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RESUMO
O objetivo do presente trabalho é observar a consequência jurídica que pode ser acarretada
mediante a verificação do crime de excesso, bem como analisar a tamanha dificuldade de
diferenciação entre a modalidade dolosa e a existência de culpa. O trabalho também visa
apontar aspectos relevantes acerca da figura do excesso exculpante, que, embora não previsto
na legislação brasileira enquanto tipo penal é figura amplamente explorada jurisprudencial e
doutrinariamente.
Palavras-chave: Legitima Defesa- Exclusão de ilicitude- Legitima Defesa dolosa e culposa.
ABSTRACT
The objective of the present study is to observe the legal consequence that can be caused by
the verification of the crime of excess, as well as to analyze the great difficulty of
differentiating between the malicious modality and the existence of guilt. The paper also aims
at pointing out relevant aspects about the exculpatory excess figure, which, although not
provided for in Brazilian legislation as a criminal type, is a widely explored case-law and
doctrinally.
Keywords: Legitima Defesa- Exclusion of unlawfulness- Legitima Defensive and willful
mischief.
INTRODUÇÃO
Ao nascer o homem tem consigo direitos e deveres, e assim, nasce também seu direito
de legítima defesa. Sempre que pensamos no Direito Penal, fazemos uma associação a
normas proibitivas, punições e até mesmo algumas sanções, jamais os primeiros pensamentos
e conceitos são ligados às normas que permitem e possibilitam algumas condutas.
Obviamente, a ação humana muitas vezes não é coerente com aquilo exposto em lei, porém ao
se tratar de Legítima Defesa devemos ter claro em nossas mentes o que podemos fazer e até
onde podemos ir.
A Legítima Defesa é um exemplo claro de conduta que muitas vezes apresenta erros,
onde o indivíduo se excede em suas ações. É necessário cautela ao analisar uma situação onde
houve uso de legítima defesa. Devem-se observar os requisitos, e estes devem estar
concernentes a aquilo que se diz correto para a existência deste instituto.
Uma vez comprovada a exatidão da ação do indivíduo, não há que se falar de ilicitude
do fato típico, e consequentemente não há punição do agente. Porém o cenário de legítima
defesa deve entender a imprescindibilidade dos meios de defesa utilizados, e o uso moderado
desses artifícios. Isso porque não observada a justificação do ato perante os pressupostos,
poderá ser caracterizado o ato praticado pelo agente como ato excessivo, respondendo então
por essa transgressão.
entendido por quem julga que a ação tomada em determinada situação era extremamente
necessária, sendo a única alternativa a ser tomada, contudo, a realidade pode ter sido outra.
3VENZON, Altayr. Excessos na legítima defesa. Porto Alegre: Fabris, 1989, p.11.
4 LINHARES, Marcello J. Legítima Defesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 1
5 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p.383.
mesmo diploma, que dispõe: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente
dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de
outrem."6 Importante é lembrar que a legítima defesa consiste em ação de repelir agressão
com objetivo de cessá-la. E é essa a exata definição que a difere de vingança, e satisfação de
vontade própria. Neste sentido, a vítima busca por si só repelir as agressões contra si ou
contra terceiros, substituindo a atuação imediata do Estado.
A natureza jurídica da legítima defesa tem como causa a exclusão de ilicitude, baseada
em dois fundamentos: a defesa do ordenamento jurídico ante uma agressão injusta, e a
necessidade da defesa dos bens jurídicos perante uma agressão. Fernando Capez expõe que “o
Estado não tem condições de oferecer proteção aos cidadãos em todos os lugares e momentos,
logo, permite que se defendam quando não houver outro meio”7 Neste sentido, Nucci nos
ensina que:
Sendo assim, podemos dizer que a legitima Defesa busca proteger os bens que estão
ameaçados por uma conduta ilícita efetuada pelo homem, tendo em vista que somente o
homem pode cometer uma agressão injusta não amparada pelo Direito, pois não existe a
possibilidade da caracterização da legitima defesa em casos que não se configura uma
agressão injusta.
