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UNIVERSIDADE ÚNICA

CURSO DE PÓS GRADUAÇÃO EM SEGURANÇA PÚBLICA, ATIVIDADE


DE INVESTIGAÇÃO E INTELIGÊNCIA

JOSÉ ADEMIR DOS SANTOS FILHO

LEGÍTIMA DEFESA COMO DIREITO E DEVER NO ORDENAMENTO


JURÍDICO BRASILEIRO

Artigo a ser apresentado à Banca do Exame do


Curso de Pós Graduação em Segurança
Pública, Atividade de Investigação e
Inteligência, como requisito para aprovação na
disciplina de TCC em Segurança Pública

Fortaleza – CE

Março de 2023.
LEGÍTIMA DEFESA COMO DIREITO E DEVER NO ORDENAMENTO
JURÍDICO BRASILEIRO

[José Ademir dos Santos Filho]1

RESUMO

Este trabalho tem como missão a análise do instituto da legítima defesa, com foco no seu
utilizador e quando este, respaldado por tal dispositivo, age em direito ou dever. A priori a
análise desta excludente de ilicitude passou pelo instituto em si, demonstrando todos seus
requisitos objetivos e subjetivos, fundamentos, doutrinas e jurisprudências. Mais adiante foi
demonstrado o fator social de violência a qual o país se encontra, em especial os
profissionais de segurança pública, e como isso atinge os mesmos quando na utilização do
dispositivo legal. Concluindo este trabalho abordamos em específico a legítima defesa
policial, o quão complexo e incômodo ela é para o agente da lei, podendo gerar terríveis
consequências jurídicas para os mesmos.
PALAVRAS-CHAVE: Legitima Defesa; Legitima Defesa Policial.

José Ademir dos Santos Filho — Universidade Única.

2
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO
2 DESENVOLVIMENTO
2.1 A LEGÍTIMA DEFESA
2.1.1 Conceito e fundamento
2.1.2 Natureza Jurídica
2.1.3 Espécies e Requisitos Legais
2.1.4 Legítima defesa aplicada pelos profissionais de segurança pública às vítimas
reféns
2.2 A PROFISSÃO POLICIAL NO BRASIL
2.2.1 Histórico
2.2.2 Aspectos legais
2.2.3 Fatores sociais de risco
2.3 LEGÍTIMA DEFESA POLICIAL
2.3.1 Legítima Defesa, Dever Policial
2.3.2 Legitima defesa ou estrito cumprimento do dever legal?
2.3.3 Rito processual
2.3.4 Legitima defesa da vítima refém
3 CONCLUSÃO
4 REFERÊNCIAS

1 INTRODUÇÃO

A aplicação da legítima defesa vem sendo, durante o passar dos anos,


objeto de críticas e debates entre legisladores, doutrinadores e cidadãos. Permeado
por populismos e “achismos”, este instituto passou por recentes modificações, o que
confere maior segurança jurídica aos que dele fazem uso.
Quando relacionada ao âmbito policial (uma das categorias mais expostas
a condições de trabalho perigosas e, muitas vezes, violentas) a legítima defesa
torna-se um dever, além de um direto.
Há recentes discussões a respeito do tema. Diversos juristas vêm
analisando a eficiência deste instituto no que diz respeito ao respaldo jurídico
necessário para que o cidadão ou agente da lei possa exercê-lo. Acrescenta-se o
3
interesse do autor deste estudo pela temática, visto que o mesmo tem experiência
profissional como agente da lei. Com isto, esta pesquisa tem como objetivo geral
demonstrar que a correta aplicação isonômica do instituto da legítima defesa aos
cidadãos e agentes da lei garante a segurança jurídica necessária aos mesmos para
efetivar a sua praticabilidade.
Este estudo mostra-se relevante por contribuir com a literatura do Direito
Penal, ampliando as análises e discussões voltadas para a aplicabilidade do instituto
da Legítima Defesa. O presente trabalho abordou em seu referencial teórico a
legítima defesa; a profissão policial no Brasil e a legítima defesa policial.
Além disso, para a realização deste estudo, foi feita uma revisão
integrativa de literatura, característica do método bibliográfico. Este tipo de pesquisa
proporciona a análise e síntese de conhecimentos, levantando estudos significativos
que poderão contribuir com o aprofundamento do tema tratado.
Esta pesquisa envolveu uma busca em livros, artigos e jornais
relacionados a área do direito. Os descritores utilizados foram: “legítima defesa” e
“legítima defesa policial”. Como critério de inclusão: estudo na língua portuguesa.
Como critérios de exclusão: temáticas que se distanciaram do tema do estudo.
Após a coleta de dados as informações, estes foram analisados na
conclusão, buscando associar as pesquisas à resolução da pergunta problema.

