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EXCESSO DE LEGÍTIMA DEFESA: A LINHA TÊNUE ENTRE O EXCESSO


DOLOSO E A EXISTÊNCIA DE CULPA

EXCESS OF LEGITIMATE DEFENSE: THE TENNIS LINE BETWEEN DOUBTFUL


EXCESS AND THE EXISTENCE OF BLAME

Philippe Escobar Penteado1


Edison França Lange Junior 2

RESUMO
O objetivo do presente trabalho é observar a consequência jurídica que pode ser acarretada
mediante a verificação do crime de excesso, bem como analisar a tamanha dificuldade de
diferenciação entre a modalidade dolosa e a existência de culpa. O trabalho também visa
apontar aspectos relevantes acerca da figura do excesso exculpante, que, embora não previsto
na legislação brasileira enquanto tipo penal é figura amplamente explorada jurisprudencial e
doutrinariamente.
Palavras-chave: Legitima Defesa- Exclusão de ilicitude- Legitima Defesa dolosa e culposa.

ABSTRACT
The objective of the present study is to observe the legal consequence that can be caused by
the verification of the crime of excess, as well as to analyze the great difficulty of
differentiating between the malicious modality and the existence of guilt. The paper also aims
at pointing out relevant aspects about the exculpatory excess figure, which, although not
provided for in Brazilian legislation as a criminal type, is a widely explored case-law and
doctrinally.
Keywords: Legitima Defesa- Exclusion of unlawfulness- Legitima Defensive and willful
mischief.

INTRODUÇÃO

1 Graduando do Curso de Direito do Centro Universitário da Grande Dourados – e-mail:


liphappy@hotmail.com
2 Graduado em Direito pelo Centro Universitário da Grande Dourados (2007).Pós-graduado em Direito
Tributário, com habilitação em Ensino Superior, pela Rede Luiz Flávio Gomes e Faculdade Uniderp-
Anhanguera. Atualmente é servidor efetivo do Tribunal de Justiça de Mato Grosso do Sul e Professor do Centro
Universitário da Grande Dourados – UNIGRAN. E-mail – edison.lange@unigran.br

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Ao nascer o homem tem consigo direitos e deveres, e assim, nasce também seu direito
de legítima defesa. Sempre que pensamos no Direito Penal, fazemos uma associação a
normas proibitivas, punições e até mesmo algumas sanções, jamais os primeiros pensamentos
e conceitos são ligados às normas que permitem e possibilitam algumas condutas.
Obviamente, a ação humana muitas vezes não é coerente com aquilo exposto em lei, porém ao
se tratar de Legítima Defesa devemos ter claro em nossas mentes o que podemos fazer e até
onde podemos ir.

A Legítima Defesa é um exemplo claro de conduta que muitas vezes apresenta erros,
onde o indivíduo se excede em suas ações. É necessário cautela ao analisar uma situação onde
houve uso de legítima defesa. Devem-se observar os requisitos, e estes devem estar
concernentes a aquilo que se diz correto para a existência deste instituto.

Uma vez comprovada a exatidão da ação do indivíduo, não há que se falar de ilicitude
do fato típico, e consequentemente não há punição do agente. Porém o cenário de legítima
defesa deve entender a imprescindibilidade dos meios de defesa utilizados, e o uso moderado
desses artifícios. Isso porque não observada a justificação do ato perante os pressupostos,
poderá ser caracterizado o ato praticado pelo agente como ato excessivo, respondendo então
por essa transgressão.

Encontramos desarmonia no entendimento de muitos magistrados, já que se trata de


matéria complexa, onde cada situação deve ser analisada de forma única, e, em cada análise
pode se nascer uma opinião distinta. Então para que se chegue a um consenso deve-se levar
em consideração o comportamento da vítima, o comportamento do agente, e a consequência
de ambas as ações e reações.

De igual relevância, pende a argumentar sobre o excesso utilizado na legitima defesa,


quando há chance do agente conscientemente envolvendo a condição em que se encontra,
abusar dos meios de defesa, indo além do essencial para cessar a ação do agressor, com o
intuito de saciar vontade própria, onde pratica ato sem necessidade.

É comum observar-se no período processual, os advogados e defensores fazendo o uso


do contexto de legítima defesa para defender os interesses de seus clientes, sempre se
baseando no argumento de que o indivíduo cometeu tal reação para proteger-se ou proteger a
outrem, sem levar em consideração os requisitos específicos, e almejando assim, que seja

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entendido por quem julga que a ação tomada em determinada situação era extremamente
necessária, sendo a única alternativa a ser tomada, contudo, a realidade pode ter sido outra.