9 PRADO, Luiz Régis. Comentários ao Código Penal.4 ed. rev. atual. eampl. São Paulo: Editora RT,
2007,p.322.
10 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral, vol. 1. 8. ed. São
Paulo:Saraiva, 2003, p.279.
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Acerca da natureza jurídica da legitima defesa, Damásio defende a tese de que existem
dois grupos que proporcionam a sua fundamentação:
2 ANTIJURIDICIDADE
11 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro.
6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p.549.
12 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. parte geral. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 385.
13COLA DA WEB. Antijuricidade ou ilicitude. Disponível
em:,<https://www.coladaweb.com/direito/antijuridicidade-ou-licititude>. Acesso em: 12.nov.2018.
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de antijuridicidade não fica preso ao direito penal, e pode abranger os outros tipos de direito,
podendo ter uma natureza civil, penal ou administrativa.
3 DA EXCLUSÃO DA ANTIJURIDICIDADE
De grande valia é lembrar-se de que a agressão em si não precisa ser uma conduta
típica. Mesmo que a Legítima Defesa é um instituto a ser usado quando a uma agressão de um
indivíduo (em forma de ação), não terá valor contra ato da natureza ou em um tumulto por
exemplo. Aqui a agressão deverá necessariamente ser atual e iminente. Atual, é aquela que no
mesmo momento a pessoa foi agredida, ela já se defende, e não algum tempo depois, ou seja,
uma reação. Já a iminente, é aquela que vai ocorrer, mas a pessoa que seria agredida se
defende antes de ser afetada.
Importante frisar que a fuga imediata, e reação após fuga descaracteriza o instituto. E,
de igual forma, não há que se falar de Legítima Defesa contra ato futuro, uma vez que esta
poderá ser evitada por outro meio. Também não existe culpa em atos preparatórios, desde que
estes carreguem consigo agressão ou iminência.
16Mirabete, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2006.l p. 178.
supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a situação a legítima. Não há isenção da pena
quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo”. Conforme a
jurisprudência em julgado nos Tribunais do nosso país a respeito da defesa putativa, temos:
Para uma melhor compreensão desta espécie, podemos destacar o exemplo ensinado
por Rogerio Greco:
Num bar um indivíduo está próximo ao lavatório e vê chegar no local seu
inimigo que está armado com um punhal, vindo em sua direção a fim de
matá-lo. Se o agente reage com vontade ou intenção de se defender, ele
estará agindo em legítima defesa autêntica se o agredido nada fizesse, talvez
sofresse uma agressão física. Mas suponhamos que neste mesmo bar, que o
agente já tenha sofrido várias vezes ameaças de morte por seu agressor, de
repente este entra no bar e esteja caminhando rapidamente em sua direção, o
agente saca o revólver e mata seu desafeto. Este é um caso de legítima
defesa putativa.18
Essa espécie de legítima defesa é um dos assuntos mais complexos deste instituto, pois
a imaginação do agente causa uma reação imediata de defesa, diante de uma situação que lhe
cause medo, ou ameaça, sendo assim suas características são fundamentais para a
caracterização da legitima defesa putativa, posto que a mesma não exclui a responsabilidade
civil do ato ilícito praticado.
4.1 Requisitos
Este tipo de agressão ocorre, quando um bem jurídico tutelado pelo ordenamento
jurídico é atacado de forma injusta, conforme salienta Fernando Capez:
No pleno exercício deste meio de defesa, mesmo que a vitima seja considerada como
incapaz perante o direito Civil, ela ainda pode exercer o seu direito de legitima defesa, pois o
fato de ser incapaz não anula o caráter injusto da agressão.
Sobre a agressão injusta, seja ela atual ou na iminência de ocorrer leciona Damásio:
19 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 16.ed. São Paulo: Saraiva, 2012,p.306.
