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Contato Imediato

COMO FAZER
HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS

Juan Acevedo
Contato Imediato

COMO FAZER
HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS

Direção de Julieta de Godoy Ladeira


Juan Acevedo

Contato Imediato

COMO FAZER
HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS

£lobal editora
OJuan Acevedo
Título original: Como hacer historietas (ISBN 84-85016-35-1)
Editorial Popular, Madrid

EQUIPE DE REALIZAÇÃO

Supervisão Gráfica: Nadia Basso


Diagramaçãoe Revisão (coord.): Fernando de B. Gião
Revisão: Sílvio N. Ferreira (Copydesk)
Vera Lucia F. P. Gião
Arte-final: Paulo S. Cassares
Silene Miranda
Composição, Paginação e Filmes: GrarH Box - Editoração Eletrônica

Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional


(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Acezedo, Juan.
Como fazer histórias em quadrinhos / Juan Acezedo ;
[tradução Sílvio Neves Ferreira]. — São Paulo : Glo-
bal, 1990.

Bibliografia.
ISBN 85-260-0242-2

1. Estórias em quadrinhos 2. Estórias em quadri-


nhos - Tecnica I. Titulo.

CDD-741.5028
90-1095 -741.5014

Índices para catálogo sistemático:


1. Estórias em quadrinhos : Linguagem e comunicação
741.5014
2. Estórias em quadrinhos : Tecnica 741.5028

Nº de catálogo: 1799

Direitos reservados:
Clobal editora e distribuidora ltda.
Rua França Pinto. 836 Rua Mariz e Barros, 39
Fone: (01) 572-4473 conjs. 2686
Cep 04016 — V. Mariana Fone: (021) 273-5944
Cx. Postal 45329 Cep20270 - Tijuca
São Paulo — SP Rio de Janeiro — RJ
A Enriquee Julieta, meus pais.
JUAN ACEVEDOFernández de Paredes, peruano,é jornalista. Colabora-
dor de diversos periódicos peruanose educadorligado àsartes, além de suas
atividades acadêmicas exercidas em universidades de seu país, vem-se
dedicando à divulgação das técnicas de histórias em quadrinhos com a
realização de diversos encontros e cursos. Voltados sobretudo à realidade
daspróprias comunidades, esses cursos têm sido realizados em vários países
da Europa e Américas, incluindo o Brasil. Como quadrinhista é criador,
entre outros, de “Paco Yunque”, traduzido e editado também na Europa.
PREFÁCIO

COMO LIBERTAR A VOZ E O OLHAR

Ao longo deste século, o caminho da História repercutiu, com um


certo paradoxo sinistro, na paralela evoluçãodas histórias em quadrinhos,
propondo os mais importantes modelosestéticos precisamente nas esferas
com maiorpotencialidade de colonização cultural. Com efeito, os vértices
qualitativos dos quadrinhos firmam-se, sem dúvida, no seio da produção
para a imprensa norte-americana, desde o princípio do século até os pri-
meiros tempos da Guerra Fria, envolvendo meia centena de anos de imen-
sa criatividade artística para um público de predominante mentalidade
adulta, enquanto que, na imensa maioria dos outros países, ainda se limi-
tavam os quadrinhos nativos a uma área quase absoluta de consumo
infantil; a partir de 1950, porém, a Argentina e, uns dez anos depois, a
França e a Itália, seguindo-as logo outras nações, unir-se-iam ao caso
britânico, exemplar nosentidode ter-se desvinculado rapidamente de uma
linha de histórias em quadrinhos para adultos de tendência tipicamente
generalizada, para concentrar esse meio de expressão na infância, com
todos os consegiientes óbices para seu desenvolvimentoartístico. Dar-se-
ia assim o fato de que notáveis autores surgidos fora dos Estados Unidos
utilizaram comproveito a linguagem dos quadrinhos objetivandoresistir
ao colonialismo ideológico da narrativa desenhada ianque, sem comisso
poderlivrar-se (e aíestá o paradoxocitado de início) da herança estética
adquirida portal meio de expressão nas fronteiras norte-americanas. A
situação agravava-se, é evidente, com ofato de que os quadrinhos ianques,
em grande parteliberais durante décadas » antinazistas ao longo da 1
Guerra Mundial, haviam involuído de forma lamentável, através de
múltiplas modelagens concretas, desde a Guerra Fria e, sobretudo, a
partir da caça às bruxas e do macartismo. Aqueles que, por dezenas e
dezenas de anos, foram os melhores quadrinhos da história desta arte,
tinham assumido uma dupla personalidade, tipo Dr. Jekyll e Mr. Hyde, a
qual era necessário reverenciar e rechaçar de uma só vez.
Com o tempo, essa situação levou ao confusionismo que consistia
não apenas na única e simplista percepção de uma daquelas personali-
dades como também no esquecimento dos geniais níveis de uma produção
anterior exemplificada por obras como Little Nemo in Slumberland, de
Winsor McCay; The Katzenjammer Kids (Os Sobrinhos do Capitão, no
Brasil), de Harold Knerr; Bringing Up Father (Pafúncio e Marocas), de
George McManus; Krazy Kat, de George Herriman; Mickey Mouse, de
Floyd Gottfredson; Wash Tubbs, de Roy Craner; Thimble Theater (Po-
peye), de Elzie Crisler Segar; Blondie, de Chic Young; Li'l Abner (Ferdi-
nando), de Al Capp; Terry and the Pirates (Terry e os Piratas), de Milton
Caniff; até chegar a The Spirit (O Espírito), de Will Eisner. E, mesmo
assim, deixa-se de recordar que, como antes da Il Guerra Mundial, escon-
diam-se nos quadrinhos norte-americanos abundantes obras de conteúdo
manifestamente reacionário e até ultradireitista, depois do conflito bélico
e em uma trajetória que alcança nossos dias, um bom número de transfor-
mações da narrativa desenhada ianque corresponde a visíveis alentos
progressistas.
Uma e outra vez, convém enfatizar na Espanha estesfatos históricos,
porque, durante muitos anos, o franquismo aniquilou sua recepção fide-
digna e proibiu sistematicamente quadrinhos espanhóis de caráter adulto,
rompendo assim as amarras entre nosso mundo da narrativa desenhada e
as mais transcendentais expressões e os rumos da mesma do outro lado
das fronteiras hispânicas. Porisso, o citado confusionismo é ainda mais
grave entre nós e manifesta-se com urgência a necessidade de recuperar o
conhecimento de um passado, sob todos os aspectos fundamental para o
desenvolvimento da arte dos quadrinhos. Um claro sintoma de tal confu-
sionismo percebe-se nas referências depreciativas aos quadrinhos norte-
americanos difundidos na Espanha durante a era de Franco, desco-
nhecendo-se ou esquecendo-se que, em primeiro lugar, é lógico que às
nossas mãos chegaram os mais pueris e os mais próximos, em ideologia, à
que aqui imperava; e, em segundo lugar, que até estes sofreram quantas
desfigurações foram do capricho da censura, para fazê-los coincidir ain-
da mais com a mentalidade retrógrada imposta por força das armas.
Agora que os quadrinhos espanhóis já contam com anos de valiosa
ressurreição ética e estética e que esse meio da expressão, em sua acep-
ção genérica, conquistou em nosso país um incipiente prestígio cultural, o
livro de Juan Acevedo Como fazer histórias em quadrinhos revela-se
extraordinariamente oportuno para favorecer uma compreensão profunda
das raízes dessa arte, raízes inseridas na “observação da realidade e não
de algum esquema”, como afirma o autor em relação a sua metodologia,
acrescentando que “estuda-se uma linguagem e a linguagem remete-nos a
uma determinada realidade” . Nesse sentido e no decorrer da obra, nascida
de um apaixonante desejo de promover a consciência crítica e a libertação
das possibilidades de expressão no Peru, Histórias em quadrinhos supera
de maneira lúcida a antes comentada perplexidade diante das ambivalências
dos modernos quadrinhos norte-americanos e assume a análise de seus
êxitos até chegar a um ponto zero, de princípio de “alfabetização” gráfica
e narrativa, para daí voltar para a livre e não colonizada possibilidade de
expressão nativa. Esse tipo de proposição, estruturada com indubitável
talento em função de seus legítimos objetivos, parece abrir um caminho
muito válido para uma criatividade racional.
E, entrando em detalhes, creio ser muito útil que o livro de Juan
Acevedo redescubra para o leitor, desde o próprio início, um dos fatores
transcendentais das autênticas obras-primas dos quadrinhos, com fregiiên-
cia desdenhadas pelos observadores dos últimos tempos, sobretudo fora
dos Estados Unidos: a direção de atores. Acevedo não emprega essa
terminologia, emprestada do cinema, mas enfoca com felicidade seu con-
teúdo e sua significação, outorgando-lhe até o privilégio de uma “primei-
ra lição”, primeira lição à qual deveriam comparecer, com humildade,
tantos desenhistas cujos personagens, misteriosamente, adotam idênticas
expressões faciais e corporais ao longode vinhetas e vinhetas que, segun-
do os roteiros, corresponderiam a estados de humor muito diferentes. Em
continuação e já multiplicando o uso de termosde origem cinematográfica,
Comofazer histórias em quadrinhos brinda-nos com duas longas partes
respectiva e expressivamente entituladas “A vinheta e a segiiência” e “A
montagem”, em capítulos que encerram, por sua vez, propostas básicas de
linguagem narrativa que também amiúde estão ausentes na obra de
conhecidos autores de quadrinhos. Recorrendo a outro termo de
procedência cinematográfica, podemosdizer que olivro de Juan Acevedo
expõe, com eficiência didática, uma teoria fundamental da direção de
cena no que se refere à narrativa desenhada.
Por fim, em Como fazer histórias em quadrinhos, adquire carac-
terísticas essenciais a consideração de que a obra não é exatamente um
manual daquela direção de cena para uso exclusivo de pessoas com
evidentes aptidões para a ilustração, mas para facilitar o acesso de qual-
quer pessoa a um meio de expressão que, aparentemente, estaria reserva-
do aos “desenhistas natos”. Esse enfoque também se torna muito oportu-
no, ainda mais quando se confundem em demasia os dotes puramente
gráficos com a inspiração no relato através de imagens desenhadas. As-
sim, Juan Acevedo defende, de modo peremptório, que os quadrinhos
sejam uma arte para o povo e que, em sua realidade mais ética, cons-
tituam sua voz e seu olhar.

Javier Coma

10
INTRODUÇÃO

A partir da década de 60, multiplicaram-se os livros sobre histórias


em quadrinhos, chegando a formar uma extensa e variada bibliografia:
livros que narram a história das histórias em quadrinhos ou que analisam
sua linguagem e seus conteúdos. Por outro lado, também naqueles anos e
desde muito antes, vinham sendo publicados livros para “ensinar a fazer
histórias em quadrinhos”. Entre estes e aqueles, aprofundaram-se as dife-
renças: enquanto os livros que ensinam a fazer quadrinhos utilizam uma
linguagem simples e seu nível não costuma ultrapassar o de um mero
manual de instruções, os dedicados à análise dos quadrinhos usam, fre-
quentemente, a linguagem austera que a atividade científica requer e que
os torna inacessíveis à massa.
Como fazer histórias em quadrinhos pretende superaras citadas dife-
renças: incorpora várias das contribuições dos livros “inacessíveis à massa”,
integrando-as em um texto destinadoprincipalmente à prática dos quadrinhos.
Este livro foi escrito com base em uma experiência concreta: nossa
participação na Oficina de Quadrinhos de Villa El Salvador, no Peru,entre
julho de 1975 e agosto de 1976.! Convém ampliar esta referência, porque
ela nos remete ao contexto em que nasceram as páginas a seguir.

Villa El Salvador e o Centro de Comunicação Popular

Villa El Salvador é uma das povoações marginais que rodeiam a


capital do Peru. Estes povoados originaram-se das fortes migrações inter-
nas ocorridas no país nas últimas décadas. Durante esse período, milhões
de pessoas se deslocaram para asprincipais cidades, em busca das vanta-

' De 1976até a data de publicação da segunda edição destelivro, o método nascido em Villa El
Salvadorfoi aplicado em diversos seminários na América Latina e na Espanha. Nocapítulo V
atualizaremos esta informação.
gens primordiais que estas representavam: trabalho, saúde, educação etc.
A maioria não conseguiu esses benefícios. Sua presença, em troca, alterou
o ritmo de crescimento das cidades, dando-lhes novas características so-
ciais, econômicas, políticas e culturais.
Nascida em 1971, Villa El Salvador está situada em um imenso
areial, vinte quilômetros ao sul de Lima. Ali, em condições econômicas e
sociais adversas, surgiram organizações que, a suas idéias, uniram a ação,
para mudar a realidade em que vivem. Uma dessas organizações é o Cen-
tro de Comunicação Popular.
Quando entramos em contato com o Centro, já havia oficinas de
teatro, cinema, audiovisuais, música, obras artísticas e serigrafia, nas quais
os habitantes aprendiam a utilizar técnicas de comunicação dentro de um
processo destinado a despertar a consciência sobre a realidade e a estimu-
lar a ação sobre ela. A essas oficinas, e com as mesmas características,
somou-se a Oficina de Quadrinhos.”
O caso do Centro de Comunicação Popular é uma das mais bem-
sucedidas experiências de educação popular da América Latina: organiza-
ção independente, formada em sua totalidade por habitantes da própria
comunidade, continua regularmente, desde 1974, a atividade de suas ofici-
nas, “Trata-se”, diz uma das matérias de sua revista Critica, “não tanto de
difundir “cultura”, masde ir criando nossa própria cultura, desde as bases
mediante a comunicação mútua daquilo que sentimos e queremos” **5

A Oficina de Quadrinhos
A Oficina começou com quinze participantes: em sua maioria, estu-
dantes de ambos os sexos, um universitário e uma dona-de-casa. As reu-

2 A Villa El Salvadorsurgiu como um dos tantos“barriados”ou “pueblos jóvenes”peruanos, mais


ou menosequivalentesàs favelas brasileiras. Hoje, é um assentamento urbanoautogerido, dotado
de uma razoável infra-estrutura e de uma constituição paralela à do Estado. Dentro de uma
proposta política francamente socialista, lá não existe a propriedade privada dos serviços
essenciais à população. Seus habitantes são, na maioria, trabalhadoresinseridos no mercado de
trabalho formal ou informal, oriundosda região andina (que falam o quechua ou aimará), para
os quais o trabalho coletivo é um dado cultural. Por suascaracterísticas, a Villa El Salvador é
reconhecida como uma experiência única no mundo (N.T.).
* Nossapresença na Villa El Salvador deveu-se a uma iniciativa coordenadaentre o Centro de
Comunicação Popular e a Diretoria Geral de Extensão Educativa.
* Critica, nº 22, p. 3, 8/jun/1975.
* O trabalho desenvolvido pelo Centro de Comunicação Popular mereceu o reconhecimento de
outras organizações populares peruanas, bem como o da UNESCO,que, em maio de 1976, doou-
lhe umagráfica e material para gravaçõese filmagens.
niões aconteciam três vezes por semana, além da sessão semanal com as
outras oficinas do Centro.
De início, alguns não confiaram em suas próprias possibilidades:
“mas eu não sei desenhar”, palavras que se juntavam aos evidentes dese-
jos de aprender a fazê-lo. Refletimos em conjunto sobre o que significa
“saber desenhar”: aqui, saber desenhar não era saber fazê-lo como os
profissionais do desenho. A Oficina não tinha porfinalidade a criação de
obras de arte — embora isso também se trataria de incentivar —, mas
oferecer a linguagem da história em quadrinhos para liberar a expressão e,
com isso, tomar possível a conscientização. Duas palavras tornavam-se
decisivas: quê e como. O que se deseja comunicar e como fazê-lo. E com
elas, implicitamente, a quem se comunica,o outro sujeito da comunicação.
Ao levá-lo em conta, ao determiná-lo, esclarecia-se a mensagem a lhe ser
dirigida e as formas — palavras e desenhos — com que se podia chegar
até ele. Compreendeu-se que saber desenhar, aqui, significava outra coisa.
A referência para avaliar o bom desenho não era dada pelos trabalhos do
profissional — que, na maioria das vezes, respondia a uma problemática
alheia —, mas pelos homens, mulheres e crianças que formavam uma
mesma comunidade (comum-unidade). A linguagem a ser empregada, como
o mundo que se constituía, convertia-se em seu acervo.
Tomar consciência de que não havia necessidade de um desenho
“perfeito” provocou umalibertação: associaram-se idéias, lembranças etc.
Assim, por exemplo,foi dito: “Todo mundo sabe somar e diminuir. Até os
analfabetos aprenderam, para que não os enganem no mercado, ou no
ônibus ou em qualquer compra, ou seja, na própria prática. Porque sabe
somar e diminuir, ninguém vai pensar que é um cientista. Da mesma for-
ma, vamos aprender a desenhar 'na prática" e, por isso, não vamos virar
artistas...” Este último ponto ficava em suspenso. Estava claro, em todo
caso, que o desenho “na prática” e para a prática era algo possível de con-
verter-se em um bem comum.
Mais tarde, a confiança nas próprias possibilidades foi-se transfor-
mando em atitude permanente, confiança que nascia e se alcançava junto
às pessoas através dos quadrinhos.
O desenvolvimento de umasessão era o seguinte: começava-se lendo
umahistória em quadrinhos, dessas que são vendidas nas bancas de jornais
ou se alugam no mercado,* quer dizer. uma das histórias em quadrinhos
que o público usualmente lê. Observavam-se seus recursos técnicos: acer-
tos, defeitos etc. Analisavam-se as relações entre esses recursos e os con-

* É um costume peruano,talvez devido à pobreza da população ouao gosto pela leitura (N.T.).
teúdos que eles transmitem, e entre esses conteúdos e a própria realidade.
Prosseguia-se com o estudo da linguagem dos quadrinhos — leitura de li-
vros especializados e constatação nos quadrinhos que tivéssemos. Por fim,
desenvolvia-se o trabalho prático: exercícios individuais e coletivos sobre
o quese aprendera.
Um dos exercícios mais interessantes foi o das “situações”. Nele, os
integrantes da Oficina propunham uma situação (esta palavra é mais espe-
cífica que “tema”) a partir da qual se dava o exercício propriamente dito.
A situação marcava apenas o ponto de partida, a visualização e o desen-
volvimento dela ficavam inteiramente por conta da criação do indivíduo
ou do grupo, conforme se havia decidido trabalhar (ambos os modos, o
individual e o coletivo, alternavam-se de maneira permanente). O trabalho
prático terminava com a crítica de cada um sobre os trabalhos.”
Este esquema não era, de modo algum, rígido. Pelo contrário, podia
apresentar variações: talvez não se lesse uma história em quadrinhos conhe-
cida, mas umade coleção (mais antiga ou vinda do exterior), talvez apenas
se desenhasse,talvez se dedicasse todo o tempo à leitura e à crítica de uma
história em quadrinhos produzida pela Oficina e que deveria ser publicada.
As atividades da Oficina não se limitavam às sessões, mas tinham
continuidade na observação, na reflexão, nas práticas de desenho etc., cuja
realização era recomendada na vida cotidiana. Das anotações resultantes
destas práticas foi surgindo o Arquivo da Oficina de Quadrinhos, que fi-
cava aos cuidados de um dos integrantes da Oficina,eleito pela maioria.
Com o tempo, o Arquivo foi crescendoe se diversificando: seção de livros,
seção de artigos recortados dos jornais, seção de quadrinhos, seção de aná-
lises feitas por membros da Oficina etc., uma espécie de memória à dis-
posição de todos os participantes da Oficina.
Com a publicação dos quadrinhos produzidos na Oficina iniciou-se
umaoutra etapa de trabalho: até então, o propósito principal tinha sido o
de aprender a manejar a linguagem dos quadrinhos; daí em diante, ao
desenvolvimento dessa aprendizagem integrou-se o interesse pelas reações
e opiniões dos leitores. Ao atingir o leitor, a comunicação se havia concre-
tizado: a partir desse momento,as respostas do leitor deviam incorporar-se
aos trabalhos da Oficina.

? É oportunoobservar queas situações escolhidas sempre eram extraídas das próprias vivências
dosintegrantes da Oficina: “uma criança traz água do tanque”, “um interiorano procura um lote
em Villa El Salvador”, “um passarinho perdeu-se do ninho” etc. Eram diversos os desen-
volvimentos: nos extremos, um “realismo” sem maior imaginação ou uma “fantasia” sem
consistência alguma; da candura própria da ingenuidade até as revelações da atitude consciente,
a presençade diferentes características: humor, ternura, desolação, amargura etc.
Ashistórias em quadrinhos da Oficina foram publicadas numarevis-
ta chamada PIOLA. Tinha umatiragem de 500 exemplares mimeografa-
dos em papel-jornal. Era vendida ao preço de dois soles” em algumas
bancas, no Centro de Comunicação Popular e também pelos integrantes da
Oficina que se convertiam em vendedores ambulantes.
A cada número, PIOLA mostrava um esmero maior: aos quadrinhos
— que cresciam em nível técnico e de argumentos — juntou seções (edi-
torial, informação e crítica) sobre o mundo dashistórias em quadrinhos.
Embora elaboradas em equipe, a maioria das histórias de PIOLA era
escrita e desenhada por um só autor. Em alguns casos, foram executadas
por dois autores, um para O roteiro e outro para os desenhos. Também se
realizaram trabalhos por encomenda: por ocasião de alguma data comemo-
rativa ou situação que estivesse ocorrendo, em coordenação com as demais
oficinas do Centro.
Não obstante, mesmo recolhendo as opiniões dos leitores e integran-
do-as aos novos quadrinhos ou trabalhando por encomenda para atender a
algum evento, a Oficina sentiu a necessidade de incrementar ainda mais a
comunicação com a coletividade, formando novos grupos e ensinando-lhes
a técnica dos quadrinhos. Osintegrantes da Oficina transformaram-se em
promotores: sua tarefa era ensinar o que haviam aprendido e aprender a
ensinar. Começou assim mais uma etapa de trabalho: nela, compreender-
se-ia que o fato de “ensinar” e de “aprender” é relativo quando trabalham
diversas pessoas, que o promotor não é “o que ensina” e os demais “os que
aprendem”. O promotor se torna um integrante a mais, com a diferença de
que ele é quem conhece, há mais tempo, uma técnica e vai conhecê-la
ainda mais, com todos, quando a difundir. Pois com os diálogos, as refle-
xões e os trabalhos práticos em grupo todos aprendem e todos ensinam.
Todas as pessoas — e, com certeza, não apenas os professores — sa-
bem por experiência própria que, ao ensinar, ao divulgar um conhecimen-
to, aquele que ensina “volta a aprender”. Se a relação é de diálogo, ao vol-
tar a aprender descobrir-se-ão novos ângulose, consegiientemente, aprender-
se-á melhor.
O aprender melhor confluiu com a própria evolução dos integrantes
da Oficina, pois as novas histórias em quadrinhos ganharam não só um
maior domínio da linguagem ali utilizada, como também uma observação
mais aguda da realidade que se exprimia no prazer com que se retocavam

“A palavra “piola” é uma expressão popular que se utiliza para significar que algo está bem.
* Com a reforma econômicade maio de 1985, o sol foi substituído pelo inti, que valia 1.000 soles.
Em março de 1989 a cotação era de 1.200 intis por dólar (N.T.).
alguns detalhes, tanto dos personagens como do ambiente. Desse gosto
pela forma brotaram expressões de verdadeira arte popular.
Atualmente, a Oficina de Quadrinhos mantém suas atividades, pro-
duzindo histórias e formando novos cartunistas. O processo, sem dúvida,
não foi retilíneo nem caiu do céu: no primeiro grupo, de quinze pessoas,
sobraram, porfim, quatro, e essa proporção, mais ou menos, repetiu-se no
desenvolvimento de outros grupos. À revista Piola foi suspensa por algum
tempo, para dar vez a novas formas de comunicação (cartazes e ilustra-
ções). Enquanto alguns membros da Oficina dedicaram-se mais aos qua-
drinhos (que continuaram a ser publicados na revista Crítica), outros en-
tregaram-se à pintura (o que originou a criação de “quadrinhos murais”).
Em todo esse processo, a Oficina afirmou-se em sua comunidade e
desenvolveu-se com ela.
É possível que alguns não dêem valor à experiência da Oficina de
Quadrinhos. Para um comerciante, por exemplo, uma revista como PI/O-
LA, com umatiragem de 500 exemplares mimeografados, é uma revisti-
nha. Uma pessoa alheia às tarefas populares considerará pouco menos que
absurdo um grupo que se empenha em fazer histórias em quadrinhos “num
ambiente como a Villa El Salvador, sem recursos materiais e, ainda mais,
histórias em quadrinhos com uma mensagem que faça pensar”. Certamen-
te, à margem das inadequadas avaliações a que leva um raciocínio simplis-
ta, é inegável que a Oficina de Quadrinhos, com suas revistas mimeografa-
dase suas seqiiências pictóricas murais, com seus ativos mas poucosinte-
grantes, com seus escassíssimos recursos econômicos, não é, nem de lon-
ge, a resposta proporcional que exige um lugar como Villa El Salvador (na
atualidade, com cerca de 280.000 habitantes). Tudoisso os integrantes da
Oficina sabem muito bem. E sabem mais: a revista é feita a mimeógrafo,
com infra-estrutura limitada, sim, masinfra-estrutura justa e própria, como
próprios são os atos que acontecem relacionados com este fato. São pró-
prios também o caminho que se escolhe, o trabalho e a realidade em que
ele acontece. Em termos qualitativos, a batalha está sendo vencida; em ter-
mos quantitativos, ainda não. Mas está-se lutando. Com base no trabalho
de seus membros, a Oficina de Quadrinhos é um fato real, integrada ao Cen-
tro de Comunicação Populare, com este, a outras organizações populares.!º

'º Emboracitemos a bibliografia básica que acompanhou a Oficina de Quadrinhos de Villa El


Salvador, queremosressaltar as contribuições de Paulo Freire, Ivan Illich, Augusto Salazar
Bondy, Augusto Boal, Umberto Eco, Ariel Dorfman, Armand Mattelart, Manuel Jafré e, em
especial, de Román Gubem,autores que,através de suas obras,fizeram-se presentes naquela
experiência e, portanto, neste trabalho.