4
2 DESENVOLVIMENTO

2.1 A Legítima Defesa

2.1.1 Conceito e fundamento

Autorizado pelo Estado, por meio de seu legislador, o instituto da legítima


defesa é amplamente utilizado, especialmente nos dias atuais. Muitas vezes aliado
ao populismo de forma equivocada, tal dispositivo possui requisitos, regras e
importantes jurisprudências que o norteiam na hora de sua aplicação. 2
Guilherme de Souza Nucci, referenciando Jescheck, traz o seguinte
fundamento:
A legítima defesa tem dois ângulos distintos, mas que trabalham
conjuntamente: a) no prisma jurídico individual, é o direito que todo homem
possui de defender seus bens juridicamente tutelados. Deve ser exercida no
contexto individual, não cabível invocá-la para defesa de interesses
coletivos, como a ordem pública ou o ordenamento jurídico; b) no prisma
jurídico-social, é justamente o preceito de que o ordenamento jurídico não
deve ceder ao injusto, daí porque a legítima defesa manifesta-se somente
quando for essencialmente necessária, devendo cessar no momento em
que desaparecer o interesse de afirmação do direito ou, ainda, em caso de
manifesta desproporção entre os bens em conflito. É desse contexto que se
extrai o princípio de que a legitima defesa merece ser exercida de forma
menos lesiva possível. (Nucci, 2020.. p. 224).

Cleber Masson, importante doutrinador brasileiro diz:


De fato, o Estado avocou para si a função jurisdicional, proibindo as
pessoas de exercerem a autotutela, impedindo-as de fazerem justiça com
as próprias mãos. Seus agentes não podem, contudo, estar presentes
simultaneamente ame todos os lugares, razão pela qual o Estado autoriza
os indivíduos a defenderem direitos em sua ausência, pois não seria correto
deles exigir a instantânea submissão a um ato injusto para, somente depois,
buscar a reparação do dano perante o Poder Judiciário. (MASSON, 2020. p.
344)

José Cerozo Mir (2020) contrapõe as ideias de Masson e afirma que a


impossibilidade da atuação dos órgãos do Estado não é pressuposta da legítima
defesa, dessa forma, a defesa do bem tutelado pelo agente é independente à
atuação do Estado naquele determinado momento. Assim, se o agente pratica o
determinado instituto legal de modo a cumprir todos seus requisitos, estará
amparado, mesmo que o órgão do Estado pudesse atuar no determinado momento.

2
BRASIL. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
5
2.1.2 Natureza Jurídica

Tipificado no art. 25 CP, a legítima defesa, com base na Teoria Tripartite


do conceito analítico de crime, é uma excludente de ilicitude ou antijuridicidade.
Desta forma, mesmo que o fato praticado pelo agente seja típico, e presumido ilícito,
o autor não será responsabilizado juridicamente pelo fato, pois sua atitude se
amoldou ao Direito.
Com essa ideia, Masson (2020, p. 323) registra que: “Presente uma
excludente de ilicitude, estará excluída a infração penal. Crime e contravenção penal
deixam de existir, pois o fato típico não é contrário ao Direito. Ao contrário, ele se
amolda”. No mesmo sentido, Aníbal Bruno nos traz:
Pela posição particular em que se encontra o agente ao praticá-las, se
apresentam em face do Direito como lícitas. Essas condições especiais em
que o agente atua impedem que elas venham a ser antijurídicas. São
situações de excepcional licitude que constituem as chamadas causas de
exclusão de antijuridicidade, justificativas ou descriminantes. (BRUNO,
apud GRECO, 2020. p.153)

2.1.3 Espécies e Requisitos Legais

Existem duas espécies principais de legítima defesa no ordenamento


jurídico brasileiro: a legítima defesa autêntica ou real e a legítima defesa putativa ou
imaginária.
A legítima defesa autêntica ou real ocorre quando o agente, de fato, no
mundo concreto, está sendo vítima de uma agressão injusta, e a repele de modo em
que todos os requisitos do instituto estejam presentes.
Já a legítima defesa putativa, divergente da legítima defesa real, consiste,
na verdade, em uma descriminante putativa, um erro de tipo que exclui a
culpabilidade, na Teoria Tripartite. Positivado no art. 20 §1, este último afirma que é
isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe
situação de fato que, se existisse, tornaria a ação legítima. Não há isenção de pena
quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo. 3
Cleber Masson nos traz:
É aquela em que o agente, por erro, acredita existir uma agressão injusta,
atual ou iminente, a direito seu ou de outrem. Exemplo: ‘A’ foi jurado de

3
BRASIL. Código Penal.. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
6
morte por ‘B’. Em determinada noite, em uma rua escura, encontram-se. ‘B’
coloca a mão no bolso, e ‘A’, acreditando que ele iria pegar uma arma,
mata-o. Descobre-se, posteriormente, que ‘B’ tinha a intenção de oferecer-
lhe um charuto para selar a paz. (MASSON, 2020. p.352)

Temos como requisitos legais da legítima defesa: injusta agressão, atual


ou iminente, uso moderado dos meios necessários e proteção do direito próprio ou
alheio.