1 ASPECTOS GERAIS DA LEGÍTIMA DEFESA

1.1 Origem e conceituação

A legítima defesa é fielmente ligada ao instituto da autodefesa inerente do próprio ser


humano. Sua evolução ocorreu juntamente com a manifestação dos sistemas jurídicos, e a
evolução da sociedade. Primeiramente exercida de forma primitiva através do exercício da
justiça feita pelas próprias mãos no processo de vingança privada, para logo após assumir o
caráter de vingança pública. Surgindo assim, o talião, uma forma precária e rudimentar do
instituto da legítima defesa, limitando a vingança quanto à essência da punição e à medida do
direito material.3Desta forma, descreve Linhares sobre seu pensamento da definição de
Legitima Defesa: “antes de vir consignada em códigos, já existia como lei da natureza, como
norma decorrente da própria constituição do ser, dessas que o homem recebe antes de se
estabelecer em sociedade”.4

Sabe-se que os primeiros conceitos referentes a Legitima Defesa estão interligados a


limitação do uso da força pelos Estados, limitação esta que se diz respeito a realizações de
guerra, ou seja, um país não poderia meramente por sua vontade começar uma guerra sem a
apresentação de justa causa. Neste sentindo, é valido destacar os ensinamentos de Damásio:

A nossa jurídica da legitima defesa surgiu quando o Estado reclamou para si


o castigo do autor em face da pratica de uma ofensa pública ou privada,
iniciando-se o processo evolutivo do direito de punir e do direito de
liberdade: de um lado, o magistério estatal punitivo como forma de repressão
ao delito; de outro; a legitima defesa exercida por qualquer particular
injustamente vitima da agressão.5

Atualmente o instituto da Legitima Defesa compõe a segunda causa de exclusão da


antijuricidade prevista pelo artigo 23 do nosso diploma penal. Regulado pelo artigo 25 do

3VENZON, Altayr. Excessos na legítima defesa. Porto Alegre: Fabris, 1989, p.11.
4 LINHARES, Marcello J. Legítima Defesa. 4. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1992. p. 1
5 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. v. 1. São Paulo: Saraiva, 2002, p.383.

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mesmo diploma, que dispõe: “Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente
dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de
outrem."6 Importante é lembrar que a legítima defesa consiste em ação de repelir agressão
com objetivo de cessá-la. E é essa a exata definição que a difere de vingança, e satisfação de
vontade própria. Neste sentido, a vítima busca por si só repelir as agressões contra si ou
contra terceiros, substituindo a atuação imediata do Estado.

Podemos dizer que a “impunidade” do agente em situação de legitima defesa sempre


foi reconhecida, contudo, o instituto jurídico da legitima defesa foi instituído de forma
gradativa na legislação brasileira, em virtude da inconformidade do Estado frente à imposição
da ação da força contra força. Sendo assim, diante da necessidade do Estado de proteger os
direitos individuais, surge a legitima defesa como uma exceção que permite que o indivíduo
revide quando a agressão do injusto atacar os seus direitos.

1.2 Natureza jurídica

A natureza jurídica da legítima defesa tem como causa a exclusão de ilicitude, baseada
em dois fundamentos: a defesa do ordenamento jurídico ante uma agressão injusta, e a
necessidade da defesa dos bens jurídicos perante uma agressão. Fernando Capez expõe que “o
Estado não tem condições de oferecer proteção aos cidadãos em todos os lugares e momentos,
logo, permite que se defendam quando não houver outro meio”7 Neste sentido, Nucci nos
ensina que:

Valendo-se da legítima defesa, o indivíduo consegue repelir as agressões a


direito seu ou de outrem, substituindo a atuação da sociedade ou do Estado,
que não pode estar em todos os lugares ao mesmo tempo, através dos seus
agentes. A ordem jurídica precisa ser mantida, cabendo ao particular
assegurá-la de modo eficiente e dinâmico.8

6 JUS BRASIL. Decreto Lei 2848/40. Disponível em:<


https://www.jusbrasil.com.br/topicos/10637196/artigo-25-do-decreto-lei-n-2848-de-07-de-dezembro-de-
1940>. Acesso em: 10 de nov.2018.
7 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal- Parte Geral. 15.ed. São Paulo: Saraiva.2004, p.263.
8NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de direito penal: parte geral: parte especial .São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2005.p.222.
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Sendo assim, podemos dizer que a legitima Defesa busca proteger os bens que estão
ameaçados por uma conduta ilícita efetuada pelo homem, tendo em vista que somente o
homem pode cometer uma agressão injusta não amparada pelo Direito, pois não existe a
possibilidade da caracterização da legitima defesa em casos que não se configura uma
agressão injusta.

Como ocorre com a decretação preventiva de prisão, em que a autoridade policial


efetua a busca e a prisão de um individuo, que mesmo sendo preso ele não pode agredir o
policial alegando a excludente da legitima defesa, pois nesse caso a prisão não é injusta e não
configura o estado de legitima defesa, pois quando a agressão for por uma causa justa a
legitima defesa não se concretizara. O autor Luiz Régis Prado conceitua alguns aspectos sobre
a legítima defesa:

Vem a ser a repulsa ou o impedimento de agressão ilegítima atual ou


iminente pelo agredido ou terceira pessoa, contra o agressor sem ultrapassar
a necessidade de defesa e dentro da racional proporção dos meios
empregados para impedi-la ou repeli-la.9

Neste sentido, Bitencourt conceitua a agressão como:

A conduta humana que lesa ou põe em perigo um bem ou interesse


juridicamente tutelado. É irrelevante que a agressão não constitua um ilícito
penal. A agressão, porém, não pode confundir-se com provocação do agente,
devendo-se considerar a sua intensidade para valorá-la adequadamente. (...)
A reação deve ser imediata à agressão, posto que a demora na repulsa
descaracteriza o instituto da legitima defesa. Se passou o perigo, deixou de
existir, e não pode mais fundamentar a defesa legítima, que se justificaria
para eliminá-lo.10