16
Este livro

Este livro foi escrito com basenacitada experiência. Com ele, que-
remos oferecer um texto útil para as pessoas que desejam aprender a fazer
histórias em quadrinhos, bem como para aqueles que estiverem interessa-
dos em promover a educação popular por esse meio.
Nopresente trabalho, parte-se da observação da realidade e não de
esquema algum. Estuda-se em que consiste a linguagem dos quadrinhos,
analisa-se cada um de seus elementos, individual e coletivamente.
Estuda-se uma linguagem e esta nos remete a uma determinada rea-
lidade. Estuda-se o mecanismo da linguagem dos quadrinhos e procura-se
esclarecer como, a partir desse mecanismo, estão já definidas as relações
entre quem produz a história em quadrinhos e quem lê.
Quando quem lê é um leitor passivo, limitado simplesmente a consu-
mir os produtos que lhe são impostos, não é de estranhar que ignore como
funciona o meio através do qual recebe mensagens, os truques que o
emissor utiliza para orientar suas emoções e suas idéias numa direção
final: a defesa do sistema dominante.
Pelo fato de esse leitor passivo ser o leitor típico de uma sociedade
dominante, os editores o chamam “leitor médio”, simplesmente o especta-
dor anônimo,alheio às tarefas de seu tempo, massificado e, por tudo isso,
destituído de si mesmo. É o homem oprimido: só poderálibertar-sea partir
do desenvolvimento de sua consciência e à medida que esta lhe sirva para
atuar em conjunto com outros homens, transformando-se a si mesmo e
transformando seu mundo até instâncias qualitativamente superiores.
É preciso compartilhar o conhecimento para que exista uma relação
de diálogo, verdadeiramente entre iguais, uma relação libertadora. Basea-
dos nessa convicção, fizemoseste livro, focalizando nosso estudo a partir
das próprias formas, para descobrir como age quem nos envia mensagens,
que recursos emprega,e para deduzir que finalidades busca. A análise dos
conteúdos produzir-se-á, então, com maior riqueza e teremos dado passos
fundamentais na formação de nossa consciência crítica.
| CAPÍTULOI
O QUE E A HISTORIA
EM QUADRINHOS

As histórias em quadrinhos são conhecidas, pelo mundo afora, por


diversos nomes. Na Espanha, são chamadas tebeos; na América Latina,
chistes, monitos ou munequitos; nos Estados Unidos, comics; na França,
bandes dessinées; na Itália, fumetti etc.' Em cada caso, trata-se da mesma
coisa: histórias em quadrinhos.
No mundo contemporâneo, as histórias em quadrinhos ocupam uma
parte importante das publicações. Aparecem sob a forma de revistas sema-
nais e quinzenais e também, nos jornais, todos os dias. Os leitores de
quadrinhos, em todo o globo, chegam à casa das centenas de milhões.?
Diante disto, parece ocioso perguntar o que é a história em quadri-
nhos,não fosse o fato de que, todas as vezes que fizermos em público esta
pergunta tão simples, assistimos ao confronto de opiniões, confronto que,
em não poucos casos, tornou-se apaixonada. Por enquanto, evitaremos o
enfrentamento e recordaremos apenas as opiniões mais singelas, aquelas
que, descrevendo nosso objeto de estudo, ajudam-nos a defini-lo.
A história em quadrinhos é um meio de comunicação que atinge a
um número enorme de pessoas.
A história em quadrinhos é muito atraente, pois é feita com desenhos
e isto torna sua leitura muito amena.
Às vezes, as aventuras são contadas com simples desenhos e às
vezes, também, com palavras escritas junto aos desenhos. Isso é a história
em quadrinhos.

! No Brasil, consagraram-se as expressões “histórias em quadrinhos”, “quadrinhos”, “charge” e


“chargista” (no campo específico do quadrinho político), “cartum”e “cartunista”. Mencionam-
se, também, os termos “quadrinizar”, “autor e movimento quadrinhista” e “publicação quadri-
nhística”. Nos países de língua espanhola da América Latina, diz-se também historietas (N.T.).

? No Brasil, somente ostreze principais títulos das duas mais importantes editoras de revista de
histórias em quadrinhos(classificadas comoinfanto-juvenis) somam umatiragem de 2,5 milhões
de exemplares mensais(cf. revista Imprensa, nº 17, p. 73, jan. 1989). A primeira publicação do
gênero, no País, foi a revista O Tico Tico, lançada em 11 de outubro de 1905 (N.T.).

19
Partiremos dessas idéias, que formam o lugar comum das opiniões
que as pessoas têm a respeito dos quadrinhos. Uma definição em termos
mais exatos virá adiante.

20
CAPÍTULO II
OS PERSONAGENS

Examinemos qualquerrevista de histórias em quadrinhos. Nela vere-


mos vários quadrados e, dentro destes, os personagens.! Talvez também
encontremos textos, talvez não.
Os personagens são os sujeitos da ação. Sobre eles, desenrola-se a
história que está sendo contada: são os “mocinhos” ou os “bandidos”. Ou
são indivíduos cujo mundo se assemelha mais ao de um ser humano ver-
dadeiro, com suas diversas habilidades e contradições.
Vamos iniciar nosso trabalho aprendendo a representar os perso-
nagens,isto é, aprendendo a desenhá-los. Para tanto, seguiremos alguns
modelos simples e úteis.?

"Também chamados“bonecos”, no desenho de humor (N.T.).

2 Os modelos que vamosestudar valem para todas as classes de histórias em quadrinhos. Para dar
mais clareza à sua exposição, escolhemos um tipo de desenho muito simples, próprio do
quadrinho humorístico. Obviamente, um desenhoque procure ser mais “fiel à realidade”terá de
atentar para vários problemas dos quais não cuidamos, pois nosso objetivo é outro.
1. CONSTRUÇÃO DA CABEÇA

Construímos a cabeça a partir de um “ovo” ou “zero”.

Sobre essa base, traçaremos uma linha vertical que nos servirá de
eixo. Vamos traçá-la de leve, pois é apenas uma linha auxiliar para o
desenho final.

22
Também de leve, traçaremos uma linha horizontal a um terço do
eixo vertical, contado a partir do topo da cabeça.

Com isso, está pronta a estrutura básica sobre a qual se colocarão os


demais elementos. Vejamos:

O nariz surge junto ao cruzamento das duas linhas.

23
E, à mesma altura da linha horizontal, podemos pôr os olhos.

As orelhas são colocadas nos lados, à mesmaaltura do nariz.


Podem ser feitas como as asas de uma xícara ou como o desenhista
achar melhor.

Deixamos para o fim as sobrancelhas e a boca porque, na caricatura,


a expressão do estado de ânimo que o rosto mostra costuma ser feita
apenas através do movimento de sobrancelhas e boca. Na vida real, a
expressão revela-se de maneira mais sutil: é por isso que, às vezes, perce-
bemos quando uma pessoa está alegre, aborrecida, atenta etc., sem que
ostente demonstrações especiais. Na caricatura, entretanto, os olhos são
reduzidos a um par de pontos, o que faz com que as sobrancelhas sejam
aquilo que define a expressão.

24
2. AS EXPRESSÕES DE ÂNIMO FACIAIS

Expressões básicas

a. À alegria

Quando estamosalegres, tudo parece expandir-se e isto nota-se tam-


bém norosto. As sobrancelhas se arqueiam para cima e a boca vai, como
se diz, “de orelha a orelha”.
b. 4 raiva

Na raiva, ao contrário, tudo parece contrair-se. Em vez de expansão,


há tensão: as sobrancelhas voltam-se para o centro do rosto e a boca se
torce num movimento para baixo, de modo inverso ao que acontece na
alegria.

c. À tristeza

Este estado de ânimoparece mais de desânimo. Tudo parece cair: as


sobrancelhas caem para os lados e à boca, repetindo para baixo o movi-
mento da raiva, parece amolecer.

26
d. A serenidade

A serenidade, o repouso, a calma têm uma predominância de linhas


horizontais. Os movimentos das sobrancelhas e da boca tornam-se menos
pronunciados,até estabilizar-se.

Alegria, raiva, tristeza e serenidade são as quatro expressões básicas.


Assim as denominamos porque a partir delas podemos conseguir outras
expressões.

Trabalho prático

Desenhar várias vezes e em diversas segiiências as expressões bási-


cas.
Para fazer este exercício, convém não consultar os exemplos.
Então, uma das coisas que mais rapidamente se percebe é que, em
alguns casos, a memória falha e se erra a expressão. Ninguém deve
assustar-se com isso, pois o exercício não é de memória. Agora
pode-se ver com clareza: os modelos indicados dãoresultado, mas não
devem ser entendidos comolição a ser aprendida de modo mecânico.
Esses modelos são o resultado de um processo de simplificação
baseado narealidade e esta, como sabemos, não admite receitas. É
por isso que, ao dar o modelo de umaexpressão, descrevemos breve-
mente “o que se sente”, o que motiva a expressão. É por isso que
aquele que está aprendendoà desenhar as expressões faciais tem que
ver e sentir! — o que acontece com o rosto, com os músculos
faciais. Tudo o que foi dito ficará, então. mais compreensível.
Expressões derivadas

Assim chamamos as expressões que resultam das combinações das


expressões básicas.
Dois exemplos:

a. Malícia

As sobrancelhas da raiva e a boca da alegria dão comoresultado uma


alegria maliciosa. Não é a alegria expansiva e saudável, nem a raiva con-
centrada e áspera. É o sorriso do brincalhão, do sádico, de quem se alegra
diante de algo que, para outrem, causa dor.

b. Ingenuidade

As sobrancelhas da tristeza e a boca da alegria dão comoresultado uma


alegria triste. E o sorriso inibido do tímido, de quem se sente envergonhado.

28
Trabalho prático

Combinar as expressões básicas e reconhecer os efeitos.

Descrever em palavras em que consiste a expressão e como contri-


buem paraela as expressões básicas.
Este exercício costuma despertar entusiasmo, pois os resultados que
se vão obtendo são surpreendentes. Percebe-se, então, que existe
“algo mais” que a expressão desenhada, algo que tem a ver com a
maneira de desenhar de cada um. Isso não se corrige, porque é de
cada um e porque tende a enriquecer as expressões. Aqui, não se
deve olhar se há narizes “melhores” que outros, nem bocas “me-
lhores” que outras. Cada qual pode fazer esses traços como achar
melhor: grandes, pequenos, arredondados, espalhadosetc. O que inte-
ressa neste ponto é consolidar nosso aprendizado do desenho de
expressões e a isso devemos dar atenção.

29
Intensidade da expressão

Nosso repertório de expressões amplia-se de acordo com os diversos


graus de intensidade que têm os estados de ânimo. Assim, por exemplo,na
expressão de raiva, do desprazer podemos passar à cólera e da cólera à
fúria; ou, na expressão de alegria, de um mero sorriso podemos passar ao
riso e doriso, à gargalhada.

O que varia é a maior ou menor ênfase dos traços, com o que se


obtêm desde as expressões mais sutis até outras mais evidentes. Estas
últimas fazem com que nossa estrutura inicial se “quebre”: as sobrancelhas
invadem os olhos,o nariz invade a boca etc. O que na verdade não muda
é a direção do movimento que as sobrancelhas e a boca fazem, que conti-
nuam operando na base da expressão.

Trabalho prático

Testar diversos graus de intensidade das expressões básicas e deri-


vadas. Costuma acontecer que as mais evidentes atraem rapidamente
nossa atenção. Consideremos também as mais sutis, que, muitas vezes,
são mais agudas, permitindo-nos penetrar no íntimo do personagem.
É preciso experimentar não só no papel como também com nossos
próprios rostos, como quem faz teatro, e notar como um trejeito da

30
boca, de uma sobrancelha, uma piscadela, uma careta etc., podem
dar um caráter peculiar à expressão.

Sinais gráficos que enfatizam a expressão

As expressões do rosto são resolvidas com base no movimento das


sobrancelhas e da boca. Na história em quadrinhos, porém, também exis-
tem recursos que servem pararealçar as expressões, para dar-lhes determi-
nada precisão. Estes recursos são os chamados sinais gráficos e usam-se
tanto para a expressão de um estado de ânimo como para indicar certas
características das coisas.
Alguns dos sinais usados com fregiiência para as expressões de âni-
mo são os seguintes:

a. Linhas retas que partem do rosto para fora

Estas linhas significam brilho intenso e destacam o sujeito ou objeto


ao qual se aplicam. Por exemplo:

A expressão de alegria converteu-se em “alegria radiante” (vitalida-


de, júbilo, entusiasmo etc.).
b. Linhas “vibratórias” que parecem ser emitidas pelo rosto

Estas linhas significam calor, radiação. Por exemplo:

O personagem não parece apenas aborrecido, mas sua raiva é mais


ativa, quase insuportável.

c. Linhas quebradas, comoraios, que parecem ser emitidas pelo rosto

Estas linhas significam energia, eletricidade. Por exemplo:

A expressão de aborrecimento adquire matizes extremos: o perso-


nagem está “soltando faíscas”.

32
d. Linhas “vibratórias” paralelas aos lados da cabeça

Estas linhas significam arrepios. Por exemplo:

SL NB

A expressão de tristeza transformou-se em medo.

e. Gotas que parecem brotar do rosto

Estas gotas significam suor ou lágrimas, conforme o caso. Por exem-


plo:

A expressão de timidez, com estas gotinhas, alcançou a humilhação;


por sua vez, a expressão de tristeza explodiu no pranto.
Ossinais gráficos mudam de conteúdo conforme a circunstância em
que sãoutilizados e a expressão à qual são aplicados.

Trabalho prático

1. Dê exercício: Combinar diferentes expressões, básicas e derivadas,


com ossinais gráficos aprendidos.
2. De reconhecimento: Examinar histórias em quadrinhos e indicar
os sinais gráficos que acompanham as expressões de ânimo.
3. De enriquecimento: Organizar um código de sinais gráficos apli-
cados às expressões de ânimo com os conteúdos que comunicam.
Estes sinais surgirão da própria leitura de histórias em quadrinhos
que se faça (os que mostramos são apenas os mais conhecidos),
assim como da recordação de leituras anteriores. Se for possível
inventar outros, tudo bem, desde que comuniquem com clareza
aquilo que se quer dar a entender.
Estes três passos — exercício, reconhecimento e enriquecimento —
podem ser aplicados, agora, a título de revisão, a tudo que foi
aprendido até aqui.
3. MOVIMENTO DA CABEÇA

Até agora estudamos as expressões de uma cabeçavista de frente e à


altura de nossos olhos. Vamos estudar essa cabeça a partir de outros pon-
tos de vista.

Movimentoslaterais da cabeça

Para virar a cabeça para um lado, temos que deslocar a linha eixo
vertical (*). Com ela, é lógico, vão os demais traços.

35
Trabalho prático

1. Desenhar uma por uma as posições aprendidas. Depois, como


resumo, deve-se desenhar as diversas posições da cabeça enquanto
esta vai girando lentamente até voltar à posição em que se iniciou
o exercício. =
2. Reconhecer, na leitura de histórias em quadrinhos, as diversas
posições laterais da cabeça.

36
A cabeça conforme o ângulo de visão

Estudaremos agora a cabeça a partir de umaaltura diferente daquela


dos nossos olhos. Esta lição está relacionada com o “ângulo de visão”, que
entenderemos melhor quando examinarmosos planos.
Enquanto ao virar a cabeça para os lados era determinante a posição
da linha-eixo vertical, para vê-la de cima para baixo o determinante é a
linha horizontal (**). Não a entenderemos, porém, como linha reta, mas
como uma oval ou umacircunferência,” pois a cabeça — emboraa esteja-
mos estudando sem nos preocuparmos com seu volume — não é uma
superfície plana.

(ud)

Quando se olham os objetos por cima ou por baixo, a parte que se


destaca mais é a que está próxima a nós. Assim, a parte do alto será a mais
destacada da cabeça vista de cima. Poresta razão, as outras proporções se
alteram.

é) 1 1) Ga

* Circunferência é a linha fechada plana cujos pontos são equidistantes de um outro ponto situado
no mesmoplano, chamadodecentro da circunferência. Círculoé a figura plana contida nointerior
de umacircunferência (N.T.).

37
E, vista por baixo, ocorre o inverso, destacando-se as diversas partes
de baixo para cima.

1 [ *)

Su Ge +)
RR Vi *)

Trabalho prático

1. Trabalhar, por cima e por baixo, diversas posições da cabeça (de


frente, de perfil, de três quartos etc.) e, a cada vez, combinar as
expressões.
2. Como já se tem um maior domínio dos movimentos da cabeça,
bem como das expressões faciais, imaginar situações em que a
reação de ânimo de um personagem é realçada. Imaginar primeiro
e desenhar depois. Assim, não se parte das expressões, mas das
situações em que ocorrem.

38
Também podem-se introduzir outros personagens que tenham rela-
ção com o primeiro (a relação pode ser explicada na situação ima-
ginada). Aqui, o que interessa é o trabalho de expressões e do mo-
vimento da cabeça.
4. BREVE AVENTURA PELOS CAMINHOS
DO DESENHO NATURALISTA

Tínhamos falado sobre um desenho “mais fiel à realidade” e sugeri-


mos que todos deviam realizar pelo menos uma sessão prática. Vamos
estudar, então, alguns princípios para o trabalho com este tipo de desenho,
no que se refere a volume, luz e sombra, bem comoà figura humana.

Volume, luz e sombra

O pintor francês Paul Cézanne afirmava, no fim do século passado,


que, na natureza, “tudo é conforme o cubo, o cilindro e a esfera”. Ouseja,
na natureza, todos os corpos se resolvem com base nestes sólidos geo-
métricos.

E se observarmos detidamente os objetos que nos rodeiam ou a pai-


sagem em volta, comprovaremos que Cézannetinha razão ao formular seu
enunciado: “na natureza, tudo é conforme o cubo, o cilindro e a esfera”.
“Na natureza...”, obviamente, é um modo de dizer. Alude à capaci-
dade do homem para abstrair o essencial das formas que aparecem a seus

40
olhos, essa necessidade de estruturar, de relacionar tudo aquilo com que
entra em contato.
Vemosas coisas atentando para a forma de seu volume. Este surge
diante de nosso olhar conforme se dão luzes e sombras, e conforme rela-
cionamos umas com as outras.
Para estudar como ocorrem as luzes e as sombras nos objetos, o
exercício mais elementar é escolher um sólido geométrico e colocá-lo na
frente de um foco de luz. É evidente que a face que o sólido apresenta ao
foco será a mais iluminada, assim comoa face oposta será a que menos luz
recebe. O interessante é aquilo que acontece entre as duas faces. Se a
superfície do objeto é curva, apreciaremosde forma gradual a passagem da
luz à sombra.

Um procedimento recomendável para o desenho destes estudos é que


a diferenciação entre os planos de luz e sombra se faça de início tenue-
mente, para depois, pouco a pouco,ir sendo reforçada até chegar à sombra
maisintensa.
Como o objeto não existe isolado no espaço, devemos valorizar
também os tons relativos à superfície sobre a qual repousa e a seu espaço
circundante.
Opcionalmente, os interessados podem tornar mais complexo este
exercício elementar com novos objetos que tenham diversos planos, bem
como acrescentando outros focos de luz.
Um foco de luz único ou duplo funcionam bem quando estamos
trabalhando num ambiente interior. Fora deste espaço, os problemas deluz

41
são diferentes. É o que podemos constatar num ambiente exterior, à luz do
dia: lá, a luz invade quase tudo.

Trabalho prático

1. Estudar vários objetos e notar como até os que oferecem mais di-
ficuldades podem ser simplificados se os reduzirmos ao sólido
geométrico que define sua estrutura e sobre o qual trabalharemos
os detalhes.

2. Estudar como se apresentam as luzes e as sombras em um sólido


geométrico colocado diante de um foco de luz. (Podem servir-nos
comosólidos geométricos: uma caixa, uma lata de leite, uma bola
etc. O foco de luz pode vir da própria luz do dia através de uma
porta ou janela, algumas vezes entreabertas.)

Os interessados podem aprofundar seus estudos introduzindo novos


objetos e focos de luz.

A figura humana, realidade e proporções

Em termosdo estudo de volumes, o corpo humano é apenas mais um


objeto. Continua valendo, portanto, o quefoi dito sobre sólidos geométri-
cos e sobre luz e sombra.
Para o estudo do corpo humano, também é importante respeitar suas
proporções. Tomando como medida a altura de uma cabeça, alguns trata-
dos afirmam que a estatura de um homem adulto considerado normal é
igual a oito cabeças. Em geral, essa proporção é adequada. Não obstante,
essa proporção pode variar sem que, com isso, se perca a “normalidade”,
pois, como sabemos, o gênero humano apresenta diversas características,
segundo as condições em que se reproduziu.
O mais interessante, em todo caso, será reportarmo-nos à realidade,
para constatar quantas cabeças de altura têm as pessoas que nos cercam.

a,
MI
1
g Dj f NA
Um modo simples de fazer a medida é com o braço estendido e com
os dedos polegar e indicador. Com o punho fechado, o indicador será o
“cursor”, fixando-se a uma altura do polegar em que coincida com a cabe-
ça (ver ilustração).

43
Depois, essa medida fixa de nosso polegar nos servirá para estabele-
cer divisões imaginárias no corpo. Assim, saberemos quantas cabeças de
altura tem cada pessoa e à altura de qual divisão situam-se as diferentes
partes do corpo humano.
Quanto à cabeça, podemosdizer que tem “três partes iguais”, em que
se localizam a testa, o nariz e o queixo. Estudemos isso na realidade.

Trabalho prático

1. Copiar uma cabeça ao natural. Obedecer às proporções, bem como


à relação de luzes e sombras.
2. Realizar estudos de proporções tomando como modelos pessoas
que se disponham a posar. Não importa que os detalhes não
fiquem bem desenhados: o que importa é aprender o sentido das
proporções na estrutura do corpo humano.
5. CONSTRUÇÃO DO CORPO

Aprendemosa estudar os objetos e os corpos tal comose apresentam


a nossos olhos. Voltamos agora ao desenho simples da história em qua-
drinhos caricatural, em que apenas respeitamos a norma ou proporção de
que nossos quadrinhos precisam.

O plano

O “traçado” ou “esqueleto” é a estrutura que serve de base para as


figuras que fazemos.
Lembram-se como as crianças representam as figuras humanas?

A
Nosso “traçado” apenas melhora o desenho infantil: deixamos espa-
ço para os ombrose os quadris.

0 EBa 45
Esse “traçado” é a base de nossa figura e, portanto, dele depende o
movimento que esta vai ter, independentemente de que o desenho seja
naturalista ou caricatural.
Sobre a base do “traçado”, podemos preencher o corpo com ovais e
circunferências que lhe darão consistência.
Convém que traçemos todasessas partes primeiro a lápis para depois
terminá-las a tinta. Ao passara tinta, não seguiremos fielmente a linha a
lápis, mas esta nos servirá de referência; do contrário, as circunferências e
ovais darão um aspecto demasiado rígido à figura.

46
Trabalho prático

1. A partir do “traçado”, testar diferentes proporções em homens,


mulheres, crianças, velhos etc.
2. Recordar pessoas reais e desenhá-las. Não interessa tanto retratá-
las, mas obedecer às proporções de suas figuras. Aqui será visto
como, em muitos casos, as funções que um homem desempenha
guardam uma relação com suas proporções e atitudes corporais
(desse modo, por exemplo, um camponês, um funcionário público,
uma dona de quitanda etc.).

Oy Mogno A
A RR
A
RR,

47
Movimento do corpo

Este tema é eminentemente prático. Poressa razão, vamosnos prepa-


rar para esta prática revendo, de início, o “traçado” e descrevendo suas
partes.
O “traçado” conta com um eixo principal(*) que corresponde à coluna
vertebral. Esse eixo desempenha uma função chave no equilíbrio do corpo.
Conta também com duaslinhas transversais em relação ao eixo prin-
cipal: a superior(**) corresponde aos ombrose inferior (***) corresponde
aos quadris.
Dos ombros e dos quadris pendem as extremidades superiores (bra-
ços) e inferiores (pernas), sendo que estas normalmente servem de base
para toda a estrutura.

m— dpdg

Assinalemos agora, no “traçado”, os pontos que servem de base aos


movimentos do corpo humano mais evidentes a nossos olhos. Nesses pontos,
existem articulações.

