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INTENSIVO I

Disciplina: Direito Penal


Prof. Rogério Sanches
Aula nº 08

MATERIAL DE APOIO – MONITORIA

Índice

1. Artigo Correlato
1.1. Pessoa jurídica não pode praticar crime
2. Jurisprudência Correlata
2.1. STJ - RHC 20155 / PR
2.2. STJ - HC 113896 / PR
3. Assista!!!
3.1. O que se entende por conceito material de crime?
3.2. Quais os elementos do tipo penal para a teoria causalista?
4. Leia!!!
4.1. Em relação ao conceito de infração penal, o Código Penal Brasileiro adota o sistema tricotômico ou
dualista?
4.2. O homem morto pode ser sujeito passivo de crime?
5. Simulados

1. ARTIGO CORRELATO

1.1. PESSOA JURÍDICA NÃO PODE PRATICAR CRIME

Autor: Sidio Rosa de Mesquita Júnior, Procurador Federal e Professor Universitário. Graduou-se em Segu-
rança Pública (1.989) e em Direito (1.994). É especialista Direito Penal e Criminologia (1.996) e Metodo-
logia do Ensino Superior (1.999). Também, é Mestre em Direito (2.002) e cursa Doutorado. É autor dos
livros seguintes livros (todos publicados pela Editora Atlas): Prescrição Penal; Execução Criminal: Teoria e
Prática; e Comentários à Lei Antidrogas: Lei n. 11.343, de 23.8.2006.
Data: Março de 2010

1. INTRODUÇÃO

O objetivo deste estudo é demonstrar que não existem razões científicas razoáveis para sustentar a pos-
sibilidade de poder a pessoa jurídica vir a praticar crime. Trata-se de terreno arenoso, crescendo dia a dia
o número de defensores da possibilidade de incriminar a conduta da pessoa jurídica.

A análise não poderá prescindir do conceito analítico de crime, visto que dois de seus elementos terão
máxima importância na análise. O primeiro deles é a conduta, enquanto parte integrante da conduta e o
ponto central da discussão será a culpabilidade.

O Direito alienígena desconhece o conceito bipartido de crime defendido por muitos brasileiros, pelo qual
a culpabilidade não integra o conceito de crime [01] – daí a opção pelo conceito tripartido, o qual é mais
aceito mundialmente, apresenta-se mais completo e razoável que o unitário, o bipartido clássico e o qua-
dripartido.

2. A PESSOA JURÍDICA É INCAPAZ DE EXPRESSAR SUA VONTADE

Desde o momento em que o causalismo puro foi superado, isso no início do século passado (década de

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1930), o elemento vontade não pode ser afastado do conceito de conduta. A pessoa jurídica, portanto,
não pode praticar conduta jurídico-criminal. Ela, também, não pratica crime porque não há como verificar,
em uma pessoa jurídica, o elo subjetivo que liga o autor ao fato.

Personificamos determinados entes públicos (pessoas jurídicas de direito público) e privados (pessoas
jurídicas de direito privado), a fim de tornar possíveis certas relações na sociedade. Tais pessoas podem
ser de Direito interno ou externo (CC, art. 40). Porém, são ficções do Direito que não detêm vontade. Elas
sequer podem comparecer em Juízo sozinhas, devendo ser representadas, porque incapazes de exprimir
suas próprias vontade (CPC, art. 12, inc. VI).

Imagine-se o absurdo que seria a ação criminal movida contra a União por crime. Seria uma posição es-
tapafúrdia em que os entes estatais visariam à imposição de penas a eles próprios, em uma verdadeira
confusão. Na hipótese, poder-se-ia até dizer impossível a criminalização da conduta porque a auto-lesão é
impunível. Em sentido contrário, alguém poderia até sustentar que o ius puniendi é do Estado, pessoa de
Direito público que não se confunde com a União. Tal argumento não nos seduz, porque quem legisla pri-
vativamente em matéria criminal é a União, ou seja, há efetiva confusão entre quem cria crimes e comina
penas e a pessoa sujeita à norma criminal, caso se entenda ser a União passível de responsabilidade jurí-
dico-criminal.