Na caracterização da legitima defesa deve ocorrer o animus de impedir a conduta do


agressor, com uma reação necessária e moderada, a fim de repelir a agressão sendo ela injusta
atual ou iminente, contra si ou contra terceiros, desde que não exista a possibilidade de outro
meio de defesa, respeito acima de tudo os limites da lei. De acordo com Zaffaroni e
Pierangeli:

9 PRADO, Luiz Régis. Comentários ao Código Penal.4 ed. rev. atual. eampl. São Paulo: Editora RT,
2007,p.322.
10 BITENCOURT, Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: Parte Geral, vol. 1. 8. ed. São
Paulo:Saraiva, 2003, p.279.
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O problema mais complexo da legitima defesa não é a sua natureza, mas o


seu fundamento. É definido pela necessidade de conservar a ordem jurídica e
de garantir o exercício dos direitos. Conforme seja acentuado um ou outro
dos aspectos deste duplo fundamento, se insistira em seu conteúdo social ou
individual. Na realidade, o fundamento da legitima defesa é único, porque se
baseia no principio de que ninguém pode ser obrigado a suportar o injusto.
Trata-se de uma situação conflitiva, na qual o sujeito pode agir
legitimamente, porque o direito não tem outra forma de garantir o exercício
de seus direitos, ou melhor dito, a proteção de seus bens jurídicos.11

Acerca da natureza jurídica da legitima defesa, Damásio defende a tese de que existem
dois grupos que proporcionam a sua fundamentação:

O Primeiro grupo parte do principio que o homicídio cometido em legítima


defesa é voluntário, não se castigando o autor porque se fundamenta na
conservação da existência, essa teoria é bastante restrita, uma vez que se
baseia exclusivamente no homicídio, entendendo o instituto com escusa e
causa de impunidade. O segundo grupo fundamenta a legítima defesa como
exercício de um direito e causa de justificação, pois não atua contra o direito
quem comete reação para proteger um direito próprio ou alheio ao qual o
Estado não pode oferecer a tutela mínima, esta é a seguida pelo Código
Penal.12

Na primeira corrente o autor defende que o ato de repelir a agressão é um ilícito


penal, contudo o exercício da legitima defesa configura a exclusão da culpabilidade. Já na
segunda corrente, o autor entende que o ato de se defender de uma agressão nem chega a se
considerado como um ato ilícito, com fundamento no direito primário de defesa do homem
que cedeu ao Estado.

2 ANTIJURIDICIDADE

A antijuridicidade, ou ilicitude, pode ser considerada como o antagonismo do


comportamento ao ordenamento jurídico. Isto é porque a antijuridicidade em seu conceito
literal significa: anti (contrário) juridicidade (qualidade ou caráter de jurídico, conformação ao
direito legalidade, licitude), ou seja, é o oposto a norma jurídica13. Dessa forma, o significado

11 ZAFFARONI, Eugenio Raúl. PIERANGELI, José Henrique. Manual de Direito Penal Brasileiro.
6.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004.p.549.
12 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. parte geral. 28. ed. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 385.
13COLA DA WEB. Antijuricidade ou ilicitude. Disponível
em:,<https://www.coladaweb.com/direito/antijuridicidade-ou-licititude>. Acesso em: 12.nov.2018.
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de antijuridicidade não fica preso ao direito penal, e pode abranger os outros tipos de direito,
podendo ter uma natureza civil, penal ou administrativa.

A antijuricidade pode ser classificada em dois aspectos: o formal e o material. Onde


no primeiro ocorre a oposição de uma norma legal, e no segundo ocorre uma projeção fora do
direito positivo, pois se origina da "contrariedade do fato às condições vitais de coexistência
social ou de vida comunitária, as quais, protegidas pela norma, se transforma em bens
jurídicos.14 Nota-se que para se viver em uma sociedade, é preciso que se estabeleçam
requisitos gerais de comunhão básica. O direito nasce, portanto, como representante dessa
coletividade, para comandar determinadas condutas, que se obrigam a ser comandadas sob o
julgamento do Direito.

3 DA EXCLUSÃO DA ANTIJURIDICIDADE

São chamados de tipos permissivos, as causas que excluem a antijuridicidade do fato


tipo em nosso Direito. Essas causas são excludentes por permitirem que seja praticado um
fato típico. Isso não quer dizer que há o desaparecimento da tipicidade, a exclusão da
antijuridicidade, apenas torna uma conduta típica justificável. Resumidamente, se estiverem
presentes na ação, os elementos objetivos da norma permissiva, deixará de existir o caráter
antijurídico da ação, e não se investigará o caráter subjetivo que resultou na pratica da
agressão do agente.

Nucci ainda defende em sua obra a importância do elemento subjetivo, quando


discorre: “melhor teria agido o legislador se tivesse feito constar, expressamente, na lei penal,
como fez o Código Penal italiano, a consciência da necessidade de valer-se da excludente.”
15Lembrando que, não será caracterizado como Legitima Defesa se não estiver presente os
elementos subjetivos, ou seja, por mais que uma ação seja baseada na Legitima Defesa, se
nesta não conter somente os elementos objetivos, será descaracterizada.