* Chama-se articulação a qualquer união entre ossos adjacentes, independentemente de que


permitam ou não o movimento.Asarticulações que aqui nos interessam são as que permitem o
movimento.

48
A estabilidade das articulações depende, em primeiro lugar, da ati-
vidade dos músculos próximos. São os músculos que fixam as articulações
e que tornam possível o movimento. Dos moluscos ao homem, este tecido
— músculo — dota os animais da capacidade de mover-se.º
Salientamos que a estabilidade das articulações depende da atividade
muscular para fazer notar que os músculos continuam seu trabalho até
mesmo quando estamos parados.
Trata-se de um estado de semicontração ou tônus muscular. Sem
este, nenhum músculo manter-se-ia no lugar. Já imaginaram, por exemplo,
o que aconteceria com os músculos do rosto se perdessem o tônus?
Ficaríamos de cara caída! Podemos ver um pouco disso nos anciãos, nos
quais os músculos, por cansaço,já não têm o tônus da juventude.
Entender a função do tônus muscular nos servirá, mais tarde, para
compreender melhora relação entre o movimento e os estados de ânimo.

Existem dois tipos de movimentos:


O movimento angular ou articulação “em dobradiça” ocorre quando
há flexões (o ângulo diminui) ou extensões (o ângulo aumenta).

É * Flexões
º Extensões

* Existem três classes de músculos: o liso ou involuntário,o cardíacoe o voluntário, estriado ou


esquelético, que é o que nosinteressa para entender o movimento. Os músculos voluntários
constituem 40% do peso do corpo.

49
O movimento de rotação é aquele que se realiza em tomo de seu
próprio eixo.

Trabalhoprático

1. Para aprender a desenhar um corpo em movimento, nada melhor


que experimentar com o próprio corpo antes de pegar no lápis.
Começar com os movimentos das articulações nas extremidades,
pois são mais simples de observar. !r, pela ordem, testando todos os
movimentos possíveis de angulação (flexões e extensões), bem como
de rotação, de cada articulação. A ordem será a seguinte:
a. Ombro.
b. Cotovelo.
c. Punho.
d. Movimentos combinados das articulações do braço.
e. Quadris.
f. Joelho.
g. Tomozelo.
h. Movimentos combinados das articulações da perna.
i. Coluna vertebral.º
j. Movimentos combinados das articulações das extremidades e da
coluna (inclusive os movimentos do pescoço), nas posturas habi-
tuais que o corpo humano adota.

* A coluna vertebral é composta portrinta e três pequenos ossos chamados vértebras, o que
significa outras tantas articulações. Comoestas articulações funcionam em conjunto, quase
sempre descrevem movimentos curvos.

50
Aorealizar esses movimentos, veremos que alguns não podem acon-
tecer sem que, ao mesmo tempo, ocorram outros. Assim, por exem-
plo, se levantarmos uma perna além de uma certa altura, a coluna
vertebral também realizará um movimento. Esse movimento da coluna
ocorre para manter o equilíbrio.

51
Este exercício, de fácil comprovação, leva-nos a uma conclusão
simples: o corpo é uma estrutura e o movimento de uma de suas
partes implica o trabalho de outras, compensando-se, assim, o movi-
mento inicial e mantendo-se o equilíbrio da estrutura. Isso acontece
sempre, mesmo quando o movimento de outras partes é menos evi-
dente à primeira vista.
É necessário insistir no trabalho com os dez pontos assinalados:
desenhando a partir do traçado para evitar complicações. E, sobre-
tudo, estudar os movimentos mais comuns que as pessoas fazem e
anotá-los em um caderno de rascunho. Assim, o desenho do corpo
humano em movimento será dominado.
6. A EXPRESSÃO CORPORAL

Há quem diga que o movimento corporal pode reforçar uma expres-


são de ânimo.
Naverdade, o movimento do corpo humano não só reforça a expres-
são como participa dela. A expressão é mais notória no rosto, mas ocorre
em todo o corpo.
Ao estudar o movimento do corpo humano, observamos que o corpo
é uma estrutura e o movimento de uma de suas partes nunca ocorre iso-
ladamente, e sim em relação ao movimento de outras partes. Se nos aprofun-
darmosnessa afirmação, veremos queela abrange não apenas o movimento,
mas toda a atividade do ser humano. Por essa razão, nossos movimentos
têm também algo a ver com nossas emoções e com nossos pensamentos.
Estamosfalando datão falada unidade corpo-mente. Unidade da qual
não podemosalterar uma das partes sem alterar as outras.
Se aceitarmos o que foi dito, compreenderemos por que um estado
de alegria, por exemplo, tem certa expressão, e um estado depressivo, ou-
tra. E essas expressões estão nas formas que adotamos, em nossos gestos e
posturas corporais.” Levaremos em conta estas formas para aprender a
desenhar como se expressam corporalmente nossos personagens.
É evidente que um estado de ânimo não se manifesta apenas nos
movimentos corporais, mas também nos pensamentos. Existem pessoas,
por exemplo, que mudam de opinião segundo seu estado de ânimo: se
estão deprimidas, tudo lhes parecerá uma desgraça e, se estão contentes,
sua visão será das mais otimistas.
Todos esses detalhes, que convêm observar em nós mesmose nos
que nos cercam, enriquecerão as possibilidades de nossos personagens,
pois estes nascerão da própria vida.

Expressões básicas
Vejamos como se manifestam no corpo as quatro expressões básicas,
visando estudar, na prática, outras expressões.

? Aparentemente,cada estado de ânimo tem um determinadotônus muscular, movendo o corpo


em um ou outrosentido, comose verá nas expressões.

53
Alegria

Ao estudar a expressão de alegria no rosto, vimos que tudo parecia


expandir-se. Já notaram o que acontece com nosso corpo quando estamos
alegres? Acentua-se a vitalidade, os movimentos são mais veementes. A
alegria — como qualquer estado de ânimo — tem diversas intensidades às
quais corresponde uma expressão corporal mais ou menosintensa. Assim,
as figuras A e B representam uma alegria mais comum, enquanto que a C
corresponde a uma alegria mais efusiva.

Raiva

Na raiva, a sensação que percorre nosso corpo, ao contrário da ex-


pansão daalegria, é uma tensão que quase chega à contração muscular. Os
ombros encolhem-se, as pernas ficam rígidas ou realizam movimentos
bruscos. As pessoas descrevem muito bem esse estado de ânimo: “a gente
»
nem se agiienta”, “parece que vai estourar”, “dá vontade de rebentar”.

54
Tristeza

Naalegria ou na raiva, embora de formas opostas, ocorre um impul-


so (de expansão ou de concentração). Na tristeza, é como se o impulso se
diluísse, os braços e a cabeça parecem cair, como se estivessem sem for-
ças. As pessoas dizem da tristeza; “a moral lá embaixo”, “estava arrasa-
do”, “o mundocaiu”.

4REISES

Serenidade

A expressão corporal de serenidade, de acordo com a expressão fa-


cial desse estado de ânimo, é de harmonia de movimentos. Acontece quan-
do a atitude é de atenção (por exemplo, numaatividade que requer paciên-
» «
cia ou calma). As pessoas dizem: “está em seu juízo perfeito”, “de cabeça
» «e » « »
fresca”, “sossegado”, “esse estado de “ficar numa boa””.
Trabalho prático

1. De exercício

a. Desenhar como se manifestam as quatro expressões básicas no


rosto e no corpo. Desenhar diversas posições conforme os per-
sonagens.
b. Recordar situações nas quais ocorreram expressões de ânimo.
Identificar o estado de ânimo, descrevê-lo e desenhar comoele
se expressou.
c. Imaginar situações diante das quais surgem osdiversos estados
de ânimo. Por exemplo: uma pessoafoi assaltada, outra perdeu
o emprego, uma outra teve um filho etc. Imaginada a situação,
desenhá-la.
d. Em relação a qualquer dos personagens desenhados anterior-
mente, desenhar outro ou outros que se comuniquem com o
primeiro.

2. De reconhecimento

a. Examinar histórias em quadrinhos e reconhecer as diversas ex-


pressões corporais.
b. Verificar se coincidem as expressões corporais com os perso-
nagens e com a situação em que se encontram. Assim, fica-se
sabendo se uma expressão é ou não adequada para o persona-
gem e a situação.

56
Sinais e expressões
Não vamos repetir o que já foi dito sobre os sinais gráficos que
realçam as expressões. Basta-nos saber que aqueles sinais que vimos nas
expressões faciais servem da mesma forma para as expressões corporais.

O que se vê com maisclareza, no caso das expressões corporais, são


as linhas cinéticas, que são as linhas que servem para indicar o movimen-
to.

* Mais adiante, dedicamos uma seção especial sobreas figuras cinéticas, pois são uma legítima
contribuição das histórias em quadrinhos.

5a
Trabalho prático

1. De execução
a. Desenhar como se manifestam as expressões derivadas no rosto
e no corpo. Considerar suas diversas intensidades.
b. Combinar expressões derivadas com sinais gráficos que re-
alçam a expressão corporal.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e reconhecer as expressões
corporais derivadas e, caso haja, os sinais gráficos que as re-
forçam.
b. Verificar se coincidem as expressões com os personagens e
com a situação em que se encontram. Da mesma forma, verifi-
car se o uso dos sinais gráficos é adequado.

58
7. PSICOLOGIA DO PERSONAGEM

Duas propostas

Quase todos os livros que ensinam a fazer histórias em quadrinhos


têm um capítulo dedicado à tipologia. Nele, falam do “tipo intelectual”, do
“tipo atlético” etc., e dão os traços característicos de cada um, bem como
suas equivalências com os “mocinhos”, os “bandidos” etc., instruindo o
aprendiz de cartunista a repetir esses traços, de modo que — asseguram —
não ocorram equívocos na elaboração dos personagens.
Estas recomendações,feitas de maneira simples e natural, induzem a
se retornar um antigo vício: partir de esquemas e não da própria realidade.
O “convite” para repetir padrões pré-estabelecidos leva a uma atitude
impositiva (ainda mais palpável quando tais padrões são alheios a nosso
ambiente) e nega, portanto, o exercício da capacidade criadora e crítica do
autor de histórias em quadrinhos.
Nossa proposta é exatamente ao contrário: toma como base a própria
existência de quem vai fazer quadrinhos, pede-lhe que parta da própria
realidade e volte a ela, como recurso de constante aprendizado.

O tipo e a história do personagem

Umavez, pelo menos, já ouviram dizer que alguém é do “tipo in-


telectual”. É provável que esse alguém seja magro e de testa alta, de gestos
rápidos e medianamente comunicativo.
Diz-se do “tipo emotivo” que é bem mais gordo, de gestos harmonio-
sos, alegre e conversador.
Do “tipo motor” diz-se que é maciço, quase anguloso, muito inquieto
e imaginativo.
Também se diz que, na verdade, estes tipos não se apresentam puros,
mas como aspectos predominantes.
O que há de certo nisso tudo? Já vimos que o ser humano funciona
de acordo com sua estrutura. Não é de surpreender, portanto, que descu-
bramos uma correspondência entre as formas físicas de um indivíduo e

59
suas atitudes, sua maneira de enfrentar diversos problemas. Basta observar
a nós mesmose as pessoas que conhecemos.

Parece que cada indivíduo traz esta correspondência desde o nasci-


mento, com uma tendência para desenvolver certas disposições mais do
que outras.
As tendências inatas de uma pessoa não determinam, é claro, sua
formadeser. São, simplesmente, tendências que podem ser concretizadas,
modificadas ou frustradas conforme as experiências que a pessoa tenha
em sua vida.
Poresta razão, o “tipo” de uma pessoa nos servirá apenas como dado
referencial. Levaremos mais em consideração a vida desta pessoa: as expe-
riências que a marcaram de um determinado modo,as situações que agora
vive e seus projetos para o futuro.
Tudo isso nos prepara para construir de maneira mais completa,
nossos personagens, mesmo quando forem inventados. De um personagem,
interessam-nosseus traços, gestos, modos, costumes, idéias, sentimentos, a
situação concreta em que se encontra.”
Algo que nos interessará em especial é a reação dosleitores diante de
nossos personagens, se existe ou não uma relação de contradição entre

* Dizermos que nos interessarão tais ou quais aspectos do personagem não significa que
tenderemos à reprodução minuciosa da realidade, pois isso poderia nos levar a extremos
absurdos. Se observamos todos esses aspectos é para assinalar a importância de que nossos
personagens possuam coerência, que cada ação ou pensamento seja reconhecido comopróprio
ou possível dele (mesmo quandose trate de contradições). Isso vale para todotipo de história em
quadrinhos, tanto as mais naturalistas comoas caricaturais.

60
estes e aqueles, e em que se baseia essa relação. Assistir a esse encontro
permitir-nos-á tirar várias conclusões em relação ao personagem,ao leitor
e a nós mesmos. Isso tudo será tão ou mais valioso que os conselhos que
recebamosa respeito.
As considerações feitas até aqui indicam o trabalho com uma classe
de personagens: os personagens psicológicos, aqueles que se assemelham
aos homensreais, com a riqueza e complexidade que isso pressupõe. Exis-
tem ainda os personagens arquetípicos, que permitem outro tipo de histó-
rias em quadrinhos (que é, além de tudo, o mais antigo e difundido).
Os personagens arquetípicos correspondem melhor a um símbolo, a
um modelo bastante simplificado que funciona como um molde:o “herói”,
o “bandido”, a “mulher fatal”, o “cientista descuidado” etc. O modelo,
neste caso, determina de antemão as características que o personagem vai
apresentar. Assim, por exemplo, o “herói” costumater feições agradáveis,
ser esbelto, inteligente, generoso e valente, enquanto que a “mulherfatal”
tem uma beleza fria, é elegante, calculista e, frequentemente, malvada
(como se vê, este procedimento é muito diferente de estudar a vida real).
Em todo caso, uma consideração será válida: observar que ações e que
diálogos cabem ao personagem, para não perder a coerência.

Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar um personagem (real ou imaginário) em várias
posições. O desenho, mais próximo do estilo caricatural ou do
naturalista, é inteiramente opcional. Observar os traços do
personagem, bem comoseus gestos, modos e costumes. Caso
necessário, para reforçar uma atitude, pode-se acrescentar um
texto que exprima suas idéias e/ou sentimentos.
b. Desenhar um personagem que se relacione com o anterior. A
relação é livre: pode ser de proximidade, de afinidade ou de
oposição. Aqui, além de observar os traços e hábitos do per-
sonagem, é preciso concentrar o interesse na relação existente
com o personagem anterior e na situação em que o rela-
cionamento tem lugar. Os textos são opcionais.
c. Um exercício interessante, caso se esteja trabalhando em grupo,
é estabelecer a relação de nosso personagem com aqueles cri-
ados pelas outras pessoas. Surge então a possibilidade de uma
dinâmica maior de respostas e situações imprevistas.

61
2. De reconhecimento
a. Observar, na leitura de histórias em quadrinhos, se os person-
agens têm coerência (o que pensam, sentem e fazem e em que
situações transcorre sua ação).
b. Ver se os personagensdessas histórias têm relação ou não com
a realidade em que vivemos. A relação não se estabelece ape-
nas pela semelhança de aparências externas, mas, princi-
palmente, pelas situações em que ocorre a ação, pelo conjunto
de relações existentes e pela maneira de responder a tais
situações.

62
8. AS PROPORÇÕES DA IMAGINAÇÃO

Formas antigas e formas novas

Estudamos as expressões e o movimento da cabeça com base num


“ovo” ou “zero”, forma que lembra uma cabeça verdadeira. De igual modo,
ao estudar o corpo, mesmo quando simplificamos, fizemo-lo a partir de
formas que lembram um corpo real.
Escolhemos essas formas porque, por sua simplicidade, prestam-se
ao estudo inicial.
Na história, sobretudo nos “quadrinhos de humor”, podem-se traba-
lhar os personagens a partir de diversas formas. Não obstante, seja qual for
a base, continuarão funcionando os princípios que indicamos para as
expressões e os movimentos. Examinemosas histórias em quadrinhos que
tenhamos à mão e comprovaremostal fato.
Após o reconhecimento, podemos chegar a uma conclusão: antes de
qualquer esquema, o que interessa na verdade são os princípios para as
expressões e o movimento.Isso foi bem compreendido pelos criadores dos
quadrinhos contemporâneos, quando se lançaram em busca de novas for-
mas, deixando de lado os velhos esquemas.

“GummerStreet”. porPhil Krohn.


QUEM ESTA DANDO?
ESTOU E" QUERENDO!

te e a dp VA O =EsM ge ear]

“Eek & Meek”, PM Howie Schneider.

63
“57
“AC” (Antes de Cristo), por Johnny Hart.

64
E por que os autores dos modernos quadrinhos procuram novas for-
mas? Sem dúvida, não pelo desejo de serem diferentes. Necessitam de
novas formas para expressar novos conteúdos. O que querem comunicar é
impossível de ser comunicado através de esquemas convencionais (e aqui
já não nos referimos ao desenho de personagens, masao de toda a história
em quadrinhos).
É interessante saber o que está ocorrendo com os quadrinhos con-
temporâneos. Eles avançaram, libertando-se dos esquemas iniciais. Suas
conquistas nos ajudam a compreender que o importante é que o desenho se
ajuste aos objetivos. Atentemos, portanto, ao que queremos dizer e ao
modo de dizê-lo.

Rabiscos e manchas

Vamosrealizar umas brincadeiras para “soltar a mão” (e a imagina-


ção) que servirão para complementar, em sentido oposto, nossos estudos
do natural.
Isto é puro exercício.

a. Fazer um rabisco qualquer, sem dar-lhe nenhum significado.


É necessário fazer o rabisco antes de saber o que vai acontecer depois.
Agora, desse rabisco, fazer surgir uma cabeça com sua respectiva ex-
pressão. Procurar fazê-lo com o menor número possível de linhasacres-
centadas ao rabisco.
b. Fazer um rabisco qualquer. Depois, virar o papel de cabeça para baixo
e do rabisco criar um corpo, com sua respectiva expressão (com o
mínimo possível de acréscimos, é claro).
c. Fazer um rabisco qualquer. Imaginar como aproveitá-lo para obter um
personagem. Depois, desenhar, não o personagem imaginado e sim
outro diferente (pode-se girar o papel até encontrar a forma que pareça
mais interessante).

Perceberam o objetivo desse exercício? É tirar proveito do imprevis-


to, aprendera improvisar. Por isso, cada exercício é uma armadilha para aqui-
lo que o senso comum poderia antever. Se fizermoso trabalho em conjunto
com outras pessoas, poderemos, por exemplo, trocar rabiscos a serem
trabalhados ou relacionar uns com os outros, atribuir-lhes pensamento etc.
Outro tanto podemos fazer com manchas, melhor ainda se não têm
de fazer nada como exercício.
NATUREZA
DA LINGUAGEM DOS QUADRINHOS:
TINTA SOBRE PAPEL

Façamos uma pausa em nosso aprendizado. E vamos aproveitá-la


para avaliar nosso progresso e observar o que ainda temos pela frente.
Reflitamos sobre tudo isso.
Trabalhamos com nossos próprios rostos e corpos para depois dese-
nhar expressões e movimentos. Com base nessa experiência simples, assi-
milamos melhor a relação entre dois “mundos”: o da realidade (nossos
gestos, nossos movimentos) e o da simplificação dessa realidade (nossos
desenhos).
O assunto está claro: uma coisa é o gesto que fazemos e outra é o
desenho que fazemos desse gesto. Fazemos o gesto no rosto, movendo os
músculos faciais. Fazemos o desenho, com um lápis, sobre o papel. A
mudança de condições torna-se determinante: o gesto é um movimento
real, leva um certo tempo; o desenho não repete o movimento do gesto,
mas representa, de maneira estática, um momento daquele movimento. E
não é só isso: o gesto ocorre no rosto, uma figura tridimensional; o dese-
nho acontece em uma superfície plana, bidimensional.
Esse reconhecimento do óbvio não é em vão: prepara-nos para com-
preender melhor a natureza das histórias em quadrinhos.
Se tivermos como ponto de vista sua base estritamente material, a
história em quadrinhos é tinta sobre papel. Esta base estabelece umasérie
de limitações em relação à realidade: esta é dinâmica, o quadrinho é está-
tico; por fim, os sentidos auditivo, olfativo e gustativo, que têm na reali-
dade o que considerar, não participam da história em quadrinhos, pois esta
não emite sons, cheiros e sabores.
De maneira precisa, diante de suas limitações para reproduzir “fiel-
mente” a realidade, a história em quadrinhos cria e desenvolve seus pró-
prios recursos. E estes recursos constituem sua própria linguagem. As-
sim, por exemplo, frente à falta de movimentos, utiliza uma convenção
gráfica (as figuras cinéticas) que dá a entender o tipo, a intensidade e a
direção do movimento; frente à falta de sons, usa a linguagem escrita, à
qual confere especiais expressões mediante o desenho, dando a entender o
tipo, intensidade, procedência ou o alcance do som etc. (ver as ilustra-
ções).
Não é difícil entender o que estamos explicando, assim como não é
difícil ler e entender as histórias em quadrinhos. Não obstante, a leitura
dessashistórias pressupõe um ato complexo de abstração e de síntese por
parte do leitor. A leitura de uma linguagem que evoca movimentos, sons e

67
outros aspectos, partindo de base materiais diferentes daquelas destesatri-
butos, não pode ser uma leitura simples. Parece simples por que, desde
criança, acostumamo-nos a ler histórias em quadrinhos. Aquilo que, num
primeiro momento, pôde ser descoberta e aprendizagem, converteu-se com
a prática, em formas que integramos a nós mesmos.

SRS
a ESP
LS ss
CL

“O homemde Richmond”, por Mantelli e Ernesto Garcia.

* Quandonão nosfoi possível averiguar quemé o autor dahistória em quadrinhos, citamos a


empresa editora.

68
CAPÍTULO III
A VINHETA
E A SEQUÊNCIA

Todos os dias, em nossavida cotidiana, narramos uma série de fatos.


A linguagem que mais empregamos é a das palavras e também a dos
gestos. No caso da história em quadrinhos, a narrativa se dá por meio das
vinhetas.
A vinheta é a representação, através da imagem, de um espaço e de
um tempo da ação narrada. Podemos dizer que a vinheta é a unidade
mínima de significação da história em quadrinhos."

MAS NESSE
INSTANTE

“Gringo”, por M. Medina e Carlos Giménez.

* Alguns definem a vinheta como “cada quadro dahistória em quadrinhos”, incorrendo em um


erro: observa-se um formatoda vinheta — que, na verdade, é muito variável — e descuida-se do
que a vinheta significa na história. Na seção seguinte trataremos dos formatosda vinheta.

69
“Conjunçãode ases”, por Roger King e Néstor Olivera.

70
Quando duas ou mais vinhetas se articulam para significar uma
ação, dizemos que ali existe uma segiiência.

ara E Ter Wai

ro
.

“Opiloto fantasma” (Marvel Comics Group).

As vinhetas se entrelaçam para narrar uma ação, mas não a seguem


fielmente, porém dão-lhe alguns momentos significativos, eliminando re-
dundâncias e períodos sem significação. Baseado nessas vinhetas que re-
presentam momentos descontínuos, o leitor reconstitui a unidade da narra-
tiva.

7
Isto é muito importante: a história em quadrinhos carece de movi-
mento, mas o sugere. É leitor que lhe dá movimento e continuidade, em
sua imaginação.
Agora podemos definir a história em quadrinhos em termos mais
exatos: é uma estrutura narrativa formada pela segiiência progressiva de
vinhetas.

“Planeta”, porJan.
“O eternauta”, por H. Oesterheld e A. Breccia.

73
Trabalho prático

1. De exercício
a. Fazer uma segiiência composta porduas,três e até quatro vinhe-
tas. Este exercício não inclui textos, ou seja, a segiiência deve
ser organizada exclusivamente com base em imagens. O tema
é livre.
b. Se o trabalho for em grupo, deverá ser escolhida umasituação
para todos. A partir dessa situação, cada um fará uma seqiiência
composta por duas, três e até quatro vinhetas. Opcionalmente,
podem-se incluir textos.?
c. Uma prática interessante é fazer sequências com trabalho em
grupo, isto é, juntar várias pessoas para a produção de uma
única sequência, de maneira que se somem as contribuições e
aptidões de cada um.? ,

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhose assinalar as sequências.
Como umasó história em quadrinhos pode compreender várias
ações, observar-se-á queas sequências variam de extensão, sendo
a mínima de duas vinhetas e a máxima sem limite determinado.
b. Selecionar um certo número de sequências e tentar eliminar al-
gumas vinhetas. Comprovar-se-á que existem vinhetas cujo
significado torna-se imprescindível para a segiiência, de ma-
neira que, se forem eliminadas, altera-se o sentido da ação
narrada ou um determinado aspecto da mesma. Também há
segiiências nas quais algumas vinhetas podem ser eliminadas
sem que o sentido da ação sofra mudanças importantes.
c. Ainda com as segiiências selecionadas, tentar modificar a or-
dem em que se sucedem as vinhetas. Chegar-se-á, então, a
diversas conclusões: 1) a segiiência perde todo o sentido; 2) o
sentido original da segiiência se reforça; 3) a sequência adquire
um sentido diferente do que originalmente tinha. Em qualquer
caso, se for necessário, podem-se agregar vinhetas adicionais.