20 Idem, ibidem.
21 JESUS, Damásio de. Direito Penal. Volume 1. Parte geral. 35.ed. São Paulo: Saraiva,
2014.p.428.
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O autor Nelson Hungria entende que o instituto da legitima defesa não se refere apenas
ao ato de violência ou de dolo da agressão injusta, pois pode correr legitima defesa nos casos
em que o individuo se defende com o emprego da força moderada para impedir um furto, por
exemplo, como salienta o próprio autor:
Neste contexto, podemos dizer que a legitima defesa é a própria ordem jurídica
exercida por institutos não estatais, e sim por pessoas normais vitimas de um ato de agressão
na maioria das vezes injusto. Sendo assim, é valido destacar que uma agressão injusta pode
ocorrer pelo emprego de violência ou não, desde que o ato seja capaz de produzir um
resultado, sendo assim a legitima defesa de agressão injusta surge para impedir a continuidade
da agressão.
A Legítima Defesa de direito próprio, como seu nome já diz, é aquela que o autor da
repulsa é o próprio detentor de seu direito de defesa. E defesa de direito alheio, é aquela que
se pratica em defesa do bem jurídico ameaçado de terceiro. Como descreveu Nucci: “a defesa
Esse requisito versa sobre os meios considerados eficientes e necessários para cessar
uma agressão. O doutrinador Guilherme Nucci o defende com as seguintes palavras: “são os
eficazes e suficientes para repelir a agressão ao direito, causando o menor dano possível ao
24 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 4.ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003, p.229.
25MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. Parte Geral. V.1. 6. ed. Rev. Atual e ampl. Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p.403.
26 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19.ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.322.
atacante”27.É preciso que haja proporção entre o ataque sofrido e a defesa ao ataque.
Fernando Capez nos ensina que:
Os autores Mirabete e Fabrini entendem que os meios necessários são aqueles que
estão à disposição da vitima no momento da agressão injusta, independente de seu potencial
lesivo:
Um meio que, prima facie, pode parecer excessivo, não será tal se as
circunstâncias demonstrarem sua necessidade in conreto. Sendo assim,
quando um indivíduo franzino se defende com uma arma de fogo contra um
agressor desarmado, mas grande robustez física, não fica elidida a legítima
defesa.30
Já de forma contraria, Fernando Capez se manifesta, a dispor que é indispensável que
ocorra uma proporção entre os meios de defesa e agressão:
Assim, o emprego de arma de fogo, não para matar, mas para ferir ou
amedrontar, pode ser considerado menos lesivo, e, portanto necessário.
Considere-se o exemplo do paralitico, preso a uma cadeira de rodas, que, não
dispondo de qualquer outro recurso para defender-se, fere a tiros quem lhe
27Op cit.
28CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Volume 1, parte Geral.16.ed.São Paulo: Saraiva,
2012, p.311.
29MIRABETE, JulioFabrini. Manual de direito penal. Volume 1: parte geral. 27.ed. São Paulo: Atlas,
2011, p.171.
30 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código Penal. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p.302.
tenta furtar umas frutas. Pode ter usado os meios, para ele, necessários mas
não exerceu uma defesa realmente necessária, diante da enorme
desproporção existente entre a ação agressiva e a reação defensiva.31
5 O ELEMENTO SUBJETIVO
Quem utiliza do instituto da Legítima Defesa, deve saber que se trata, de acordo com
este requisito subjetivo, de uma agressão presente ou iminência desta, e a necessidade de
defesa. Aqui, não é preciso o conhecimento de que é previsto o artifício no Código Penal,
porém, precisa-se agir com intuito de apenas cessar a agressão.
31Op.cit.
32GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016, p.461.
forma culposa, ocorre quando o indivíduo cometer erro inescusável e superável, ou seja,
quando o ato praticado pela pessoa, através dos requisitos da culpa, pode ser cometido por
qualquer outra. Aqui, vemos a caracterização da culpa imprópria. Neste tipo de erro cometido
na forma culposa do excesso, é punível, porém, haverá redução de pena por se tratar de
imperícia, imprudência ou negligência (requisitos da culpa).
