas da sociedade como "inimigos" promove uma
série de conflitos no interior do corpo social de um determinado Estado, e não promovendo a
inclusão social, a equidade, a proteção dos direitos individuais e a justiça social.
Nesse contexto, Greco observa que o direito penal do inimigo, quando considerado como um
conceito descritivo, pode ser entendido e usado para analisar e descrever realidades do direito
positivo, ou seja, nas leis e práticas penais em vigor em uma determinada sociedade.
Entretanto, o autor ressalta que, um conceito descritivo de direito penal do inimigo não pode
ser possível, pela palavra "inimigo" possuir um caráter valorativo, no qual seria difícil usá-la
para descrever algo. Essa palavra, por si só, já carrega uma conotação negativa e subjetiva,
associada à ideia de oposição, conflito ou ameaça. Logo, ao tentar descrever situações
específicas no direito positivo usando o termo "inimigo", inevitavelmente se introduzem
divisões e ambiguidades que podem comprometer a objetividade e a precisão do conceito,
que se torna desnecessário.

No decorrer de sua obra, o autor em questão também discorre sobre a concepção do direito
penal do inimigo como um conceito denunciador-crítico. Nessa perspectiva, o autor em
questão sustenta que essa abordagem deve ser negada devido a sua natureza difamatória e por
ser considerada dispensável no estudo do direito penal do inimigo. Luís Greco (2005,
p.245-246) elucida,

“Mas para manifestar uma tal atitude, não se precisa do conceito


de direito penal do inimigo. É necessário apenas explicar que tais
fenômenos desrespeitam os mais básicos e fundamentais limites a
qualquer exercício legítimo do poder estatal. O conceito de
direito penal do inimigo seria, na melhor das hipóteses, um
conceito intermediário indispensável,uma etiqueta, que aponta
para o desrespeito aos limites invioláveis acima mencionados,
este, sim, decisivo.”

Para Greco, o conceito de pena é um conceito mais amplo, além da simples punição a quem
cometeu um ato infracional. O autor destaca a importância de entender a pena como um meio
de intervenção estatal que deve ter como objetivo principal não apenas retribuir o mal
causado pelo crime, mas também prevenir novas infrações. A pena deve ser entendida como
um meio de reintegrar o infrator a sociedade, lhe proporcionando oportunidades de
reabilitação e reinserção social. Nesse sentido, ele discorre sobre a importância de
implementação de políticas públicas que priorizem a educação, a capacitação profissional e o
acompanhamento psicológico de condenados, com o intuito de prepará-los para a vida após o
cumprimento da pena.

Somado a isso, é válido ressaltar a importância de se sancionar penas proporcionais, que


levem em consideração a gravidade do delito cometido, mas também as circunstâncias
pessoais do infrator. Enquanto Jakobs, entende a pena como um instrumento de prevenção do
crime, ou seja, a pena deve ter como objetivo principal intimidar possíveis infratores e a
reforçar a norma jurídica de determinado Estado, a fim de promover a manutenção da ordem
social, o que se contrapõe a ideia tradicional de retribuição da pena.

O conceito de pena como algo tradicional está enraizado ao longo da história em sistemas de
justiça junto de alguns valores culturais de cada scoeidade.No decorrer da história do direito
penal, é possível perceber uma evolução dos sistemas de justiça, com abordagens mais
humanitárias e voltadas para a ressocialização de infratores, porém, ainda é possível perceber
práticas punitivas em algumas partes do mundo.

O conceito de pena tradicional se contrapõe à ideia do direito penal do inimigo. Enquanto a


