Você está na página 1de 32

Políticas Educacionais

Aula 3
Turma: Ciências Biológicas 4ª fase – 2022/2
Professora Vanessa dos Santos Moura
07/10/2022
A “nova” direita e as
transformações na pedagogia da
política e na política da pedagogia
Tomaz Tadeu da Silva
TURMA DA MÔNICA EM
“CIDADANIA”
“Gibi divulga liberalismo nas escolas”

 São Paulo, terça-feira, 15 de março de 1994


 LUIS HENRIQUE AMARAL
DA REPORTAGEM LOCAL
 A Turma da Mônica está ensinando princípios do liberalismo para crianças entre
7 e 14 anos das escolas municipais. Desde o começo do ano letivo, os alunos
estão recebendo um gibi da Mônica sobre a crise econômica brasileira feita pelo
Instituto Liberal. Nele, o "monstro" inflação – que rouba e come o dinheiro do
Cebolinha – é gerado pelo governo, que "gasta mais do que arrecada".
“Gibi divulga liberalismo nas escolas”

 A razão do déficit, segundo a cartilha liberal (e sua versão infantil, o gibi), é que o
governo atua "em áreas que não deveria".
 A revistinha afirma: "com o passar do tempo, o Estado acabou entrando em
outras áreas, extração de petróleo, transporte, turismo, esportes etc." A
publicação está sendo usada para fundamentar debates entre professores e
alunos.
 Segundo o gibi, "com tantas atribuições, o governo precisa arrecadar mais, por
isso aumenta os impostos". Em tom "crítico", a revista mostra Cebolinha
espirrando. Ao seu lado, um homem usando uma cartola onde está escrito
"governo" diz: "Será que tem algum imposto sobre espirro?"
“Gibi divulga liberalismo nas escolas”

 No quadrinho seguinte, o gibi joga a culpa pela sonegação de impostos no


governo.
 "Com tanto imposto, há muita sonegação", diz o narrador, e aparecem dois
sonegadores bem-vestidos, com sacos de dinheiro na mão, correndo de um leão
(símbolo da Receita Federal). Dois quadrinhos depois, a revista conclui: "o pior é
que o Estado é mau empresário".
“Gibi divulga liberalismo nas escolas”

 O gibi foi editado pelo IL (Instituto Liberal) e produzido pelos Estúdios Maurício
de Souza. Segundo Alberto Machado, diretor do IL, seu objetivo é divulgar os
ideais do liberalismo e o conceito de cidadania. Este conceito é colocado como
um "sentimento", que se reflete em fiscalizar a ação dos políticos.

 A primeira edição do gibi foi de 500 mil exemplares, ao custo de US$ 60 mil,
patrocinado pelo Bradesco, Citibank, Unibanco, Shopping Eldorado e Metalac.
“Gibi divulga liberalismo nas escolas”

 A diretora de Orientação Técnica da Secretaria de Educação, Kátia Issa Drugg, diz que
as crianças da rede municipal receberam o gibi quando visitaram a 1ª Feira da
Cidadania, promovida pelo Instituto Liberal, em maio do ano passado. "Algumas
escolas não receberam e pediram exemplares. Os pedidos foram encaminhados para
o instituto", diz.
 Kátia afirma que a secretaria apenas autorizou a distribuição dos gibis: "as
ideologias devem ser discutidas nas escolas. Não há problema nisso",
afirmou. Segundo ela, "as diretoras das escolas não podem selecionar
ideologicamente o material que recebem sob pena de serem acusadas de
partidarismo", diz.
PARA REFLETIR...

 LEVANDO EM CONTA O CONTEXTO DOS ANOS 1990 E A POPULARIDADE DA


“TURMA DA MÔNICA” NA ÉPOCA, EXISTE ALGUM PROBLEMA EM APRESENTAR O
LIBERALISMO A ALUNOS DE 7 A 14 ANOS DAS ESCOLAS MUNICIPAIS?

 QUAL PARECE SER A “QUESTÃO” NA DIVULGAÇÃO DESSE TIPO DE MATERIAL?