a) Injusta agressão

Agressão, segundo o dicionário, dentre outras definições, consiste na


ação violenta, verbal ou física, marcada por impulsos destrutivos em relação a si
mesmo ou a outros.4 Para Rogério Sanchez Cunha(2020), “a agressão é a conduta
humana, omissiva ou comissiva, que ataca ou coloca em perigo bens jurídicos de
alguém”; já para Cleber Masson (2020), é “toda ação ou omissão humana,
consciente e voluntária, que lesa ou expõe a perigo de lesão um bem ou interesse
consagrado pelo ordenamento jurídico”.
Injusto, segundo definição denotativa, consiste no oposto à justiça 5. Para
Rogério Greco (2020), injusta é “aquela agressão que não poderá ser amparada
pelo ordenamento jurídico”; para Sanchez (2020), “é aquela contrária ao direito, não
necessariamente típica”.
A agressão injusta poderá ser de caráter comissivo ou omissivo, doloso
ou culposo, além de ser contrária ao Direito, porém, não necessariamente ao Direito
Penal, uma vez sendo necessário apenas que o agredido não seja obrigado a
suportá-la.
Temos como exemplo o furto de uso ou crimes onde é possível a
aplicação do Princípio da Insignificância, que apesar de serem contrários ao Direito,
não são crimes, uma vez que ocorre a exclusão do fato típico. 6
Divergindo de Masson, Greco e outros tantos doutrinadores, como Luiz
Flávio Gomes e Antonio Molina, Rogério Sanchez Cunha defende que:

4
MICHAELIS. Dicionário Brasileiro da Língua Portuguesa.Disponível em:
https://michaelis.uol.com.br/moderno-portugues/busca/portugues-brasileiro/agressao. Acesso em: 09
Abril 2021
5
PRIBERAM, Dicionário. Disponível em: https://dicionario.priberam.org/injusto . Acesso em: 09 Abril
2021
6
MASSON, op. cit., p.347
7
A agressão, para caracterizar legítima defesa, deve ser dirigida, com
destinatário certo, pois, do contrário, caracteriza perigo atual (sem
destinatário determinado, permitindo, conforme as circunstâncias, a
descriminante do estado de necessidade. Logo, se diante de um carro
desgovernado, o pedestre, para salvar a sua vida, sacrifica bem jurídico de
terceiro, agiu em estado de necessidade (e não legítima defesa). (CUNHA,
op. cit., p.332-333).

b) Atual ou iminente

O termo “atual”, para o dicionário, é característica do que existe ou está


em ação no momento presente. Segundo a doutrina, para Masson (2020), “é a
agressão presente, isto é, já se iniciou e ainda não se encerrou a lesão ao bem
jurídico”; Cunha (2020) afirma que para Sanchez, “é a presente, que ocorre no
determinado momento, que está ocorrendo”.
Iminente, para o dicionário, é característica do que está a ponto de
acontecer. Segundo Masson (2020), iminente é “a agressão prestes a acontecer, ou
seja, aquela que se torna atual em um futuro imediato”; para Sanchez, segundo
Cunha (2020), “iminente é aquela que está prestes a ocorrer”.
Vale salientar que é pacífico entre os doutrinadores que, em hipótese
alguma, será aceito a agressão futura ou remota e a agressão passada ou pretérita,
uma vez que configuraria medo e vingança, respectivamente.

c) Uso moderado dos meios necessários

Refere-se à intensidade e ao meio de reação da vítima ao agressor, que


deverá ser não mais que o suficiente para fazer cessar a injusta agressão. Nesse
sentido, Sanchez pontua:
Entende-se como necessário o meio menos lesivo à disposição do agredido
no momento da agressão, porém capaz de repelir o ataque com eficiência.
Encontrado o meio necessário, deve ser ele utilizado de forma, sem
excessos, o suficiente para impedir a continuidade da ofensa. (CUNHA, op.
cit., p.335)

Vale salientar que há doutrinadores que defendem a repressão da injusta


agressão por meio de omissão por parte da vítima. Nesse sentido, afirma Fernando
de Almeida Pedroso:
A repulsa à agressão sofrida, como meio de conjurá-la, pode tonalizar-se
por omissão. É o caso de duas pessoas que estão em um iate em alto-mar:
o agente, franco e magro, é agredido pelo seu companheiro de viagem, forte
e musculoso – começam a lutar e o agressor, que não sabia nadar, cai na
8
água; o agente não o salva, omitindo-se, e o deixa afogar-se. Igual: o guia
de safari que, ouvindo às espreitas daqueles que o contrataram sua
iminente sentença de morte, para que lhe fossem subtraídos os pertences,
abandona-os à própria sorte em inóspito e para eles desconhecido pantanal
e selva africanos. (PEDROZO, apud CUNHA, op. cit., p.336-337).

d) Proteção do direito próprio ou alheio

Esse ponto atém-se a quem é o titular do bem jurídico atacado. O agente


utilizador do instituto da legítima defesa fica autorizado a defender bem próprio,
caracterizando-se a legítima defesa própria ou “in persona”, de forma similar poderá
defender o bem jurídico de outrem que esteja sendo lesado: legítima defesa de
terceiro ou “ex persona”.
Importante frisar que a maior parte da doutrina e jurisprudência defende
que deve haver proporcionalidade entre os bens jurídicos em conflito. Nessa ideia, a
6ª Turma do STJ já proferiu decisão:
A excludente de legítima defesa não pode ser acolhida se a defesa não
demonstrou, em nenhuma oportunidade, que o acusado agiu em defesa da
própria vida contra injusta agressão da vítima. Muito menos revelou o uso
moderado dos meios necessários, nem a exigível proporcionalidade entre a
agressão e a reação.7 (STJ, 2014)

De igual modo pontua Masson:


O bem jurídico preservado deve ser de igual valor ou superior ao
sacrificado, sob pena de configuração do excesso. Exemplo: não pode
invocar legítima defesa aquele que mata uma pessoa pelo simples fato de
ter sido por ela ofendido verbalmente.( STJ: RE 1.459.909/MS, 2014).

