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ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico E-book transcrito a partir da aula do Professor Thiago de Melo Costa Pereira
Volume V
EXPEDIENTE:
Autor: ICTQ – Instituto de Pesquisa e Pós-Graduação para o Mercado Farmacêutico
Revisão Técnica: Farmacêutica Me. Juliana Cardoso
Produção: Vitae Editora
Edição: Egle Leonardi e Jemima Bispo
Colaboraram nesta edição: Erika Di Pardi e Janaina Araújo
Diagramação: Cynara Miralha
Vitae Editora
Anápolis (GO), 2022
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FARMACOTERAPIA E FISIOPATOLOGIA DO SISTEMA CARDIOVASCULAR E Aqueles que mais expressam possuem maior produção de angiotensina 2. Tal fator pode
RESPIRATÓRIO estar relacionado ao quadro de hipertensão.
Dessa forma, ao observar o mosaico, percebe-se que, para cada fator, o indivíduo poderá
O mosaico abaixo foi feito por Irvine H. Page, um hipertensólogo muito importante na ter uma boa resposta de queda de pressão. Muitas vezes, o profissional de saúde pode administrar
história do entendimento e desenvolvimento das doenças cardiovasculares: diurético para reduzir o sódio, porém, o problema do paciente não é o balanço de sódio, mas
o fator idade, ou seja, ele pode envelhecer e sofrer mudanças na pressão arterial.
Cérebro: o cérebro está muito vinculado ao aumento da pressão arterial, porque ele faz a
atividade simpática, liberando mais noradrenalina, aumentando a resposta simpática renal
e aumentando, também, a avidez ao sódio. Vale ressaltar que o sistema simpático causa
vasoconstrição.
Há um estudo realizado com o probiótico ‘kefir’, uma mistura de bactérias e leveduras. Adaptado de Kaplan, 1998.
No estudo, foi demonstrado experimentalmente e clinicamente os benefícios do probiótico.
Experimentalmente, ele ocasiona a redução da pressão arterial, melhora da função endotelial
Analisando o esquema acima, se tais tipos de influências forem combatidos (sódio, número
e redução da pressão arterial e de angiotensina 2. Recentemente, o estudo mostrou que o de néfrons, estresse, alterações genéticas, obesidade e fatores derivados do endotélio), pode
‘kefir’ é capaz de ter alguns peptídeos e inibir a ECA, enzima conversora de angiotensina, haver melhoras de respostas, culminando no produto.
ou seja, a ECA pode prejudicar a produção de angiotensina 2, gerando o efeito semelhante
ao captopril. O produto é natural e pode ser consumido livremente pela população, atuando No esquema, o autor faz a conta: PA=DC X Resistência periférica. No entanto, a ideia de
Kaplan é alterar a pré-carga (volume sistólico), a força de contração e frequência. Tais fatores
como um nutracêutico.
mexem diretamente no débito.
Caso contrário, se o paciente não obedecer a essas mudanças de estilo de vida, fatalmente,
ele será refém de pluriterapia, polifarmácia, aumento de efeitos colaterais e elevação de
dose. Isso porque a resposta tradicional não ocorre em uma dose terapêutica para a maioria
dos pacientes. Vale ressaltar que a resistência vascular periférica também está vinculada
à atividade simpática, que está atrelada ao sistema renina angiotensina, alterações de mem-
brana celular que levam ao metabolismo diferente de sódio e mecanismos de segundos
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mensageiros, podendo fazer com que mais cálcio entre na célula, aumentando ainda mais Na imagem abaixo, o indivíduo desenvolve danos endoteliais por diversos motivos:
a resistência. Também há fatores que levam à hipertrofia muscular lisa, culminando no
aumento da resistência vascular.
Vale lembrar que a hipertrofia estrutural não é mediada apenas por alterações genéticas,
mas envolve um excesso de insulina. Assim, percebe-se uma interação entre diabetes,
hiperinsulinemia e hipertensão. As doenças se conectam.
Por isso, a figura acima traz a reflexão de que a farmacoterapia é apenas um coadjuvante
no processo que pode modular as respostas pressóricas por mudança de estilo de vida.
O gráfico abaixo representa a hipertensão arterial primária (rosa), a qual abrange a maioria
da população, e a hipertensão secundária (azul), provocada por um motivo:
HIPERTENSÃO SECUNDÁRIA
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Na imagem acima, observa-se o clip sendo introduzido na artéria renal de um camundongo.
