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FICHAMENTO

ZAFFARONI, Eugênio Raul . O inimigo do direito penal.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio


Lamarão. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007. 224 p. (Coleção Pensamento
Criminológico)

Zaffaroni trabalha com maestria o conceito de inimigo, trazendo o desenvolvimento


histórico de sua influência no direito penal.

Desde os hostis no direito romano a idéia de um inimigo do Estado serviu como


fundamento para a expansão e rigor do poder punitivo. Com o advento da revolução
industrial o conceito ganha novas matizes, funcionais aos objetivos da classe
burguesa em ascensão.

No séculos XX e XXI Zaffaroni vê a influência da propagação do modelo norte


americano de organização social difundir um avivamento substancial no uso do
conceito de inimigo, bem perceptível nas "guerras às drogas", "guerra ao terror",
campanhas de Law & Order e outras medidas típicas.

Um sistema penal paralelo que os eliminava mediante detenções administrativas


ilimitadas (invocando estados de sítio, de emergência ou de guerra que duravam
anos) e um sistema penal subterrâneo, que procedia à eliminação direta por morte e
ao desaparecimento forçado, sem nenhum processo legal.

O livro é constituído de sete capítulos, cada um deles contribui de forma significativa


na abordagem dialética entre o Estado de Direito e o de Polícia sob o senso crítico
de um autor, traduzindo sua experiência e fundamentação sobre o tratamento
punitivo dado aos seres humanos privados da condição de pessoas, em abordagens
que se complementam.
I.INTRODUÇÃO OU PROLEGÔMENOS INDISPENSAVÉIS

Assim, no primeiro capítulo de O Inimigo no Direito Penal, o autor discute em seis


subtópicos, as hipóteses que colocam o ideário e o próprio poder punitivo em xeque,
apresentando-nos ainda, o conceito do que é direito penal e as últimas tendências
globais adotadas pelo poder punitivo no que diz respeito à atribuição do tratamento
de inimigo a determinadas pessoas.

1.HIPOTESE GERAL OU BASICA

A rigor, quase todo o Direito Penal do século XX, na medida em que teorizou
admitindo que alguns seres humanos são perigosos só por isso devem ser
segregados ou eliminados, coisificou-os sem dizê-lo, e com isso deixou de
considerá-los pessoas, ocultando esse fato com racionalizações.

2.AS ULTIMAS TENDÊNCIAS MUNDIAIS DO PODER PUNITIVO QUE NÃO PODE


SER DEIXADA DE LADO PELA DOUTRINA

Segundo o autor, o contexto mundial atual torna a reação política obrigatória contra
o designado inimigo da sociedade, sobre o qual se pretende o aniquilamento total.
Em tempos de discussões sobre os direitos humanos e negociação, o que ocorre, na
prática, é a “solução que arrasa com os direitos e, mais cedo ou mais tarde, acaba
no genocídio.
3.O CONTEXTO MUNDIAL TORNA A REAÇÃO POLÍTICA OBRIGATORIA

Os Estados Nacionais são débeis e incapazes de prover reformas estruturais; os


organismos internacionais tornaram-se raquíticos e desacreditados; a comunicação
de massa, de formidável poder técnico, está empenhada numa propagando volkisch
(populista) e vingativa sem precedentes.

4.O INIMIGO NÃO MERECE TRATAMENTO DE PESSOA

Não é a quantidade de direitos fundamentais privados de um indivíduo que lhe anula


a condição de pessoa, mas sim “a própria razão em que essa privação de direitos se
baseia, isto é, quando alguém é privado de algum direito apenas porque é
considerado pura e simplesmente como um ente perigoso.

5.QUAL A ESCÊNCIA DO INIMIGO

Não obstante, para se livrar do efeito perverso do conceito de inimigo no direito


penal, ou pelo menos, para contê-lo, não basta precisar o conceito de inimigo; é
necessário também precisar previamente o que se entende por direito penal.

6.DUAS PALAVRAS SOBRE “O DIREITO PENAL “

Na realidade o conceito do inimigo é incompatível com Estado de Direito,o que na


verdade seria adequado uma renovação doutrinal penal corretora, dos componentes
autoritários que se acompanhou durante quase todo tempo no seu percuso,um
ajuste penal que se ajuste com a teoria política que corresponde ao estado de
polícia.
II.O INIMIGO NA PRÁTICA DO EXERCÍCIO REAL DO PODER DO PODER
PUNITIVO

Já o segundo capítulo o autor trata dos pressupostos do inimigo na prática do


exercício real do poder, colocando em destaque as características do poder punitivo
na Revolução Mercantil. Zaffaroni faz neste capítulo uma análise histórica sobre a
concepção de inimigo, demonstrando que esse conceito é pré- Moderno,
remontando a Roma da antiguidade clássica.