Apesar de ser corrente minoritária, importante pontuar a opinião


contraditória do grande doutrinador Sanchez:
Não se impõe a observância de proporcionalidade entre bem jurídico
injustamente atacado e aquele atingido no exercício da legítima defesa. Não
há escala de valor entre os bens em conflito, nem há direito que se deva
admitir violado sob pretexto da maior relevância do direito do agressor. A
proporcionalidade que deve ser observada, como vimos na análise do uso
moderado dos meios necessários, é a da relação entre a forma como se
deu o ataque e a forma como ocorre a defesa. Noutras palavras, nada
impede que alguém que tenha seu patrimônio atacado num furto invista
contra a integridade física do furtador para fazer cessar a injusta agressão,
desde que, aí sim, o faça proporcionalmente (moderadamente)

2.1.4 Legítima defesa aplicada pelos profissionais de segurança pública às


vítimas reféns
7
STJ: RE 1.459.909/MS, rel. Min. Maria Thereza de Assis Moura, 6ª turma, j. 14.08.2014
9
Acrescida pela Lei 13.964, mais conhecida como “Pacote Anticrime”, o
parágrafo único nos trás que observados os requisitos previstos no caput do art 25
CP, é considerado em legítima defesa o agente de segurança pública que repele
agressão ou risco de agressão a vítima mantida em refém durante a prática de
crimes.8
Estudo mais profundo acerca deste tópico será desenvolvido mais
adiante.

2.2 A PROFISSÃO POLICIAL NO BRASIL

2.2.1 Histórico

Remetendo-nos à história do Brasil, mais precisamente após a chegada


da família real portuguesa, a história da Polícia no Brasil começa. Documentos
datados de 1530 norteiam-nos acerca de quão antiga é a profissão policial no Brasil.
Ainda no período imperial, destaca-se a criação da Guarda Real de Polícia, que
possuía muitas semelhanças com a atual Polícia Militar dos Estados. Já a primeira
polícia militarizada veio a ser criada em 1866, e recebeu o nome de Corpo Militar de
Polícia da Corte, que posteriormente, já em 1920, viraria a atual Polícia Militar. 9
Já a história da Polícia Civil é datada do século XIX. Criada no Rio de
Janeiro, a Polícia Judiciária Civil era comandada pelo seu Intendente Chefe que,
com base em um sistema inquisitivo, tinha as prerrogativas de investigar, prender e
julgar os investigados naquela época10
A Polícia Penal, por sua vez, a mais nova dentre todas as polícias
arroladas no art. 144 da Constituição Federal de 1988, foi criada a partir da Emenda
Constitucional nº 104, que veio a ser sancionada em 04 de dezembro de 2019. Nela
estão inclusos os antigos Agentes Penitenciários e Agentes de Execução Penal,
responsáveis pela segurança e disciplina dentro das unidades penitenciárias dos
Estados e da União.

2.2.2 Aspectos legais


8
BRASIL. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
9
Breve Relato sobre a História da Polícia Brasileira. Disponível em: https://juspol.com.br/breve-relato-
sobre-a-historia-da-policia-brasileira/#_edn6 . Acessado em: 09 Abril 2021
10
Breve Relato sobre a História da Polícia Brasileira. Disponível em: https://juspol.com.br/breve-
relato-sobre-a-historia-da-policia-brasileira/#_edn6 . Acessado em: 09 Abril 2021
10
Regidas por Estatuto próprio de cada instituição, as Polícias têm como
missão principal, segundo o art. 144 da CF/88, a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, atuando dentro de sua respectiva
competência.
É importante frisar que, além das instituições listadas no rol de segurança
pública da Carta Magna, outros órgãos possuem o chamado “poder de polícia”. A
tipificação do poder de polícia, ironicamente, não é trazida pelo Código Penal ou
Código de Processo Penal, e sim pelo Código Tributário Nacional, por meio da Lei
5.172 de 25 de outubro de 1996:
Art 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública
que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a
prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público
concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da
produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas
dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à
tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais
ou coletivos11

Nesse sentido, segundo Meirelles (2012), frisa Tácito que “O Poder de


Polícia é, em suma, o conjunto de atribuições concedidas a Administração para
disciplinar e restringir, em favor do interesse público adequando, direitos e
liberdades individuais”.

Desta forma, Cooley ratifica:


O Poder de Polícia (police power), em seu sentido amplo, compreende um
sistema total de regulamentação interna, pelo qual o Estado busca não só
preservar a ordem pública senão também estabelecer para a vida de
relações do cidadão àquelas regras de boa conduta e de boa vizinhança
que se supõem necessárias para evitar conflito de direitos e para garantir a
cada um o gozo ininterrupto de seu próprio direito, até onde for
razoavelmente compatível com o direito dos demais. (COOLEY apud
MEIRELLES, 2002, p.128)

2.2.3 Fatores sociais de risco

Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), agência da


Organização das Nações Unidas (ONU), a profissão policial é uma das mais
perigosas no mundo.