pena tradicional se baseia em princípios elucidados anteriormente, o direito penal do inimigo
dispõe de uma abordagem mais dura e punitiva para certos tipos de criminosos considerados
como inimigos da sociedade. A teoria proposta por Jakobs,é uma teoria que desperta debates
importantes no âmbito jurídico e criminológico por conta de sua natureza e suas implicações
nas políticas penais. Ela argumenta que certos criminosos devem ser tratados de forma
diferente e mais severa pela justiça, para o autor os indivíduos que se enquadram no direito
penal do inimigo não devem ser considerados como sujeito de direitos, mas sim como
inimigos do Estado, o que infringe de forma diretamente os direitos individuais e promove
situações de abuso de poder junto da estigmatização de uma parcela da sociedade.
O estudo da teoria do direito penal do inimigo é de suma importância para uma reflexão
crítica da realidade do poder punitivo do Estado e como ele tem um poder sobre os
indivíduos, essa abordagem pressupõe uma relação conflitiva entre o Estado e os "inimigos".
O desejo do Estado em controlar a sociedade é uma preocupação fundamental no campo da
teoria política e do direito.
Outro importante autor que teceu diversas críticas a ideia de "Direito Penal do Inimigo" foi o
Eugenio Raúl Zaffaroni, ministro da Suprema Corte Argentina, professor do Departamento de
Direito Penal e Criminologia da Universidade de Buenos Aires, doutor e vice-presidente da
Associação Internacional de Direito Penal, reconhecido internacionalmente por suas
contribuições críticas e reflexivas ao campo do Direito Penal e Criminologia. Zaffaroni
questiona vigorosamente essa dicotomia de tratamento entre os considerados inimigos da
sociedade e os outros indivíduos que merecem a proteção do Estado, principalmente em sua
obra " O inimigo no direito penal", publicada em 2007 como resposta ao livro de Jakobs,
argumentando que ela representa uma ameaça aos fundamentos democráticos e aos direitos
humanos. Para ele, a ideia do "Direito Penal do Inimigo" pressupõe uma desumanização do
indivíduo e uma ruptura com os princípios básicos do Estado de Direito.

Uma das principais críticas de Zaffaroni é a falta de garantias processuais e a potencial


arbitrariedade inerente a essa abordagem. Ao categorizar certos grupos como "inimigos",
Zaffaroni argumenta que o sistema penal está suscetível a marginalizar ainda mais os
indivíduos já vulneráveis, como minorias étnicas, sociais ou políticas. Essa marginalização é
exacerbada pela falta de garantias processuais adequadas, o que aumenta o risco de
discriminação e injustiça. A aplicação seletiva e discriminatória da lei, segundo Zaffaroni,
mina a confiança no sistema judicial e amplia as disparidades sociais. Quando certos grupos
são estigmatizados como "inimigos", eles tendem a receber um tratamento mais severo e
menos justo perante a lei, enquanto outros são favorecidos. Isso não apenas compromete a
equidade do sistema penal, mas também perpetua desigualdades sociais preexistentes.

Além disso, Zaffaroni argumenta que a lógica do "Direito Penal do Inimigo" cria um ciclo de
violência e repressão, em vez de abordar as causas subjacentes dos problemas sociais. Essa
abordagem punitiva, que se concentra na exclusão e na punição severa dos indivíduos
considerados como "inimigos" do Estado, não apenas falha em resolver as questões sociais
profundamente enraizadas, mas também pode exacerbar os problemas existentes. Ao
privilegiar a punição sobre a compreensão e a reabilitação, o sistema penal corre o risco de
perpetuar a marginalização e a alienação dos indivíduos, em vez de promover a reintegração e
a justiça restaurativa. Zaffaroni ressalta que, ao tratar certos grupos como inimigos e aplicar
medidas extremas de controle e restrição sobre eles, o Estado pode minar os direitos
fundamentais e a dignidade humana desses indivíduos, contribuindo para um ciclo de
violência e exclusão social.
Outro ponto central de sua crítica é o impacto negativo do "Direito Penal do Inimigo" sobre
os direitos fundamentais, como a presunção de inocência, o devido processo legal e a
proporcionalidade das penas. Ressalta que ao estabelecer uma distinção rígida entre
"cidadãos" e "inimigos", há uma tendência de sacrificar tais direitos em nome da suposta
segurança da sociedade. Essa lógica muitas vezes justifica a aplicação de medidas
excepcionais, como detenções preventivas prolongadas, restrições aos direitos de defesa e
investigações intrusivas, sob o pretexto de combater ameaças à ordem pública. No entanto,
Zaffaroni adverte que essa abordagem punitiva pode minar os próprios princípios que visam
proteger, prejudicando a credibilidade e a legitimidade do sistema de justiça. Além disso, ao
adotar penas desproporcionais e medidas coercitivas sem o devido escrutínio, o Estado pode
comprometer a integridade do sistema jurídico e promover a erosão das liberdades
individuais.