1.O PODER PUNITIVO NA REVOLUÇÃO MERCANTIL

Como instrumento indispensável para se organizar as estrturas sociais,


colonizadoras primeiro e colonizadas depois sem levar em conta a enorme
transformação cultural que seu surgimento provocou, associado ao modelo
inquisitorial que o acompanhava.

2.A REVOLUÇÃO INQUISITORIAL :O SEQUESTRO DE DEUS

O poder punitivo ressurge na época inquisitorial. Até aquele período as situações


conflitantes eram resolvidas mediante luta como ordália ou a presença direta de
Deus na tomada de decisões. A ordália do dolo era a via pelo qual Deus expressava
sua decisão e, por conseguinte, decidia sobre a verdade.

3.O PODER PUNITIVO NA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL

Entretanto com surgimento do poder punitivo, passou-se a buscar a verdade


através da inquisitio. A revolução industrial, por sua vez, substituiu a ignorância.
Ainda assim, a lógica de eliminação física permanecia, apesar de mais restrita -
apenas a criminosos gravosos e a dissidentes. A solução ora encontrada para os
inimigos foi o encarceramento em prisões, pois lá seria possível domesticá-los e
reinseri-los na produção industrial.
4.O PODER PUNITIVO NA PERIFÉRIA NEOCOLONIZADA

Deste ponto, cabe ressaltar que o exercício do poder de vigilância que surgiu desta
transformação é o poder do senhor, conhecido como dominus, “que monopolizava o
bem, e quem se lhe opunha era sempre o mal” O dominus era bom, e sua
“generosidade” se mostrava em verdadeira campanha para “nos libertar” dos
inimigos, de todo o mal que se expressava no Satã, nos hereges na bruxaria.

5.O VELHO AUTORITARISMO DO SÉCULO XX

Já no século XX, surge um autoritarismo que no plano concreto exerceu seu “poder
repressivo de forma genocida, criando sistemas penais subterrâneos, com
desaparecimentos, torturas, e execuções policiais, individuais e em massa sem
nenhum respaldo legal. Este autoritarismo fundava-se num velho racismo
spenceriano e numa técnica de manipulação das massas intitulada völkisch.

6.O NOVO AUTORISTARISMO COOL DO SÉCULO XXI

No século XXI, este autoritarismo tornou-se cool. O sistema penal transformou-se no


fator de controle e redução da taxa de desemprego. Já a legislação penal se
aproximou de institutos inquisitórios sob o pretexto de uma idéia difusa de crime
organizado. Este período ficou marcado pela falta de um inimigo, após o ocaso do
socialismo soviético.

7. O AUTORITARISMO COOL NA ÁMERICA LATINA

Dessa maneira, o discurso cool, na América latina participa do “simplismo de sua


matriz norte-americana”, carecendo da mesma forma, de respaldo cientifico, e sim,
se orgulha disso, porque essa publicidade popular denigre os discursos jurídicos e
criminológicos obrigando os operadores do direito a assumirem a mesma função.
Logo, o exercício do poder punitivo “tornou-se tão irracional que não tolera sequer
um discurso acadêmico rasteiro, ou seja, ele não tem discurso, pois se reduz a uma
mera publicidade.

8.O BALANÇO DO EXÉRCITO REAL DO PODER PUNITIVO NA HISTÓRIA E NA


ATUALIDADE

Sempre se reprimiu de modos diferentes os iguais e os estranhos os amigos e os


inimigos a discriminação do poder punitivo é uma constante deriva na história até os
dias atuais.
III.O INIMIGO NOS DISCURSOS JURIDICOS, PENAIS E CRIMINOLOGICO

No terceiro capítulo, constatamos que ele tem por objetivo estimular uma reflexão
crítica acerca da natureza dos discursos jurídicos penais e criminológicos sobre o
inimigo. Esses discursos tiveram como precursor o filósofo Protágoras, que
sustentava a tese de que os incorrigíveis deveriam ser excluídos da sociedade.

1.O DIREITO PENAL PRÉ MODERNO

A modernidade, por sua vez, adveio com uma definição de inimigo etnocentrista e
racista. Os inimigos não mais se limitavam aos criminosos graves, incluíam agora os
chamados indesejáveis: pequenos ladrões, prostitutas, homossexuais, bêbados,
vagabundos, jogadores, etc.