11
BRASIL. Código Tributário Nacional. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l5172compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
11
FIGURA 01 – Dados em relação ao número de policiais mortos 12

Fonte:
https://g1.globo.com/monitor-da-violencia/noticia/2020/09/03/no-de-pessoas-mortas-pela-policia-
cresce-no-brasil-no-1o-semestre-em-plena-pandemia-assassinatos-de-policiais-tambem-sobem.ghtml

Em 2020, apenas nos seis primeiros meses, houve a morte de 103


policiais no Brasil, um aumento de 24% em relação a todo o ano de 2019, que
contou com a morte de 83 policias. No Ceará, considerando o mesmo período,
houve um aumento de incríveis 1000% nos casos de policias mortos.
Os números são do Monitor da Violência, uma parceria entre o G1, o
Núcleo de Estudos da Violência da USP e o Fórum Brasileiro de Segurança Pública.
Nota-se, com base nos estudos especializados, que apesar de estarem dos policiais
de folga, esses são os mais vitimados por crimes violentos letais intencionais (CVLI).
Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública do ano de 2020, 64% dos
policiais vitimados por CVLI estavam de folga. 13

12
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2021/02/anuario-2020-final-100221.pdf . Acesso em: 09 Abril 2021
13
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2021/02/anuario-2020-final-100221.pdf . Acesso em: 09 Abril 2021
12
FIGURA 02 – Dados em relação aos PMS e PCS mortos em serviço e fora, e
suicídio de policiais14

Fonte: Dados das Secretarias Estaduais de Segurança Pública e/ou Defesa Pessoal (2019)

Outro ponto estarrecedor é a quantidade de policiais que cometem


suicídio. Segundo a OMS, o suicídio é uma das maiores causas de morte no
mundo.15 No referido período, houve mais mortes por suicídio do que em efetivo
serviço policial.
Um ponto que nos ajuda a entender essa estatística é a desenfreada
violência nacional, que vitimiza não só os policiais, mas toda sociedade. Em 2020,
houve um total de 43.892 crimes violentos no Brasil, um aumento de pouco mais de
5% em relação ao ano anterior.16

Figura 03 – Dados do total de crimes violentos no Brasil

14
Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2020. Disponível em: https://forumseguranca.org.br/wp-
content/uploads/2021/02/anuario-2020-final-100221.pdf . Acesso em: 09 Abril 2021
15
Suicide in the world: Global Health Estimates, 2019, p. 6. Disponível
em: https://www.who.int/publications/i/item/suicide-in-the-world Acesso em: 09 Abril 2021
16
Monitor da Violência. Disponível em:
http://especiais.g1.globo.com/monitor-da-violencia/2018/mortes-violentas-no-brasil/?
_ga=2.92484319.391371196.1617823374-395429212.1611881939#/dados-mensais-2019 . Acesso
em: 09 Abril 2021
13
Fonte: G1 – Monitor da Violência: As mortes violentas mês a mês no Brasil (globo.com)

Mais especificamente no Ceará, no ano de 2020, ocorreram 4.039 CVLI,


um aumento de mais de 80% em relação ao ano anterior, que contava com 2.235
CVLI.
Figura 04 – Dados do total de crimes violentos no Ceará

Fonte: G1 – Monitor da Violência: As mortes violentas mês a mês no Brasil (globo.com)

2.3 LEGÍTIMA DEFESA POLICIAL

Como demonstrado acima, em uma sociedade com tanta violência fica


clara a importância do exercício da legítima defesa. Quando praticada por policiais, a

14
legítima defesa ganha algumas características e trâmites especiais, visando
justamente um tratamento diferencial à categoria mais exposta a essa violência. Mas
esse diferencial, ainda assim, é suficiente para garantir a segurança jurídica
necessária a qual os policiais tanto almejam? Vejamos a seguir.

2.3.1 Legítima Defesa, Dever Policial

É preciso compreendermos que, para o Policial, a legítima defesa é mais


que um direito, é um dever! Isso porque, por imposição legal, no art. 13 §2, o Código
Penal incumbe o policial de um papel denominado “garantidor”, e este, em caso de
inação para evitar o resultado, responderá pela omissão.
Art 13 § 2º - A omissão é penalmente relevante quando o omitente devia e
podia agir para evitar o resultado. O dever de agir incumbe a quem:
a) tenha por lei obrigação de cuidado, proteção ou vigilância;
b) de outra forma, assumiu a responsabilidade de impedir o resultado;
c) com seu comportamento anterior, criou o risco da ocorrência do
resultado17