O membro do MP e o Juiz, enquanto investidos, respectivamente, das suas atribuições e jurisdição, são
órgãos do Estado. O membro e o órgão acusando e condenado o todo, do qual fazem parte, é uma con-
tradição inaceitável, até porque, independentemente da teoria que se adote acerca da natureza jurídica
do Estado, ele será constituído e criará órgãos para atender ao bem comum.

3. A CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO PREVÊ A RESPONSABILIDADE CRIMINAL DA PESSOA JURÍDICA

O mau agente público, aquele que se vale da máquina estatal para provocar danos sérios à sociedade,
poderá ser responsabilizado administrativa, civil e criminalmente, restando a responsabilidade da pessoa
jurídica adstrita à reparação do dano civil e excepcionalmente à responsabilidade administrativa. Aliás, a
responsabilidade civil das pessoas jurídicas prestadoras de serviços públicos está expressamente prevista
no art. 37 da CF, in verbis:

"§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos res-
ponderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de
regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa".
Não obstante o exposto, com o advento da CF/1988, passou-se a entender ser possível a responsabiliza-
ção criminal da pessoa jurídica em matéria ambiental, eis que seu art. 225, § 3º dispõe:

"§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas
físicas e jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os
danos causados".
Da mesma forma que João José Leal, entendo que o art. 225, § 3º, da CF merece interpretação restritiva.
A responsabilidade da pessoa jurídica será administrativa e civil, ficando a responsabilidade criminal ads-
trita às pessoas físicas. [02]

4. ANÁLISE DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL DA PESSOA JURÍDICA ANTE A TEORIA DO CRIME

4.1 A PESSOA JURÍDICA É INIMPUTÁVEL

A conduta jurídico-criminal relevante da pessoa jurídica é inexplicável na teoria do crime, bem como sua
culpabilidade. Porém, em decorrência do direito anglo-saxão, especialmente da América do Norte, emer-
giu corrente favorável à criminalização da conduta da pessoa jurídica, o que deu ensejo à criação da Lei n.
9.605/1998.

Entendemos ser necessário respeitar o princípio societas delinquere non potest. Isso decorre do princípio
da culpabilidade, agasalhado em nossa CF, por ele nullum crimem sine culpa. Esta, por sua vez, deve ser
demonstrada em um devido processo legal. Corroborando, há o preceito do art. 18 do CP, que entende só

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ser possível a responsabilização pela conduta dolosa, admitindo a responsabilização pela negligência ape-
nas excepcionalmente. Assim, o art. 19 entende que a responsabilização por qualquer resultado só poderá
se dar se este for causado, no mínimo, negligentemente.

A CF norteia as normas infraconstitucionais. Também, as regras gerais do CP devem ser aplicadas à legis-
lação especial, quando é compatível com elas (CP, art. 12). Ora, se é necessário respeitar ao princípio da
culpabilidade, em face dos preceitos mencionados, não há como pretender ver vontade em uma ficção do
Direito.

Em sentido contrário à nossa posição, Flávio Augusto M. de Barros sustenta:

De acordo com a teoria da ficção jurídica, a pessoa jurídica não tem existência real, não tem vontade pró-
pria. Apenas o homem possui aptidão de ser sujeito de direitos. Ora, essa teoria não pode prevalecer,
porque, se a pessoa jurídica é uma ficção, o Direito o é, porque emanado de uma pessoa jurídica, isto é,
do Estado. Trata-se de uma teoria contraditória, pois, ao mesmo tempo em que nega a vontade à pessoa
jurídica, admite que ela adquira direitos. [03]
O texto transcrito traduz o pensamento do autor acerca da pessoa jurídica no plano criminal. Ele entende
que em outros ramos do Direito não há inconveniente porque prevalece a regra de que a pessoa jurídica é
capaz para adquirir direitos. [04] Data venia, o autor confunde capacidade de aquisição de direitos com a
capacidade de exercício de tais direitos.