4 ESPÉCIES DE LEGÍTIMA DEFESA

14 Noronha, E. Magalhães. Direito Penal.São Paulo: Saraiva, 2001.pág. 97.


15 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado, 4. ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003,p.215.
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Sabe-se que a Legítima Defesa exibe algumas características importantes: seus


requisitos e suas espécies. Estas se diferem em alguns pontos, desta forma, necessária se faz a
separação e classificação de cada um dos tipos. Este instituto se compõe por duas espécies
distintas: legitima defesa autentica ou real, e a legitima defesa putativa. Onde na primeira
hipótese ocorre a agressão injusta de forma real, ou na sua eminencia de acontecer, visto que
neste caso ela pode ser impedida pelo agente no exercício de uma conduta moderada. De
acordo com o jurista Júlio Mirabete, a reação a uma agressão injusta ou iminente se resume
em uma ação humana que lesa, ou põe em risco um direito existente e que:

Embora, em geral, implique em violência, nem sempre esta estará presente


na agressão, pois poderá consistir em um ataque sub-receptício (no furto, por
exemplo), e até em uma omissão ilícita (o carcereiro que não cumpre o
alvará de soltura, o médico que arbitrariamente não concede alta ao paciente,
a pessoa que não sai da residência após sua expulsão pelo morador, etc.) É
reconhecida a legítima defesa daquele que resiste, ainda que com violência
causadora de lesão corporal, a uma prisão ilegal. 16

De grande valia é lembrar-se de que a agressão em si não precisa ser uma conduta
típica. Mesmo que a Legítima Defesa é um instituto a ser usado quando a uma agressão de um
indivíduo (em forma de ação), não terá valor contra ato da natureza ou em um tumulto por
exemplo. Aqui a agressão deverá necessariamente ser atual e iminente. Atual, é aquela que no
mesmo momento a pessoa foi agredida, ela já se defende, e não algum tempo depois, ou seja,
uma reação. Já a iminente, é aquela que vai ocorrer, mas a pessoa que seria agredida se
defende antes de ser afetada.

Importante frisar que a fuga imediata, e reação após fuga descaracteriza o instituto. E,
de igual forma, não há que se falar de Legítima Defesa contra ato futuro, uma vez que esta
poderá ser evitada por outro meio. Também não existe culpa em atos preparatórios, desde que
estes carreguem consigo agressão ou iminência.

Já a legitima defesa putativa, se concretiza apenas na imaginação do agente, é quando


o mesmo acredita que esta sendo agredido injustamente, contudo não ocorre ameaça ou a
agressão de fato, hipótese que encontra respaldo no parágrafo 1º do art. 20 do Diploma Penal,
quando diz: “§1º. É isento de pena quem, por erro plenamente justificado pelas circunstâncias,

16Mirabete, Júlio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2006.l p. 178.

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supõe situação de fato que, se existisse, tornaria a situação a legítima. Não há isenção da pena
quando o erro deriva de culpa e o fato é punível como crime culposo”. Conforme a
jurisprudência em julgado nos Tribunais do nosso país a respeito da defesa putativa, temos:

RECURSOEX OFFICIO ABSOLVIÇAO SUMÁRIA - LEGÍTIMA


DEFESA REAL E PUTATIVA - EXCLUDENTES DE ILICITUDE -
CONFIGURAÇAO - RECURSO DESPROVIDO - MANUTENÇAO
DODECISUM.1. Na dicção do art. 25, do Código Penal, age em legítima
defesa quem, usando de meios necessários com moderação, reage à injusta
agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de terceiro.2. Não há falar-se
em excesso na conduta dos acusados, haja vista que, consoante farto
entendimento jurisprudencial, legítima defesa nada mais é do que uma
reação humana, que não pode ser medida com transferidor,
milimetricamente ou com matemática proporcionalidade, devendo ser
analisada caso a caso.3. Justamente por se tratar a legítima defesa de ato
instintivo e reflexo, conclui-se a partir do conjunto probatório dos autos
que os acusados, que eram desafetos e já tinham sofrido ameaças de morte
antes dos fatos narrados na denúncia, não agiram comanimus necandi, mas
sim, em legítima defesa real e putativa, impondo-se aplicar a excludente de
ilicitude prevista no art. 23, inciso II, do CP.4. Recurso de que se conhece
e a que se nega provimento. (TJ-ES - RECEXOFF: 24050234558 ES
024050234558, Relator: MAURÍLIO ALMEIDA DE ABREU, Data de
Julgamento: 26/08/2008, PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL, Data de
Publicação: 18/01/2010).17

Para uma melhor compreensão desta espécie, podemos destacar o exemplo ensinado
por Rogerio Greco:
Num bar um indivíduo está próximo ao lavatório e vê chegar no local seu
inimigo que está armado com um punhal, vindo em sua direção a fim de
matá-lo. Se o agente reage com vontade ou intenção de se defender, ele
estará agindo em legítima defesa autêntica se o agredido nada fizesse, talvez
sofresse uma agressão física. Mas suponhamos que neste mesmo bar, que o
agente já tenha sofrido várias vezes ameaças de morte por seu agressor, de
repente este entra no bar e esteja caminhando rapidamente em sua direção, o
agente saca o revólver e mata seu desafeto. Este é um caso de legítima
defesa putativa.18