A omissão tratada nesse parágrafo é a chamada omissão imprópria,


comissivo por omissão ou omissão qualificada. Para Juarez Tavares, “diz-se, na
verdade, que os crimes omissivos impróprios são crimes de omissão qualificada
porque os sujeitos devem possuir uma qualidade específica, que não é inerente e
inexiste para as pessoas em geral. O sujeito deve ter com a vítima uma vinculação
de ordem, para a proteção de seus bens jurídicos, que o situe na qualidade de
garantidor desses bens jurídicos.18
Ou seja, a omissão por parte do policial em serviço gera responsabilidade
jurídica para o mesmo, nesse caso vindo a responder pelo resultado, a título de dolo
ou culpa, a depender do caso concreto. Nesse sentido, exemplifica Greco:

Se o policial, dolosamente, deixa de prestar socorro à vítima que havia sido


atingida por um disparo de arma de fogo, por reconhece-la como um
perigoso traficante, se esta vier a falecer, não será responsabilizado pelo
crime de omissão de socorro (art 135, parágrafo único, do CP), mas, sim,
pelo homicídio doloso por omissão. (GRECO, 2020. p. 205).

2.3.2 Legítima defesa ou estrito cumprimento de um dever legal


17
BRASIL. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
18
TAVARES, 1996, apud GRECO, 2020, p. 200
15
Mais acima destrinchamos e estudamos todo o art. 25 do CP, mas e se
um policial, em efetivo exercício, vier a matar um infrator da lei durante uma troca de
tiros, em que buscava a prisão deste, o agente da lei age em legítima defesa ou
estrito cumprimento do dever legal?
Para entendermos melhor essa questão é preciso, antes de tudo,
compreendermos o instituto do estrito cumprimento do dever legal.
Trazido pelo Código Penal, em seu art. 23 III, diz-nos que não haverá
crime quando o agente praticar o fato em estrito cumprimento do dever legal. Esse
instituto, assim como a legítima defesa, é causa de exclusão da ilicitude ou
antijuridicidade do fato. Isto é, por mais que um agente cometa um fato tipificado, o
mesmo não será responsabilizado juridicamente, devido a exclusão da
antijuridicidade na teoria analítica do crime.
O “dever legal” tratado nesse artigo é qualquer obrigação direta ou
indiretamente, resultante de lei; englobando assim decretos, regulamentos e
decisões judiciais.19
Assim, devido a esse dever jurídico de agir do policial, é comum que
ocorra a “confusão” sobre qual das exclusões de ilicitude será arguida para inocentar
o policial no caso concreto acima indagado.
Durante a atuação do policial, este sempre age primeiramente, em
exercício regular de direito, em estrito cumprimento do dever legal, para só então, se
necessário, praticar a legítima defesa. Isto porque, no nosso ordenamento jurídico,
só há uma possibilidade em o Estado ordena a morte de terceiros. Trazida por nossa
Constituição Federal, em seu art. 5º XLVII, alínea a), a autorização da pena de morte
dá-se, apenas, em caso de guerra declarada.

Em consonância, nos tribunais superiores ocorre este entendimento:


EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL. POLICIAIS MILITARES
INVESTIGADOS POR HOMICÍDIO. EXCLUDENTES DE ILICITUDE DA
LEGÍTIMA DEFESA E DO ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL
RECONHECIDAS PELO JUIZ SUSCITANTE E SUSCITADO. TROCA DE
TIROS COM A VÍTIMA, QUE TERIA RESISTIDO A PRISÃO, APÓS
PRATICAR UM ROUBO. MILITARES EM SUA FUNÇÃO TÍPICA. 1. Não se
vislumbra indícios mínimos de dolo homicida na conduta praticada. Tanto é
assim, que os juízos suscitante e suscitado decidiram pelo arquivamento do
inquérito policial, ao reconhecer que os policiais militares agiram

19
MASSON, op. cit., p.360
16
resguardados pelos excludentes de ilicitude da legítima defesa e do estrito
cumprimento do dever legal.20 (STJ,2014).

O STF então, pacificando o tema, decidiu:


EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL EM CONFLITO POSITIVO DE
COMPETÊNCIA. POLICIAIS MILITARES INVESTIGADOS POR
HOMICÍDIO. EXCLUDENTES DA ILICITUDE DA LEGÍTIMA DEFESA E DO
ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL RECONHECIDAS PELO
JUÍZO SUSCITANTE E SUSCITADO. TROCA DE TIROS COM A VÍTIMA,
QUE TERIA RESISTIDO À PRISÃO, APÓS PRATICAR UM ROUBO.
MILITARES EM SUA FUNÇÃO TÍPICA. POSSIBILIDADE DE
CONFIGURAÇÃO DE HOMICÍDIO DOLOSO QUE NÃO AFASTA O
DISPOSTO NO ART. 9.º, INCISO II, ALÍNEA C, DO CÓDIGO PENAL
MILITAR. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA CASTRENSE. AGRAVO
REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. Embora as alterações introduzidas pela lei
n.º 9.299/96 tenham excluiu do rol dos crimes militares o crime doloso
contra a vida praticado por militar contra civil, competindo à justiça comum o
julgamento do referido delito, evidencia-se no caso a competência da justiça
castrense. 2. Não se vislumbra indícios mínimos de dolo homicida na
conduta praticada. Tanto é assim, que os juízos suscitante e suscitado
decidiram pelo arquivamento do inquérito policial, ao reconhecer que os
policiais militares agiram resguardados pelas excludentes de ilicitude da
legítima defesa e do estrito cumprimento do dever legal. 3.
Inexistindo animus necandi na conduta investigada, praticada por militares
em serviço, no exercício da função típica, evidencia-se a competência da
justiça militar, nos termos do art. 9.º, inciso ii, alínea c, do código penal
militar. Precedentes. 4. Agravo regimental desprovido. 21 (STF, 2017)