4.2 PRINCÍPIO DA CULPABILIDADE E PESSOA JURÍDICA

A pessoa jurídica, assim como o doente mental, não pode ser sujeito ativo de crime. Falta-lhe condição
para exprimir sua própria vontade. A realidade, não apreendida por pessoas que pretendem conceber co-
nhecimentos simplistas, vulgares, demonstra que a pessoa jurídica sequer chega ao plano da pessoa física
incapaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se segundo referido entendimento.

Nos planos civil, empresarial, econômico, do consumidor e tributário, criamos mecanismo para atingir
terceiros que se valem da pessoa jurídica como instrumento de ilícitos prejudiciais à sociedade: a descon-
sideração da personalidade da pessoa jurídica. Aliás, o CP é claro no sentido de que aquele que se vale de
outrem como instrumento de seu delito responde pelo fato como seu. Com outras palavras, desconsidera-
se a personalidade da pessoa jurídica para imprimir a responsabilidade a quem dela se valeu como ins-
trumento de crime.

O princípio de culpabilidade traduz a idéia de que ninguém pode ser punido sem dolo ou negligência e,
mais ainda, sem censurabilidade (culpabilidade). [05] Um doente mental tem vontade, embora sua capa-
cidade de exprimir a vontade seja limitada, às vezes impossibilitando o conhecimento da ilicitude do fato
ou a condução segundo o direito, ou seja, determina-se visando a um fim. A pessoa jurídica, por sua vez,
não tem vontade própria, esta sempre emanará de outrem, o que impossibilita falar em conduta jurídico-
criminal da pessoa jurídica.

O Estado, pessoa jurídica de Direito externo, não detém vontade própria. Do mesmo modo, não a detêm
os entes federados (Flávio Augusto propõe a irresponsabilidade criminal dos entes públicos [06]). Ora,
criar distinções entre pessoas jurídicas, a fim de que umas não sejam atingidas pela norma criminal, im-
portará negar responsabilidade a algumas, assumindo a ausência de vontade autônoma de cada uma de-
las. Isso demonstra a insuficiência da construção de referido autor.

Cláudio Brandão piora a perspectiva, uma vez que passa a entender que não somente a ordem ambiental
está no âmbito do direito criminal, isso quanto à responsabilidade da pessoa jurídica. Sua posição estende
a abrangência ao Direito Econômico uma vez que faz referência ao art. 173, § 5º, da CF. [07]

Mesmo que ampliados os alcances dos preceitos constitucionais mencionados (art. 225, § 3º, e 173, § 5º,
ambos da CF), não é possível verificar a possibilidade de culpabilidade da pessoa jurídica. Ela é personifi-
cada, mas como ficção, para ser titular de direitos e obrigações, embora o sistema normativo lhe negue
capacidade para exprimir sua vontade. Aliás, essa incapacidade é visível em vários momentos – tanto é
que se a pessoa jurídica é instrumento de ilícito que cause danos a terceiros, possível é a desconsideração

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da sua personalidade, alcançando-se seus titulares.

Cláudio Brandão sustenta:

A pessoa jurídica não tem livre arbítrio, como se verifica na pessoa humana, por isso seu agir deve ser
estudado com base na sua própria natureza, por isto a ação praticada pela pessoa jurídica é chamada de
ação da instituição ou de ação institucional. É claro que a ação institucional é um pressuposto da ação
individual dos seres humanos que compõem a instituição, destarte deve-se fazer uma dupla imputação
para o juízo de censurabilidade da ação (que é a culpabilidade). Ao ser humano imputar-se-á uma culpa
individual, e à uma pessoa jurídica imputar-se-á uma culpa coletiva, com base na ação institucional. [08]
Nada mais equivocado que o texto transcrito. Ele peca, principalmente, por trazer a pretensa possibilidade
de se violar o princípio non bis in idem. Observe-se: (a) a pessoa responder duas vezes (uma por respon-
sabilidade coletiva e outra por responsabilidade individual) é inadmissível; (b) constitui bis in idem punir
por responsabilidade coletiva e responsabilidade individual, uma vez que a responsabilidade coletiva é a
soma das diversas responsabilidades individuais, ou seja, responsabilidade coletiva não é outra coisa se-
não responsabilidades individuais congregadas. Assim, resta evidente a esterilidade da proposta transcri-
ta, não sendo outra coisa senão discurso.