 “Em primeiro lugar, a cartilha é uma demonstração bastante didática do discurso
liberal que atribui à intervenção do Estado e à esfera pública TODOS OS MALES
SOCIAIS E ECONÔMICOS de nossa atual situação e à livre iniciativa TODAS AS
VIRTUDES que podem conduzir à regeneração e recuperação da democracia, da
economia e da sociedade (...)” (SILVA, 2007, p. 11. Grifos acrescentados)
 “Corrupção, ineficiência, desperdício são excrecências que sequer podem ser
traçadas a algum possível mal funcionamento da dinâmica capitalista; elas são
atribuídas, ao invés disso, a uma “política” pública que curiosamente nada deve a
seu núcleo econômico” (SILVA, 2007, p. 12).
 “É obviamente importante nesse processo de construção da hegemonia do
discurso liberal/empresarial/capitalista a criação de novas expressões e termos e
a redefinição de velhos slogans e palavras e sua vinculação respectivamente
positiva ou negativa ao CAMPO BOM (o capitalismo, a livre iniciativa, os
empresários, e suas inerentes virtudes) ou ao CAMPO MAU (a intervenção
estatal, os movimentos sociais, os funcionários públicos, os políticos e seus
essenciais defeitos)” (SILVA, 2007, p. 12. Grifos acrescentados).
 QUAL A POSIÇÃO DA EDUCAÇÃO NO PROJETO NEOLIBERAL???
 RESPOSTA: ASSUME UMA POSIÇÃO ESTRATÉGICA  LEMBRAM DOS DOIS
INTITUTOS QUE POSSUEM UMA VINCULAÇÃO ELEMENTAR COM A EDUCAÇÃO
PÚBLICA NO BRASIL...???
 “Nesse projeto [neoliberal], a intervenção na educação com vistas a servir aos
propósitos empresariais e industriais tem duas dimensões principais. De um lado,
é central, na reestruturação buscada pelos ideólogos neoliberais, atrelar a
educação institucionalizada aos objetivos estreitos de preparação para o local de
trabalho...”
 “... De outro, é importante também utilizar a educação como veículo de
transmissão das ideias que proclamam as excelências do livre mercado e da livre
iniciativa. Há um esforço de alteração do currículo não apenas com o objetivo de
dirigi-lo a uma preparação estreita para o local de trabalho, mas também com o
objetivo de preparar os estudantes para aceitar os postulados do credo liberal”
(SILVA, 2007, p. 12).
QUESTÃO

 A EDUCAÇÃO É TAREFA DO ESTADO?


RESPOSTA

CAPÍTULO III
DA EDUCAÇÃO, DA CULTURA E DO DESPORTO
Seção I
DA EDUCAÇÃO

 Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será


promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno
desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua
qualificação para o trabalho.
RESPOSTA

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;
III - pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;
IV - gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;
V - valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente
por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
VI - gestão democrática do ensino público, na forma da lei;
VII - garantia de padrão de qualidade.
VIII - piso salarial profissional nacional para os profissionais da educação escolar pública, nos termos de lei federal.         
(Incluído pela Emenda Constitucional nº 53, de 2006)
IX - garantia do direito à educação e à aprendizagem ao longo da vida.       (Incluído pela Emenda Constitucional nº 108, de 2020)
Tese do texto de Silva:

 “O Projeto neoconservador e neoliberal envolve, certamente, a criação de um


espaço em que se torne impossível pensar o econômico, o político e o social fora
das categorias que justificam o arranjo social capitalista. Nesse espaço
hegemônico, visões alternativas e contrapostas à liberal/capitalista são
reprimidas a ponto de desaparecerem da imaginação e do pensamento até
mesmo daqueles grupos mais vitimizados pelo presente sistema, cujos males,
estranhamente, são atribuídos não ao seu núcleo econômico – capitalista – mas
ao suposto fato de que ainda não é suficientemente capitalista” (SILVA, 2007, p.
13-14).
Sociedade voltada para o consumo (Z. Bauman)

 Atenção para o contexto de escritura do texto: meados dos anos 1990


 Alguma coisa mudou? Ou as coisas se agravaram?

