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Guimarães Rosa:

um (re)inventor da linguagem
Mineiro, de Codisburgo, nasceu em 1908.
Demonstrou, desde cedo, seu interesse por
línguas e por elementos relacionados à
natureza.
Formado em Medicina, exerceu a profissão
pelo interior de Minas Gerais. Porém,
abandou a carreira para se dedicar à
diplomacia.
Em 1963 (06 de agosto), foi eleito membro
da Academia Brasileira de Letras, porém
tomou posse apenas quatro anos depois: em
16 de novembro de 1967. Faleceu três dias
após sua posse.
Estreia no mundo literário em 1946, com a
publicação de Sagarana: uma coletânea de
contos de cunho regionalista, surpreendendo
a crítica devido à originalidade da linguagem
e às técnicas de narrativa, apontando uma
mudança substancial na prosa regionalista de
até então.
Obras publicadas:
- 1936: Magma; (livro de poesias com o qual ganhou
o concurso promovido pela Academia Brasileira de
Letras);
- 1946: Sagarana;
- 1956: Corpo de baile (novelas, publicado
atualmente em três partes: Manuelzão e Miguilim,
No Urubuquaquã, no Pinhém e Noites do Sertão);
- 1956: Grande sertão: veredas;
- 1962: Primeiras estórias;
- 1967: Tutaméia – terceiras estórias.
Publicações póstumas:
- 1969: Estas estórias;
- 1970: Ave, Palavra;
- 2011: Antes das primeiras estórias.
A narrativa para além do
regionalismo

Ainda que a prosa regionalista na literatura


brasileira date da literatura da primeira
metade do século XIX, iniciando-se no
Romantismo, Guimarães Rosa diferencia-se
por trazer aos seus textos elementos
universais, indo além do regionalismo e dos
problemas vividos (quase que
exclusivamente) pelo homem do sertão.
Inova, ainda, na linguagem, recriando na
literatura a fala do sertanejo tanto no plano
do vocabulário quanto no plano da sintaxe (a
construção das frases). Nesse sentido, dá voz
ao homem do sertão por meio de técnicas
como o foco narrativo em 1ª pessoa, o
discurso direto e o discurso indireto livre.
A língua falada no sertão está presente em
toda sua obra, resultado da longa
observação, de anotações e pesquisa
linguística.
Neste fragmento de “Sarapalha”, conto
publicado em Sagarana, é possível observar
o conhecimento minucioso que Guimarães
Rosa revela da vegetação e da língua
regionais:
“Aí a beldroega, em carreirinha
indiscreta – ora-pro-nobis! – apontou
caules ruivos no baixo das cercas das
hortas, e, talo a talo, avançou. Mas o
cabeça-de-boi e o capim-mulambo, já
donos da rua, tangeram-na de volta; e
nem pôde recuar; a coitadinha rasteira,
porque no quintal os joás estavam
brigando com o espinho-agulha e com o
gervão em flor.”
Neste outro excerto, inicial da obra-prima
Grande sertão: veredas, é possível observar
a preocupação com a construção sintática e
melódica das frases:
“– Nonada. Tiros que o senhor ouviu
foram de briga de homem não. Deus
esteja. Alvejei mira em árvore, no
quintal, no baixo do córrego. Por meu
acerto. Todo dia isso faço, gosto; desde
mal em mim mocidade. Daí vieram me
chamar. Causa dum bezerro, um bezerro
branco erroso, os olhos de nem ser.”
ROSA, Guimarães. Meu tio Iauaretê. In: _____. Estas
estórias.
Em sua linguagem, Guimarães Rosa vai além
do propósito de retratar realisticamente a
língua do sertão: tomando por base a língua
regional, recria a própria língua portuguesa,
pautando-se em termos já em desuso, na
criação de neologismos, no emprego de
palavras tomadas de empréstimo a outras
línguas e na exploração de novas estruturas
sintáticas. Soma-se a isso o fato de se construir
uma narrativa que usa de recursos mais
comuns à poesia (ritmo, aliterações,
metáforas, imagens), resultando em uma prosa
altamente poética.
A literatura de Guimarães Rosa ultrapassa o
regionalismo, transpondo o espaço em que
quase sempre se situam seus textos,
alcançando uma dimensão universal: “o
sertão é o mundo” (afirmação de Riobaldo,
protagonista de Grande sertão: veredas). A
narrativa roseana envolve o leitor de modo a
se ver como sendo também um sertanejo e
jagunço, fazendo parte daquele mundo.
Assim...
... o leitor passa a lidar com os mais variados
temas, na medida em que vai se
identificando com as preocupações do
homem sertanejo: o bem e o mal, Deus e o
diabo, o amor, a violência, a morte, a
traição, o sentido e o aprendizado da vida, a
descoberta infantil do mundo, dentre outros
elementos: reflexões / inquietações /
angústias / conflitos / anseios que envolvem
não apenas o homem do sertão.

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