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DESAFIOS DA IMPLANTAÇÃO E CONSOLIDAÇÃO DA

EDUCAÇÃO TÉCNICA E PROFISSIONAL NO BRASIL

por Silvana Soares Lacerda - sexta, 15 mar 2024, 09:09

A história da educação brasileira é marcada por diversos contrastes nos conteúdos,


currículo, formas de acesso e permanência. Os acontecimentos mundiais como a globalização
são o marco para as significativas mudanças partir da nova ordem neoliberal fundada no
individualismo e competitividade. O resultado disso foi o sucateamento e privatização, com
intervenção mínima do Estado sobre a sociedade civil. No campo político, disputas de poder
entre profissionais liberais, ruralistas, militares e religiosos. Nada diferente do que acontece
hoje. No campo educacional, tendências pedagógicas conservadoras e progressivas. No
campo científico, visões epistemológicas positivistas e humanistas. Nesse cenário de guerra
surge a Educação Profissional Brasileira, marcada pela dualidade que sempre permeou as
relações de poder no Brasil.

No início do Séc. XX, a Educação Profissional no Brasil adotou um caráter


assistencialista com base de instrução teórica e prática para o ensino industrial. O Projeto
Pedagógico era pautado na transmissão repetitiva de métodos e práticas de ensino centradas
no professor e em manuais técnicos. Os meninos "pobres e humildes" eram incumbidos de
exercer ofícios de carpintaria, tornearia, alfaiataria, sapataria, entre outros. Do outro lado, a
Educação Básica era propedêutica para elites com ensino das Ciências, Letras e Artes. O
poder aquisitivo garantia a formação intelectual clássica nas escolas privadas e os sem poder
aquisitivo dispunham de formação intelectual técnica nas escolas públicas. No início da
década de 20, houve um esforço público para modificar o caráter assistencialista para preparar
operários para a formação profissional. Surge o movimento da Escola Nova, resistente à
ordem moral e religiosa com incentivos à implantação de escolas públicas com ensino laico
voltado para a cidadania e conhecimento científico.

Os Anos de Chumbo (1964-1985) foram marcados pela tendência tecnicista nas


escolas. Houve grande estímulo à implantação de multinacionais, a criação do vestibular
classificatório, a substituição de disciplinas humanistas por nacionalistas e moralista, a
proibição de manifestação pública dos professores, estudantes e funcionários das escolas, a
burocratização do ensino, o controle dos conteúdos, o direcionamento e planejamentos
educacionais e por fim; o uso da repressão. Notamos uma tradição instrumentalista das
relações entre escola e as classes dominantes. Boudieu & Passeron (1975) já denunciavam o
ofuscamento da subjetividade dos indivíduos pelo poder de dominação da lógica totalizante
da educação técnico - profissionalizante.

Atualmente, a Educação Profissional se estrutura em um conceito de Politecnia, onde


prevalece a ideia de multiplicidade das atividades pensadas a partir da apreensão do real,
potencializando o ser humano. Dessa forma, podemos escolher entre ser artista, comerciante,
operário, político, servidor público, exercendo a cidadania e superando a razão instrumental
em um processo educacional que estimula a imaginação, a criação, a crítica e a autocrítica. A
Educação Profissional se recusa formar "consumidores" em lugar de cidadãos. Para isso,
todos enquanto agentes políticos, devemos estar comprometidos com um projeto democrático,
de valorização da inclusão e equidade em uma sociedade fundada na igualdade política,
econômica e social com uma escola vinculada ao "mundo do trabalho" e não ao "mercado de
trabalho". É um caminho árduo e possível à medida que nossas experiências vivenciadas em
todos os espaços da sociedade, de forma articulada, exercerem função educadora na busca da
construção de uma cultura fundada na solidariedade entre indivíduos, povos e nações.

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