Ao induzir a clipagem de uma das artérias renais, um rim fica atrófico e o outro compensa,
desenvolvendo uma hipertrofia do rim chamada ‘contralateral’.
Foi a partir dos estudos de Goldblatt que se descobriu como o sistema renina-angiotensina
é deflagrado.
Observa-se que há uma clipagem da artéria renal. O animal foi dissecado, os pesqui-
sadores separaram toda a estrutura: aorta, artéria renal e rim. Com a estenose da artéria
renal, diminui-se a perfusão intrarrenal, gerando um aumento da produção de renina e da
proteína. A renina converte o angiotensinogênio em angiotensina 1, a qual é convertida em
angiotensina 2, por meio da ECA. A angiotensina 2 já possui seus efeitos locais, mas também
se distribui ao longo do organismo. A renina também pode contribuir para angiotensina 2
no plasma, a qual aumenta a resposta simpática, a resistência vascular e a pressão arterial.
Lembrando que a angiotensina 2 também pode se acumular facilmente no rim contralateral.
Esse padrão desencadeado pela angiotensina 2 se assemelha em um indivíduo com estenose
que não foi feita por clipe, mas recebeu uma estenose devido a uma artéria de má formação
anatômica. Se houver uma oclusão parcial por formação de placa, o rim passa a receber
menos sangue e desencadeia todo o mecanismo compensatório, a fim de aumentar a pressão
arterial do paciente e melhorar a perfusão do rim que estava com pouco sangue. No entanto,
o indivíduo se torna hipertenso às custas de um rim mal perfundido.
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Ao medir a pressão arterial em um indivíduo, não é possível identificar se ele tem hiper- Resumindo: O paciente que tem hipertensão renovascular possui prejuízo da perfusão de
tensão renovascular apenas pelo valor-pressão. O paciente apresentará alguns sinais carac- um dos rins, libera renina, produz angiotensina 1 e gera angiotensina 2, cujo excesso é um
terísticos da doença por meio do tratamento ou por meio de exames mais detalhados como gatilho para o desenvolvimento da hipertensão.
arteriografia.
O indivíduo da imagem abaixo pode ter uma cura da hipertensão se uma reconstituição
Para resumir: da artéria for feita:
Atualmente, tal reconstituição ocorre com stents, muito utilizados em coronárias. Por
meio deles, é possível desobstruir o rim em partes. Dessa forma, ele consegue novamente
ser melhor perfundido, produz menos renina e, consequentemente, menos angiotensina 2.
As quatro vias mais comuns para que a renina seja liberada são: queda do sódio, pressão O indivíduo que tem má formação anatômica também sofre de hipertensão secundária.
de perfusão da arteríola aferente, vasodilatação intensa e aumento da atividade simpática. De acordo com a imagem abaixo, o coração passa pela aorta e, de repente, faz uma estenose:
Vale ressaltar que no próprio sistema renina-angiotensina há uma via de escape que é:
angiotensina 2 perde um aminoácido pela ECA2 e se transforma em angiotensina 1-7, a qual
tem efeitos contrários à angiotensina 2, atuando na redução da pressão arterial.
Recentemente, descobriu-se uma via alternativa pela ECA2 que, ao perder um aminoácido,
virava o oposto. Fala-se muito sobre a ECA2 na história porque ela é uma enzima para
a angiotensina 2, mas também é uma fechadura para o COVID-19 entrar na célula. Trata-se
de uma proteína que tem uma função extra que pode ser uma solução para que o sistema
não tenha um aumento da pressão arterial de maneira absurda.
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Abaixo do fechamento indicado pela seta, o paciente tem baixa pressão. Dali para cima, Tireotoxicose: o paciente produz muito T3 e T4. Quem tem hipertireoidismo são pacientes
a pressão está muito alta e o coração pode desenvolver hipertrofia. que passam a ter a glândula liberando T3 e T4 em uma primeira fase. Depois, não há mais
produção de T4 e o paciente evolui para o hipotireoidismo. Na fase de tireotoxicose, em
Isso é chamado de ‘coarctação da aorta’. Pelo hipofluxo passa menos sangue nos rins.
plena liberação dos hormônios, o paciente desenvolve hipertensão.
Naturalmente, o indivíduo desenvolverá hiperemia devido à coarctação.
Os fármacos que podem ser hipertensores são: corticoides (tanto oral quanto parenteral),
Se medida no braço, a pressão estará alta, mas, se for medida na perna, ela estará baixa.