A proposta de Cláudio Brandão é ainda mais vazia porque estende o leque constitucional, pretendendo
tornar possível a responsabilidade criminal para fatos alheios às questões ambientais, quando a CF se
restringe a estas (observe-se que entendo diversamente, ou seja, a CF, para mim, não admite a respon-
sabilidade criminal da pessoa jurídica).

4.3 FUNDAMENTOS ANGLO-SAXÃOS EM FAVOR DA RESPONSABILIDADE CRIMINAL DA PESSOA JURÍDICA

Lendo Roland Hefendehl, chegamos a conclusão parecida com a de Cláudio Brandão, como se ela tradu-
zisse a idéia de Bernd Schünemann. Ocorre que ao mesmo tempo que, citando Schünemann, Roland He-
fendehl procura explicar a responsabilidade criminal de pessoa jurídica, reconhece: "A atribuição de ato de
outrem à empresa não é sinônimo de um ato da empresa, nem é a atribuição da culpabilidade de outrem
à empresa sinônima da determinação de uma culpabilidade da empresa". [09]

Para que não haja responsabilidade criminal da empresa, Schünemann apud Hefendehl, estabelece os
seguintes critérios de exclusão: (1) ser possível punir o crime com multa; (2) crimes que, pela própria
natureza, não podem ser praticados pela empresa, v.g., estupro. [10]

Exigir que o crime seja punível com multa afastará a intervenção do Direito Criminal. Administrativamen-
te, tal sanção pode ser imposta sem maiores problemas, o que demonstra ser vazia de conteúdo a pro-
posta de se responsabilizar criminalmente a empresa. Ademais, ainda citando Schünemann, referido autor
reconhece ser necessário verificar se o ato é da empresa ou de algum dirigente em si, sendo importante
analisar níveis administrativos para se poder detectar o que seria ato individual e o que seria ato coletivo
(este é o da empresa), o que não está claro ainda, exigindo um afundamento que demandará "longo tem-
po". [11]

Segundo Hefendehl, Schünemann propõe a total quebra dos princípios relativos à culpabilidade nos casos
de responsabilidade criminal da pessoa jurídica, invocando a teoria do risco para justificar a responsabili-
dade pela criação do risco proibido. [12] Essa posição funcionalista é complementada com a idéia, tam-
bém funcionalista, de que a empresa constitui sistema autopoiético, com objetivos diversos dos objetivos
de seus empregados.

A doutrina norte-americana não consegue explicar claramente a culpabilidade da empresa, socorrendo-se


da tese do respondeat superior, que significa:

(rehs-pond-dee-at superior) no Latin ‘permite ao patrão responder’, uma explicação doutrinária de influ-
ência no Direito, que possibilita que um principal (empregador) é responsável por ações de seus/suas a-
gentes (empregados) no ‘curso do emprego’. Assim, um agente firma um contrato de compra satisfatório
para seu empregador, em nome do empregador, pode criar uma obrigação contratual entre o vendedor e
o empregador. Por exemplo: se um motorista de caminhão de distribuição negligentemente atropela uma

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criança na estrada, a companhia para qual o motorista trabalha será responsável pelo dano. [13]
Essa tese é salutar no âmbito civil. No entanto, ante o princípio da culpabilidade e o princípio da persona-
lidade, em matéria criminal é impossível transferir para o empregador (pessoa jurídica) a responsabilida-
de pelos atos de seus empregados. Desse modo, é insustentável juridicamente a tese da responsabilidade
criminal da pessoa jurídica.

4.4 A CONSCIÊNCIA DA ILICITUDE É ELEMENTO DA CULPABILIDADE

A pessoa jurídica pode ver reconhecida a sua vontade por ficção. Aliás, entende-se que ela tem vontade
quando firma contratos, mas o faz representada por uma pessoa natural. É, portanto, verificar consciência
da ilicitude no ato da pessoa jurídica. Essa consciência, mesmo que potencial, é fundamental ao reconhe-
cimento da culpabilidade.