2:3O fato de que cada integrante do grupo trabalhe a partir de uma única situação para todos —
o que conduzirá depois à visão e crítica conjuntas de todos os trabalhos — é o que nos leva a
recomendar, no primeiro exercício, que o tema sejalivre ou, melhor dizendo, sem nenhum prévio
acordo com os outros membros do grupo. É interessantealternar estesdois tipos de exercícios:
o individual e o coletivo,e integrá-los (comono terceiro exercício). Esta opçãofica aberta para
todas as demais práticas.

74
Comitê de Educação

Esta sequência, queilustra asidéias de uniãoe ordem, seria mais eficaz se a primeira vinheta
tivesse sido posta emterceirolugar.

75
Praticamos com seqiiências e até mesmo as compusemos e decompu-
semos; ou seja, realizamos práticas de montagem.
Alguns imaginam que, como a montagem é a fase final na produção
de uma história em quadrinhos, deve ser ensinada também no final. Não
queremosser tão rígidos assim. Introduzimos, a partir deste capítulo, ligei-
ras práticas de montagem, para dar maior dinamismo à nossa aprendiza-
gem.
A história em quadrinhos, sem dúvida, é uma estrutura narrativa
complexa. Sua fase final, a montagem, será observada com toda essa
complexidade. Chegaremos também à montagem. Mas não vamos esperar
até o fim para acabar de descobrir a estrutura. Preferimospartir de um es-
quema simples daquela estrutura. Integraremos, passo a passo, a complexi-
dade que outros elementos lhe dão.

VINHETA VINHETA VINHETA VINHETA VINHETA

u 4 O s
E n4
SEQUÊNCIA SEQUÊNCIA
N —— 4
MONTAGEM

76
ELEMENTOS DA VINHETA:
1. O ENQUADRAMENTO

Oselementos que definem, compõem e se integram na vinheta são: o


enquadramento (que compreende os personagense os sinais gráficos que
reforçam suas expressões, bem como os cenários em que tem lugar sua
ação), o ângulo de visão, os textos (que compreendem o discurso que em
geral se apresenta em balões e letreiros, bem como as onomatopéias), as
metáforas visuais e as figuras cinéticas, bem como o modo em que todos
estes elementos se relacionam, ou composição.
Já assinalamos que o movimento real dá-se em um tempo, do qual
cada vinheta representa um momento. O movimento real também se dá em
um espaço, do qual cada vinheta representa um fragmento.
A vinheta perfila o espaço real, enquadrando-o em largura e altura.
Esta limitação bidimensional do espaço real denomina-se enquadramento.
O enquadramento da realidade preenche uma necessidade da repre-
sentação. Como também o fazem a pintura, a fotografia e o cinema.
O enquadramento, ao participar da realidade, seleciona uma parte
desta. Logicamente, o autor de histórias em quadrinhos escolherá os en-
quadramentos que mais convenham à sua narrativa.
Podemos distinguir diferentes tipos de enquadramento, segundo a
atenção que dermos ao espaço que representam (“planos”) ou para o espa-
ço que ocupam no papel (“formatos”).

Os planos

Conforme o espaço que representam, os enquadramentos denomi-


nam-se planos, que também se diferenciam segundo sua referência ao
corpo humano *

* A palavra “plano”, como outras que se usam para designar elementos da linguagem dos
quadrinhos, foi tomada da terminologia cinematográfica. A utilização convencional destes
termos tem a ver com várias coincidências que existem entre estas duas linguagens de nosso
tempo: o cinemae a história em quadrinhos.

71
Plano geral

É o enquadramento suficientemente amplo parasituar a figura huma-


na completa em seu interior.

ÉÍ PELA RUA PRINCIPAL DESTA CIDADE SEM LE) NEI ORDEM, QUE VEMOS CHEGAR UM CAVALEIRO SOLITÁRIO DISTANTE DE SEU LAR...

“Lucky Luke”. por Morris e Goscinny.

O plano geral permite referências ao ambiente em que transcorre a


ação. Uma paisagem (rural ou urbana), um estádio de futebol etc., serão
captados pelo plano geral.
Quando o plano geral tem uma grande profundidade de campo e não
é possível divisar a figura humana, o enquadramento denomina-se plano
geral à distância ou grande plano geral.

Onde deixou a nave do tempo,


Egon?
Escondida na

“Flash Gordon”, por DanBarry.

78
Plano total

Deve seu nome ao fato de que dimensões do espaço que representa


estão próximas da figura humana completa.

sta noite, quan-


do ouvires meu
assobio, Aquarda-
rei no jardim e
iremos para a
greja.

“Quem matou Dom Rodrigo?”, por R. O'Neile A. del Castillo.

Como podemos ver, à medida em que passamos de um plano para


outro, não apenas varia o espaço representado como também variam os
valores expressivos que são próprios de cada plano.
No plano médio, a referência ao ambiente é menor, mas, em troca,
podemos apreciar, de modo mais preciso, a ação ou movimento da figura
em toda sua extensão,

79
Plano americano

Recorta o espaço naaltura dos joelhos da figura humana.

GASo
«NEM ELE NEM ELA VOLTA -
RÃO A SER OS MESMOS.

“Rip Kirby”, por Alex Raymond. “O Homem-aranha”, por G. Conwaye R. Andru.

80
O plano americano também tem sido chamado de plano de conversa-
ção, dado que, quando batemos papo com alguém, estando atentos a seu
rosto, os limites de nossa percepção visual parecem diluir-se naaltura dos
joelhos.
'

Pluno médio

Limita o espaço à altura da cintura da figura humana.

E duvido muito que volte.


Duvido muito.

Jeff Cobb” . por Pete Hoffman

81
Aqui tem duas outrês pepitas...
masisso não é nada! Para trazer
as pepitas que existem em mi-
nha mina, só com carretas...!

“Kendall”, porJerry McKinlaye Arturodel Castillo.

No plano médio, podemos apreciar com mais clareza os traços e a


expressão do personagem, que começa a se impor à atenção do leitor.
O plano médio é o mais utilizado na televisão (telejornais, repor-
tagens etc.), no cinema e nos anúncios publicitários dos jornais.

Primeiro plano

Limita o espaço à altura dos ombros da figura humana.

«MUITO SUSPEITO,
ENTENDE? I
1
!
i
i

|
4
. A

“Ben Bolt”, por John Cullen Murphy.

82
“O Espírito”, por Will Eisner.

No primeiro plano, o espaço foi delimitado e só resta ao leitor prestar


atenção à expressão do personagem. Dessa maneira, o primeiro plano nos
aproxima da intimidade do personagem, de seu estado afetivo, de suas
dúvidas etc.

Plano de detalhe

Também chamado primeiríssimo plano. Limita o espaço em torno de


umaparte da figura humana ou de um objeto em particular.

“Ben Bolt”, por John Cullen Murphy.


De repente, tropeça num
fio e...

“Jeff Cobb”, por Pete Hoffman.

O plano de detalhe serve para nos aproximar de uma parte do corpo


ou de um objeto que, de outro modo, quase passaria despercebido.

pufis lo est

84
Quando damosas referências correspondentes a cada plano, não es-
tamos falando em termos de exatidão, mas sim de aproximação. Não se
podem fixar, de maneira rigorosa,os limites para estabelecer onde termina
um plano e começa outro. Seria uma tarefa inútil. O importante é saber
como funcionam os planos e quais são suas possibilidades expressivas. À
medida que avançarmos em nossa aprendizagem, comprovaremos que estas,
em cada plano, também têm a ver com o conjunto da narrativa em que
estão traçados, com todaa estrutura.

Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar os diversos planos em vinhetas isoladas, a fim de re-
conhecê-los por meio da prática.
b. Fazer uma segiiência composta por duas, três ou até quatro vi-
nhetas, atentando para o uso dos planos segundo a ação nar-
rada.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e assinalar os diversos pla-
nos.
b. Além do reconhecimento dos diversos planos, atentar para sua
função na seqiiência da qual fazem parte. Trata-se de observar
a qualidade do uso do plano: se é simplesmente correto ou
excelente, ou está errado etc. Caso se encontre um plano cuja
função seja considerada equivocada ou insuficiente para a ação
narrada, especificar qual seria o mais adequado.

Além dos exercícios indicados, convém que prestemos atenção ao


uso dos planos no cinema, na televisão, nos cartazes publicitários
etc. E importante estudar como são utilizados esses planos para a
comunicação de diferentes conteúdos. Este reconhecimento “a frio”
é essencial, porque nos coloca na posição de quem elaborou aquelas
mensagens, escolhendo determinadas formas para causar impacto
sobre o público. Darmo-nos conta de como atuam essas formas para
comunicar seus conteúdos é um primeiro passo para formarmos nossa
consciência crítica. Também é conveniente anotarmos, em nosso
caderno de rascunhos, os exemplos que nos pareçam mais interessan-
tes, para depois mostrá-los a outras pessoas.

* Esta indicação — que iremos recordar em outro momento — vale para todosos elementos que
compõem a vinheta. Sendo esta uma célula de uma estrutura maior (a história em quadrinhos),
é lógico que seus elementos guardem umacerta relação com aquela estrutura.

85
Os formatos
Denomina-se formato a configuração que o enquadramento apre-
senta no papel.
Em geral, os limites do enquadramento estão assinalados por uma
linha demarcatória. Nesse caso, o formato pode ser retangular (de predo-
minância horizontal ou vertical), quadrado, circular etc.

/
O ME ENTRARA BOCA,
NE POR QUE NAS
ORELHAS?

“Lembre-se!” , por J.C. Morhain e SolunoLopez

86
A escolha de umformato depende do espaço e do tempoque se quer
representar. Assim, por exemplo, um plano de detalhe (que porsi repre-
senta pouco espaço na realidade) mostrado em uma vinheta de pequenas
dimensõessignifica um tempo muito breve de narrativa (e de leitura). Ao
contrário, um plano geral, numa vinheta de grandes dimensões, significa
um tempo maiorda narrativa e induz a uma leitura mais demorada.
E interessante observar essa relação entre os espaços e tempos
representados e os espaços e tempos reais que são exigidos para serem
mostradose lidos. A consciência dessa relação levou à criação da chamada
vinheta-flash (vinheta-relâmpago), que é aquela de pequenas dimensões
que serve para esclarecer um momento importante da ação e que se costu-
ma inserir no interior de umavinheta maior.
O gatilho & apertado...

“O Cobra”. por Ray Collins e M. À. Repetto.

87
Quanto à linha que marca os limites do enquadramento, trata-se uni-
camente de uma convenção que parece obedecer à necessidade de ordenar
a narrativa, estabelecendo a diferença entre uma vinheta e outra. Essa
exigência de ordenamento, entretanto, pode ser satisfeita alterando-se a
linha demarcatória ou até mesmo sem sua presença.

Anônimo (Revista Jarano, nº 6).

88
A linha demarcatória pode ser modificada ou eliminada porque care-
ce de significado por si mesma. Pode adquirir significado, porém, se for
delineada de maneira inusitada.
Assim, por exemplo, a linha demarcatória delineada com pequenos
traços ou com pequenas semicircunferências significa que o conteúdo da
vinheta não tem existência na “realidade” da história narrada: já a teve
(quando se trata de uma lembrança) ou ainda vai tê-la (quando se trata de
uma projeção no futuro). Em outros casos, significa apenas que a ação
narrada nessa vinheta teve lugar na imaginação do personagem (divaga-
ções, sonhos etc.)

“Nossosrobôs, que nos serviam, lutaram! Res -- que destrulram 08 dois


pPor nós durante séculos." pelo robós
tornaram-se tão

“Mandrake”, por Lee Falk.

MRE A Te Neem

[os Zan
TINOS! EU SABIA TUDO COMEÇOU DOIS DIAS ANTES COM O
:
QUE ERA UMA ENCONTRO DO NAUFRAGO
ARMADILHAOLAF

PEA ORDA BILAMTINA,


ARRASSOU O POVO DA ILHA
DO “VIN- IQUITIAS,A LESTE DECRETA,
DEX: Cao POSM EA “FUGI PARA O MAR,
REBÁTIZADO Aq NÃO Ti
BARCA

“Osvikings”, por Alfredo J. Grassi e Alberto Salinas.

89
Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar diversos formatos de vinhetas a fim de reconhecer
suas possibilidades na própria prática.
b. Fazer uma segiiência atentando para o uso dos formatos,
segundo a ação narrada.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e assinalar os diversos for-
matos.
b. Além do reconhecimento dos diversos formatos, atentar para
sua função na segiiência da qual fazem parte. Trata-se de ob-
servar a qualidade do uso do formato. Caso se encontre um
formato cuja função seja considerada inadequada para a ação
narrada, especificar qual seria o mais apropriado.

90
2. O ÂNGULO DE VISÃO
Outro dos fatores que definem a expressão do conteúdo da vinheta é
o ângulo de visão.
O ângulo de visão é o ponto a partir do qual a ação é observada.
Existem três tipos de ângulo de visão: médio, superior e inferior.

Ângulo de visão médio

A ação é observada como se ocorresse à altura dos olhos.

“O Cobra”, por RayCollins e M. A. Repetto.

“Os supermachos”, por Rius.

91
Ângulo de visão superior

A ação é enfocada de cima para baixo.


É nl h À QUE FOr EXPULSA DE SOUTH BEND EA MULHER
QUE ODIANA, AJUDARAM O ANTIGO MEDICO A OLHAR
DE FRENTE PARA OQ 60L...

“Black Soldier”, por Clarence Stampe


Ernesto R. Garcia.

* dai
DE : B

aa E q E
(ga 1 | “O Homem-aranha”,
im PR mn por Gerry Conwaye Ross Andru.

92
Ângulo de visão inferior

A ação é focalizada de baixo para cima.

(Mas... perdi um de vista...) (Lá está Tim! Ficarei atirando)


ÕÓ para distrair Kendall

“Ernie Pike”, por H. G. Oesterheld e Solano López.

Assim como nos casos dos planos, a escolha de um determinado


ângulo de visão não é um fato aleatório. Esta opção tampouco obedece ao
simples desejo de tornar o relato mais ameno (embora seja este um dos
seus resultados). O uso de um ângulo de visão produz efeitos expressivos
determinados.
As possibilidades expressivas dos ângulos de visão não funcionam
de maneira mecânica. Entre outras, são possibilidades cuja ação depende
do contexto em que estão incluídas: o tema e o momento da ação que está
sendo narrada, a relação psicológica ou estética que articula as vinhetas etc.
Dessa forma,o ângulo superior, que em um caso pode servir para minimizar

“A balada do mar salgado”, por HugoPratt. Plano geral e ângulo de visão médio para
contemplar a relação dos personagensentre si e com o ambiente. Meio plano e primeiro
plano com mudanças no ângulo de visão;vê-se “Crânio” por debaixo e “Pandora” por
cima (como se vêem um aooutro e permitindo aoleitor pôr-se no lugardeles, entrando na
própria ação).
Amabilidade e candura são mostradas nãosó pela “atuação” dos personagens(expressões
e qualidade do desenho), como tambémpelo adequadousodosplanos e ângulos devisão

94
um personagem, em outro pode ser utilizado para apenas obter-se um
maior predomínio da ação; o ângulo de visão inferior, em vez de fazer com
que um personagem pareça majestoso, pode dar-lhe umaaparênciaridícula.
Por todas estas observações, faz-se necessário que a função de um
ângulo de visão não seja encarada de modo isolado, mas como parte da
estrutura em seu todo.
A várias milhas da ... rodando por uma deserta:
cidade... estrada de subúrbio... É noite. A tragédia
espreita...

“JeffCobb”, porPete Hoffman. O ângulodevisão é complementadode maneira precisa


pelotexto informativo daação.

TENHAM PACIÊNCIA
- NOS ALGUMAS
PAGINAS E VAMOS
EXPLICAR-LHES...

— COMEPARIA À
PENSAR QUE ROBBIE
ME TROUXE À
A CÁ
BRINCADEIRAS

“O Homem-aranha”, por Gerry Conwaye Ross Andru. História em quadrinhosquefaz


da mudança do ângulode visão uma constante, marcando umritmo vertiginosoe, às
vezes, quase desengonçado(coerente comotipode narrativa).
Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar os diversos ângulos de visão em vinhetas separadas,
a fim de reconhecê-los mediantea prática. Fazê-lo várias vezes,
experimentando diferentes inclinações em cada ângulo.
b. Fazer uma segiiência composta por duas, três ou quatro vinhetas,
atentando para o uso dos ângulos de visão, segundo a ação
narrada.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e assinalar os diferentes
ângulos de visão.
b. Além do reconhecimento dosdiferentes ângulos de visão, aten-
tar para sua função na segiiência da qual fazem parte. Observar
a qualidade do uso do ângulo de visão. Caso se encontre um
ângulo de visão cuja função seja considerada equivocada e
insuficiente, especificar qual seria o mais adequado.

Da mesma forma, além desses exercícios, prestaremos atenção ao


uso dos ângulos de visão no cinema,na televisão, na publicidade etc.
Convém anotar, em um bloco de rascunhos, os exemplos que nos
pareçam mais interessantes, para depois comentá-los em grupo.

96
3. OS TEXTOS

A história em quadrinhos vale-se da linguagem escrita para represen-


tar o som (isto é, todas as sensações que são percebidas por intermédio do
ouvido).
Daíresulta que, na história em quadrinhos, conjugam-se dois meios
de expressão distintos: o desenho e a escrita. Ambos influenciam-se mu-
tuamente, chegando, em muitos casos, a interessantes níveis de integração.
Nos quadrinhos, a linguagem escrita serve para comunicar os diálogos
e pensamentos dos personagens (em geral inseridos nos balões),.o discurso
do narrador ou “voz externa” (geralmente nosletreiros) e as onomatopéias.

O balão
O balão é uma convenção própria da história em quadrinhos que serve
para integrarà vinheta odiscurso ou o pensamento dos personagens.

A VERDADE TODA A VERDADE NADA MAIS


QUE A VERDADE? BEM...HIC! VOU CONTAR

“Loco Sexton”, por Héctor Oesterheld e Arturodel Castillo.

* Para conseguir essa integração, o balão abriga em seuinterior a linguagem escrita e/ou o
desenho.

97
Semtítulo, por Caloi.

Breve referência histórica

Os antecedentes históricos do balão remontam à filactera ou faixa


que se incluía em algumas pinturas de artistas cristãos e que servia para
escrever em seu interior o texto atribuído ao personagem representado.

CrÊCASIR aperta

Cras te rea ma mo

“A Primeira Nova Crônica e Bom Governo”, por


Felipe Guamán Poma de Ayala (obra realizada
entre 1587 e 1615).

98
A passagem da filactera da pintura ao balão dos quadrinhos, eviden-
temente, não foi direta. Os passos intermediários e necessários foram dados
pelas gravuras populares que apareceram após a invenção da imprensa, e
pelos trabalhos dos desenhistas satíricos ingleses (desde o século XVII) e
norte-americanos (desde o século XVIII).
Tão interessante quanto seguir a linha evolutiva que levou à concep-
ção do balão é constatar a necessidade de “fazer falar” os personagens
representados, que está presente em diversas culturas. Situamo-nos no
princípio do fenômeno:a filactera, ou a forma que lhe seja equivalente em
outra cultura, interessa-nos também,por si mesma, como forma quesignifica
voz, ar expirado, som que sai da boca ao homem.

A presença de signos verbais em duas culturas pré-colombianas:a asteca e a mochica.

99
A presença de filacteras em um desenho inglês do
século XVII.

Com base nessas referências, organizaremos nosso estudo sobre o


balão atentando para a forma que apresenta e para o que significa, bem
comopara sua localização no interior da vinheta.
O balão: forma e significado

O balão consta de um corpo ou forma delimitada em que estão


contidos o texto do diálogo ou os pensamentos do personagem, além de
um rabicho que indica o personagem que exprime esse conteúdo.

BALÃO

4— RaBicHo

100
A expressão do que está sendo falado ou pensado é feita através da
linguagem escrita da imagem.
Ouseja, o balão é composto por dois elementos: o continente (corpo
e rabicho) e o conteúdo (linguagem escrita ou imagem). A silhueta resul-
tante do corpo mais o rabicho não é apenas continente, mas significa, em
si mesma, voz ou som, quando se refere ao discurso falado; ou significa
algo ainda mais abstrato, a mente, quando se refere ao pensamento.
Quandosignifica fala ou ruído, é, na maioria dos casos, uma fala ou
um ruído “neutro”. Quer dizer, só significa fala ou ruído. Vejamos o
seguinte exemplo:

CUIDADO COM
OS TRUQUES, HEIN?

CUIDADO COM
OS TRUQUES, HEIN?

101
CUIDADO COM
OS TRUQUES, HEIN?

Nessas três vinhetas, a silhueta dos balões alterou-se sem que isto
tenha modificado, de modo algum, a qualidade do conteúdo. Nos três
casos os balões são “neutros”.
Entretanto, a história em quadrinhos conta com certas maneiras de
delinear que possuem significados precisos e afetam qualquer elemento da
vinheta a que forem aplicados (entre estes, o balão).” Então, a fala e o som
perdem sua neutralidade e ganham outro caráter. O modo de delinear
substitui o modo de pronunciar. Vejamos.
O balão cuja silhueta foi delineada com linhas quebradas, parecidas
com os dentes de um serrote, significa uma particular vibração da voz.
Serve para exprimirgritos, estalidos, irritação, bem como para indicar que
a voz provém de algum aparelho elétrico (um alto-falante, um rádio, um
telefone etc.)

“Umplanodiabólico”, por Beth Abe


e Oswal.

7 É possível que essas maneiras de delinear tenham origem nossinais gráficos aplicados às
expressões, que estudamos nocapítulo dos personagens.

102
PETER!
PETER!oue
ACONTECEU?

SANTO DEUS, S
a
er ZM /

” DB gr. /

“O Homem-aranha”, por Gerry Conwaye Ross Andru.

O balão delineado com tracinhos, silhueta de linha intermitente, sig-


nifica pouca intensidade no volume da voz. Serve para expressar segredos,
confidências etc.
PATMIR...“

E A voz ERA UM SUSSURRO


“Henga” ,por Diego Navarroe Juan
Zanotto.

103
(NÃO O CASTIGAM PORQUE”
à sEU PAi É Rico. Vou Con-
* TAR PARA MAMÃE, «e
1

“Paco Yunque”, por Juan Acevedo.

O balão delineado com umalinha tremida significa vacilação na voz.


Será apropriado, portanto, para expressar medo, falta de vigoretc.

“Watami”, por H. G. Oesterheld e


Moliterni.

104
“Branca de Nevee osanõesfatídicos”, por
Steve Skeats e E. Maroto.

O balão cuja ponta do rabicho não aparece, masfica oculta, significa


que o emissor da voz não aparece na vinheta. O ponto em que é interrom-
pido indica o lugar de onde provém fala.

“Ben Bolt”, por d. Cullen Murphy

105
... PARA APEDREJA-LA COMO NA BÍBLIA...
ENTÃO, SUA LÍNGUA IRA PARA ONDE NÃO
POSSA SER OUVIDA...!

“Black Soldier”, por Clarence Stamp e E. Garcia.

O balão cuja ponta do rabicho não aparece mas se une a outro balão
significa que este outro balão pertence ao mesmo personagem e é pronun-
ciado em um momento posterior. Este “rabicho-ponte” indica, então, “pausa
intermediária”.

PARA O QUE O
TIO SAM DIGA!

“Exterminador Um” , porBill Dubay


e Paul Neary.

106
ANIQUILASTE UMA TRIBO

'A? TEMPO QUE OS


SACOS ALUISLEVA.
RAM NOSSOS BRAVOS
PARA A PRIGÃO. QUEM

paNeAS8Ee
MATOU AS Es
BRANI

“O ataúde do morto vivo”, por B.


Lewis e J. Ostiz.

Em outros casos, o “tempo duplo” é mostrado pela união de dois


balões em alguma parte de seus corpos. E, em certos casos, simplesmente
por balões diferentes correspondentes a um mesmo personagem.

A
dO
SU Y
Sa VBAud

“Sinfonia paraflauta”, por Claire Bretecher.

107
O balão com vários rabichossignifica que a voz provém de diversos
emissores ao mesmo tempo.

LIA / ; TUDO O QUE


FP
ES i EEnEO geE
pASvERSoo
SENHOR [açá

VV |
== o Efe
LAR DD mid
“Ojulgamento de Salomão”. por John Lenti.

Alguns desenhistas preferem deixar de lado o corpo do balão e usam


apenas o rabicho para indicar quem emite a fala. Este uso do rabicho
pressupõe que aquele que o aplica possui um amplo domínio da composi-
ção da vinheta. Observemos no exemplo que os textos aparecem pru-
dentemente distanciados.