AINES, anfetaminas, anabolizantes, descongestionantes, ciclosporina, alguns antidepressivos,
Tomar anti-hipertensivo não será bom para o paciente, porque ele terá prejuízo da função
renal. cocaína, EPO (eritropoetina), ergotamínicos, T3 e T4, contraceptivos entre outros.
Os portadores de coarctação geralmente são crianças, devido à má formação anatômica. AINES: as prostaglandinas têm participação humoral na ação vasodilatadora, em especial
A coarctação agravou-se ao longo do crescimento da criança, mas pode ser resolvida cirur- a prostaciclina (PG2). No parênquima renal, ela funciona para aumentar a excreção de sódio
gicamente. Normalmente, as coarctações não são benignas e merecem uma correção, feita e água. O uso de AINES pode aumentar a pressão arterial, sendo dose-dependente ou
por meio de stents. tempo-dependente. Isso serve de alerta para os idosos.
De forma geral, leva-se alguns períodos para descobrir coarctações em crianças. A doença Anfetaminas: por aumentarem a oferta de noradrenalina e dopamina, aumentam
ocasiona sinais de cansaço, taquicardia, sudorese. A criança pode ser agitada, devido a resposta simpática, culminando no aumento de débito cardíaco e de resistência. Trata-se
à resposta simpática compensatória, porém em alguns momentos, ao medir a pressão pela de um efeito indissociável das anfetaminas.
perna, o valor está muito baixo. Ao realizar exames de tomografia, percebe-se uma hipertrofia
cardíaca incomum na infância. Anabolizantes: a testosterona aumenta o débito cardíaco e a resistência vascular.
Alguns indivíduos que têm o diagnóstico de apneia do sono, tratados cirurgicamente ou Alguns antidepressivos: os antidepressivos que mais aumentam a pressão arterial são
com uma bomba positiva de pressão, podem ter a correção da pressão arterial, principalmente, aqueles que elevam a concentração de noradrenalina, dopamina e, secundariamente,
enquanto dormem, porque o normal é observar uma queda da pressão arterial durante serotonina. Entre os antidepressivos que causam esses efeitos estão: venlafaxina, desven-
o sono. Geralmente, o indivíduo com apneia é o oposto. Ao fazer o MAPA, encontra-se lafaxina, bupropiona, duloxetina, sibutramina. Tais medicamentos não bloqueiam nenhum
o aumento da pressão arterial enquanto dorme. Isso é um gatilho que deve ser investigado receptor alfa, aumentam a oferta de noradrenalina e são os que mais contribuem para o
mais detalhadamente. aumento da pressão arterial. Em associação com anfetamina, o paciente perde peso
e desenvolve hipertensão.
IRC: se o indivíduo fizer transplante e receber um rim saudável, ele deixa de ser hipertenso.
Cocaína: o mecanismo de ação da cocaína é muito semelhante ao das anfetaminas. Pode
Aldosteronismo primário: pode ser um tumor na glândula suprarrenal que produz haver indivíduos que abusam da cocaína e desenvolvem hipertensão secundária.
aldosterona. Se o paciente fizer uma adrenalectomia e retirar o tumor, ele deixa de produzir
EPO: hormônio produzido pelo parênquima renal. Se usado de forma abusiva aumenta
aldosterona e não será mais hipertenso.
muito o hematócrito, podendo elevar a pressão arterial. Em paciente nefropata que utiliza
Síndrome de Cushing: o excesso da produção de cortisol também aumenta a ação EPO, mas em dose de suplementação, a chance de desenvolver hipertensão não é tão relevante
mineralocorticoide, mas também pode ser corrigido por adrenalectomia e controle na produção como nos casos de abuso do medicamento.
do cortisol. Ergotamínicos: são antienxaquecosos que possuem ação vasoconstritora e seu uso
prolongado pode trazer danos.
Feocromocitoma: tumor na medula da suprarrenal. O indivíduo produz muita adrenalina
e é hipertenso até tratar a feocromocitoma, que pode ser combatida com adrenalectomia. T4 e T3: o T4 aumenta a sensibilidade do coração à noradrenalina e eleva a pressão arterial.
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Contraceptivos: não importa se orais ou parenterais, todos eles aumentam, em média,
de 15 a 20 milímetros de mercúrio de pressão arterial. Esse efeito deve ser considerado,
principalmente, em mulheres que ultrapassaram os 35 anos de idade.
Na tabela abaixo, é possível observar mais detalhadamente os fatores que podem ser
sinais de uma hipertensão arterial secundária:
Idem Arq Bras Cardiol 2016; 107(3Supl.3):1-83 PRINCÍPIOS GERAIS DO TRATAMENTO MEDICAMENTOSO DA HA
O hipotireoidismo pode elevar a pressão arterial devido a uma retenção hídrica (volume),
enquanto o hipertireoidismo eleva a pressão arterial devido ao aumento do débito cardíaco,
de frequência e força.