O ato ilícito da pessoa jurídica, no plano criminal, deve ser visto como erro, responsabilizando-se o tercei-
ro que a induziu a erro pelo referido ato, eis que aquela não é capaz de culpabilidade, sendo defeituosa
qualquer proposta de adoção do princípio societas delinquere potest. Esse princípio surgiu em substituição
ao princípio societas delinquere non potest sob o argumento de há maior pragmatismo em sua adoção,
isso em face da evolução da economia. Ocorre que a pessoa jurídica é mero instrumento de pessoas e são
estas que devem sofrer a drástica intervenção jurídico-criminal.

5. SUBSIDIARIEDADE DO DIREITO CRIMINAL

Sendo subsidiário, o Direito Criminal deve se afastar daqueles lugares em que as sanções dos outros ra-
mos do Direito representarem coercibilidade suficiente para evitar a prática de ilícitos. Observem-se as
penas passíveis de aplicação às pessoas jurídicas, constantes da Lei n. 9.605, de 12.2.1998, em seu art.
21:

- multa – essa pena pode ser imposta pela Administração em decorrência de processo administrativo, que
tem procedimento mais célere e pode ser mais eficaz que a multa decorrente de crime, uma vez que esta
deverá ser aplicada pelo Juiz natural em procedimento mais formal que o administrativo, haja vista que a
processualidade administrativa é norteada pela formalidade moderada;

- restrição de direito – essa pena pode ser especificada isolada ou cumulativamente em suspensão parcial
ou total de atividades, interdição temporária do estabelecimento ou atividade, proibição de contratar com
o Poder Público e vedação à obtenção de subsídios (art. 22). Todas essas modalidades de restrições são
previstas em leis eminentemente administrativas, v.g., Lei n. 8.884/1994 (lei de proteção da ordem eco-
nômica) e Lei n. 8.666/1993 (lei das licitações), apresentando-se inócua a previsão da Lei n. 9.605/1998.

- prestação de serviços à comunidade – essa pena, tenho como efetiva pena privativa de liberdade, mas
quando se fala da prestação de serviço à comunidade da pessoa jurídica, permite-se duas objeções bási-
cas: (a) a pena não pode ser imposta porque viola o princípio da personalidade, uma vez que não é a
pessoa jurídica que a cumpre mas os seus empregados; (b) se pensarmos que ela é quem cumpre por
meio de seus empregados, arcando com os custos do serviço, estaremos reconhecendo a péssima técnica
legislativa, uma vez que a pena não seria de efetiva prestação de serviços, mas de prestação pecuniária.

É interessante notar que a Lei n. 9.605/1998 foi extremamente tímida no que concerne às razões, além
de utilizar péssima técnica legislativa. Com efeito, aquilo que denominou prestação de serviços à comuni-
dade, por meio de custeio de programas de projetos ambientais (art. 23, inc. I), constitui efetiva presta-
ção pecuniária. Ademais, a legislação administrativa admite a decretação da morte da pessoa jurídica,
isso como sanção, sendo estranha referida timidez legislativa.

Uma pessoa jurídica que vem sendo utilizada como instrumento para a prática de crime de pessoa física
pode ser perdida em favor da União, eis que a empresa não pode se destinar precipuamente à prática de
crime, eis que, se o for, demonstrará, na verdade, organização criminosa, devendo ser cassada definiti-
vamente sua atividade. Afinal, a "sociedade" que tende à prática de crime não será outra coisa senão a
materialização de uma organização criminosa, devendo determinar-se a cessação total ou parcial de suas
atividades, o que pode se dar, inclusive, em caráter definitivo, cassando-se o seu registro porque não a-

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tendidos os fins que se propôs e, pior, constituirá, se mantida a empresa, a ser mero instrumento de cri-
me.

6. CONCLUSÃO

A pessoa jurídica não pode praticar a conduta jurídico-criminal porque despida de vontade própria. Al-
guém poderia dizer que a empresa é partícipe do crime de seus empregados ou dirigentes, o que seria,
também, inadmissível, uma vez que ela não teria como aderir à vontade delituosa de seus empregados,
esvaziando qualquer tentativa de se falar em concurso de pessoas envolvendo a empresa.