 “Um projeto alternativo que possa servir de contraposição à ofensiva neoliberal não terá nenhum sucesso
se não compreender primeiro como funciona essa nova economia do afeto e do sentimento, na qual a
apropriada utilização da mídia adquire um papel central. (...) Qualquer tentativa intelectualista e
racionalista de apenas refutar de forma lógica os “argumentos” neoliberais está longe de compreender os
mecanismos envolvidos na economia política dos sentimentos populares habilidosamente utilizada pelos
pedagogos da livre iniciativa e do livre mercado. A luta entre sistemas alternativos de sociedade não é
uma luta intelectual entre atores bem intencionados para determinar qual o melhor sistema de sociedade
(...) mas uma luta em torno de recursos materiais, na qual uma variedade de instrumentos culturais e
simbólicos são utilizados para produzir visões e conceitos sociais conflitantes” (SILVA, 2007, p. 15-16).
HERMENÊUTICA

 “A presente ofensiva neoliberal precisa ser vista não apenas como uma luta em
torno da distribuição de recursos materiais e econômicos (o que ela também é),
nem como uma luta entre visões alternativas de sociedade (idem), mas
sobretudo como uma LUTA PARA CRIAR AS PRÓPRIAS CATEGORIAS, NOÇÕES E
TERMOS através dos quais se pode nomear a sociedade e o mundo” (SILVA, 2007,
p. 16).
 DEMIURGO – o “dador” de nomes
 HISTORICIDADE DOS CONCEITOS
 APAGAMENTO PROPOSITAL DA HISTÓRIA E, HOJE, DA CIÊNCIA
 “A intromissão de pessoas alheias ao campo da educação no fazer pedagógico,
justificada pelo simples fato de serem pagantes das escolas, de uma forma ideológica,
raivosa e desprovida de reflexão crítica, tem contaminado a saúde psicológica dos
professores”, pontua o dirigente sindical. “Isso somado a ameaças e exposição nas redes
sociais. O que leva ao sofrimento desses profissionais, que acabam não encontrando nas
suas próprias escolas a defesa de que precisam”.
 Este não é o primeiro caso ocorrido este ano. Em março, um comentário que criticava o
desperdício de água por latifundiários, postado no perfil pessoal em uma rede social
pelo professor Ronan Moura Franco, do Colégio Marista Sant’ana, de Uruguaiana, virou
pretexto para uma campanha de ódio, difamação e ameaças protagonizada nas redes
sociais por pessoas ligadas ao agronegócio, muitas delas alheias à comunidade escolar. A
escola cedeu à pressão e demitiu o professor.
 “(...) a estratégia liberal de retirar a educação institucionalizada da esfera pública
e submetê-la às regras do mercado significa não mais liberdade (a palavra-fetiche
da retórica neoliberal) e menos regulação, mas precisamente mais controle e
“governo” da vida cotidiana na exata medida em que a transforma num objeto de
consumo individual e não de discussão pública e coletiva. Nesse caso, menos
governo significa mais “governo”” (SILVA, 2007, p. 18).
Questão: por quais
motivos a escola
pública está em crise?
RESPOSTA DE SILVA:

 “As escolas privadas não são mais eficientes que as escolas públicas por causa de alguma qualidade
inerente e transcendental da natureza da iniciativa privada (o contrário valendo para a administração
pública), mas porque um grupo privilegiado em termos de poder e recursos pode financiar
privadamente uma forma privada de educação (sem esquecer a vantagem de capital cultural inicial – de
novo resultante de relações sociais de poder – de seus/suas filhos/as, em cima do qual trabalham as
escolas privadas)”.
 “As escolas públicas não estão no estado que estão simplesmente porque gerenciam mal seus recursos
ou porque seus métodos ou currículos são inadequados.”

 POR QUE ESTÃO NO ESTADO QUE ESTÃO?


POR UMA DECISÃO POLÍTICA!

 É PRECISO QUE ISSO FIQUE CLARO: HÁ UMA DECISÃO POLÍTICA POR TRÁS DISSO.
A EDUCAÇÃO PÚBLICA VEM CONSTANTEMENTE SENDO SUCATEADA COMO UM
PROJETO PARA DESTRUÍ-LA.
 “Elas (as escolas públicas) não têm os recursos que deveriam ter porque a
população a que servem está colocada numa posição subordinada em relação às
relações dominantes de poder (SILVA, 2007, p. 20)”.

Você também pode gostar