Essa espécie de legítima defesa é um dos assuntos mais complexos deste instituto, pois
a imaginação do agente causa uma reação imediata de defesa, diante de uma situação que lhe
cause medo, ou ameaça, sendo assim suas características são fundamentais para a

17 JUS BRASIL. Jurisprudência. Disponível em: <https://tj-


es.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/8522605/recurso-ex-officio-recexoff-24050234558-es-
024050234558>. Acesso em: 10 de dez.2018.
18 GRECO, Rogério. Código Penal Comentado. 2. ed. Niterói: Impetus, 2009, p.358.

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caracterização da legitima defesa putativa, posto que a mesma não exclui a responsabilidade
civil do ato ilícito praticado.

4.1 Requisitos

Sobre os requisitos do exercício da Legitima defesa, podemos destacar os


ensinamentos de Fernando Capez, que apresenta a seguinte sequência: “agressão injusta, atual
ou iminente a direito de próprio ou terceiro, repulsa com os meios necessários, e o uso
moderado de tais meios através do conhecimento da situação justificante”.19

4.1.1 agressão injusta

Este tipo de agressão ocorre, quando um bem jurídico tutelado pelo ordenamento
jurídico é atacado de forma injusta, conforme salienta Fernando Capez:

Agressão é toda a conduta humana que ataca um bem jurídico. Só as pessoas


humanas, portanto, praticam agressões. Ataque de animal não configura,
logo, não autoriza a legitima defesa. Já a agressão injusta é contraria ao
ordenamento jurídico, tratando-se de agressão ilícita, muito embora injusto e
ilícito em regra, não sejam expressões equivalentes. Não se exige que a
agressão injusta seja necessariamente um crime. Exemplo: a legitima defesa
pode ser exercida a proteção da posse ou contra furto de uso, ou dano
culposo etc.20

No pleno exercício deste meio de defesa, mesmo que a vitima seja considerada como
incapaz perante o direito Civil, ela ainda pode exercer o seu direito de legitima defesa, pois o
fato de ser incapaz não anula o caráter injusto da agressão.

Sobre a agressão injusta, seja ela atual ou na iminência de ocorrer leciona Damásio:

Exige-se que a agressão seja injusta, contraria ao ordenamento jurídico


(ilícita). Se a agressão é licita, a defesa não pode ser legítima. Assim, não
comente o fato acobertado pela causa de exclusão da ilicitude quem repele
uma diligencia de penhora em seus bens realiza por um oficial de justiça
munido de mandado judicial. A conduta do oficial , se bem que constitua
agressão, não é injusta.21

19 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Geral. 16.ed. São Paulo: Saraiva, 2012,p.306.
20 Idem, ibidem.
21 JESUS, Damásio de. Direito Penal. Volume 1. Parte geral. 35.ed. São Paulo: Saraiva,
2014.p.428.
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O autor Nelson Hungria entende que o instituto da legitima defesa não se refere apenas
ao ato de violência ou de dolo da agressão injusta, pois pode correr legitima defesa nos casos
em que o individuo se defende com o emprego da força moderada para impedir um furto, por
exemplo, como salienta o próprio autor:

A legítima defesa não esta subordinada, sequer, à condição de violência da


agressão. Assim, não se pode recusá-la para impedir a consumação de um
furto simples ou com destreza. Igualmente não é necessário que a agressão
seja dolosa: também uma ação imprudente pode surgir um perigo, que
autorize a reação contra a quem comete. A agressão pode partir de uma
multidão em tumulto, e contra este cabe legitima defesa, ainda que nem
todos os seus componentes queiram individualmente, a agressão.22
Este instituto pode ocorrer mesmo em casos de condutas não criminosas, mas que se
disponha de ilicitude e cause ameaça ou lesão ao bem jurídico da vitima. A contento a esse
assunto, destaca Francisco de Assis Toledo:

Se a agressão não precisa ser um crime, bastando sua ilicitude, conclui-se


que também não exige seja ela culpável, já que na área penal, o juízo de
culpabilidade pressupõe a tipicidade e ilicitude. Com isso, forçoso é admitir-
se a legitima defesa contra agressão de inimputáveis: ébrios habituais,
doentes mentais, menores e outros inimputáveis que não cometem crimes,
mas sem duvidas praticam atos ilícitos e ate típicos.23

Neste contexto, podemos dizer que a legitima defesa é a própria ordem jurídica
exercida por institutos não estatais, e sim por pessoas normais vitimas de um ato de agressão
na maioria das vezes injusto. Sendo assim, é valido destacar que uma agressão injusta pode
ocorrer pelo emprego de violência ou não, desde que o ato seja capaz de produzir um
resultado, sendo assim a legitima defesa de agressão injusta surge para impedir a continuidade
da agressão.