2.A PREVENÇÃO GERAL E A RAZÃO DO ESTADO

O processo penal concentrava nos inquisidores as figuras do defensor, do acusador


e do juiz. O defensor será autorizado a atuar em limites muitos estreitos, sendo
seriamente ameaçado casos se excedesse em sua função. A doutrina pré-moderna
não só admitiu a seletividade do poder punitivo como tratou de legitimá-la,
aceitando-se implicitamente que para os amigos rege a impunidade e para os
inimigos o castigo.

3.A DOUTRINA PENAL NA MODERNIDADE E A PRETENSA INDIVIDUALIZAÇÃO


ONTICA DO INIMIGO

Nesse momento, como as opções de tratamento dos inimigos estavam limitadas,


pois não era mais possível matá-los e nem deportá-los, só restava a privação da
liberdade.. Para este autor, aquele sistema permite ao juiz “substituir uma pena
limitada por uma ilimitada ou desproporcional”, porém com outro nome: medida; já
este sistema possibilita uma pena limita que deve ser somada a uma ilimitada
(medida). Desse modo, conclui-se que a punição sobre aquele que fosse
considerado inimigo poderia ser indefinida, com simples justificativa de neutralizar
sua periculosidade.

4. O COROAMENTO DO INIMIGO ONTICO GARAFOLIANO,A LEGITIMAÇÃO DO


GENOCÍDIO PELO DIREITO PENAL DO SÉCULO XX
Vale observar que a cisão do direito penal é desenvolvido a um ramo paralelo as
penas determinadas, comportando medidas de segurança ou penas indeterminadas,
a rigor a tese de Stooss foi relativamente prudente e ate progressista, suas medidas
eliminava a eliminação física e deportação .

5.O SISTEMA PENAL CAUTELAR LATINO- AMERICANO

Na América Latina, por fim, o sismógrafo do direito penal é o direito processual, em


síntese, o direito penal latino-americano divide-se em sistema penal cautelar e
sistema penal de condenação, sendo que qualquer alteração neste último pouco
influencia nas taxas da população carcerária. Isto, por conseguinte, significa a
deformação do sistema penal latino-americano, em que o poder punitivo é exercido
e prescinde de uma busca efetiva da verdade real e de uma condenação formal.
IV. O INIMIGO ESTRANHO OU HOSTIS NA TEORIA POLÍTICA

Nessa capítulo, Zaffaroni já observa que reconhecer um inimigo no direito penal já


direciona o poder punitivo para um direito penal do autor.

1.O QUE SE DISCUTE SÃO OS DIREITOS INVIDUAIS DOS CIDADÕES

O direito penal se limitou a discutir o tratamento penal diferenciado dos inimigos e


estranhos, destinado a neutralização do perigo que representam.O certo que só
poderia existir um tratamento penal diferenciado realmente limitado a cada cidadão.

2. ADMITIR O CONCEITO DE HOSTIS

Entra, nesse cenário, a chamada exceção que não é exceção, simplesmente,


porque é uma contradição declarar-se guerra a ninguém. A guerra clama sempre por
um inimigo, pois só assim serão justificados estados de exceção e a violação de
regras de direito penal, processual penal e internacional humanitário. Contudo, como
a guerra é permanente, “o poder de guerra (contra os inimigos) do momento bélico
passa a ser poder punitivo (contra infratores) no momento político”. Assim sendo,
todos os declarados inimigos pelo soberano sofrerão como se inimigos do próprio
Estado o fossem, pois a guerra é constante, apenas os inimigos que vão se
revezando.

3.A CONFRONTAÇÃO DE HOBBES E LOCKE

Ambos compartilham uma visão passiva e defensiva de cidadania, que não visualiza
a importância da participação e do consenso. Importa-lhes a esfera pública apenas
na medida que preserva ou ameaça a esfera da vida privada.
4.O CONFRONTO ENTRE KANT E FEUERBACH

Feuerbach defende a existência de direitos, afirmando que no estado natural


também existem direitos dos indivíduos. Kant é o grande invariável do direito pena
liberal, limita a alcunha de inimigo as categorias de assassinos e traidores.