Entender que a pessoa jurídica tem vontade própria não é suficiente para verificar crime na sua conduta,
visto que faltará o domínio sobre a própria vontade, o que afastará a culpabilidade.

Finalmente, as penas passíveis de aplicação podem ser impostas administrativamente e a reparação do


dano pode ser exigida em juízo cível. Assim, em face da subsidiariedade do Direito Criminal, nem mesmo
em relação aos delitos ambientais, será cabível a intervenção jurídico-criminal.

Notas

1. MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. A culpabilidade integra o conceito analítico de crime. Disponível em:
<http://www.investidura.com.br/biblioteca-juridica/artigos/direito-penal/4160-a-culpabilidade-integra-o-
conceito-analitico-de-crime.html>. Acesso em: 20.12.2009, às 20h55.

2. LEAL, João José. Direito penal geral. São Paulo: Atlas, 1999. p. 169.

3. BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1, p. 111.

4. Ibidem.

5. BUSATO, Paulo César, HUAPAYA, Sandro Montes. Introdução ao direito penal. Rio de Janeiro: Lúmen
Júris, 2003. p. 170-181.

6. BARROS, Flávio Augusto Monteiro de. Direito penal. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 1, p. 113.

7. BRANDÃO, Cláudio. Teoria jurídica do crime. Rio de Janeiro: Forense, 2001. p. 60/61.

8. Ibidem. p. 62.

9. HEFENDEHL, Roland. Corporate criminal liability: model penal code section 2.07 and the development
in western legal systems. www.buffalo.com, 2.10.2003, 2h05. Texto no original: "The attribution of
someone else’s act to a corporation is not synonymous with an act of the corporation, nor is the attribu-
tion of someone else’s culpability to the corporation synonymous with a determination of a corporation’s
culpability".

10. Ibidem.

11. Ibidem.

12. Ibidem.

13. www.dictionary.law.com, 20.11.2003, 10h10: "(rehs-pond-ee-at superior) n. Latin for ‘let the master
answer’, a key doctrine in the law of agency, which provides trat a principal (employer) is repnsible for
the actions of his/her/its agente (employee) in the ‘course of employement’. Thus, an agent who signs an
agreement to purchase goods for his employer in the name of the employer can create a binding contract
between the seller ande the employer. Another Example: if a delivery truck driver negligently hits a child
in the street, the company for which the driver works will be liable for the injuries".

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Fonte: http://jus.uol.com.br/revista/texto/14673/pessoa-juridica-nao-pode-praticar-crime

2. JURISPRUDÊNCIA CORRELATA

2.1. STJ - RHC 20155 / PR

Relatora: Ministra Maria Thereza De Assis Moura


Órgão Julgador: Sexta Turma
Julgamento: 01/12/2009

Ementa:
RECURSO ORDINÁRIO EM HABEAS CORPUS. DENÚNCIA POR VÁRIOS CRIMES E CONTRAVENÇÕES PE-
NAIS. PRETENSÃO DE TRANCAMENTO COM RELAÇÃO AOS DELITOS DE AMEAÇA. AUSÊNCIA DE REPRE-
SENTAÇÃO DA VÍTIMA. PENA MÁXIMA INFERIOR A UM ANO. PRESCRIÇÃO EM DOIS ANOS. RECONHECI-
MENTO DE OFÍCIO. 1. Tratando-se de contravenções penais e de crime cuja pena máxima prevista é infe-
rior a 1 (um) ano, a prescrição se opera em 2 (dois) anos, a teor do art. 109, VI, do Código Penal, período
que já transcorreu desde o último marco interruptivo (recebimento da denúncia, art. 117, I, CP). É de
rigor que seja declarada, de ofício, extinta a punibilidade, pelo reconhecimento da prescrição da pretensão
punitiva, ficando prejudicado o mérito do recurso ordinário. 2. Habeas corpus concedido, de ofício, para
declarar extinta a punibilidade com relação às contravenções penais previstas nos arts. 42, III, e 62, da
Lei de Contravenções Penais, e ao delito previsto no art. 147 do Código Penal, julgando prejudicado o re-
curso ordinário.