4.1.3 defesa de um direito próprio ou alheio

A Legítima Defesa de direito próprio, como seu nome já diz, é aquela que o autor da
repulsa é o próprio detentor de seu direito de defesa. E defesa de direito alheio, é aquela que
se pratica em defesa do bem jurídico ameaçado de terceiro. Como descreveu Nucci: “a defesa

22 Hungria Nelson. Comentários ao Código Penal.4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958.p.293.


23 DE ASISM Toledo Francisco. Princípios básicos de direito penal. 5.ed..São Paulo: Saraiva,
1994.p.196.
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de direito alheio independe do consentimento da pessoa agredida, desde que se trate de um


bem indisponível”24. Já se tratando de bens disponíveis, o doutrinador acredita na
importância da permissão da vítima, se possível for.

É valido destacar, que a respeito da defesa de direito de terceiros, esta também se


estende a pessoa jurídica. Neste sentido nos ensina Cleber Masson:

É Possível o emprego da excludente para a tutela de bens pertencentes às


pessoas jurídicas, inclusive do Estado, pois atuam por meio de seus
representantes e não podem defender-se sozinhas. Veja-se o exemplo da
pessoa que, percebendo uma empresa ser furtada, luta com o ladrão e o
imobiliza até a chegada da força policial.25
Para Mirabete, o instituto da legitima defesa de terceiros:

Inclui a dos bens particulares e também o interesse da coletividade, como na


hipótese da prática de atos obscenos em lugar público, da perturbação de
uma cerimônia fúnebre, bem como do próprio Estado, preservando-se sua
integridade, a administração da justiça, o prestígio de seus funcionários
etc.26
A respeito da legitima defesa de terceiros nos casos dos bens jurídicos disponíveis,
quando ocorre a aceitação de terceiro, não há em que se falar na ação de legitima defesa
alheia, como no caso em que um individuo se submete ao procedimento da tatuagem sobre o
próprio corpo de forma consentida, através de uma agressão tolerada, a qual não configura a
ilicitude do ato, e não necessita intervenção de terceiros, e não se ampara pelo instituo da
legitima defesa de terceiros. Contudo, se o bem agredido for indisponível e mesmo com
consentimento da vitima, poderá ser exercido o instituto da legitima defesa de terceiros.

4.1.4 moderação no emprego dos meios necessários

Esse requisito versa sobre os meios considerados eficientes e necessários para cessar
uma agressão. O doutrinador Guilherme Nucci o defende com as seguintes palavras: “são os
eficazes e suficientes para repelir a agressão ao direito, causando o menor dano possível ao

24 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 4.ed. rev. e atual. São Paulo: Revista
dos Tribunais, 2003, p.229.
25MASSON, Cleber. Direito Penal esquematizado. Parte Geral. V.1. 6. ed. Rev. Atual e ampl. Rio
de Janeiro: Forense; São Paulo: Método, 2012, p.403.
26 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de Direito Penal. 19.ed. São Paulo: Atlas, 2003, p.322.

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atacante”27.É preciso que haja proporção entre o ataque sofrido e a defesa ao ataque.
Fernando Capez nos ensina que:

A necessidade do meio não guarda relação com a forma que é empregado.


Interessa apenas saber se o instrumento era menos lesivo colocado à
disposição do agente no momento da agressão. Exemplo se o sujeito tem um
pedaço de pau a seu alcance e com ele pode tranquilamente conter a
agressão, o emprego da arma de fogo revela-se desnecessário.28

Os autores Mirabete e Fabrini entendem que os meios necessários são aqueles que
estão à disposição da vitima no momento da agressão injusta, independente de seu potencial
lesivo:

É evidente, porém, que “meio necessário” é aquele de que o agente dispõe


no momento em que rechaça a agressão, podendo ser ate mesmo
desproporcional com o utilizado no ataque, desde que seja o único a sua
disposição no momento.29
Neste sentido, podemos dizer que os meios necessários são os meios disponíveis que a
vitima possui no momento da agressão ou de seu perigo eminente para que ocorra a
neutralização do ato. Contudo, se existir a possibilidade de defesa de um único modo, o
individuo deve agir de forma moderada. Nelson Hungria defende a tese de que não existe uma
adequação entre os meios de defesa e ataque, e que cada caso deve ser analisado de forma
isolada, pois:

Um meio que, prima facie, pode parecer excessivo, não será tal se as
circunstâncias demonstrarem sua necessidade in conreto. Sendo assim,
quando um indivíduo franzino se defende com uma arma de fogo contra um
agressor desarmado, mas grande robustez física, não fica elidida a legítima
defesa.30
Já de forma contraria, Fernando Capez se manifesta, a dispor que é indispensável que
ocorra uma proporção entre os meios de defesa e agressão:

Assim, o emprego de arma de fogo, não para matar, mas para ferir ou
amedrontar, pode ser considerado menos lesivo, e, portanto necessário.
Considere-se o exemplo do paralitico, preso a uma cadeira de rodas, que, não
dispondo de qualquer outro recurso para defender-se, fere a tiros quem lhe

27Op cit.
28CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Volume 1, parte Geral.16.ed.São Paulo: Saraiva,
2012, p.311.
29MIRABETE, JulioFabrini. Manual de direito penal. Volume 1: parte geral. 27.ed. São Paulo: Atlas,
2011, p.171.
30 HUNGRIA, Nelson. Comentários ao código Penal. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1958, p.302.