“Corto Maltês”, por Hugo Pratt.

108
Por vezes, a silhueta do balão deixa de ser uma simples linha, para
ser desenhada com mais cuidado. É quando o balão assemelha-se a um
pedaço de gelo se derretendo (para significar a “frieza” com que o texto é
pronunciado) ou a uma chama ardente (para significar uma voz apai-
xonada).*
O balão cujo rabicho é formado por pequenos círculos, como bolhas,
significa que o texto não foi pronunciado, mas é apenas um pensamento.
Às vezes, essas bolhas chegam ao corpo do balão, parecendotirar peso da
fala, fazendo-a “flutuar”.

QUE REBU-
LIÇO QUE ESTES CRIMI-
NOSOS ME FIZERAM ONTEM/
SOU UM HOMEM HON-
RADO E NÃO MEREÇO
ESSE TRATAMENTO...
NEM SER CHAMADO...
DE COVARDE
POR WALTER!

ENTÃO, VOU DESERDA-LOS. DEIXAM-ME


APODRECER NESTA HABITAÇÃO IMUN-
DAODEIO TUDO O QUE POSSA ANDAR,
FALAR E VIVER...MAS ACIMA
DE TUDO, ODEIO
A ELES,

“Apenas uma besta” (Marvel Comics “Magiainfernal”, por


Group). Dough Moenche R. Corben.

* Podemosdizer, então, que a linha deixou de ser um sinal abstrato e transpôsa fronteira da
metáfora visual.

109
As letras:tipo e significado

Com o conteúdo do balão ocorre algo semelhante: em geral, o tipo


mais usado de letra é a chamada “letra de imprensa”, cuja expressão tem
um resultado “neutro”. Os seguintes são alguns dos modelos para sua
escrita:
1. O primeiro passo consiste em traçar linhas horizontais para
marcar o tamanho das letras. Estas linhas são uma simples
referência para evitar a desordem da escrita e a consegiiente
dificuldade na leitura (portanto, deverão ser apagadas depois
de escrito o texto). Devemos levar em conta os espaços entre
as letras e entre as palavras.

COMO
—CHEGUEI
MASO
2. Após definir a distribuição do texto, passa-se a delinear a
silhueta do balão. Esta ordem, primeiro o texto e depois o
balão,é recomendável paraevitar o resultado freqiiente quando
se procede de maneira inversa: o texto fica sobrando.

A “letra de imprensa” é a mais usada. Mas há situações em que não


basta para exprimir determinados efeitos expressivos. É quando entra em
ação o desenho: o modo de delinear afeta a mensagem dos textos. Veja-
mos alguns exemplos.

HO
A letra de tamanho maiorque o usual costumasignificar um volume
mais alto que o da voz normal. Se a este traço acrescentarmos uma linha
tremida, será o ideal para a expressão de um brado, um grito de pavor.

“Hor”, por Diego Navarro e Juan Zanotto

A letra de tamanho maior que o usual e sem nenhum tremorserve


para expressar uma atitude resoluta, decidida, vigorosa.

QUI! TAMBORES!
TAMBORES !TAM-
ceoABnco
NOS MATAR?TAM-
DANCA,
UM MILHÃO DE
BORES RUGEM NA Dem Rea
MINHA CABEÇA RAS
HA!

“Terry e os piratas”, por Milton Caniff.

mi
“Watami”, por H. Oesterheld eJ.
Moliterni.

A letra de tamanho menor que o usual significa um volume mais


baixo que o da voz normal. E utilizada para expressar umaatitude tímida
e/ou confidencial.

“Mafalda”, por Quino.

112
A letra que descreve um ritmo visual, geralmente ondulado, significa
que o texto é4 cantado”. Costuma ser complementada com algumas notas
musicais.

“Mafalda”, por Quino.

A letra “à mão”, por seu caráter corriqueiro, destaca a psicologia pe-


culiar do personagem.

HOJE MESMO ATARDE


COMPRO UM POSTAL
MANDOPARA ELA

aqui
Querida
404 jraLas....
i

“Mafalda”, por Quino.

“Mafalda”, por Quino.

113
A letra “à mão” põe em evidência a riqueza de possibilidades expres-
sivas da letra desenhada diante das carências da tipografia simples. Além
disso, a letra desenhadadeixa de ser simples letra e integra-se graficamen-
te à vinheta: imagem palavra escrita formam uma unidade. Essa integra-
ção ocorre em diferentes graus, desde a letra de tipografia que é incluída
de modo discreto no balão até a letra desenhada que, em dado instante,
liberta-se do balão e invade o espaço.

OS SOLDADOS COMEÇAM A ARRA- À


SAR A ALDEIA E CHEGAM A CABANA
* ONDE TRATAM DE BETSY WHHOL.

O SOLDADO VAI AMRAR,


MAS A RECONHECE...
Go

“Função no inferno”, por Erno Zorád e Tybor C. Horwath.

14
Localização do balão na vinheta

A posição do balão dentro da vinheta não é (ou não deveria ser) um


fato arbitrário, mas deveser estabelecida de acordo com dois conceitos: o
sentido da leitura e o sentido da composição da vinheta.
Examinemos algumas vinhetas em que haja vários balões. Em que
ordem os lemos?

POR QUE ME
INTERROMPE,
MIKIS?

"O mestre”, por Mino Milani e Aldo di Gennaro.

Er, PACO!odE E OLA!


NOITE DE VERRE-
NA CARA! Sim, CLARO

“A última 'verbena"”, pela equipe Butifarra


(A “verbena” é uma espécie de festa junina. N.T.)

15
Não é difícil estabelecer a ordem de leitura dos balões de uma vi-
nheta: é a mesma ordem de leitura de qualquer texto; ou seja, leitura
horizontal, da esquerda para a direita e seguindo de cima para baixo.

Este modo de percorrer os textos denomina-se linha de indicatividade


e é o resultado da educação que recebemosa respeito: da esquerda para a
direita e de cima para baixo lemoslivros, jornais, cartazes etc.
Em outras culturas, com outros costumes, a maneira de proceder a
leitura é diferente. Assim, por exemplo, os árabes também o fazem em
horizontal, mas da direita para a esquerda,e os japoneses lêem no sentido
vertical, de cima para baixo e da direita para a esquerda.
É necessário levar em conta a linha de indicatividade para posicionar
nossos textos na ordem em que desejamos que sejam lidos.
Além de atentar para o sentido da leitura, para distribuir os balões,
devemos também atentar para o sentido da composição da vinheta. Veja-
mos o seguinte exemplo:

16
Nesta vinheta, temos dois personagens: 4 e B. O diálogo deve ser
iniciado por B, sendo respondido por A. O fato de que B está à direita e na
parte inferior situa-o em posição desfavorável para iniciar o diálogo. O que
faremos?
Umasolução é alongar os rabichos dos balões para indicar quem fala
primeiro.

Como podemos verificar, não é a melhor solução: os balões ficaram


amontoados e os rabichos alongados “de mau jeito”.
Para a colocação dos balões, não devemos esquecer que contamos
com todo o espaço da vinheta e não apenas com a parte superior desta.
Podemos localizar os balões em qualquer parte da vinheta, sempre que —
é lógico — não dificultem a leitura (para o que teremos presente a linha
de indicatividade) nem impeçam que se veja a ação ou a expressão dos
personagens.

117
Uma possibilidade pouco aproveitada é a de cruzar os rabichos. Ela
costuma dar resultados eficazes, embora não convenha abusar desses
“cruzamentos”, pois sua repetição pode incomodar leitura.

Outra solução para o problema proposto é ajustar a própria situação


da qual se origina: modificamos toda a vinheta, de modo que o perso-
nagem queinicia o diálogo não esteja à direita, nem na parte inferior. Para
isso, aplicamos uma troca de eixo, o que equivale a captar a ação a partir
de outro ponto de vista (que seja mais adequado à boa leitura).

Feabt a
118
Também modifica-se a vinheta mudando o plano ou o ângulo de
visão. Isso ocasionará uma nova proporção entre os personagens.

Não esqueçamos, contudo, que a mudança de eixo, a escolha de um


plano ou de um ângulo de visão não são feitas aleatoriamente, mas têm a
ver com a ação que se narra, pois seu uso permite determinados efeitos
expressivos.

Trabalho prático

1. De exercício
a. Treinar, várias vezes, até conseguir dominá-la, a escrita com
“letra de imprensa”.
b. Desenhar situações em que ocorram diversos balões. Fazê-lo
em vinhetas isoladas, para reconhecer os balões pela prática.
c. Desenhar uma vinheta em que os personagens tenham opiniões
diferentes. Seus diúlogos ou pensamentos serão mostradosatra-
vés dos balões apropriados para esses efeitos. Atentar, também,
para a linha de indicatividade.
d. Rever várias seqiiências: em cada uma, experimentar um só
tipo de balão, assim como diferentes posições dos balões na
vinheta. Combinar temas diversificados.
e. Fazer umaseqiiência, atentando para o uso dos diversos balões,
segundo a ação narrada.
f. Desenhar os diversostipos deletra e indicar as expressões a que
dão lugar.
g. Fazer uma segiiência, atentando para o uso das letras desen-
hadas segundo a ação narrada.

2. De reconhecimento
a. Examinarhistórias em quadrinhose indicar os diversos tipos de
balões e de letras. Atentar, além disso, para o funcionamento
da linha de indicatividade.

19
b. Além do reconhecimento dos diversos balõese tipos de letras, atentar
para sua função na seqiiência da qual fazem parte. Caso se encontre
um balão ou tipo deletra que seja considerado impróprio, especificar
qual seria o mais adequado.

120
“A quimera do ouro”, por Tabaré. Neste caso, para osefeitos da piada, as imagens
dentro do balão são mais apropriadas que o texto.

121
DEVO CONCLUIR
«A OPERAÇÃO AN-
TES QUE ELLEN

É POLÍCIA SA:
BERA QUE VEIO
A HONG-KONG a
PARA TIRARILE-/NÃO.
GALMENTE

“Skorpio”, por Oswal.

122
Página de “La Codorniz”, por Pablo. Que texto poderia competir com a “elogiiência”
dografismo de Pablo?

123
SH SFC E =: istmo ENpu CJRRE

(257)
Kokuri densetsu (“A lenda da raposa”), por Tsunoda Jirô. História em quadrinhos
japonesa. Além da ordem diferente de leitura, podemos observar a integração entre
imagem e texto nogrito desesperado do personagemferido. A tradição detexto e imagem
têm muita força na cultura oriental.

124
O letreiro

O letreiro é uma convenção própria da história em quadrinhos que


serve para incluir na vinheta o discurso do narrador ou “voz externa”
(aquela que o locutor emite no rádio, na televisão ou no cinema).

HA MUITOS
MILHÕES DE
,ALGO
QUE VINHA
DAS

“O mestre”, por Mino Milani e Aldo di Gennaro.

“NÃO ERA A Mim QUE AM.


CAVA «LA CONTRA À PAREDE!

E AGORA wu
o EDIFÍCIO
INTEIRO DES-
MORONAVA!

“O Homem-aranha” , por Gerry


Conwaye Ross Andru.
À GATA NÃO ESCUTA... SENTIU O
CHEIRO DE SEU DONO...

“O mestre”, por Mino Milani e Aldo di Gennaro.

O letreiro vem a ser algo assim como o primo pobre e discreto do


balão, que tem nele um antepassado semelhante mas que não obteve o
mesmo sucesso. Contudo, é mantido.
Em geral, o letreiro não chegaa integrar o texto à imagem, limitan-
do-se a agregá-lo por um lado. Sua forma mais comum é a retangular
horizontal, embora possa adotar outros formatos. Com freqiiência, contém
uma fala alheia à própria ação, que diz algo sobre esta, sem que esteja
exatamente inserida nela.
Parece que essa “neutralidade” do letreiro tem sido uma espécie de
desafio para os cartunistas que, desde o princípio, dedicaram-se a violá-la:
incluíram no letreiro a face de quem narrava ou uma ação desenhada,
alteraram ou omitiram o seu contornoetc. Graças a estes esforços, chegou-
se, em muitoscasos, à integração entre imagem e palavra escrita por meio
do letreiro.

126
R RI
por EDGAO pea BURROUGHS'
CE s

Po emaeatANA
SE PARA ATACAR O

SE AMOTI
HOMENOS -DEDOI VARAM
S DE -MURMU:
O CAPITA TANTOS ANOS
O NA LEGIÃO! CONSEG UI LEVA
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ATE QUARTEL LA OS TRANQUEI
AaanneAgpare

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SATAQU Ras

nero,
No rosso pf age
OÉ OeasTÃS
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CARNOT tNÃO EEN. É see
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DEM DUES PO
DERDO AFASTAR 09

MA?GA
ALDa!
IORa!c"Comi M OS
VOU ITALEV LEGSIO:
NáRmiD
feo ERES
MAS
A LO ATÉ
PRETI-
ONDE ESTÃO 08 VÍV
GARAD LUTAR PARA RECUÓERA-LOS!*

“Tarzan”, por Edgar Rice Burroughs e Harold Foster.

127
PNY ADV:
E!
AN RP AER dk
MAR ARS N
1 NoEIN: IR
hANU
E,um motivo E A
FAMANIAA. FÊMEA
NA QUE PRO-
* CRIA A QUE RE-
PRODUZ A E.

AINDA DISTANTE, ROQUESilo


JOGADO NA NOITE DO MONTE
RECUPERA AS FOR S FORÇAS
QUE DESTINA BUSCAiMPDA e
.E ÀS VEZES VIGIA NOSSO SONO, VEL...
QUANDO CHEGA O CANSAÇO...

“O escuro”, porJ. Narvaja e Carlos Roume. Texto e imagemcompletamentam-sepor


meiodosletreiros: nãoreiteram um sentido único, mas ambasaslinguagens referem-se
a uma mesma ação, recorrendocada qual a suas próprias possibilidades.

128
MAS COMO ALGUNS DE
NOS,PETER PARKER TEM
UMA RESERVA EXTRA DE
IA...UMA OBSTINA: [4

“O Homem-aranha” por Gerry Conwaye Ross Andru. Interesse narrativo combasenos


tempos que marcamos letreiros(no último,altera-sea linha demarcatória para acentuar
o “tom” do narrador).

Trabalho prático

1, De exercício
a. Desenhar diversos tipos de letreiros (horizontais, verticais, em
diversas posições etc.), em vinhetas isoladas, para reconhecê-
los pela prática.
b. Fazer uma seqiiência atentando para o uso dos letreiros segundo
a ação narrada. Buscar a complementação entre letreiros e
imagens, evitando a mera repetição.
c. Fazer uma seqiiência atentando para a complementação entre
letreiros e balões, formando uma unidade com a imagem.
d. Fazer uma segiiência procurando integrar graficamente os le-
treiros. Não descuidar do uso do tipo de letra dentro do le-
treiro.

129
2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e reconhecer os diversosle-
treiros.
b. Além do reconhecimento dosletreiros, atentar para sua função
na segiiência da qual fazem parte. Caso se considere errado o
uso de um letreiro, especificar qual seria o mais adequado.

A onomatopéia
Vimosos diversos níveis de integração que textos e imagens chegam
a alcançar na história em quadrinhos, graças ao fato de que os balões e as
letras podem ser desenhadas de diferentes modos. Talvez seja na
onomatopéia que, com mais fregiiência, integram-se a linguagem escrita e
a imagem.
A onomatopéia é a imitação do ruído de algo, através de um vocábu-
lo; assim, por exemplo, “dim-dom” é a onomatopéia de um sino, “rata-
plam” sugere o toque de um tamboretc.

“Rip Kirbv”. por John Prentice.

“O mestre”, por Mino Milani e Aldo di Gennaro.


Navinheta, as onomatopéias podem situar-se no interior do balão ou
independentementedele. Este último é o caso mais comum, pois, na história
em quadrinhos, as onomatopéias nem sempre são pronunciadas pelos per-
sonagens, mas localizam-se exatamente no lugar de onde provém o ruído.
À sua posição, a onomatopéia acrescenta a maneira como é dese-
nhada. Não se trata apenas do fato de que a onomatopéia imita o ruído de
algo, mas de que também sugere graficamente tipo de ruído.
Na onomatopéia, a integração entre linguagem escrita e imagem al-
cança sua maior expressão. É precisamente por isso que os quadrinhos
norte-americanos — que são os mais difundidos do mundo — fizeram
com que se divulgassem onomatopéias próprias do idioma inglês, mesmo
quando traduzidas. É que quase sempre se verte apenas o texto compre-
endido nos balões, sendo, em muitas ocasiões, impossível substituir o
texto que está fora deles (a menos que se redesenhe a vinheta em questão).

“Jeff Cobb”, por Pete Hofjman.

131
“O Homem-aranha”, por G. Conway e R. Andru.

É fácil compreenderque oscartunistas norte-americanos empreguem


onomatopéias peculiares de sua língua. Mais explicável ainda é que os de
outras nacionalidades, com outros idiomas, também utilizem onomato-
péias provenientes do inglês. Esse fenômeno parece obedecer a duas ra-
zões vinculadas entre si: a difusão que os quadrinhos norte-americanos
obtiveram (e com eles suas onomatopéias, pela integração texto-imagem) e
a própria natureza do idioma inglês, cujos substantivos e verbos possuem
grande expressividade sonora. Assim, por exemplo:

VERBO SIGNIFICADO EM ONOMATOPÉIA


EM. PORTUGUES EM
INGLES QUADRINHOS

Toclick Estalar, dar estalidos secos CLICK


To crack Quebrar, rachar CRACK
To crash Espatifar-se nosolo, colidir com estrépito CRASH
To gulp Engolir, tragar GULP
To smack Beijar SMACK
To sniff Cheirar SNIFF
To splash Salpicar de água, patinhar SPLASH

132
Dessa forma, os quadrinhos norte-americanos não só disseminam
seus conteúdos específicos (de acordo com seus interesses específicos)
como também impõem suas formas lingúísticas.”
Sendo a linguagem uma maneira especial de apreender o mundo,
expressão íntima de umacultura e psicologia próprias, interessa compreen-
der estes fenômenos em sua raiz, a fim de agirmos crítica e livremente
diante deles. Podemos observar, então, que não se trata de recusar as
onomatopéias vindas de fora, nem tampouco de repeti-las mecanicamente,
fugindo da mais humilde das tarefas criativas e negando o próprio ser.
Muitos cartunistas compreenderam este problema e se deram ao tra-
balho de utilizar onomatopéias pertencentes a seus idiomas. Dentre os
desenhistas “estrangeiros” (para os norte-americanos) podemos apreciar os
seguintes exemplos:

isto É UM BILHETE
Fast
pus"
QUEGU IÉ ISTO
QUIEQUIE 5702
DE METRB!
ISTO É UM BILHETE
DE METRG!

“Tango”, por L'Avi.

* Ocolonialismo mental que ambosos fatos comportam foi imposto através dos diversos meios
de comunicação de massa (a canção comercial, a televisão, o cinemaetc.).

133
s Zeri óis”, por Ziraldo. De onomatopéia em onomatopéia, o “Capitão América” —
e a a t 4
como outros heróis dos quadrinhos norte-americanos — desgasta-sefazendo ruídos.
Trabalho prático

1. De exercício
a. Fazer umalista das onomatopéias orais mais conhecidas (em
grupo, é mais agradável e frutífero).
b. Lembrar de situações em que se produzem ruídos e tratar de
expressá-los em onomatopéias. Não importa se estas não te-
nham sido escutadas antes: o interessante é o exercício de ex-
pressá-las.
c. Produzir diversos sons com diferentes objetos e materiais e
tratar de expressá-los com onomatopéias (em caso de dúvida,
recorrer a este exercício sempre dá resultado).
d. Desenhar, uma a uma, várias situações em que se produzam
sonse nelas posicionar as onomatopéias. Fazê-lo de modo que
sugiram os ruídos em questão também através do próprio de-
senho.
e. Fazer uma segiiência atentando para o uso das onomatopéias
conforme foram praticadas até aqui.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhose indicar as diversas onoma-
topéias.
b. Além de reconheceras diversas onomatopéias, observar se cor-
respondem ao ruído que é preciso imitar mediante o vocábulo
escrito e sua forma gráfica. Caso pertençam a outro idioma e
se decidir que dão um resultado mais expressivo do que aque-
las que se podem obter em nossa própria língua, integrá-las ao
uso desta.

O conteúdo dos textos

Estudar os textos não significa apenas ocupar-se das formas que


estes adotam para aparecer nos quadrinhos, mas também do conjunto de
idéias que transmitem.
Estas não se comunicam unicamente através dos textos. São passadas
também por meio de cada desenho ou de cada ação mostrada. As idéias,
porém, talvez sejam oferecidas de maneira mais explícita nos textos.
Que tipo de redação utilizaremos em nossos textos? E do quetrata-
rão eles? Em geral, os livros sobre histórias em quadrinhos respondem a
estas perguntas no capítulo referente a “Roteiro e Argumento”. Nele, é
costume aconselhar o uso de uma linguagem clara, de preferência concisa
e que provoque, conforme o momento da narrativa, o suspense ou o im-
pacto. Basta ler algumas histórias em quadrinhossignificativas para com-
provar que nelas domina-se amplamente essa técnica de roteiro. Bem, este
pode ser um conselho aproveitável.
Em todo caso, para os textos e argumentos de nossas histórias em
quadrinhos será preciso ter os olhos postos na realidade.
Os olhos postos na realidade em que vivemos. Esta atitude não des-
carta, de modo algum, os caminhos da imaginação. O que se quer é que
esta surja da consciência da realidade: então, poderemos enxergar mais
além do imediato. Não será mera fuga sem rumo (simples descarga de
tensões ou, no caso mal-intencionado, fuga proposital da realidade), mas
vôo que faça redescobrir a realidade, que retorne a ela para enriquecê-la.
Com a história em quadrinhos tradicional ocorre o inverso. Ela não
parte de uma visão da realidade, mas alude a ela, deformando-a. Tem um
estranho pudor quanto ao sexo e a procriação (não trata deles ou trata-os
de maneira falsa) e recusa-se a abordar alguns temas como o trabalho, a
política, as contradições sociais etc.
A história que propomos, em troca, vai sendo construída sobre o
alicerce de nossa vida cotidiana: interessam-nos a paz e os conflitos, as
tensões sociais e também as tensões individuais, o trabalho, o amor, a
alegria, as decepções. Interessa-nos toda atividade do homem. Porém não
nos interessa porque é assim, sem mais nada, mas pela maneira como
podemos relacioná-la com nossa vida.
Por isso, interessam-nos também as reações dos leitores diante de
nossas obras: integrar seus pontos de vista às histórias em quadrinhos é
convertê-las em um meio que torna possível o relacionamento frutífero
entre autor e leitores.
Linguagem clara e concisa? Sim, por sua eficácia; mas sem que isso
signifique um obstáculo para englobar discursos mais complexos.
Buscar o suspense e o impacto? Há que saber fazê-lo; mas que seja
em um contexto que dê margem à compreensão e não ao melodrama. Os
conselhos, no fim das contas, ganharão validade em sua relação com a
própria vida, de acordo com o que comunicamos, como o fazemos e a
quem nos dirigimos.

136
OS QUADRINHOS: .
UM MEIO DE COMUNICAÇÃODE MASSA

Fizemos um reparo sobre as histórias em quadrinhos tradicionais e


isso nos leva a abrir um novo parêntese, que aproveitaremos para aprofun-
dar nossas reflexões sobre os quadrinhos como meio de comunicação.
Antes, realizamos uma primeira abordagem da natureza da história
em quadrinhos na qual tratamos de sua base estritamente material: tinta
sobre papel. Observamos como, a partir dessa base, que impõe várias
limitações, os quadrinhos desenvolvem sua própria linguagem. Agregue-
mos agora outro conceito: os quadrinhos são um meio de comunicação de
massa.
Este fato condicionou, desde o princípio, as formas e conteúdos da
história em quadrinhos.

A origem dos quadrinhos e a indústria jornalística

Durante o século XIX, na Europa e nos Estados Unidos, os jornais


utilizaram diversos incentivos para atrair um maior número de leitores e
exercer, assim, o controle do mercado: a narrativa detalhada de crimes,
aventuras e outros eventos sensacionalistas deram espaço para o denomi-
nado “jornalismo marrom”. O aumento da circulação exigiu a moderni-
zação dos sistemas de impressão, tiragem e distribuição peculiares da nova
indústria.
O jornalismo norte-americano teve favorecida sua expansão por dois
episódios políticos: a guerra com o México e a Guerra de Secessão, diante
dos quais aperfeiçoaram-se rapidamente os sistemas informativos. Novos
inventos também impulsionaram tal crescimento: os pombos-correio ti-
veram que ceder lugar ao telégrafo, aos cabos submarinos, ao telefone.
Além disso, sustentado pela cada vez maior publicidade comercial, o jor-
nalismo dos EUA converteu-se, no último quarto do século passado, no
mais vivo e ágil do mundo.
Nessa etapa,na décadafinal do século XIX, dois empresários enfren-
taram-se numatitânica luta comercial: Joseph Pulitzer e William Randolph
Hearst. Seu campo de batalhaera o jornalismoe, entre seus objetivos, além
dos negócios, estava a pressão sobre o poder político, econômico e social.