A forma dolosa é aquela em que o agente responde por ato punível. Caracteriza-se
como dolosa, a legítima defesa onde há erro em seus requisitos, exemplo, quando uma pessoa
que supostamente estaria agindo em legítima defesa, mas por excesso nos meios empregados,
passa de vítima para agente delituoso. Assim, o agente responderá por agressão injusta. Um
exemplo prático de reação dolosa é quando um agente mesmo após cessar a agressão, da
continuidade ao ato por vontade própria, como no caso em que uma pessoa é atacada por um
inimigo que no momento do ato está desarmado e atua com o intuito de neutralizar a agressão,
mas após se defender sem extrapolar os meios necessários, ele se apossa da arma e decide
matar o agressor. Neste caso o agente estava amparado pela legitima defesa, contudo após o
seu ato proposital ele passa ser responsabilizado de forma dolosa. Sobre esse assunto,
podemos destacar a seguinte jurisprudência:
Neste caso o erro inescusável fez com que o agente respondesse pelo excesso, pois
mesmo após de cessada a agressão o autor continuou o ato com emprego de uma pedra,
resultando assim, portanto, o homicídio qualificado.Com isso, a responsabilidade do agente
será estabelecida com base nos resultados em excesso pelo ato praticado, desse modo o
mesmo só ira responder pelo o que extrapolar o aceitável no momento da legitima defesa, de
si ou de outrem. Sendo assim, se o agente praticar a lesão corporal em exercício da legitima
defesa sem cometer excesso, o mesmo será beneficiado pelo instituto da legitima defesa, mas,
contudo caso ele extrapole os meios necessários e pratique o excesso de defesa cometendo um
homicídio, por exemplo, o mesmo respondera por homicídio doloso consumado.
Existem manobras que ajudam a identificar a veracidade dos fatos, como exame de
corpo e delito, oitiva de testemunhas ou autópsia. Porém, nenhuma das alternativas existentes
poderá garantir por completo o que realmente ocorreu.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste sentido, foi possível perceber que o exercício da Legitima Defesa aborda a
possibilidade de uma conduta típica ser considera como lícita no ato da repulsão de uma
agressão injusta, desde que sejam respeitados os requisitos impostos pelo artigo 25 do nosso
diploma penal. Pois nem sempre o Estado pode se fazer presente perante um ato de uma
injusta agressão ou em sua eminencia. Sendo assim, existe a possibilidade da autodefesa ou
defesa de outrem amparada na norma jurídica penal, em ato legitimo, que exclui, portanto a
hipótese de crime. Embora existam situações que configurem o excesso desse direito, como é
no caso da utilização de um meio desnecessário, ou na pratica do ato sem moderação, cada ato
deverá ser analisado de forma isolada pelo legislador, estudando o método e a ponderação do
exercício da legitima defesa, podendo assim ser caracterizada ou afastada a legitima defesa
por excesso.
REFÊRENCIAS
BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal. Parte Geral, vol. 1. 8. ed. São
Paulo:Saraiva, 2003.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral ,vol.1.16.ed.São Paulo: Saraiva,
2012.
CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 15.ed. São Paulo: Saraiva.2004.
GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016.
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NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 4. ed. rev. e atual. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2003.
Noronha, E. Magalhães. Direito Penal.São Paulo: Saraiva, 2001.
PRADO, Luiz Régis. Comentários ao Código Penal.4 ed. rev. atual. eampl. São Paulo:
Editora RT, 2007.
TOLEDO, Francisco. Princípios básicos de direito penal. 5.ed.São Paulo: Saraiva, 1994.
Submetido em 19.06.2019
Aceito em 24.03.2020
Revista Reflexão e Crítica do Direito, v. 8, n. 1, p. 136-153, jan./jun. 2020 ISSN 2358-7008