2.3.3 Rito processual

Encabeçada pelo Ministro de Justiça e Segurança Pública, Sérgio Moro à


época, a Lei 13.964/2019, mais conhecida como Pacote Anticrime, veio trazer
mudanças no Código de Processo Penal. Dentre as quais está a mudança do rito
processual nos crimes nos quais os policiais são investigados por fato relacionado
ao uso de força letal, praticado no exercício profissional.
Em seu art 14-A nos traz:
Art. 14-A. Nos casos em que servidores vinculados às instituições dispostas
no art. 144 da Constituição Federal figurarem como investigados em
inquéritos policiais, inquéritos policiais militares e demais procedimentos
extrajudiciais, cujo objeto for a investigação de fatos relacionados ao uso da
força letal praticados no exercício profissional, de forma consumada ou
tentada, incluindo as situações dispostas no art. 23 do Decreto-Lei nº 2.848,
de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), o indiciado poderá constituir
defensor.22

20
STJ: AgRg no cc 133875/SP. nº 2014/0115118-1. Terceira Seção. Rel. Ministra Laurita Vaz. Ac. Em
13/08/2014
21
STF. RECURSO EXTRAORDINÁRIO: 972.173 ES 2017/972.173. RELATORA MIN. ROSA
WEBER. DJ. 30/05/2017
22
BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/del3689.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
17
A mudança vai além. Em seu §2, é tratado acerca de um defensor
designado ex-ofício pela instituição a que o policial estava vinculado à época dos
fatos:
§ 2º Esgotado o prazo disposto no § 1º deste artigo com ausência de
nomeação de defensor pelo investigado, a autoridade responsável pela
investigação deverá intimar a instituição a que estava vinculado o
investigado à época da ocorrência dos fatos, para que essa, no prazo de 48
(quarenta e oito) horas, indique defensor para a representação do
investigado.23

Fica clara a parcialidade do legislador para com esta categoria, porém, na


prática, não há nenhuma grande novidade. Isso porque a própria Constituição
Federal, em seu art. 5 LV e LXIII, além da Lei 8.906/94 (Estatuto da OAB), no seu
art.7 XXI, garante aos investigados o direito de constituir defensor para acompanhar
os trâmites do procedimento.
Ratificando esse entendimento, o STF, em sua Súmula Vinculante nº 14,
traz-nos que “É direito do defensor, no interesse do representado, ter acesso amplo
aos elementos de prova que, já documentados em procedimento investigatório
realizado por órgão com competência de polícia judiciária, digam respeito ao
exercício do direito de defesa”. A novidade, na prática, ficou a cargo da nomeação
ex-ofício de um defensor por parte da instituição a qual o policial é subordinado,
trazendo maior segurança jurídica aos mesmos.
Apesar de bem-intencionado, o legislador deixou lacunas. Isso porque,
como já demonstrado acima, a maioria das mortes de policiais ocorrem fora do
serviço. Vale salientar que, por mais que o policial esteja fora do serviço, ele ainda
assim tem o dever de agir. Assim traz-nos Greco, quando explanando acerca dos
garantidores:

Talvez um dos fardos mais pesados criados pelo Direito Penal seja a
posição de garantidor. Para os policiais militares, esse fardo se torna ainda
mais pesado, uma vez que, de acordo com o Estatuto da Polícia Militar de
quase todos os Estados da federação, o policial militar, mesmo fora do seu
horário normal de trabalho, ainda é considerado como garantidor, tendo,
mesmo nas horas e nos dias de folga, o dever de agir para impedir os
resultados previstos nos tipos penais. O raciocínio não é diferente quando
estamos diante de um policial civil, cujos estatutos também prevêem a sua
condição de garantidor durante as 24 horas do dia. 24

23
BRASIL. Código de Processo Penal. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/del3689.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
24
GRECO, op. cit., p.207
18
Logo, para a correta adequação da teoria do dispositivo legal à prática
policial, faz-se necessário que o direito dado aos policias seja integral, que perdure
também quando o mesmo esteja em sua folga.