2.2. STJ - HC 113896 / PR

Relator: Ministro OG Fernandes


Órgão Julgador: Sexta Turma
Julgamento: 19/10/2010

Ementa:
HABEAS CORPUS. FORNECIMENTO DE BEBIDA ALCOÓLICA A MENOR DE 18 ANOS. CONDUTA QUE SE
AMOLDA À PREVISTA NO ART. 63 DA LEI DAS CONTRAVENÇÕES PENAIS. AFASTAMENTO DO ART. 243 DO
ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. CORRÉUS EM SIMILITUDE DE SITUAÇÕES. EXTENSÃO DE
EFEITOS. ORDEM CONCEDIDA. 1. "A distinção estabelecida no art. 81 do ECA das categorias 'bebida alco-
ólica' e 'produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica' exclui aquela do obje-
to material previsto no delito disposto no art. 243 da Lei 8.069/90; caso contrário, estar-se-ia incorrendo
em analogia in malam partem" (REsp-942.288/RS, Relator Ministro Jorge Mussi, DJ e de 31.3.08). 2. A
interpretação sistemática dos dispositivos nos arts. 81 e 243 do ECA, e do art. 63 da LCP, conduz ao en-
tendimento de que a conduta de fornecimento de bebida alcoólica a menores de dezoito anos melhor se
amolda àquela elencada na Lei das Contravenções Penais. Precedentes. 3. Havendo corréus condenados
pelo mesmo dispositivo, devem os efeitos da desclassificação ser também a eles estendidos. 4. Ordem
concedida para, desclassificando a conduta prevista no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente
para aquela descrita no art. 63 da Lei das Contravenções Penais, reduzir as penas recaídas sobre o paci-
ente. Extensão dos efeitos da ordem aos corréus Aline Aparecida Borges e Tadeu Kuczar Filho, redimensi-
onando, também em relação a eles, as penas aplicadas, além de permitir a substituição das privativas de
liberdade por restritivas de direitos.

3. ASSISTA!!!

3.1. O que se entende por conceito material de crime?

Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20100706124413650

3.2. Quais os elementos do tipo penal para a teoria causalista?

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Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20101028141648623

4. LEIA!!!

4.1. EM RELAÇÃO AO CONCEITO DE INFRAÇÃO PENAL, O CÓDIGO PENAL BRASILEIRO ADOTA O


SISTEMA TRICOTÔMICO OU DUALISTA?

Autora: Denise Cristina Mantovani Cera


Publicação: 30/11/2010

O Código Penal Brasileiro adota o sistema dualista ou binário. Prevê a infração penal como gênero, e co-
mo espécies o crime e a contravenção penal. Delito é sinônimo de crime, e a contravenção penal possui
como sinônimos: crime anão, delito liliputiano e crime vagabundo.

Lei de Introdução ao Código Penal, Art. 1º Considera-se crime a infração penal que a lei comina pena de
reclusão ou de detenção, quer isoladamente, quer alternativa ou cumulativamente com a pena de multa;
contravenção, a infração penal a que a lei comina, isoladamente, pena de prisão simples ou de multa, ou
ambas, alternativa ou cumulativamente. (Destacamos)

A matéria em estudo foi objeto de questionamento do concurso da ABIN/2010 – CESPE:

“No Código Penal Brasileiro, adota-se, em relação ao conceito de crime, o sistema tricotômico, de acordo
com o qual as infrações penais são separadas em crime, delitos e contravenções”. Resposta: ERRADA

Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=20101129130112975

4.2. O HOMEM MORTO PODE SER SUJEITO PASSIVO DE CRIME?

Autora: Denise Cristina Mantovani Cera


Publicação: 09/03/2011

O sujeito passivo de uma infração penal é a pessoa ou o ente que sofre as consequências da mesma.