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tenta furtar umas frutas. Pode ter usado os meios, para ele, necessários mas
não exerceu uma defesa realmente necessária, diante da enorme
desproporção existente entre a ação agressiva e a reação defensiva.31

Diante de algumas divergências doutrinarias, é valido destacar que deve existir um


limite de moderação entre os meios necessários empregados no exercício da legitima defesa.
Posto que a agressão deve ser repelida de forma proporcional. Ou seja, não há um conceito
definido, uma vez que se analisa cada caso através de suas peculiaridades. O que deve ocorrer
é a proporcionalidade na defesa mediante a uma agressão injusta, sendo ela atual ou iminente,
contra si ou contra outrem.

5 O ELEMENTO SUBJETIVO

Quem utiliza do instituto da Legítima Defesa, deve saber que se trata, de acordo com
este requisito subjetivo, de uma agressão presente ou iminência desta, e a necessidade de
defesa. Aqui, não é preciso o conhecimento de que é previsto o artifício no Código Penal,
porém, precisa-se agir com intuito de apenas cessar a agressão.

5.1 O excesso de legítima defesa

Já fora especificado a necessidade da moderação para empregar os meios necessários


para a defesa neste instituto, e para que se caracterize o excesso, deve-se caracterizar
primeiramente a própria legítima defesa. O excesso de legitima defesa prevê que o motivo da
exclusão da ilicitude do ato se inicia de forma correta, contudo a partir de uma determinada
atitude a vitima da agressão extrapola os meios necessários de defesa. Neste sentido, Rogerio
Greco destaca que “quando falamos em excesso, o primeiro raciocínio que devemos ter, uma
vez que lógico, é que o agente, inicialmente, agia amparado por uma causa de justificação,
ultrapassando, contudo, o limite permitido pela lei”.32

A doutrina costuma classificar o excesso de legitima defesa, em doloso, culposo ou


exculpante. O excesso poderá ocorrer de forma culposa e na forma dolosa em todas as causas
de exclusão de ilicitude, contudo possui mais utilização no instituto da legitima defesa. Na

31Op.cit.
32GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal. 18. Ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016, p.461.

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forma culposa, ocorre quando o indivíduo cometer erro inescusável e superável, ou seja,
quando o ato praticado pela pessoa, através dos requisitos da culpa, pode ser cometido por
qualquer outra. Aqui, vemos a caracterização da culpa imprópria. Neste tipo de erro cometido
na forma culposa do excesso, é punível, porém, haverá redução de pena por se tratar de
imperícia, imprudência ou negligência (requisitos da culpa).

A forma dolosa é aquela em que o agente responde por ato punível. Caracteriza-se
como dolosa, a legítima defesa onde há erro em seus requisitos, exemplo, quando uma pessoa
que supostamente estaria agindo em legítima defesa, mas por excesso nos meios empregados,
passa de vítima para agente delituoso. Assim, o agente responderá por agressão injusta. Um
exemplo prático de reação dolosa é quando um agente mesmo após cessar a agressão, da
continuidade ao ato por vontade própria, como no caso em que uma pessoa é atacada por um
inimigo que no momento do ato está desarmado e atua com o intuito de neutralizar a agressão,
mas após se defender sem extrapolar os meios necessários, ele se apossa da arma e decide
matar o agressor. Neste caso o agente estava amparado pela legitima defesa, contudo após o
seu ato proposital ele passa ser responsabilizado de forma dolosa. Sobre esse assunto,
podemos destacar a seguinte jurisprudência:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRIBUNAL


DO JÚRI. HOMICÍDIO QUALIFICADO. ALEGAÇÃO DE QUE O
VEREDICTO ABSOLUTÓRIO FOI MANIFESTAMENTE CONTRÁRIO
À PROVA DOS AUTOS. PROCEDÊNCIA. ACATAMENTO DA TESE
DE NEGATIVA DE AUTORIA PELO CORPO DE JURADOS. APELADO
CONFESSOU O CRIME A ELE IMPUTADO PERANTE A
AUTORIDADE POLICIAL, EM JUÍZO E AO SER INTEROGADO EM
PLENÁRIO. CONFISSÃO CORROBORADA POR PROVAS
TESTEMUNHAIS. ALEGAÇÃO DE LEGÍTIMA DEFESA.
TESTIFICADO QUE O APELADO CONTINUOU AS AGRESSÕES
MESMO APÓS A VÍTIMA ESTAR DESARMADA E CAÍDA NO CHÃO.
RÉU NÃO UTILIZOU MODERADAMENTE DOS MEIOS
NECESSÁRIOS PARA REPELIR INJUSTA AGRESSÃO. EXCLUDENTE
DE ILICITUDE GIZADA NO ART. 25 DO CÓDIGO PENAL NÃO
CONFIGURADA. RECURSO A QUE SE DÁ PROVIMENTO
UNANIMEMENTE. 1. O Conselho de Sentença, acatando a tese de negativa
de autoria esgrimida pelo patrono do réu, proferiu veredicto absolutório em
seu favor. 2. A decisão do Corpo de Jurados se mostra manifestamente
dissociada das provas arrecadadas aos autos na medida em que além do
apelado haver confessado a participação no homicídio da vítima, as provas
testemunhais o apontam como um dos autores do crime narrado na denúncia.
3. Alegação de legítima defesa. Improcedência. Consta dos autos que o réu
continuou as agressões com uma pedra mesmo após a vítima estar
desarmada e prostrada no chão. 4. À míngua de utilização dos meios
moderados para repelir injusta agressão da vítima, verifica-se que não restou
caracterizada, na situação dos autos, a excludente de antijuridicidade
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estampada no art. 25 do Diploma Punitivo. (Apelação Criminal nº 000318-