2.3.4 Legítima defesa da vítima refém

Retornando ao tema citado no item 2.1.4, a legítima defesa da vítima


refém foi também incluída no nosso ordenamento jurídico por força da Lei
13.964/2019. Em seu parágrafo único, o art. 25 nos traz:
Parágrafo único. Observados os requisitos previstos no caput deste artigo,
considera-se também em legítima defesa o agente de segurança pública
que repele agressão ou risco de agressão a vítima mantida refém durante a
prática de crimes25

Aqui vemos um instrumento que visa a melhor compreensão do instituto


da legítima defesa, vez que mesmo antes deste parágrafo ser incluso, os agentes
que nessa situação se encontravam, já estavam respaldados pela legítima defesa de
terceiros.
Para Rogério Sanchez, este parágrafo é considerado como um dos
requisitos para caracterização da legítima defesa. O mesmo titula esse requisito de
“conhecimento da situação do fato justificante”, defendendo que “deve o agente
conhecer as circunstâncias do fato justificante, demonstrando ter ciência de que está
agindo diante de um ataque atual ou iminente (requisito objetivo)” 26

Para Cleber Masson, o parágrafo é “redundante e desnecessário” por


duas razões:
(a) Se estão “observados os requisitos previstos no caput deste artigo”, é
porque já se caracteriza uma situação clara de legítima defesa, e (b) se
existe “vítima mantida refém durante a prática de crimes”, o agente de
segurança não só pode, mas deve repelir agressão ou risco de agressão a
ela endereçado, inclusive com a prática de fato típico, porém lícito, seja pla
configuração de legítima defesa de terceiro, seja pela obrigação de prender
quem quer que seja encontrado em flagrante delito (CPP, art. 301) 27

Aqui, novamente, é trazida uma mudança na legislação para maior


segurança jurídica do policial, deixando-o mais confortável para, se preciso,
neutralizar a ameaça que põe a vida do refém em perigo.

25
BRASIL. Código Penal. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del2848compilado.htm . Acesso em: 09 Abril 2021
26
CUNHA, op. cit., p.338
27
MASSON, op. cit., p. 350
19
Nesse sentido, pontua Masson:

Fica a impressão, portanto, de que o legislador incluiu este parágrafo único


no art. 25 do Código Penal para proporcionar maior segurança jurídica às
instituições de segurança pública e a seus membros, conferindo-lhes uma
proteção explícita para um direito que sempre foi consagrado pelo Direito
Penal. Essa atitude, ainda que desnecessária, mostra-se aceitável,
principalmente pela repercussão que alguns casos têm tomado no Brasil
nos últimos tempos. 28

Em consonância, ratifica Greco:


Nesses casos, se o agente de segurança pública atua, visando à liberação
da vítima, obviamente que estaria amparado pela legítima defesa. Seu
comportamento se amoldaria, perfeitamente, ao conceito previsto no caput
do art. 25 do Código Penal. Contudo, mesmo diante de situações tão
evidentes, parte de nossa classe política, principalmente aqueles ligados
aos partidos de esquerda, sempre questionaram os comportamentos
praticados pelos agentes de segurança pública, deslegitimando-os. Assim,
na verdade, o parágrado único do art 25 do estatuto repressivo resolve
eliminar de vez com esse tipo de questionamento, fazendo uma verdadeira
interpretação autêntica do conceito de legítima defesa. 29

28
MASSON, op. cit., p. 350
29
GRECO, op. cit., p 164
20
3 CONCLUSÃO

Foi tratado neste trabalho o instituto da legítima defesa, tema que foi
destrinchado em todo o dispositivo legal, com o intuito de demostrar que a mesma é
muito mais complexa do que imaginamos, principalmente quando aliada à
conjuntura social em que vivemos no Brasil. Durante as pesquisas realizadas, foi
possível notar a intensa problemática de violência social vivenciada no Brasil e, por
estarmos acostumados, não notamos o quão grave e assustadora é essa realidade.
Violência essa que atinge a todos, sem distinção de classe social, raça, credo e
profissão, e de igual forma todos temos o direito à legítima defesa, direito esse a ser
exercido quando essa violência assustadora “bater em nossa porta”.
Nota-se sobretudo que a categoria policial necessita de maior respaldo
legislativo para que possa resguardar seus bens jurídicos e os de outrem, visto que
obriga-se a assumir o papel de garantidor. Dessa forma, torna-se imprescindível que
o ordenamento jurídico pátrio assegure a esses profissionais direitos proporcionais
às responsabilidades às quais estão obrigados. Embora as recentes mudanças
promovidas pelo “Pacote Anticrime” tenham conferido significativas melhorias acerca
de tal problemática, muito ainda necessita ser feito a fim de garantir uma efetiva
proporcionalidade entre os deveres e direitos da categoria em questão.
A pesquisa e trabalho buscou responder se, com base na legislação
vigente, há segurança jurídica para a efetiva praticabilidade da legítima defesa. Com
base nas pesquisas e estudos feitos, fica claro que o Estado tem se esforçado para
garantir a segurança jurídica dos praticantes de tal dispositivo, sobretudo dos
agentes da lei, categoria mais beneficiada pelas mudanças trazidas na legislação.
Chegamos à conclusão de que há segurança jurídica, porém não o
suficiente para atender todas as necessidades dos agentes da lei e cidadãos. As
mudanças trazidas foram boas, porém, por vezes, redundantes, sem efetividade na
prática, além de que tais mudanças apenas respaldam em caso de efetivo exercício
policial, quando é fato que a maioria das ocorrências com resultado morte dão-se
quando o policial está de folga.
Por fim, é preciso que o Estado continue avançando e trazendo novos
dispositivos legais, para que todos aqueles que vierem a praticar seu direito estejam
respaldados e amparados por uma segurança jurídica forte e consistente.

21
4 REFERÊNCIAS

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23

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