137
Naânsia de tornar mais atraente o seu periódico, o New York World,
Pulitzer publicou, desde 1893, um suplemento dominical com uma página
em cores. Nesta apareceu, em 1895, uma vinheta de autoria do desenhista
Richard Outcault, que descrevia cenas pitorescas dos bairros populares de
Nova York e que tinha como personagem principal um garoto vestido com
um camisolão amarelo. O garoto converteu-se em personagem permanente
do dito suplemento, chegando a ficar conhecido como Yellow Kid (“Ga-
roto Amarelo”). Para fazer com que seus personagens “falassem”, Out-
cault incluía textos em cartazes, paredes, no próprio camisolão do Yellow
Kid, e nessa convenção gráfica que iria afirmando suas características: o
balão, elemento específico da história em quadrinhos.
Em 1896, Hearst conseguiu conquistar Outcault, que passou, com
seu Yellow Kid, para The New York Journal. Pulitzer, então, encarregou o
pintor George Luks de continuar desenhando, com idêntico estilo, o mes-
mo personagem no New York World. O mesmo personagem publicado, ao
mesmo tempo, em dois jornais diferentes, feito por desenhistas diferentes!
Desta maneira, utilizada pelos magnatas da imprensa, acolhida com
entusiasmo por um vasto público,entre regateiose atos de pirataria comer-
cial, começou a história da história em quadrinhos.
Esta breve resenha tem um objetivo: estudara história em quadrinhos
como meio de comunicação de massa que surgiu durante a etapa de expan-
são do capitalismo. Este fato permite compreender os fatores que condi-
cionaram as formas e os conteúdos das histórias em quadrinhos.
Elas precisaram submeter-se ao espaço que lhes prescrevia o jornal:
ao desenhista competia administrar esteticamentetal espaço, de conformi-
dade com as possibilidades técnicas de impressão, além dos ritmos narra-
tivos que pretendia obter.
Se o aspecto de sua feitura tornou-se decisivo para as formas que os
quadrinhos adotaram, o aspecto de sua comercialização o foi para seus
conteúdos.

Primeira metade do século XX: o império dos quadrinhos


norte-americanos

No ano de 1909, Hearst criou o International News Service, a pri-


meira agência especializada em produzir material literário, artístico e de
entretenimento: histórias em quadrinhos, anedotários, palavras cruzadas
etc. Esta agência fornecia com exclusividade para os jornais de Hearst. Em
1915, também sob o domínio de Hearst criou-se uma nova agência do

138
mesmotipo: o King Features Syndicate, que vendia matérias para diversos
periódicos, dentro e fora dos EUA. Em poucos anos, o King Features
Syndicate era o mais importante distribuidor de histórias em quadrinhos.!
Paralelamente ele, existiram outros syndicates menores, todos dis-
tribuindo histórias em quadrinhos por quase todo o mundo. Isso acarretou
duas conseqiiências principais:
1. A padronização dos quadrinhos, com a eliminação dos aspectos que
porventura provocassem recusa em países com outros costumes (era
necessário cuidar da relação com a clientela).
2. A imposição das histórias em quadrinhos norte-americanas sobre as
locais — muitas no nascedouro — de outros países.

DEM, MuNcA
SE SABEhou
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Canna mes
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PALAVRAS,
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x este
você.
DÉUMA
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D0RMAL DE
Amanuh E
VEJA O QUE
MAVTT GANHA
POR Si MESMA.

“Mutt e Jeff”, por Bud Fisher,nascido em 1907(este exemplo é de 1915). O encanto dos
primeiros quadrinhos foi-se debilitando diante da padronização imposta pelo mercado
capitalista, embora alguns autorestalentosos conseguissem queseu gênio sobrevivesse.

' Ashistórias em quadrinhosnasceram nojornale para o jornal. Foi há pouco,na década de 30,
que se libertaram dele e adquiriram a formade revista.

139
Conquistados os novos mercados, o segundo passo era mantê-los:
optou-se por atuar em terreno seguro, fazendo da padronização uma ca-
racterística e da atitude conservadora uma norma. Ingênuas ou dramáticas,
as histórias em quadrinhos sempre respeitaram as instituições e os valores
tradicionais. Como outros meios de comunicação, os quadrinhos norte-
americanos propagaram em outros países as idéias, costumes, expressões
etc. próprias do esquema do american way of life (o estilo de vida capita-
lista ianque, bem entendido).
A maioria dos países receptores, ainda carentes de uma sólida escola
dentro do novo gênero, aceitaram jubilosos os quadrinhos importados. Os
jornais desses países os compravam porque, além de seu baixo custo
(comprar um cartoon de um syndicate saía mais barato que pagar os origi-
nais de um desenhista), o modelo que as histórias em quadrinhos defen-
diam coincidia com os esquemas dos donos dos jornais.
A grande crise do ano de 1929 (seguida do período da Grande De-
pressão) e a II Guerra Mundial foram episódios que abalaram os EUA e,
comoera de se prever, isso se refletiu com mais ou menos evidência em
suas histórias em quadrinhos: durante os anos de crise, os quadrinhos
desenvolveram um sugestivo processo de sinal invertido, chegando-se a
considerar essa fase como a “Época de Ouro dos Quadrinhos”. E durante o
segundo conflito mundial, vários foram os desenhistas que, usando o pa-
pel, combateram ao lado das forças armadas norte-americanas.!!
Em meados deste século surgiram algumas histórias em quadrinhos
que manifestavam uma consciência e uma sensibilidade distintas: “Pogo”
(1948), “Peanuts” (1950; “Minduim” ou “Charlie Brown”, no Brasil), “B.C.”
(1958; “AC”, no Brasil), entre outros, despertam o interesse de um público
mais intelectual. Seu aparecimento não foi casual: no momento em que o
grosso dos quadrinhos norte-americanos alcançava seu fim de ciclo, em
uma minoria deles manifestou-se o espírito de uma nova época. Esta,
entretanto, já não terá por eixo principal os Estados Unidos.
Noque diz respeito aos primeiros cingiienta anos deste século, ative-
mo-nos aos quadrinhos norte-americanos. Noutros países, como a Argenti-
na, a Espanha, a França e a Itália, o gênero também teve excelentes cria-
dores. No mercado internacional, porém, são os syndicates norte-ame-

* Alguns dos casos mais destacados são os seguintes: em 1941, Ham Fisher, em entendimentos
com o Departamento de Guerra, fez de “Joe Palooka” (“Joe Sopapo”, no Brasil) um promotor
da política intervencionista; em 1942, Milton Caniff criou “Male Callpara os jornais do exér-
cito; em 1943, Roy Cranecriou o aviador “Buz Sawyer”etc. Terminadaa guerra, vários desses
personagens continuam em outra: espionam, sabotam,difamam, combatem — enfim — as
causas populares em diversoslugares do planeta.

140
ricanos que mantêm o monopólio: o Super-homem e “seus amigos do
peito” exercem seu domínio até mesmo nas localidades mais afastadas. E
. neste domínio que concentramos nossa atenção.!2

Segunda metade do século XX:


a novahistória em quadrinhos
Na segunda metade do século atual, o panorama começa a mudar
substancialmente. Já podemos sentir uma primeira diferença nos novos
títulos que, procedentes de diversos países, entram em cena no mercado
internacional.
As novas histórias em quadrinhos surgem, concretamente, a partir da
década de 60. Não constituem um movimento único, mas apresentam di-
versas características, segundo seu próprio contexto.
Na Htália, na França e na Espanha, assim como em outros países da
Europa, aparecem Diabolik, Neutron, Valentina, Asterix, Barbarella etc.,
em paraleio com interesse que o gênero desperta em alguns intelectuais.
Nesses anos, editam-se livros e revistas sobre os quadrinhos e organizam-
se grupos para sua análise e crítica.
Também em alguns países da América Latina, como a Argentina, o
Brasil e o México, criam-se novas histórias em quadrinhos. (El Eternauta,
Ernie Pike, Los Supermachos, Los Agachadosetc.) que propõem um maior
nível de participação. Vai ficando para trás a concepção dos quadrinhos
como simples objeto de entretenimento: assumindo esse aspecto, comuni-
cam-se outros elementos.
Nos países socialistas, produzem-se histórias em quadrinhos que
desenvolvem posições ideológicas opostas àquelas difundidas pelas tradi-
cionais. A partir da década de 70, concretizam-se os esforços para a cria-
ção de um movimento de cartunistas com uma nova consciência de seu
papel: como o Grupo P-ELE, que impulsiona a agência Prensa Latina,
onde se abrigam criadores oriundos dos diversos continentes. Uma expe-
riência muito importante foi desenvolvida pela editora chilena Quimantú
(maio de 1971 a setembro de 1973), que reuniu vários desenhistas e espe-
cialistas em ciências da comunicação e produziu histórias em quadrinhos
de cunho autenticamente popular (El manque, Los 5 de la aurora, La
Firme etc.).

* Existem livros dedicadosà história das histórias em quadrinhos. Nosso interesse é, simples-
mente, apresentar os traços principais que permitam compreender o atual panorama dos
quadrinhos.

141
“A garagem hermética”, por Moebius, de 1977.
Durante a década de 70, continuou a pesquisa de
novasformase conteúdos, ao mesmo tempo em que,de
modo concomitante, diversificavam-se os gostos e
interesses do público leitor.

“Valentina”, por Guido Crepax.

142
Nos EUA, assim como em outros países de avançado desenvolvi-
mento industrial, aparecem quadrinhos clandestinos que, aos poucos, vão
afirmando sua presença: são as histórias em quadrinhos undergroud
(“subterrâneas”, ou alternativas), de argumentos e formas agressivas, ex-
pressão e protesto que evidenciam os aspectos desumanizantes da socie-
dade de consumo. Enquanto isso, pelos canais do comércio normal, alas-
tram-se os super-heróis que aposentam os fatigados heróis das décadas
anteriores. Não obstante, depois do boom inicial, o interesse pelas histórias
de super-heróis se debilita: são vencidas pela padronização que o mercado
impõe.
As novas histórias em quadrinhos, na maioria, expressam o espírito
de seu tempo: as tentativas de construir um novo homem, umanova socie-
dade. Também contribui para essa tarefa um novo tipo de quadrinhos
surgido na década de 70: a história em quadrinhos popular. Ela é particu-
larmente interessante porquesignifica uma nova opção, desde seu nível de
infra-estrutura: elaborada em geral por amadores, com intenções em tudo
opostas às do comerciante ou industrial capitalista, busca chegar ao leitor
com uma mensagem libertadora, quer incentivar sua consciência e dar
alento à sua ação no ambiente em que vive. Os cartunistas populares não
se detêm diante das dificuldades que o acesso a uma tecnologia cara pres-
supõe; recorrem ao mimeógrafo, ao duplicador manual, ao gelatinógrafo
etc. É que as tarefas do cartunista popular não esperam: são as tarefas do
lutador social. Por isso, quase sempre, o cartunista popular está vinculado
a uma organização popular. A necessidade de reagir ao sistema opressor
não quer dizer a exclusão da pesquisa formal ou da melhoria das condições
de industrialização e comercialização. Tal necessidade faz com que se
comece já. Progredir significa sempre um processo, neste casoinextricável
do objetivo: contribuir para o desenvolvimento dos movimentos populares.

“Os agachados”, porRius.

143
MEU IRMAOZINHO 6 MUITO
DEPOIS DE MORRER JE E] TRABALHADOR. PRECISA DI-
SUA ESPOSA E Com p ZER PARA ELE SE CUIDAR,SÓ ISSO
TANTOS FILHOS
+.« CARAMBA

ASSIM OS TRÊS CONTERRÂNEOS ESTÃO RECORDANDO


PARENTES E AMIGOS ... OS PROBLEMAS QUE VEEM EM SUA CIDADE
«»» ANSELMO TAMBEM QUER NOTICIAS PARA LEVAR A SUA
GOMUNIDADE, LA SABE-SE MUITO POUCO DO QUE ACONTECE

ENTÃO, GENTE, O QUE SE


PASSA AQUI EM LIMA ?

“Por que... uma nova Constituição”, por Cuyé. Editada por ILLApara osetor
camponês peruano.

144
Quanto à história em quadrinhos tradicional, em que pese a medio-
cridade e a estagnação que caracteriza grande parte dela, continua sendo
lida por um extenso público. Porém, já não detém o monopólio: os novos
quadrinhos disputam-lhe a posição em diferentes lugares do mundo, con-
quistando um setor cada vez mais amplo, que prefere uma obra que dê
elementos para participar ao mero divertimento.
A variedade de histórias em quadrinhos existentes é um sinal do
desenvolvimento que o gênero alcançou. Trata-se de várias linhas, que
podem realizar descobertas, avanços, mas também estacionar e desviar-se.
Vinculada intimamente aos processos sociais, a evolução dos quadrinhos
depende de como os assumam autores e editores e da relação que se
estabeleça com os leitores,relação definitiva, sentido último da história em
quadrinhos.

145
4. AS METÁFORASVISUAIS

Todosos dias, entre nossas expressões usuais, empregamos umasérie


de metáforas. Dizemos, por exemplo, “o dinheiro virou fumaça”, refe-
rindo-nos ao dinheiro gasto com rapidez, “tem um parafuso de menos”,
para indicar uma pessoa confusa ou excêntrica, “custa os olhos da cara”,
de algo cujo preço é muito elevado etc.
Utilizamostanto as metáforas que já não reparamos em seu significa-
do primeiro (ou no que significam em si mesmas), mas diretamente naqui-
lo a que aludem. Assim, entre os exemplos acima, quando se diz “o di-
nheiro virou fumaça”, não se pensa no dinheiro convertendo-se em fumaça
e sim no dinheiro gasto em pouco tempo. Quando, pelo contrário, pensa-
mos nosignificado primeiro, estamos visualizando a metáfora.
Nahistória em quadrinhos, a metáfora visual é uma convenção grá-
fica que expressa o estado psíquico dos personagens mediante imagens de
caráter metafórico. A maioria das metáforas visuais que se usam nos
quadrinhos procedem da linguagem oral, tais como as que podemos exa-
minar nos exemplos a seguir.
Na linguagem oral, “dormir como um tronco” equivale a “dormir
profundamente”. Nos quadrinhos, isso é visualizado por uma tora sendo
serrada (o ressonar).
Na linguagem oral, “ficar com a mente iluminada” equivale a “pen-
sar com clareza” (inspiração, alcance ou correção do pensamento). Nos
quadrinhos,isso é visualizado por uma lâmpada elétrica acesa.

“Pigui” (anônimo).

146
Nalinguagem oral, “a grana saiu voando” equivale a “dinheiro gasto
muito depressa”. Nos quadrinhos, isso é visualizado por uma cédula com
asas.

“Pafúncio e Marocas” por


Bill Kavanagh.

Na linguagem oral (e esta metáfora tem umalongahistória) o “cora-


ção” alude à “emoção” (“jogar com o coração”, “é preciso ter coração”
etc.) e, com mais fregiiência, a um tipo de emoção: o amor (“a dona do
meu coração”, “o coração despedaçado”, “coração de pedra” etc.). Nos
quadrinhos, isso foi visualizado por uma figura semelhante ao “coração”
do naipe de copas.

“Enanio”, por Tom.

Nem todas as metáforas visuais dos quadrinhos provêm da lingua-


gem oral. Algumas procedem da linguagem escrita (como no caso dos

147
pontos de exclamação e interrogação,as reticências etc.) e da escrita musical
(os símbolos das notas musicais).

“Enanio”, por Tom.

A metáfora visual para os “palavrões” tem relação com a metáfora


verbal “cobras e lagartos”, embora na primeira se agreguem aos animais
alguns desenhos de aspecto intrincado (espirais, anteriscosetc.). É interes-
sante examinar esta metáfora porque nos remete à censura, que, sem dúvi-
da, lhe deu origem.
Desde há muito tempo, a censura social vem proibindo diversas
expressões. Diante dela, as pessoas transformaram (e transformam) suas
expressões, para aludir aos mesmos conteúdos. Assim surgiram muitas
metáforas.

148
“O melhorinimigo do cão”, por Alfredo. O signo
gráfico do dólar deu ocasião à metáfora visual
“capital” (dinheiro, negócio etc.).

Em épocas mais recentes, a censura política ensejou o nascimento de


uma nova metáfora visual. Trata-se de um fato que ocorre em diferentes
partes do mundo:as oposições políticas pixam suas palavras de ordem nos
muros da rua e o poderoficial borra-as de tinta. Fica a marca da existência
de oposição, mas seu conteúdo é indecifrável. Alguns cartunistas conver-
teram os borrões em metáfora visual, que integraram a seus quadrinhos
para significar “censurado”.

Semtítulo, por Gayo.

149
Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar as diversas metáforas visuais de que se tenha conhe-
cimento.
b. Recordar metáforas usadas na linguagem oral cotidiana e visu-
alizá-las. Sintetizar a visualização (ou tomar dela o mais signi-
ficativo) e desenhá-la. Submetê-la depois à apreciação de outras
pessoas para verificar sua validade (nem todas as metáforas
são passíveis de conversão bem-sucedida em metáfora visual
de quadrinhos).
c. No mesmosentido do trabalho anterior, examinar os símbolos
da linguagem escrita, dos acontecimentos etc. e experimentar
convertê-los em metáforas visuais.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhos e identificar as metáforas
visuais.
b. Além de reconhecer as metáforas visuais, refletir sobre sua
possível origem (linguagem oral, escrita, musical, acontecimen-
tos etc.). Caso se considere que o uso de alguma metáfora
visual ficou impreciso, especificar qual seria a mais adequada.

( na) NEM Aqui,


a

Semtítulo. por Mihura.

150
5. AS FIGURAS CINÉTICAS

Já conhecemosas figuras cinéticas: trabalhamos com elas ao estudar


a expressão corporal dos personagens. Vimos, então, que servem para
indicar o movimento.
As figuras cinéticas são uma convenção gráfica que expressa a ilu-
são do movimento ou a trajetória dos objetos que se movem. São algo
assim como “pegadas do movimento”.
Existem dois tipos de figuras cinéticas, que podemos batizar de
abstratas e naturalistas.
As figuras cinéticas abstratas indicam o espaço que o corpo em
movimento percorreu.
ATA
QUES DO
"GORILA”,
NÃO HA
CIÊNCIAAPE
NAS FORÇA
BRUTA E
DESPREZO

“Drácula”, porLlobet

151
Asfiguras cinéticas naturalistas descrevem alguns momentossignifi-
cativos do percurso do corpo em seu movimento. Assim, convertem-se em
“átomos de seqiiência” no interior da própria vinheta.
AONDE Va TÃO.

“Mafalda”, por Quino.

Ambosostipos de figuras cinéticas têm a mesma origem: a indica-


ção de um processo físico, o movimento, ao qual referem-se — de certo
modo — sinteticamente (as abstratas) ou analiticamente (as naturalistas).
As “pegadas do movimento” também interessaram a fotógrafos e
pintores, que obtiveram resultados valiosos.

Trabalho prático

1. De exercício
a. Desenhar diferentes corpos em movimento, experimentando os
dois tiposde figuras cinéticas (abstratas e naturalistas), segundo
o efeito que se queira obter.
b. Fazer umaseqiiência atentando para o uso dasfiguras cinéticas.

2. De reconhecimento
a. Examinar histórias em quadrinhose identificar as figuras cinéti-
cas.
b. Além de reconhecer as figuras cinéticas, atentar para a quali-
dade de seu uso. Caso se considere que alguma figura cinética
resultou excessiva, escassa etc., especificar qual seria a mais
adequada.

152
VEJAM! DEI-
XOU CAIR O
PERGAMINHO!Cid)
6. A COMPOSIÇÃO

Lembram-se de quando estudamos a forma dos objetos que nos cer-


cam, a partir do pensamento de Cézanne?

Ele se interessava pela estrutura (cone, cilindro, esfera etc.) de cada


objeto da realidade. Baseava-se no fundamental do objeto e não em suas
aparências.

Da mesma maneira, para além das aparências, podemos descobrir


que existe uma estrutura de relações entre objetos. Esta estrutura sempre
interessou aosartistas plásticos, que a conhecem por composição.

No caso dos quadrinhos, a composição trata da organização gráfica


dos elementos que compõem a vinheta, bem como da organização gráfica
do conjunto de vinhetas (em tiras, meia página, páginainteira etc.). Isto é,
refere-se tanto à vinheta como ao conjunto a que esta pertence.

Muitas vezes não se percebe, à primeira vista, a estrutura de relações


entre os elementos de um conjunto. Uma maneira simples de descobri-la é
abstrair as linhas e massas essenciais do conjunto. Resultam, então, figuras
singelas que se assemelham a figuras geométricas, letras etc., que são o
que dá unidade ao conjunto. Sem essa unidade, nossa atenção dispersar-se-
ia com facilidade.

Além de observar a estrutura dos objetos e a estrutura de suas rela-


ções, é interessante investigar as reações que estas relações provocam na
consciência humana que as percebe. Integraremos este ponto de vista em
nosso estudo sobre a ação daslinhas e das figuras de geometria plana no
espaço."

1 Existem tratadosespecializados sobre a composição que se ocupam dos numerososaspectos


que esta abarca. O presente trabalho apenastrata daslinhas e das figuras de geometria plana no
espaço base para o aprofundamento de outros estudos.

154
A ação das linhas e das figuras de geometria plana no
espaço

As linhas simples

As linhas são elementos que contêm um sentido dinâmico e psicoló-


gico.
A linha horizontal pode ser seguida com facilidade por nossa vista.
Leva o olhar, nessa direção ininterrupta, sem o menor esforço.

A linha horizontal dá impressão de repouso, de paz, de serenidade.

A linha vertical, quando é acompanhada para cima, provoca tensão


no olho, fadiga e adormecimento (isto deve-se à estruturafísica do olho).

Expressa, em geral, exaltação, ascenção. Também pode exprimir força


e estabilidade.

155
A linha reta inclinada ou oblíqua leva o olhar para as zonas indica-
das por sua inclinação. São como flechas, indicações que conduzem a
atenção para os pontos de interesse.

A linha oblíqua sugere movimento violento, penetração ou queda.

A linha curva leva os olhos a abrangerem espaço, suscitando a sen-


sação de limite entre o interno e o externo. A visão desliza até o espaço
incluído pelo arco.

A linha curva expressa movimento rítmico, suavidade, sensualidade.

As linhas compostas

Chama-se linha composta a resultante da união de duas ou mais


linhas simples com direções diferentes.
Existem dois tipos de linhas compostas: as quebradas, compostas
por várias linhas retas; e as mistas, formadas porlinhas retas e curvas.

156
Aslinhas compostas, sejam elas quebradas ou mistas, podem se rela-
cionar de maneira uniforme, criando ritmosfáceis de seguir com vista e
proporcionando distensão para o olhar.

MM
“LILI

Carr
Quando as linhas mistas não descrevem ritmos uniformes, rompe-se
a inércia no deslocamento do olho, que tem de esforçar-se para acompa-
nhar o movimento.
Que ritmos convêm para a composição de nossas vinhetas? Em ge-
ral, aqueles que apresentam certa variedade sem perder a unidade. A va-
riação é fator de amenidade visual, enquanto que a unidade assegura a
força da comunicação.
Enfatizamos “em geral” para relembrar que, em matéria criativa, não
se pode dar uma receita ou fórmula infalível (que, ademais, não existe).
Ao contrário, o sucesso de uma solução depende do contexto em que é
introduzida, bem como do efeito que se quer obter.

As figuras de geometria plana

As linhas relacionam-se e formam ritmos. Também podem formar


diversas figuras de geometria plana: o quadrado, o triângulo, o círculo etc.
Cadafigura, é lógico, provoca uma reação diferente na consciência
que as percebe. A explicação desse fenômeno tem indubitável relação com
a mencionada ação das linhas. Vejamos alguns exemplos.
O quadrado é uma figura composta por quatro linhas retas de tama-
nho igual, situadas paralelamente duas a duas e que criam quatro ângulos
retos. É uma figura “pesada”, de equilíbrio e com tendência ao estado
estático.

Do que depende esta tendência do quadrado? De sua posição: o


quadrado acima é formado por linhas horizontais e verticais. Se, em vez
disso, suas linhas são oblíquas, perde a estabilidade.

158
O triângulo é uma figura composta por três linhas retas e apresenta
três ângulos. E uma figura com tendência ao movimento.

O triângulo tende ao movimento porque, sendo formado por três


linhas retas, pelo menos uma destas apresenta-se oblíqua. O movimento
será ainda mais acentuado se a figura for composta exclusivamente com
linhas oblíquas.

O círculo é uma figura resultante de uma linha curva fechada, com


todos os seus pontos a mesmadistância de outro ponto chamado centro. O
equilíbrio do círculo é perfeito: o movimento que gera não se dá para lado
nenhum, mas sobre si mesmo.
No quadrado e no triângulo, podemos notar claramente que nosso
olhar se dirige para as pontas. Isso ocorre porque nossa vista sente-se
atraída pelo ponto onde se unem ou cruzam duas linhas. Tal ponto deno-
mina-se centro manifesto.