O morto, por não ser titular de direito, não pode ser sujeito passivo de um crime. O morto não possui
personalidade jurídica. No entanto, certos delitos contra o respeito aos mortos são punidos, sendo víti-
mas, no caso, a família ou a coletividade.

Nas palavras do professor Rogério Sanches:

A calúnia contra os mortos também é punida (art. 138, § 2º), mas, sendo a honra um atributo dos vivos,
seus parentes é que serão os sujeitos passivos, interessados na preservação da sua memória. Neste caso,
a queixa (art. 145 do CP) será movida pelo seu cônjuge (ou companheiro/companheira), ascendente,
descendente ou irmão (arts. 30 e 31 do CPP).

Calúnia

Art. 138 - Caluniar alguém, imputando-lhe falsamente fato definido como crime:

(...)

§ 2º - É punível a calúnia contra os mortos.

O professor, ao escrever sobre o crime de impedimento ou perturbação de cerimônia funerária, também


nos ensina que:

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Evidentemente, a vítima do delito não será o morto, porquanto não mais titular de direito. Tendo em vista
a objetividade jurídica, sujeito passivo será a coletividade, representada, conforme o caso concreto, pela
família, pelos amigos ou qualquer pessoa que com ele (morto) guarda relação.

Impedimento ou perturbação de cerimônia funerária

Art. 209 - Impedir ou perturbar enterro ou cerimônia funerária:

Pena - detenção, de um mês a um ano, ou multa.

Vale dizer que o assunto em estudo foi objeto de questionamento no concurso para Procurador do TC/MG,
e a assertiva incorreta dizia: De acordo com o ordenamento penal vigente, o homem morto pode ser su-
jeito passivo de crime.

Fontes:

Curso Intensivo I da Rede de Ensino LFG – Professor Rogério Sanches.

SANCHES, Rogério. Direito Penal – Parte especial. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, 2ª ed.,
p. 82 e 226.

Fonte: http://www.lfg.com.br/public_html/article.php?story=2011030908254057

5. SIMULADOS

5.1. Em tema de crimes e contravenções, é correto afirmar que:


a) às contravenções é cominada, pela lei, a pena de reclusão ou de detenção e multa, esta última sempre
alternativa ou cumulativa com aquela.
b) fato típico é o comportamento humano positivo ou negativo que provoca, em regra, um resultado, e é
previsto como infração penal.
c) são elementos do crime, apenas a antijuridicidade e a punibilidade.
d) a existência de causas concorrentes para o resultado de um fato, preexistentes ou concomitantes com
a do agente, sempre excluem a sua responsabilidade.
e) para haver crime é necessário que exista relação de causalidade entre a conduta e o seu autor.

5.2. Analise as seguintes assertivas:


I. A tentativa na contravenção penal não é passível de punição.
II. Segundo a lei penal, quando o agente, voluntariamente, desiste de prosseguir na execução ou impede
que o resultado se produza, somente responde pelos atos já praticados. Há desistência voluntária quando
o agente, embora tenha iniciado a execução do crime, não a leva adiante, desistindo da consumação.
Basta que a desistência seja voluntária, não se exigindo que seja espontânea.
III. Não há punição a ser aplicada se, nos crimes cometidos sem violência ou grave ameaça à pessoa,
houver arrependimento posterior, sendo reparado o dano ou restituída a coisa, até o recebimento da de-
núncia ou da queixa, por ato voluntário do agente.
Assinale a alternativa correta:
a) Apenas as assertivas I e II são verdadeiras;
b) Apenas as assertivas II e III são verdadeiras;
c) Apenas as assertivas I e III são verdadeiras;
d) Todas as assertivas são verdadeiras;
e) Apenas uma assertiva é verdadeira.

5.3. No Código Penal brasileiro, adota-se, em relação ao conceito de crime, o sistema tricotômico, de a-
cordo com o qual as infrações penais são separadas em crimes, delitos e contravenções.
( ) Certo ( ) Errado

GABARITO:

INTENSIVO I – Direito Penal – Rogério Sanches – Aula n. 08


5.1. B
5.2. A
5.3. Errado

INTENSIVO I – Direito Penal – Rogério Sanches – Aula n. 08

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