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Os efeitos adversos da farmacoterapia crônica são maiores que os próprios sintomas da o quinto tempo de meia-vida. Isso se aplica a uma série de fármacos. Para tomar a decisão
hipertensão. Isso dificulta a adesão ao tratamento. O esforço gira em torno de mexer na correta de substituição da dose, o farmacêutico precisa ter uma ideia do momento em que
balança acima para que os efeitos adversos sejam mínimos, pois a hipertensão não tem sintoma o fármaco se encontra no plasma. Às vezes, ele não alcançou ainda a altura ideal e, sendo
importante. Quando o indivíduo desenvolve grandes sintomas, ele já apresenta lesões de assim, não se deve interferir.
órgãos-alvo que o tornam inativo, mas não é pela pressão em si. Exemplo: o indivíduo
infartou devido à hipertensão. Vale ressaltar que alguns anti-hipertensivos têm o desfecho de inibição enzimática por
inibir uma enzima que pode levar mais de tempo, lembrando que muitas têm ação intracelular
e culminam na menor produção do metabólito e, consequentemente, na redução da pressão
arterial, ao longo do tempo. Por isso, é importante não ter pressa;
Dor no peito: também pode ser confundida com distúrbios gástricos. Há uma dor referida
Ao conversar com os pacientes, o farmacêutico deve: muito semelhante, o indivíduo tem gastrite e acha que está infartando. Por isso, é bom
acompanhar a descrição de dor no peito.
• Instruir sobre a doença, a importância do tratamento continuado, efeitos adversos
e objetivos terapêuticos, mas não deve ler a bula para o paciente a fim de relatar todos os Dor no braço esquerdo: dependendo do incômodo e da gravidade, o paciente precisa ser
efeitos adversos; levado rapidamente ao hospital e fazer um eletrocardiograma, porque, muitas vezes, o exame
aponta uma elevação chamada ‘ST’, por meio da qual é possível detectar um quadro de
• Questionar se é bem tolerado pelo paciente. Exemplo: há uma senhora que canta no coral
infarto ou será colhido o sangue para fazer a detecção das enzimas cardíacas.
da igreja e ela não se sente bem, porque toma enalapril e o medicamento pode produzir tosse
seca por uns três meses. Nesse caso, o farmacêutico precisa utilizar outra estratégia, com Edema: questionar se o edema ocorre em apenas um pé ou se é bilateral patente, porque
base no mosaico de Page; se for, significa que o retorno venoso não está tão bom. Diante de um retorno venoso
comprometido, o líquido começa a extravasar para fora do vaso.
• Questionar qual a dose inicial, se o ideal seria começar o tratamento com uma dose alta
ou baixa, com base no nível de pressão arterial do paciente. Deve-se pensar que, quanto Dispneia ou ortopneia: no caso da dispneia, o paciente sente um cansaço para respirar
mais idoso for o paciente, o ideal é privilegiar o ‘step up’, ou seja, começar com doses baixas de qualquer forma. No caso da ortopneia, o paciente só sente cansaço ao deitar-se.
e aumentar ao longo do tempo;
Estase jugular: pode ser um indício de insuficiência cardíaca e é notada sem precisar de
• Questionar se é mono ou politerapia. Sabe-se que em alguns níveis de pressão arterial palpação. Com a chegada de sangue, há uma certa congestão para a região da cava, a qual
é melhor atacar com fármacos de classes diferentes e iniciar em doses baixas, a fim de começará a refluir para os leitos adjacentes.
desfrutar melhor do efeito que eles desencadeiam sem tantos efeitos colaterais. Exemplo:
diuréticos + inibidor da ECA, hidrocloro + losartana etc. Atualmente, julga-se que a pluriterapia
favorece a adesão ao tratamento;
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Cianose: pode ocorrer devido a problemas respiratórios. Um indivíduo com COVID-19 pode
desenvolver cianose, bem como um fumante. O paciente também pode desenvolver um quadro de
cianose não por problema pulmonar, mas pela fração de injeção. A insuficiência cardíaca também
contribui para a cianose.
Queixas do próprio paciente: é necessário deixar o paciente falar e saber ouvi-lo. Cada atendimento
gera um novo aprendizado.
Ficar atento é reunir alguns sinais que podem apontar para algo mais grave.
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