Ademais, em suas críticas, enseja inúmeras discussões sobre as diferentes fases do exercício
do poder punitivo ao longo da história relacionadas à concepção de “Direito penal do
inimigo” e como elas se refletem. Desde a revolução mercantil, e na subsequente fase
colonialista e neocolonialista, onde o poder punitivo era aplicado de forma discriminatória
aos colonizados, que eram considerados inimigos ou estranhos aos interesses dos
colonizadores; à revolução inquisitorial, visto que o poder punitivo se manifestava através de
práticas violentas, como a tortura contra os rotulados como inimigos da ordem vigente.
Também a revolução industrial e a concentração urbana, onde novas formas de controle
social foram desenvolvidas, como o encarceramento em massa, para separação entre
"cidadãos" e "inimigos", até a contemporaneidade, em que o autoritarismo e o poder punitivo
continuam sendo exercidos de maneira seletiva e discriminatória, com certos grupos sendo
alvos de tratamento penal mais severo com base em suas características sociais, políticas ou
econômicas. Diante disso, essa abordagem reflete a concepção do direito penal do inimigo,
que enfatiza a punição e a exclusão em detrimento dos princípios fundamentais do Estado de
direito.

Por fim, em suas obras, Zaffaroni propõe uma visão alternativa do Direito Penal, baseada em
princípios de inclusão, justiça social e respeito aos direitos humanos. Ele defende uma
abordagem mais equilibrada e humanitária, que priorize a prevenção do crime, a reabilitação
dos infratores e a construção de uma sociedade mais justa e solidária. Ao rejeitar o "Direito
Penal do Inimigo", Zaffaroni nos convida a repensar nossas concepções de justiça e a buscar
soluções mais democráticas e eficazes para os desafios enfrentados pelo sistema penal
contemporâneo.
Neste sentido, Nilo Batista e Alessandro Baratta abordam o debate em torno do direito penal
do inimigo como um tema crucial na teoria jurídica contemporânea, suscitando reflexões
profundas sobre justiça, direitos individuais e a função do sistema penal na sociedade. Dois
autores que contribuem significativamente para esse tema, cada um trazendo perspectivas
distintas e críticas sobre o assunto.

Nilo Batista, em sua obra "Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro" (2002), argumenta
contra a aplicação do direito penal do inimigo, destacando suas implicações negativas para os
princípios fundamentais do Estado Democrático de Direito. Batista afirma: "O direito penal
do inimigo é uma espécie de abdicação do Estado de Direito. Nele, a dogmática se curva à
política criminal e a política criminal se converte em política de exceção" (BATISTA, 2002,
p. 101). O autor brasileiro enfatiza que essa abordagem, ao priorizar a segregação e a punição
severa, compromete a garantia de direitos individuais e a justiça no sistema penal.

Por outro lado, Alessandro Baratta, em suas obras "Criminologia Crítica e Crítica do Direito
Penal: Introdução à Sociologia do Direito Penal" (2002) e "O Paradigma Criminológico:
Teoria e Política" (2009), oferece uma análise crítica do direito penal do inimigo dentro do
contexto da criminologia crítica. Baratta argumenta que a aplicação seletiva dessa abordagem
perpetua as desigualdades sociais e marginaliza determinados grupos na sociedade. Em suas
palavras: "O direito penal do inimigo é o direito penal dos pobres, dos negros, dos marginais,
dos estrangeiros" (BARATTA, 2002, p. 78). O jurista italiano defende uma abordagem mais
inclusiva e justa, que leve em consideração as condições estruturais que contribuem para o
cometimento de crimes.

Portanto, as obras oferecem análises profundas e críticas sobre o direito penal do inimigo,
contribuindo expressivamente para o debate sobre justiça criminal e direitos individuais na
sociedade contemporânea. Suas reflexões destacam a necessidade de uma abordagem mais
humanitária e igualitária no sistema penal, que respeite os princípios fundamentais do Estado
de Direito.
Conclusão
Tendo em vista os aspectos observados, a teoria do Direito Penal do Inimigo, proposta por
Günther Jakobs, suscitou debates acalorados no âmbito jurídico e criminológico desde sua
introdução em 1985. Embora tenha ganhado destaque após os atentados de 11 de setembro de
2001, sua aplicabilidade e validade foram questionadas por uma série de autores, incluindo
Nilo Batista e Alessandro Baratta.