Nocírculo, não existem centros manifestos: em todas as direções, o


olho desloca-se para o centro. Este centro “vazio”, para o qual o olho se
dirige sem ser levado por linha alguma, denomina-se centro tácito.

A ação do espaço

As formas não existem isoladas, mas em relação a um espaço. Tor-


na-se impossível pensar numa forma sem espaço ou num espaço sem
formas. Na verdade, forma e espaço constituem uma unidade indissolúvel:
o espaço contém a forma e a forma contém o espaço.!*
A ação do espaço é primordial na composição, como veremos nos
exemplos a seguir.

!* Em outras épocas, falava-se de “figura” e de “fundo” e aparentemente entendia-se que o


primordial na composição era a “figura”, ficando o “fundo” como mero complemento. A
aplicação destes termosinutilizou-se com as conquistas da arte contemporânea. Referimo-nosa
eles porque algunsainda identificam o espaço com o “fundo”, o que é um equívoco. O espaço
não é um simples complemento da forma, mas constitui, com esta, uma unidade.

160
Quadrado no centro do espaço

Cercado por todos os lados de idêntico espaço, não há movimento


em direção alguma.

Quadrado na parte baixa do espaço

O espaço superior reforça o peso do quadrado.

E
Quadrado na parte alta do espaço

O espaçoinferior sustenta a figura, cuja forma não parece apropriada


para “flutuar” no vazio.
> “>

161
Quadrado em um dos extremos do espaço

A parte mais ampla do espaço desloca a figura para um lado. É um


deslocamento vagaroso, como corresponde à forma “quadrado”.

Retângulos

Observemosa diferença entre o retângulo de predominância horizon-


tal e o de predominância vertical: ambos parecem deslocar-se em seus
respectivos sentidos, mesmo quando ocupam posições semelhantes no
espaço.

162
Retângulo em um dos extremos do espaço

O deslocamento dá-se com mais mobilidade do que no caso do qua-


drado. Isto se deve ao estiramento do retângulo. com o que este ganha
mais em espaço interno.

Triângulo de base horizontal

A linha horizontal de base confere estabilidade. As duas linhas oblí-


quas levam o olhar para o ângulo superior. Dá sensação de imponência,
força etc.

Triângulo na parte central do espaço

Pela localização no espaço, a figura parece suspensa. Entretanto, a


ação das linhas oblíquas e das pontas leva nosso olhar para diferentes
direções.

163
Triângulo em um dos extremos do espaço

O espaço reforça a ação das linhas oblíquas e o movimento torna-se


mais violento. Se, pelo contrário, o espaço fosse desfavorável, o movimen-
to neutralizar-se-ia.

Z
Círculo no centro do espaço

O poder concentrador do círculo é reforçado pela ação do espaço.

164
Círculo em um dos extremos do espaço

O movimento que tem origem na ação do espaço não encontra resis-


tência na forma do círculo, que não apresenta qualquer aresta.

À medida que avançamosno terreno da composição — mesmo quan-


do estamos fazendo apreciações genéricas — dir-se-ia que nos afastamos
de nosso tema. Essa aparente contradição se desfaz ao observarmos na
realidade os princípios que estudamos. Estes princípios são abstrações
feitas a partir da realidade e de nosso modo de percebê-la. Vejamos como
funcionamnas histórias em quadrinhos.

“Corto Maltês”. por Hugo Pratt. A ação daslinhas em um ritmo rompido e sincopado
a confusãoda situaçãoflui da própria base compositiva.

165
to
“*Mas a cidade de Balda Ilan
fica nas colinas do Dag,
depois de um deserto
abrasador, que poucos, ex-
ceto os nativos do lugar,
conseguiram atravessar.'*
strap

“Principe Valente” por Harold Foster. Naparte


baixa e central da composição, encontra-se a
figura: o personagem, quase “esmagado” pelo
espaço, realiza um deslocamento pesado,
lentíssimo. O texto corrobora o que a imagem
expressa

Camelot, por fim! Arn imagina se seus


pais teriam chegado antes dele. Como
não é cavaleiro, não pode apresentar-se
ao rei Artur. Isso é atribuição de
seu pai.

“Príncipe Valente”, por Harold Foster. A árvore e sua sombra na terra formam uma
linha curva (semicircunferência), criandoa sensação deespaçointerno (envolvidopela
semicircunferência) e externo (fora dela). Nosso olhar vai antes para o interno: o
personagempenetra noespaço, a nova aventura.

166
“O Cobra”, por Ray Collins e Arturodel Castillo. Claro exemploda açãode linhas e do
espaço. Verticais e horizontais na primeira vinheta, quietude e tensão; diagonais e o
espaçoque se abre na segunda, rompendo a tensãoedandovez à ação.

167
“O Cobra”, por RayCollins e Arturo del Castillo. Nesta segiiência: oinício e o fimda
avalanche. À açãodaslinhase do espaço soma-se a qualidadedo desenho. Nãoapenas
cadavinheta, mas o conjunto emqueela ocorre (a página) possuemunidadegráfica que
enriquece a narrativa.

168
CAPÍTULO IV
A MONTAGEM

Chegamos ao momento em que se decide comoficará, finalmente, a


história em quadrinhos. Este momento corresponde à montagem. A monta-
gem é a operação mediante a qual se define de que maneira serão arti-
culados os espaços e tempossignificativos, para dar uma narração e um
ritmo determinados à história em quadrinhos.
A narração e o ritmo da história em quadrinhos compreendem, con-
forme estudamos, os aspectos gráfico e narrativo. Já nos ocupamos de
ambos anteriormente. Este capítulo, por isso, será, em boa parte, uma
espécie de revisão.

169
1. RECURSOS PARA LIGAR AS VINHETAS

Como se apresenta a história em quadrinhos? Seja em umatira, em


uma página ou em uma revista inteira, a história em quadrinhos quase
sempre aparece como uma “cadeia de vinhetas”, que o leitor percorre,
conforme a linha de indicatividade, segundo uma prioridade da esquerda
sobre a direita e de cima para baixo. Em geral, as vinhetas ligam-se umas
às outras nessa ordem.
Alguns dos recursos característicos das histórias em quadrinhos para
conectar uma vinheta a outra são as fusões, os espaços contíguos, os
letreiros e as ligações superpostas.

Fusões

Duas vinhetas relacionam-se por meio de uma fusão quando o que


vai mudando nelas, de modo progressivo, são os tons da imagem.

“Sunday” por Víctorde la Fuente. Mesmo quando mudam as relações espaciais em cada
vinheta, a imagem éfundamentalmente a mesma: um rostotenso, cuja tensãose prolonga
através das mudanças tonais que vão encadeandoas vinhetas.

170
Espaços contíguos

Duas vinhetas relacionam-se por meio de espaços contíguos quando


criam a ilusão de continuidade espaço-temporal na ação, ao mostrar em
vinhetas sucessivas espaços supostamente contíguos.

Sim. Esenãotem
algo realmente in-
= 4 7]
él
teressante para dizer,
é melhorficarde bico
calado, Morton. Onde /
está Smiles? 1

“Sunday”. por Victor de la Fuente Relacionam-se com a contigúidade de


seus espaços.

Letreiro

Já conhecemoso letreiro: é o texto que esclarece ou explica o con-


teúdo da vinheta, facilitando a continuidade entre duas delas.

“Rip Kirby”, por Alex Raimond.

Enquanto os espaços contíguos e as fusões são recursos da imagem


para ligar vinhetas, o letreiro é um recurso literário.

171
Ligações superpostas

Os balões, as letras, as figuras cinéticas etc. cumprem uma função


que podemos chamar “ligação superposta” quando servem para ligar, como
pontes, duas ou mais vinhetas. Os sons, movimentos etc. mostrados em
uma vinheta, nestes casos, em geral procedem de uma vinheta contígua.

.. OUTRO DA ILHA... «COM A SEDE QUE AyamanDie acom-


O HOMEM APERTA O ATORMENTA E O payuou TODOS Os
A GARGANTA.ECAL.|| EFEITODO QUERO- ACONTECIMENTOS.
0 SENEINEQuei. E VEAZEL VOL- DoE: AGORA
y ; NA É
Rio MA TUDO POR TACAMEAS om SO FALTA y
WEAZEL DENTRO! LEANDO. SEN- Sá UM... A
ECOA TE-SE MUITO
MAL. A
1 E VEMPA
PEN RACA.)
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E , : Uá
EXTREMO E! É
Aa 4 : FZ

Ê E
W /A AN E»

42, p- AD nb cs Are

“Terry e os piratas”, por Milton Caniff. Uni letreiro eum balao servent para ligar
graficamente duas vinhetas.

“Paco Yunque”, por Juan Acevedo.

A ligação superposta é um recurso misto: da imageme do texto.

172
2. ESTRUTURAS ESPECIAIS
DE MONTAGEM

Outra maneira de relacionar duas ou mais vinhetas é a que diz res-


peito ao enfoque da ação: um mesmo espaço pode ser ampliado ou con-
centrado.
E como se — façamos uma comparação — estivéssemos com uma
câmera filmadora aproximando-nos ou afastando-nos do tema representa-
do, Este deslocamento da câmera, no cinema, é conhecido como travel-
ling, e pode ocorrer para a frente, para trás, em sentido vertical ou hori-
zontal ou ainda, em outras direções, como se nosso olhar percorresse o
espaço, esquadrinhando-o para entender melhor uma situação.
à ENTÃO..COMEÇAM A GRITAR!

tehe stroke of mundana (ÃO vour da meta norte a por Steranho Deslocamento
para a frente.

“Mom” por Carlos Giménez. Deslocamento para trás

173
“Barbatanas de tubarão”, por Enrique Serpa, Isabel Morales e Vicente S. L. Deslo-
camentolateral.

174
3. ESTRUTURAS TEMPORAIS
DE MONTAGEM

Os deslocamentos nos permitem percorrer o espaço,e esta ação leva


um tempo. Os planos mais próximos costumam ser lidos em tempos cur-
tos, ao passo que os planos afastados provocam uma leitura mais demora-
da. Estes dados devem ser levados em conta para conferir a nossa história
em quadrinhos o ritmo que esta exige.
Além disso, a multiplicação de vinhetas (multiplicação de tempos e
espaçossignificativos) produz uma dilatação do tempo usual, provocando
um efeito de retardamento.

“O Endure”, por Manuel Serpa e Mario Ponce

175
4. ESTRUTURAS PSICOLÓGICAS
DE MONTAGEM

Existem estruturas de montagem que alteram a continuidade linear


“passado-presente-futuro” do tempo. São de dois tipos: evocação do passa-
do (ou flashback) e antecipação do futuro (ou flashforward). Podemos
acompanhar a narrativa na posição de um personagem ou fora dela. No
primeiro caso, o relato descreverá as lembranças, pensamentos, divagações
etc., do personagem, enquanto que, no segundo caso, o relato estará inse-
rido na “realidade” da ação que a história narra.
*Encontrei -os durante nie pi Ei Togo minha vida
Quejovens descara- e
um verão. | Visitem-me em Gray 1 transformou-se num
dos! Gostava tanto O ocultismo lhe Moor e falaremos | pesadelo. Comecei
deles e quiseram interessa? A nós sobre o assunto. a ver coisas horrl-
veis!
destruir-me.

“Mandrake”, por Lee Falk. Evocaçãodopassado, a partir de um “presente” em que a


história é narrada.

Trabalhoprático

1. De exercício
a. Fazer várias segiiências, uma para cada forma de montagem,
experimentando os recursos paraligar as vinhetas, as estruturas
espaciais, temporais e psicológicas. A realização dessas
sequências pressupõe a integração das práticas anteriores.
b. Fazer uma história em quadrinhos, composta por várias seqiuiên-
cias, usando as formas de montagem que a narrativa exigir.

2. De reconhecimento
a. Examinarhistórias em quadrinhos e reconheceras diversas for-
mas de montagem, atentando para a função que cumprem dentro
da narrativa, bem comopara a qualidade de sua utilização.

176
GIMENET NUNCA
HAVIA RECEBIDO

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BM, TEU IRMÃO IRMÃOS:TITO E TON- Pure,
ESTANA PORTA NHO FAZ CINCO EM QUTROTan car
INTERNATO,
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OS vê.

VERA POLIOMIELITE FI-


COU COM UMA PERNA.
MAIS CURTA,

177
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A FÓRIODE?
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PRiNas SETIVER GORTE,
ENTRO COMO

“TITO. Paracuellos del Jarama, 1951” «por Carlos Giménez. Austeridadedosformatos,


roteiro precisoe bela planificação para uma obra de imensa ternura e solidão.

178
179
180
181
HUM.ESTÁ NA

“Sonhos Molhados”, por Philip Caza. Excelente tratamentoda imageme da narrativa


que se estrutura a partir daquela. Demonstração de que, coma história em quadrinhos,
comocom qualquer outra linguagem, pode-se chegar à poesia.

182
CAPÍTULO V
A HISTORIA EM
QUADRINHOS POPULAR

1. COMO FAZER HISTÓRIAS


EM QUADRINHOS
Chegamos à terceira pausa desta nossa viagem que é conhecer a
linguagem dos quadrinhos. Terceira pausa no caminho, que dedicaremos à
avaliação de nossa aventura, o que ela ensejou e que projeções dela nascem.
Partimos em julho de 1976, como ficou registrado nas primeiras
páginas deste livro, de Villa El Salvador. Ali deu-se a experiência que ser-
viu de base para escrever o método de Como fazer hstórias em quadrinhos.
Seguiu-se um fato anedótico, do qual talvez seja conveniente falar
aqui, pois pode nos ajudar a entender o sentido de nosso trabalho.
Em 1978, o Instituto Nacional de Pesquisas e Desenvolvimento
Educativo publicou a primeira edição de Como fazer histórias em quadri-
nhos. O livro ficou à venda naslivrarias apenas por poucos dias. Segundo
informaram oslivreiros, fora retirado pelos próprios distribuidores. Logo
ficamos sabendo que voltara aos depósitos da editora, de onde não saiu
nem para atender pedidos de compra direta.
Naquele tempo, o governo do general Morales Bermúdez vivia um
processo de “direitização” galopante e apressava-se em fechar as aberturas
iniciadas, anos antes, pelo general Velasco.* Nesse quadro, a Diretoria
Geral de Extensão Educativa — que era uma das principais contribuições
da Reforma e que havia amparado nosso trabalho — foi literalmente apa-
gada de todos os organogramas. No caso deste livro, parece que algum
burocrata medroso (ou “puxa-saco”) achou-o com cara de subversivo.

* Em 1968, o Peru passou a ser governado por uma junta militar encabeçada pelo general Juan
Velasco Alvarado. A junta desenvolveu uma política reformista no campo social e nacionalista
no campo econômicoque, em particular, prejudicou os interesses norte-americanos na extração
do petróleo e do cobre peruanos. Em 1975, Velasco cedeu o posto ao general Morales Bermúdez
(N.T.).

183
Era precisoliberar o livro. Nos primeiros dias de 1980, TAREA, um
centro de educação popular, iniciou o resgate: publicou-o em forma de fas-
cículos e, quase a preço de custo, o pôs ao alcance das organizações popu-
lares e de qualquer pessoainteressada no tema. Como fazer histórias em qua-
drinhos voltara a seu ambiente: a gente da qual e para a qual havia nascido.
Em 1981, houve um acontecimento agradável: Histórias em
quadrinhos foi publicado pela Editorial Popular, da Espanha, voltando,
assim, às livrarias peruanas, mas numa edição com a qual, por ser
estrangeira, não se podiam tomar as mesmas “liberdades”. Logo seguiram-
se outras edições da TAREA e a segunda edição da Editorial Popular,
assim como a da AG SPAK, da República Federal da Alemanha.
Paralelamente a isso, surgiram oficinas na América Latina e na Espa-
nha queutilizaram Como fazer histórias em quadrinhos comosua principal
ferramenta metodológica. São elas:

1975: Oficina de Quadrinhos de Villa El Salvador


(organizada pelo Centro de Comunicação Popular de Villa El Salva-
dor e pela Diretoria Geral de Extensão Educativa do Ministério de
Educação, em Lima, no Peru).
1979: I Oficina Nacional de Quadrinhos Populares
(organizada pela TAREA, Associação de Publicações Educativas,
em Lima, no Peru).
1980: Oficina Nicaragiiense de Quadrinhos Populares
(organizada pela Frente Sandinista de Libertação Nacional e pela
Associação de Publicações Educativas, em Lima, no Peru).
1981: II Oficina Nacional de Quadrinhos Populares
(organizada pela TAREA, Associação de Publicações Educativas,
em Lima, no Peru).
1981: Oficina Regional de Quadrinhos
(organizada pela Escola de Verão de Sevilha, na Espanha).
1981: Oficina Regional de Quadrinhos
(organizada por Noves Llars, em Valência, na Espanha).
1981: Oficina Regional de Quadrinhos
(organizada pela Escola de Verão de Estremadura, em Jaraiz de la
Vera, Espanha).
1981: Jornadas de Quadrinhos Populares
(organizadas pela Escola de Verão de Gijón, Espanha).
1981: Ciclo de Palestras sobre Quadrinhos Populares
(organizado pela União dos Jornalistas de Cuba [UPEC], em Ha-
vana, Cuba).

184
1982: I Oficina Centro-americana de Quadrinhos Populares
(organizada pelo ALFORJA, Centro de Estudos e Publicações, em
San José, Costa Rica).
1982: Oficina Regional de Quadrinhos
(organizada pelo CIDHAL,na capital do México).
1983: Oficina Regional de Quadrinhos Populares
(organizada pelo Instituto de Pastoral Andina, em Cuzco, Peru).
1983: HI Oficina Nacional de Quadrinhos Populares
(organizada pela TAREA, Associação de Publicações Educativas,
em Lima, no Peru).
1984: I Oficina Colombiana de Quadrinhos Populares
(organizada pelo CINEP, em Bogotá, na Colômbia).
1985: Oficina Regional de Quadrinhos Populares
(organizada pela Equipe PUEBLO,na capital do México).
1986: I Oficina Alemã de Quadrinhos Populares
(organizada pelo AG SPAK, de Munique, República Federal da
Alemanha).
1986: Oficina de Quadrinhos
(organizada pela Escola de Verão de Ação Educativa, em Madri,
Espanha).
1986: Oficina de Quadrinhos Populares
(organizada pela Comunidade de Madri [Conselho de Educação e
Cultura], Espanha).
1986: Oficina de Quadrinhos Populares
(organizada pelo Centro de Professores da Comunidade de Valência,
na Espanha).

O fato de tentarem ocultar o livro ficou no passado, como uma


simples anedota. O que veio depois, o surgimento de oficinas em vários
países, demonstrou que não se podem amordaçar as idéias nem reprimir a
ação quando estas respondem a uma necessidade maior: o povo quer ex-
pressar-se,precisa libertar sua ação e, com isso, começar a fazer seu mundo
em que vive.
2. UMA NOVA ETAPA: .
A “OFICINA-CONCENTRAÇÃO”

Entre a Oficina de Quadrinhos de Villa El Salvadore as oficinas que


vieram depois existem várias diferenças.
A 1 Oficina Nacional de Quadrinhos Populares definiu a pauta das
oficinas posteriores: vinte desenhistas chegaram de diversas províncias do
Peru. Eram desenhistas amadores. Não desenhavam,exatamente, (como se
diz) “bem”, mas tinham algo em comum: sua vinculação a alguma organi-
zação do movimento popular (sindical, camponesa, de bairro, de mulheres,
paroquial etc.). Traziam, portanto, certa experiência de educação popular,
quase sempre nas atividades de imprensa e propaganda.
A oficina durou sete dias, nos quais trabalhou-se de manhã,à tarde e
parte da noite. Como é lógico, em uma semana não se aprende uma nova
linguagem. Mas se as pessoas já têm um nível de iniciação, abrem-se
vários caminhos paraa prática e a pesquisa da história em quadrinhos.
O novotipo de oficina nos colocou principalmente, diante de dois
problemas que resolvemos, então, de parte a parte. Um era a procedência
dos integrantes da oficina: o conjunto revelava a heterogeneidade cultural
peruana, em que às diferenças entre gente da costa, das montanhas e da
floresta somava-se o fato de que muitos chegavam, pela primeira vez, à
capital, razão pela qual mostravam-se um tanto inibidos. Carecíamos de
uma metodologia adequada para estimular sua participação. Acreditamos
que a estrutura de relação que experimentamos era, fundamentalmente,
tradicional, embora a matizássemos com diferentes abordagens aos inte-
grantes da oficina: começar com suas expressões, seus testemunhos, rela-
tar-nos coisas de suas vidas, piadas, analisar fatos reais etc. Dissemos que
era tradicional porqueali havia, na ânsia de cumprir o programa, um certo
verticalismo. Nesse relacionamento entre a estrutura tradicional e as abor-
dagens aos integrantes da Oficina, foram ganhandoterreno as segundas, de
modo que a primeira se foi demolindo e se foi preparando o campo para a
integração de uma metodologia mais adequada.
O segundo ponto era a organização das atividades para que o progra-
ma, tão concentrado, não se convertesse numa tortura para as pessoas.
Quanto a isso, também cuidamos do ritmo, tratando de “arejar” as ativida-
des. Combinávamos os momentos de leitura com os de prática e desta
emanavam asreflexões, a teoria. Cada jornada diária terminava no contato

186
com um grupo de comunicação popular que visitava a Oficina ou, então a
Oficina deslocava-se até o grupo.
Preferimos partir do reconhecimento de dois problemas, porque é
possível que estes ocorram àqueles que iniciam umaoficina: comofacilitar
a integração entre os participantes e como conseguir um clima apropriado
à aprendizagem. Naquela época,tivemos quelidar “como Deus quis” com
esses problemas, pois não tínhamos as ferramentas que a situação exigia.
Era diferente na Oficina de Villa El Salvador, com suas tardes demoradas,
em algumas das quais deixávamos os quadrinhos para nos integrarmos ao
trabalho comunitário, ao contrário desse novo tipo de “oficina-concentra-
ção”, de prazo curto e fechado.
A nova oficina teve sua própria organização, que deu margem a
contribuições que continuaram afirmando-se nas experiências seguintes.
Descrevamos um dia normal desta oficina. A jornada compunha-se
de três partes: leitura crítica, estudo e prática da linguagem e, por fim,
encontro com outro grupo (espetáculo e diálogo).
Começávamoso dia com leitura de histórias em quadrinhos. Pedia-
se às pessoas que levassem à oficina as histórias em quadrinhos de que
mais gostavam e as mais lidas em sua cidade (independentemente das
preferências do desenhista). Elas passavam de mão em mão e todos dedi-
cavam-se a sua leitura individual ou em grupo, como lhes aprouvesse.
Terminada a leitura, passava-se ao reconhecimento da linguagem dos
quadrinhos, conforme o que fora aprendido na sessão anterior. Indicavam-
se as expressões dos personagens, a utilização de planos, ângulos de visão,
balões etc., se eram corretos ou se podiam ser melhorados e, quando
possível, desenhava-se a maneira proposta. Essa leitura era muito impor-
tante porque apresentava dois aspectos: por um lado, permitia consolidar o
que fora aprendido, vendo-se como funcionava nos quadrinhos dos profis-
sionais; por outro lado, permitia a desmitificação dos profissionais, ao
facultar suacrítica a partir de dados concretos (o conhecimento e a prática
da linguagem). Percebia-se, então, que existe uma tendência “mecanicista”
em boaparte das histórias em quadrinhos do mercado. Seus autores, embora
profissionais do desenho, agem mecanicamente, sem sentir seu tema. Desde
a expressão de cada personagem, que é o começo, via-se que esses profis-
sionais possuíam um limitado repertório de expressões que deveriam ser
pensadas em sua respectiva situação. Comprovava-se a mesma atitude no
uso de outros elementos da linguagem dos quadrinhos. Avançando na
análise, via-se que essa postura não era exclusiva do desenhista, mas era
estabelecida ou aceita pelas empresas produtoras de histórias em quadri-
nhos e obedecia a determinada concepção deste meio: os quadrinhos como

187
mero objeto de consumo; o leitor — de qualquer idade — como simples
consumidor. Era a visão desumanizada do comerciante (a das empresas
multinacionais), antagônica à do comunicador popular. A partir da expe-
riência da linguagem, os membros da oficina convertiam-se em leitores
mais rigorosos, diferenciando a boa da má história em quadrinhos. Para
regozijo dos que iam aprendendo a linguagem dos quadrinhos, também
encontramos autores sumamente criativos (Quino, com sua Mafalda e outras
páginas; Goscinny e Uderzo, com Asterix; Schulz, com Charlie Brown;
Will Eisner, com Spirit, dentre os mais conhecidos). Ao apreciá-los em
outro nível de leitura — ou que, no mínimo, acabava de se tornar cons-
ciente —, parecia multiplicar-se o prazer oferecido por suas obras.
Apósa leitura, seguia-se o estudo e prática dos elementos da história
em quadrinhos, segundo o método exposto neste livro. Então gesticuláva-
mos, fazíamos ruídos, inventávamos seqiiências, argumentos etc. Procurá-
vamos a experiência direta antes de desenhar algo. Com fregiiência, rela-
cionávamos os detalhes e a estrutura maior, as relações no interior da
história em quadrinhos e entre esta e a estrutura social. Tratávamos de
exprimir a vida em seus diversos matizes.
A jornada cotidiana terminava com o encontro com um grupo de
comunicação popular. Isso, que de início fizemos para dar um fôlego à
intensidade com que se trabalhava na oficina, converteu-se numa impor-
tante descoberta: os cadernos de anotações já estavam fechados e as pes-
soas assistiam a um espetáculo. O grupo ouartista convidado apresentava
sua obra de teatro ou audiovisual, canto, poesia etc.), após o que iniciava-
se a conversação entre os expositores e os participantes da oficina de
quadrinhos. Vários assuntos eram tratados. Um era a relação entre as di-
versas linguagens, o reconhecimento de aspectos e recursos em comum,
bem como o que era específico de cada qual (segiiências, planos, expres-
sões, a mudança de tempo, o congelamento de uma imagem, a voz externa
ou dirigida ao público etc.).
Outro temaera o da experiência do grupo convidado. Eles contavam
comohaviam surgido, qual o seu objetivo, que dificuldades enfrentavam e
respondiam a outras perguntas. Os encontros tornavam-se muito estimu-
lantes para uns e outros. Para a oficina de quadrinhos, muito mais que um
descanso, os encontros eram um reforço à consciência sobre o próprio
objeto de trabalho e sobre o sentido da comunicação popular. No dia
seguinte, essa experiência era integrada às práticas de segiiência, aten-
tando-se para o conceitual ou o emotivo ou, ainda, para qualquer ocorrên-
cia aleatória que o encontro provocara no participante da oficina.