63.2006.8.17.1120(185915-2). Relator: Des. Gustavo Augusto Rodrigues De
Lima. Órgão Julgador: 4ª Câmara Criminal. Data de Julgamento:
14/7/2010)33

Neste caso o erro inescusável fez com que o agente respondesse pelo excesso, pois
mesmo após de cessada a agressão o autor continuou o ato com emprego de uma pedra,
resultando assim, portanto, o homicídio qualificado.Com isso, a responsabilidade do agente
será estabelecida com base nos resultados em excesso pelo ato praticado, desse modo o
mesmo só ira responder pelo o que extrapolar o aceitável no momento da legitima defesa, de
si ou de outrem. Sendo assim, se o agente praticar a lesão corporal em exercício da legitima
defesa sem cometer excesso, o mesmo será beneficiado pelo instituto da legitima defesa, mas,
contudo caso ele extrapole os meios necessários e pratique o excesso de defesa cometendo um
homicídio, por exemplo, o mesmo respondera por homicídio doloso consumado.

O excesso exculpante se origina do medo, do susto e do pânico oriundo da situação da


atual ou iminente e injusta agressão. Contudo o quesito mais importante deste instituto é a
medida do excesso da inexigibilidade de conduta diversa. Pois neste caso, será medida a
culpabilidade com base nos elementos do excesso da exculpante, onde apesar do
acontecimento do fato típico ilícito, a vítima poderá ter a culpabilidade afastada pelo fato da
inexistência da inexigibilidade de conduta diversa. Válido se faz lembrar que o excesso da
Legítima Defesa não irá absorver todo o ato, ou seja, o agente somente será punido por aquilo
que for considerado excesso. Tal entendimento se encontra na jurisprudência :

Dentre as hipóteses de excesso doloso, tem-se sua configuração quando a


vítima, embora agindo inicialmente sob a proteção da legítima defesa, passa
a repelir as agressões em situação que não mais justifica o revide. Na
hipótese, dá-se o chamado excesso extensivo, arredando, a partir de sua
concretização, a justificativa da legítima defesa. II- Apelo conhecido e
provido.34
É possível notar a dificuldade existente no julgamento da Legítima Defesa, uma vez
que, ao levar em consideração a verdade real, é extremamente incerta a certeza no limite entre
defesa dolosa e culposa. Afinal, como saber o que realmente se passou em uma situação onde
se fez necessário a auto defesa?

33 JUS BRASI..Jurisprudência, Disponível


em:<https://www.jusbrasil.com.br/topicos/164910440/ementa-apelacao-criminalsentenca-
condenatoriaart>. Acesso em: 20.dez.2018.
34TJCE – ACr 1998.08167-4 – 1ª C.Crim. – Des. Fernando Luiz Ximenes Rocha – DJCE 03.05.2000.

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Existem manobras que ajudam a identificar a veracidade dos fatos, como exame de
corpo e delito, oitiva de testemunhas ou autópsia. Porém, nenhuma das alternativas existentes
poderá garantir por completo o que realmente ocorreu.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Em nosso sistema jurídico penal existem determinadas hipóteses de exclusão da


antijuricidade ou ilicitude de alguns atos previstos pela redação do artigo 23 do Código Penal,
sendo uma dessas hipóteses o estado de necessidade, a legítima defesa, objeto deste estudo o
estrito cumprimento do dever legal, e o exercício regular de um direito. O instituto da legitima
defesa é considerado como uma reação natural do homem, que reflete no instinto de auto
conservação disposto pela norma jurídica brasileira, com intenção de efetuar a exclusão da
antijuricidade de uma determinada conduta.

Neste sentido, foi possível perceber que o exercício da Legitima Defesa aborda a
possibilidade de uma conduta típica ser considera como lícita no ato da repulsão de uma
agressão injusta, desde que sejam respeitados os requisitos impostos pelo artigo 25 do nosso
diploma penal. Pois nem sempre o Estado pode se fazer presente perante um ato de uma
injusta agressão ou em sua eminencia. Sendo assim, existe a possibilidade da autodefesa ou
defesa de outrem amparada na norma jurídica penal, em ato legitimo, que exclui, portanto a
hipótese de crime. Embora existam situações que configurem o excesso desse direito, como é
no caso da utilização de um meio desnecessário, ou na pratica do ato sem moderação, cada ato
deverá ser analisado de forma isolada pelo legislador, estudando o método e a ponderação do
exercício da legitima defesa, podendo assim ser caracterizada ou afastada a legitima defesa
por excesso.

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Paulo:Saraiva, 2003.
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Submetido em 19.06.2019

Aceito em 24.03.2020
Revista Reflexão e Crítica do Direito, v. 8, n. 1, p. 136-153, jan./jun. 2020 ISSN 2358-7008

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