Batista critica a abordagem do Direito Penal do Inimigo, argumentando que ela representa
uma abdicação do Estado de Direito, onde a política criminal se converte em política de
exceção, comprometendo os princípios fundamentais da justiça e dos direitos individuais. Por
sua vez, Baratta ressalta que essa abordagem tende a marginalizar grupos vulneráveis da
sociedade, como pobres, negros e estrangeiros, perpetuando as desigualdades sociais e
promovendo uma justiça seletiva e discriminatória.

As críticas de Batista e Baratta são fundamentadas em uma visão mais inclusiva e


humanitária do sistema penal, que prioriza a proteção dos direitos individuais e a busca por
soluções que abordem as causas estruturais da criminalidade. Em contrapartida, o Direito
Penal do Inimigo, ao categorizar certos grupos como inimigos do Estado, promove uma
lógica punitiva de exclusão social e marginalização, comprometendo os princípios básicos do
Estado de Direito e os direitos humanos.

A obra de Luís Greco também contribui para uma análise crítica dessa teoria, destacando suas
implicações na garantia de direitos individuais e na integridade do sistema jurídico. Greco
ressalta que a aplicação seletiva e discriminatória do Direito Penal do Inimigo mina a
confiança no sistema judicial e amplia as disparidades sociais, promovendo um ciclo de
violência e repressão em vez de abordar as causas subjacentes dos problemas sociais.

Eugenio Raúl Zaffaroni, por sua vez, questiona vigorosamente essa dicotomia de tratamento
entre os considerados inimigos da sociedade e os outros indivíduos que merecem a proteção
do Estado. Ele argumenta que essa abordagem representa uma ameaça aos fundamentos
democráticos e aos direitos humanos, promovendo a desumanização do indivíduo e uma
ruptura com os princípios básicos do Estado de Direito.
Portanto, diante das críticas de diversos autores e das preocupações levantadas sobre as
implicações do Direito Penal do Inimigo, é necessário repensar nossas concepções de justiça
e buscar alternativas mais equitativas e humanitárias para os desafios enfrentados pelo
sistema penal contemporâneo.

Ademais, é importante considerar o contexto histórico e político em que a teoria do Direito


Penal do Inimigo emerge e se desenvolve. Como mencionado, a relevância dessa teoria
ganhou destaque após os atentados de 11 de setembro de 2001, o que evidencia uma relação
estreita entre a abordagem punitiva e as políticas de segurança adotadas em resposta a
eventos de grande impacto. Nesse sentido, o papel do Estado na garantia da segurança
pública e na proteção dos cidadãos se torna central nas discussões sobre a aplicação do
Direito Penal do Inimigo.

Além disso, é necessário analisar as implicações práticas dessa teoria no sistema jurídico e na
sociedade como um todo. A categorização de certos grupos como "inimigos" do Estado pode
levar a uma série de consequências negativas, incluindo a violação dos direitos individuais, a
discriminação e o aumento das disparidades sociais. Portanto, é fundamental considerar não
apenas os aspectos teóricos, mas também as repercussões práticas do Direito Penal do
Inimigo na vida das pessoas.

Outro ponto relevante a se considerar é a relação entre o Direito Penal do Inimigo e o


princípio da proporcionalidade. Embora essa teoria defenda a aplicação de penas mais
severas para certos indivíduos considerados como inimigos do Estado, é importante
questionar se essa abordagem é realmente proporcional aos crimes cometidos e se respeita os
princípios básicos da justiça e da dignidade humana. A falta de proporcionalidade nas
medidas punitivas pode levar a uma série de injustiças e violações dos direitos individuais,
minando a credibilidade e a legitimidade do sistema penal.

Por fim, é fundamental ressaltar a importância do debate público e da participação da


sociedade civil na discussão sobre o Direito Penal do Inimigo. Como uma teoria que tem o
potencial de impactar significativamente a vida das pessoas, é essencial que haja uma ampla
reflexão sobre suas implicações e consequências, bem como um engajamento ativo na busca
por alternativas mais justas e humanitárias. Somente através do diálogo aberto e da
colaboração entre diferentes atores sociais podemos construir um sistema penal que respeite
os direitos individuais e promova a justiça para todos.
Referências bibliográficas

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Batista, Nilo. (2002). Introdução Crítica ao Direito Penal Brasileiro. 3ª ed. Rio de Janeiro:
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Buchas, Juliana. (2009). A aplicabilidade da teoria do direito penal do inimigo no Brasil.


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