5. AS CONTRADIÇÕES DE HOBBES E A COERENCIA DE SCHMITT

Em Schmitt, segundo Zaffaroni, o inimigo é indubitavelmente político, bem como a


sua definição depende de um ato do soberano. Entra, nesse cenário, a chamada
exceção que não é exceção,simplesmente, porque é uma contradição declarar-se
guerra a ninguém. Contudo, como a guerra é permanente, “o poder de guerra
(contra os inimigos) do momento bélico passa a ser poder punitivo (contra infratores)
no momento político”.

6. O HOSTIS RECLAMA UM ESTADO ABSOLUTO

O inimigo hostil nunca é compatível com um estado de direito,nem com os princípios


básicos de liberalismo político.
V.AS TÁTICAS DE CONTENÇÃO: A PROPOSTA ESTÁTITICA E SUA
INVIABILIDADE

A grande inovação da Teoria do Inimigo de Jakobs, segundo Zaffaroni[22], foi o


termo utilizado, ou seja, inimigo. Este autor complementa, ainda, que se não fosse
este termo, a teoria não teria despertado tanta polêmica. complementa ainda, que
Jakobs deve ser criticado pela introdução de elementos próprios do estado absoluto
no interior do Estado de direito, sem se dar conta de que isso o implod]. A razão é
que “todo espaço que se concede ao Estado de polícia é usado por este para
estender-se até chegar ao Estado absoluto, enterrando, definitivamente, o seu
“inimigo”: o Estado de direito.

1. UM DEBATE CONTEPORÂNIO SINGULAR

Embora exista um amplo consenso a respeito da descrição do amadurecimento


da legislação penal nas ultimas décadas, não há acordo quanto a resposta do
sabor jurídico. A proposta de contenção provocou mais amplo debate. ainda,
que “Jakobs deve ser criticado pela introdução de elementos próprios do estado
absoluto no interior do Estado de direito, sem se dar conta de que isso o
implode”[23]. A razão é que “todo espaço que se concede ao Estado de polícia é
usado por este para estender-se até chegar ao Estado absoluto.

2.NAO EXISTE CONCEITOS LIMITADOS DE INIMIGO

Argumenta –se contra as observações de Jakobs que hostis nos dias de hoje
seriam submetidos a contenção como individuo perigoso,em razão da falta de
confiança em seu comportamento futuro. Como ninguém pode prever o futuro a
incerteza do futuro mantem em aberto o juízo de periculosidade em aberto.
3. A INEVITAVEL QUEBRA DO ESTADO DE DIREITO

A proposta de Jakobs não parte de quem e nem se apoia em Schmitt,quando em


casos excepcionais o estado deve cumprir sua função de proteção,e sua
necessidade. Não se pode introduzir ou ampliar o uso do conceito do inimigo no
direito penal, mas adimiti-lo .

4. A VALIACAO NEGATIVA DA EFICACIA DA CONTENCAO

E valido observar que a legislação e a pratica impõe um poder punitivo que


aceita a discriminação penal do inimigo e suas consequência. Em medida muito
mais ampla,isso leva em consideração que o estado de direito já esta
violada,isso leva conclusão que a proposta de Jakobs e valida o principio de
admitir que continue sem medida.
VI . AS TATICAS DE CONTENCAO : A PROPOSTA DINAMICA

Neste capitulo Zaffaroni pontifica os Estados de direito não são nada além da
contenção dos Estados de polícia, penosamente conseguida como resultado da
experiência acumulada ao longo das lutas contra o poder absoluto. Apesar da
luta, é bom deixar claro que o Estado de polícia não veio a óbito, apenas
encontra-se encapsulado.

1. A DIALETICA DO ESTADO DE DIREITO E O PODER PUNITIVO

Nesse sentido, a função do direito penal de todo Estado de direito é a redução e


a contenção do poder punitivo dentro dos limites menos irracionais possíveis.
Logo, o termo direito penal garantista em um Estado de direito é um redundância
grosseira.

2. A FUNCAO ESSENCIAL DO DIREITO PENAL DO ESTADE DE DIREITO

Retomando a idéia de Estado de direito, Zaffaroni expõe que é um erro tático


conceder espaço para o Estado de polícia, pois seria “como entregar as armas,
acreditando que se chega a um armistício, quando, na realidade, trata-se de uma
rendição nas piores condições.