188
Esse esquema diário básico manteve-se, com as variantes que cada
situação determinou, na oficina nicaragiiense, na segunda do Peru e nas
regionais da Espanha.
O esquema era o mesmo, embora cada experiência lhe desse vida
própria. Dessa diversidade nasceram novas projeções para o método: aten-
dendo à sua aplicação em experiências de educação popular e também à
sua utilização por pessoas que queriam expressar-se individualmente; aber-
to em sua concepção, o método foi aplicado ao trabalho com crianças em
idade escolar, à educação de adultos, à mobilização popular, à expressão
artística etc.

189
3. DINÂMICAS PARA A PARTICIPAÇÃO

Em novembro de 1982, participei de uma oficina que marcou uma


mudança importante em nossa metodologia: a I Oficina Centro-americana
de Quadrinhos, organizada pelo Centro ALFORJA, em San José (Costa
Rica), à qual se dirigiram representantes de organizações populares dos
países daquela área (América Central).
O esquema deveria ser o que eu já conhecia, mas eis que eles me
ensinaram novas formas de relacionamentoentre os participantes da ofici-
na. O pessoal do ALFORJA já mefalara das “dinâmicas” ou técnicas para
propiciar a participação e a integração do grupo ao máximo. Haviam des-
crito algumas que me soaram como brincadeiras de escoteiros. Ainda no
primeiro dia, quando me pediram para que todos saíssem do local para
fazer uma dinâmica, consenti, dissimulando minha contrariedade. O que
queriam? De mãos dadas, organizamo-nos em duas rodas concêntricas que
giravam em sentidos opostos, de costas uns para os outros. De repente, a
pessoa que dirigia a dinâmica dava uma ordem e cada qual devia pegar a
mãode seu par (previamente designado e que estava na outra roda), desfa-
zendo logo a organização e sentando-se no chão. O último par a fazê-lo
pagava um castigo. É certo que a brincadeira nos deixava atentos, mas o
que isso tinha a ver com os quadrinhos? Até aí, nada,é evidente. Eu nunca
trabalhara com as dinâmicas e, sem perceber a necessidade de sua integra-
ção à oficina, pareciam-me algo paralelo à própria oficina. Uma tarde,
quando as pessoas já mostravam sinais de cansaço, alguém interrompeu
para pedir uma dinâmica, à qual seguiu-se outra e mais outra. As pessoas
voltaram a animar-se e aproveitamos o tema das dinâmicas para experi-
mentar novas seqiiências. Reparei, então, que não só podiam servir para a
animação como deveriam integrar-se ao assunto com que lidávamos.
Naoficina seguinte, no México, pudemos experimentar deliberada-
mente essas mudanças. Desde o primeiro momento, trabalhamos com di-
nâmicas, quebrando certos formalismos distanciadores e criando o clima
de confiança que favorecia a livre participação de todos.
As dinâmicas são jogos, muitos dos quais conhecidíssimos, que em
geral pôem em movimento todo o nosso corpo. Requerem nossa atenção e
pronta reação ou concentração para percebermos a resposta, mobilizam a
energia das pessoas, tirando-as de qualquer abstração ou fuga. Na lingua-

190
gem popular peruana, dir-se-ia que as dinâmicas “lançam fagulhas” ou
“afinam”, isto é, despertam uma atitude de alerta, dão uma nota adequada,
em um tom adequado para o trabalho. Este “tom” é de suma importância
na educação popular e liga-se ao prazer que se sente pelo que se está
fazendo. É um componente afetivo, um clima emotivo totalmente favorá-
vel ao trabalho. Com isso, nada se faz por obrigação, mas as coisas fluem
com liberdade a partir de cada pessoa, criando confiança em si mesmoe
nos companheiros da oficina.
Existem diversos usos das dinâmicas, as de apresentação no primeiro
momento, por exemplo. Na oficina de quadrinhos, era costume se combi-
nar duas delas: uma para gravar, desde o princípio, os nomes dos compa-
nheiros. Um deles, qualquer um, dizia seu nome em voz alta. O que ficava
à sua direita repetia esse nome e, por sua vez, dizia o seu. A pessoa
seguinte pronunciava o nome das duas anteriores e acrescentava o seu, e
assim iam-se juntando todos. Quando se chegava ao último (o que estava à
esquerda do primeiro), este tinha que dizer todos os nomes, mas na ordem
inversa, começando com seu próprio. Esta dinâmica de simples retenção
permite, por exemplo, brincar com o próprio nome. Os nervosse acalmam,
a gente conhece os nomes mas precisa de mais informações. Então,utili-
závamos outra dinâmica: a apresentação por pares. Estes (escolhidos ao aca-
so e procurando juntar desconhecidos) trocam, à parte, seus dados pessoais,
lugar de procedência, interesses, expectativas, gostos etc. Depois, todos
reunidos, cada um é apresentado por seu par, de forma simples e breve.
Essas são dinâmicas genéricas, que podem servir em qualquer ofici-
na, não apenas nas de quadrinhos. Há outros jogos, como o das lanchas.
Imagina-se que estamos em um navio que começa a afundar. É preciso
correr paraas lanchas salva-vidas, mas estas têm uma capacidade limitada.
O capitão do barco põe todos em uma roda e vai marcando um ritmo. De
repente, ordena que se formem lanchas de, por exemplo, quatro pessoas. O
grupo forma novas rodas com esse exato número de pessoas. Saem do
jogo, considerados afundados ou afogados, aqueles que não conseguirem
agregar-se a uma das rodas. Para os que ficam, vêm novas ordens e assim
até se chegar a dois vencedores (há casos de finalistas aguerridos em que
o número não baixa de três).
Essa dinâmica é tipicamente de animação. As dinâmicas de anima-
ção costumam ser usadas para iniciar uma jornada e criar um ambiente
alegre ou para amenizar um excessivo clima de concentração ou, ainda,
para reanimar a participação.
Foram-secriando outras dinâmicas nas oficinas de quadrinhos, volta-
das não apenas para o ânimo das pessoas como também para o próprio

191
objeto de trabalho. Dessa forma, na oficina mexicana, não se começou de
zero o estudo das expressões, como sempre havíamos feito, mas antes
introduzimos uma dinâmica com pura linguagem mímica: tratamos de
sentir e, principalmente, transmitir os estados de alegria, raiva, tristeza e
serenidade. Cada estado, um a um, foi representado por grupos de seis
pessoas e, depois, selecionamos os “atores” mais convincentes, atentando-
se ainda para os diversos matizes que se apresentavam dos estados. Forma-
dos os grupos, conversávamos sobre o que se sentia em cada estado, como
se registrava muscularmente e as imagens mentais que o acompanhavam.
O passo seguinte era uma encenação do conjunto, para ver no que dava,
como se relacionavam os grupos: vieram primeiro os tristes e depois os
enraivecidos, que não se comoviam diante do drama dos primeiros, alguns
dos quais abatiam-se ainda mais ou começavam a ficar irados. Nesse
momento, entravam os serenos, que impunham a concórdia, acalmando
uns e outros. Mas então chegavam os alegres e ocorria a desordem total
pois, exagerando seu papel, transformavam-se em brincalhões, pondo a
perder o trabalho dos serenos (que, em sua maioria, perdiam a calma,
irritando-se ou entristecendo-se ou misturando-se com os brincalhões) e
instaurando o caos. À dinâmica deu um resultado muito interessante e
motivador para a segunda etapa: desenhar as expressões, de acordo com
aquilo que se havia sentido, e desenvolver segiiências, a partir do ocorrido.
Noutros casos, utilizaram-se dinâmicas já existentes e que foram
adaptadas aos interesses da oficina de quadrinhos. Assim foi com a dinã-
mica da identidade e dos animais, na III Oficina Nacional peruana. Cada
participante mencionava o animal que gostaria de ser e por quê. O jogo faz
com que as projeções se realizem sem inibições. Cada pessoa fala das
qualidades que admira no animal escolhido e que considera, ou gostaria de
possuir. Em seguida, desenhava-se uma sequência tendo esse animal como
personagem e com desenvolvimento livre. Vinha depois a análise coletiva
das formas e conteúdos dessas histórias em quadrinhos.
Detivemo-nos nas dinâmicas porque marcaram um novo tipo derela-
cionamento entre os integrantes da oficina e, em algumas ocasiões, deram
origem a novas formas de abordagem da linguagem dos quadrinhos.

192
4. A FORMAÇÃO DE PROMOTORES

Na III Oficina Nacional peruana, apresentamos um programa de tra-


balho com uma nova etapa: a formação de promotores. Dedicamos os sete
dias já mencionados à formação de autores e prosseguimos por mais sete
voltados à formação de promotores dos quadrinhos populares. Tratava-se
de preparar pessoas que depois organizariam outras oficinas, multiplican-
do a experiência. Na segunda semana, aprofundaram-se alguns aspectos
das histórias em quadrinhos abordados na fase anterior e, em especial,
trabalhou-se com as dinâmicas e outras ferramentas metodológicas, anali-
sando em que consistiam, o que suscitavam, para que serviam, as vanta-
gens e riscos de seus usos e abusos. Reforçamos essa etapa, querealizáva-
mos pela primeira vez, com uma mesa-redonda da qual participaram edu-
cadores populares tarimbados, alguns dos quais fregientaram a oficina nos
dias seguintes.

5. O MOVIMENTO E O SONHO

Em 1984, realizou-se a Oficina Colombiana de Quadrinhos Popula-


res. Ao seu término, os integrantes exprimiram de maneira cabal algo que
se começara a pedir nas últimas oficinas: que a relação iniciada fosse
mantida. Fartos de encontros em que os acordos assumidos se descum-
prem tão logo as pessoas se dispersam, os cartunistas reclamavam que a
relação fosse organizada e que se estendesse a todos os cartunistas popu-
lares do continente.
De volta a Lima, continuamosnosso intercâmbio por cartas. O pedi-
do era justo, mas não fácil de atender. Durante o ano seguinte, orientamos
nossos esforços para essa meta: organizar o movimento dos quadrinhos
populares latino-americanos.

193
Nos primeiros dias de 1986, deu-se um passo importante. Graças ao
apoio do Escritório Regional de Comunicação da UNESCO,realizou-se o
I Encontro Peruano de Quadrinhos Populares. Durante três dias, os cartu-
nistas avaliaram seus problemas e aprovaram várias propostas de ação. A
principal delas, por unanimidade: organizar o movimento nacional, como
passo prévio para a constituição do movimento em âmbito latino-america-
no. Outra das decisões foi publicar um boletim informativo que servisse de
vínculo entre os cartunistas e que, além das tarefas de difusão, aprofundas-
se o conhecimento da linguagem dos quadrinhos e do método para seu
ensino.
O projeto dos quadrinhos populares iniciou, assim, uma nova etapa.
Osprimeiros dez anos foram de “semeadura”, de formação de oficinas na
América Latina e na Espanha. Atualmente, trata-se de relacionar essas
oficinas e outras que também estão surgindo em outras áreas.
Nosso projeto parte dos quadrinhos, mas aponta para mais adiante.
Partimos da história em quadrinhos por vocação, porque é o melhor meio
de nos expressarmos. Logo descobrimos que sua linguagem, composta por
imagens desenhadas e palavras escritas, tem um lugar privilegiado onde
parecem entrecruzar-se outros meios, dos quais os quadrinhos tomam
emprestado e aos quais reverte. Por isso, não estranha encontrar, cada dia
mais, os cartazes das ruas, os anúncios nos jornais, o cinema e outros
meios visuais recorrendo a elementos próprios dos quadrinhos para comu-
nicar suas mensagens. Isso ocorre porque trata-se de convenções suma-
mente expressivas e porque fazem parte de uma linguagem que todos
entendem. Com as oficinas de quadrinhos, queremos que as pessoas não só
entendam essa linguagem, como também que a manejem, que aprendam a
lê-la de modo crítico e a usá-la para comunicar suas próprias histórias.
Podemos afirmar, baseados nas citadas experiências, que a lingua-
gem da história em quadrinhos é um excelente ponto de partida para
organizar um programa de “alfabetização visual”. Esta denominação pode
ser polêmica. Querdizer que existem analfabetos visuais? É sabido que há
analfabetos que não sabem ler nem escrever; mas, aqui mesmo, não se está
dizendo que as pessoas entendem (“lêem”) a linguagem das imagens?
Naresposta a estas questões está presente o desafio que temosdiante
de nós, nosso sonho. Grosso modo, as pessoas entendem a linguagem das
imagens, sabem “lê-las”, mas não o fazem, não as criam. Se nos limitar-
mos ao desenho, a maioria das pessoas não o utiliza para se expressar.
Nosso desafio é trabalhar para que as pessoas dêem um salto qualitativo:
que os consumidores se transformem em produtores. Esta segunda catego-
ria não descarta a primeira, mas, em troca, o simples fato de consumir não

194
pressupõe que se chegue à produção criativa. Trata-se de passar de um
papel fundamentalmente passivo para o desempenho de um papel ativo, de
ser objeto a sersujeito, criador de imagens... e da história. Se falarmos de
quadrinhos populares, é evidente que nos movemos no quadro da educa-
ção libertadora, de um processo de transformação social em que o povo
seja cada vez mais dono de seu próprio destino. Estas palavras correspon-
dem mais a nosso sonho,o projeto de fundo. É preciso voltar ao movimen-
to, pois um e outro se alimentam mutuamente.
Em junhoe julho de 1986,participei de várias oficinas de quadrinhos
na República Federal da Alemanha e na Espanha. Um dos temas com mais
fregiência proposto foi o do sentido dos quadrinhos populares na Europa.
Vimos queeles se desenvolveram principalmente na América Latina, mas
que sua vocação é universal. Trata-se de quadrinhos que expressam o
pensamento e as vivências do povo que os cria, suas lutas e sua imagina-
ção mais livre, sua vida. Nesse sentido, cremos que o movimento dos
quadrinhos populares pode converter-se também em um espaço de integra-
ção dos povos, em que saibamosuns dos outros através de nossas próprias
expressões.
Em sua nova etapa, o projeto dos quadrinhos populares tem interes-
santes tarefas: dirigido à organização do movimento, alentando o inter-
câmbioe a integração entre os povos, deve atentar também paraa investi-
gação da linguagem da imagem, de sua relação com outros mecanismos de
percepção do ser humanoe trabalhar estes conhecimentos na perspectiva
da educação popular.

195
EPÍLOGO

Aoterminareste livro, podemos observar que está baseado em algu-


mas idéias simples. Estas idéias, nascidas que são de uma experiência
específica, também podem se converter nas conclusões do presente traba-
lho:

1º Sobre o objeto de estudo: considera-se que a linguagem dos quadrinhos


pode se transformar em um bem comum. Ou seja, que pode ser
aprendido e praticado por qualquer pessoa e não apenas, é óbvio, por
“aqueles que têm condições especiais”.

2º Sobre o método: parte-se da observação direta da realidade, não de


algum esquema, e quando se estuda um esquema, este sempre tem
relação com a própria vida.

3º Sobre o processo: pretende-se que os quadrinhos se convertam em um


meio dinâmico, emanado do contato que se estabelece com outras
pessoas e que reverta a este contato, enriquecendo-o.

Pelo exposto, a possibilidade de que os quadrinhos venham a ser um


bem comum torna-se uma necessidade: no mundo atual, em que se fala
cada vez mais acerca da libertação das consciências, é fundamental inte-
grar o conhecimento e a prática das linguagens contemporâneas como
propriedade comum a todos os homens.

196
Luis Santín. Il Oficina Nacional de Quadrinhos Populares, organizada pela TAREA (Lima,
1983).

197
K:Epo

ATEN-ÇÃO NAVE EXPLO-RA-DO-RA


A-QUI CO-MAN-DO SU-PRE-MO
INFOR-MEM SO-BRE SUA MIS

Eugenio Cordero. 1 Oficina Centro-americana de Quadrinhos Populares, organizada pelo


ALFOJA (San José, 1982).

198
Sequência sobre o enquadramento, por Heriberto Valdés. 1 Oficina Centro-americana de
Quadrinhos Populares, organizada pelo ALFORJA (San José, 1982).

Y
ES

Segiiência sobre metáforas visuais, por Jaime Luna. Il Oficina Nacional de Quadrinhos
Populares, organizada pelo TAREA (Lima, 1981).

199
POR QUE NÃO
CONSIGO PENSAR

Segiiência sobre ângulos de visão, por Alfredo Dominguez. Oficina Regional de Quadrinhos,
organizada pelo CIDHAL (México, 1982).

200
José Morales. Oficina Regional de Quadrinhos, organizada pela Escola de Verão de Estre-
madura (Jaraiz de la Vera, 1981).

201
VAMOSELEcER O vizamo |/ nnua.| | NESSA NOITE EM CASAA
COMO DIR+- HE eva, MAVIZI MUÚER
BENpoa E Desa |
o || DISCUBRÃOcd
SOLIDÁRIO E CON- ROO BURT ||COMPRE- É HORAS.
FIA TODOS NOS PA- Quefu tora. [ENDER
RA SOLUCIONAR NoS- Va NA asse. mm
SOS PROBLEMAS
EMO A e

( E
QUE EE =

, GravePRA |

Za

EI PALEU LEVO
À FAIXA...

Fragmento de “A marcha”, por Lizardo Chumpitaz. História em quadrinhos vencedora do


Concurso de Arte Popular organizado pela Confederação Geral dos Favelados do Peru, em
1982. Lizardo participa da Oficina de Quadrinhosde Villa El Salvador.

202
ZEEBO EFE GOMEZ 48 DE AGOSTO DE 1984.

PORA QUE HATA PAZ, ARO... À CONFIA EM MIM,


DEVE HAVER CONFIANÇA! CONFIANÇA E POrIBIVHA?... APROXIME-SE
NÃO ESTA" CERTO? 4 FUNDAMENTAL, SEJAMOS AMIGOS. MOS
TO JACARÉ! PAZ ENTRE NOS DOIS!

QUEM AEREDITA
EM PAZ NESTES

Jafeth Gómez, cartunista camponêsda região do Cauca. 1 Oficina Colombiana de Quadrinhos


Populares, organizada pelo CINEP (Bogotá, 1984).

203
r
criando Cardozo, animador de educação popular. | Oficina Colombiana de Quadrinhos
Populares, organizada pelo CINEP (Bogotá, 1984).

204
ans0€
TOING?

b
y
o)
UMA ONOMATOPÉIA)

NA CLANDESTI -

ES
NiDA DE

Colombia.

Eduardo Márquez, estudante universitário. 1 Oficina Colombiana de Quadrin


hos Populares,
organizada pelo CINEP (Bogotá, 1984).

205
TiPicolt
OUTRO MACHISTA
EM CRISE,

Juan Escobar,professor nicaragiiense.1 Oficina Colombiana de Quadrinhos Populares, organi-


zada pelo CINEP (Bogotá, 1982).

206
A BETERRABA
(Beta Volgaris )

A As folhas são verde escuras


com nervuras vermelhase arroxea.
dos.À variedade mais conhecida

Jenny Alfaro, promotora de educação popular, Comas (Lima, LOSS)

207
E Ny
=

|
y

E
SS

UlfBaumgártner. Exer. cício de plano:s. 1 Oficina Alemã de Quadrinhos Populares, organizada


por AG SPAK (Munique, 1986,

208
Edilberto Rojas, estudante universitário colombiano. Publicado em El Mosquito, boletim
informativo dos quadrinhos populares peruanos(Lima, 1986). (Os primeiros conquistadores
espanhóis chamavam de muiscas ao povo chibcha, que habitava a atual Colômbia. N.T.)

209
BIBLIOGRAFIA

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TEXTUAL (nº9). Número dedicado a Augusto Salazar Bondy. Lima, Revista
del Instituto Nacional de Cultura, dez. 1974.

212
ÍNDICE

Prefácio
Introdução ....

I- O QUE É A HISTÓRIA EM QUADRINHOS...............

H - OS PERSONAGENS 21
- Construção da cabeça .. 22
As expressões de ânimofaciais . 25
Expressões básicas 25
Expressões derivadas 28
Intensidade da expressão . 30
Sinais gráficos que enfatizam a expressão .. 31
Movimento da cabeça................. 35
Movimentoslaterais da cabeça . 35
A cabeça conforme o ângulo devisão..............seetereeeeseneeres 37
Breveaventura pelos caminhos do desenho naturalista 40
A figura humana, realidade e proporções... 42
Construção do corpo...... 45
O plano 45
Movimento do corpo .... 48
À expressão corporal 53
Expressões básicas 53
Sinais e expressões.............. 57
Psicologia do personagem ... 59
Duas propostas 59
O tipo e a história do personagem . 59
As proporções da imaginação 63
Formasantigas e formas novas. 63
Rabiscos e manchas 65

213
Natureza da linguagem dos quadrinhos:tinta sobre papel ......... 67

HI - A VINHETAE A SEQUÊNCIA................... srs 69


Elementos da vinheta:
1. O enquadramento ... 7
* Osplanos................ a
* Osformatos............. . 86
2. O ângulo devisão 91
3. Ostextos 97
. 97
* Oletreiro.. 125
* A onomatopéia.............. 130
* O conteúdo dostextos ... 135

Os quadrinhos: um meio de comunicação de massa 137


* A origem dos quadrinhose a indústria jornalística . 137
Primeira metade do século XX: o império dos quadrinhos
norte-americanos................ cs eerrreeererereeaeaeeeerereserareneanasas 138
Segunda metade do século XX: a nova história em quadri-
nhos 141
4. As metáforas visuais.. 146
5. As figuras cinéticas ... 151
6. A composição ..... 154
* A ação do espaço .... 160

IV - A MONTAGEM 169
1. Recursospara ligar as vinhetas... 170
2. Estruturas especiais de montagem... 173
3. Estruturas temporais de montagem .... 175
4. Estruturaspsicológicas de montagem 176

V- A HISTÓRIA EM QUADRINHOSPOPULAR...................... 183


1. Comofazer histórias em quadrinhos......... 183
2. Umanovaetapa: a “oficina-concentração 186
3. Dinâmicas para a participação 190
4. A formação de promotores... 193
5. O movimento e o sonho... 193

Epílogo 196
Bibliografia 210

214
ÍColeção CONTATO IMEDIATO
MARKETING
Francisco Gracioso

PRODUÇÃO GRÁFICA
Mário Carramillo Neto

MÍDIA
Mizuho Tahara

PLANEJAMENTO DE PROPAGANDA
Roberto Corrêa

CRIAÇÃO DE PROPAGANDA
Julieta de Godoy Ladeira

PROPAGANDA
Ricardo Ramos

PESQUISA DE PROPAGANDA
Sérgio P. de Queiroz Cotrim

OPINIÃO PÚBLICA
Tupã Gomes Corrêa

COMO FAZER HISTÓRIAS EM QUADRINHOS


Juan Acevedo

SIGNOS DO DESIGN (Prelo)


Wilton Azevedo

ATENDIMENTO DE PROPAGANDA(Prelo)
Eloy Simões

EMBALAGENS(Prelo)
Dalva S. Bolognini e Nelson D. Bavaresco

N J
Contato Imediato

COMO FAZER
HISTÓRIAS EM
QUADRINHOS

Juan Acevedo é considerado um dos melhores


humoristas gráficos da América Latina.

Este livro nasceu do apaixonante intento de pro-


mover a consciência crítica e de libertar as possibili-
dades de expressão no Peru.

Apresentando uma alternativa viável para o


aprendizado da utilização da linguagem dashistórias
em quadrinhos, de modo simples e prático, defende a
tese de que os quadrinhos são umaarte para o povo e,
em sua mais ética realidade, devem constituir sua voz
e seu olhar.

“y
global editora

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