3. EXITOS E FRACASSOS

Este receio justifica-se, pois o autor argentino percebe que o verdadeiro inimigo
do direito penal é o Estado de polícia, que, por sua essência, não pode deixar de
buscar o absolutismo.
4. DUAS PALAVRAS SOBRE O DIREITO PENAL INTERNACIONAL

Por fim, Zaffaroni chama a atenção para o fato de que o direito internacional
penal é direito penal do inimigo e não do cidadão. Para tanto, cita exemplos da
atualidade, tais como, o caso ex-presidente sérvio Slobodan Milosevic.
Outrossim, atenta para o que. ele chama de lógica do quitandeiro[30] no combate
ao terrorismo e propõe como sendo o papel do direito penal nada mais que o
ordinário, ou seja, “se delitos são cometidos, seus responsáveis devem ser
individualizados, detidos, processados, julgados, condenados e levados a
cumprir a pena

VII. ALGUMAS REFLEXOES EXCLUSIVAS

Ao longo dos séculos, sempre existiu um poder punitivo capaz de tratar algumas
pessoas como inimigos. Esta política estava presente já nos romanos com o seu
hostis e não há como negar o seu papel fundamental em manipular as massas,
pois quando se tem um inimigo comum, une-se as forças para derrotá-lo. Vale
aqui menção, também, acerca da proximidade entre esta política e a do pane et
circus, pois ambas auxiliam o soberano a conduzir as massas de acordo com sua
vontade. Retomando ao direito penal do inimigo, tem-se que tal doutrina atinge o
Estado de direito concreto, real ou histórico; portanto, perde o rumo das
conquistas já obtidas nas diversas lutas sociais já existentes. Nesse sentido, vale
ressaltar que o Estado de direito não admite nenhuma exceção legítima, pois tal
atitude significaria o rompimento da dialética que se opera no interior de todo
Estado de direito com o Estado de polícia.

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Outra injustiça, para Zaffaroni, é a falta de “critérios” para a “quantificação” (p. 27)
das penas. Os juízes ficam com grande liberdade para fixarem penas, sem critérios
claros e terminariam sendo cruéis contra pessoas pobres e brandos com pessoas
ricas.

A participação de parte da polícia em coisas erradas, como “o jogo, a prostituição, o


contrabando, o tráfico de drogas” (p. 29). Haveria um “altíssimo número de fatos
violentos e de corrupção praticados pelos próprios órgãos do sistema penal” (p. 29).

“discurso penal”, o direito penal que é aplicado hoje. Os defensores do atual sistema
penal atacam toda crítica, especialmente da “criminologia da reação social”, fazendo
a “satanização” dos críticos. Os que defendem o atual direito penal praticamente
dizem que as críticas seriam do diabo (p. 36), rotulando críticos como Zaffaroni de
“marxistas” (p. 36).

Diz que, “durante muitas décadas”, o “discurso jurídico-penal predominante” foi o


“positivista”. Depois, “superada esta fase” (p. 40), houve uma “base neokantista”,
que também não seria realista. Mais tarde, houve o “finalismo” (p. 40). Houve uma
melhora, mas estas correntes do discurso penal não seriam realistas, pois não
teriam “contato com a realidade” (p. 42).

O realismo penal de Zaffaroni é um “direito penal garantidor e ético”, humanista, um


“direito penal humanitário”. Este “realismo marginal”, a proposta de Zaffaroni, é
exposto na parte III do livro “Em busca das penas perdidas”, nas páginas 179 a 280

Zaffaroni ataca propostas de aumento das penas e de criminalização de mais


condutas do povo, pois “não haveria habitante que não fosse, por diversas vezes,
criminalizado” (p. 26), se as leis penais fossem aplicadas a todos. Ele critica
movimentos que tentam “criminalizar” “toda a população” (p. 27). Este movimento
apenas aumentaria “o arbítrio seletivo dos órgãos executivos do sistema penal” (p.
27), que teria “poder repressivo sobre qualquer habitante”, mas só operaria “quando
e contra quem” os donos do poder quisessem, com base no terror e no arbítrio.

Zaffaroni critica a prisão, a perda da liberdade, aplicada a pessoas com problemas


mentais, internadas a força em manicômios. Critica a internação forçada de pessoas
velhas e indefesas (p. 22). Diz que há pessoas pobres humilhadas e punidas pelo
Estado sem nenhuma defesa. Isto ocorre principalmente contra pessoas como os
migrantes, os miseráveis, as prostitutas, os viciados etc (p. 22). O sistema penal
seria cruel, injusto, não protegeria a sociedade, geraria o terror no povo e ainda
provoca mortes.
REFERENCIA

ZAFFARONI, Eugenio Raúl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio


Lamarão. 2. ed. Rio de Janeiro: Revan, 2007. 224 p. (Coleção Pensamento
Criminológico)

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