Você está na página 1de 12

O CURRÍCULO DO ENSINO MÉDIO INTEGRADO À EDUCAÇÃO

PROFISSIONAL: UMA REFLEXÃO NECESSÁRIA

Maria Alice Barauce Bento1

RESUMO

Nos últimos anos, com o avanço das políticas educacionais e a necessidade de


ampliar responsabilidades na busca da melhoria da qualidade de ensino, abriu-
se espaço para reflexões e discussões sobre uma organização curricular para o
Ensino Médio Integrado à Educação Profissional, que atendesse as
necessidades do aluno trabalhador que há muito foi desconsiderado pelo poder
público. A Rede Estadual de Ensino do Paraná- gestão 2003/2006- retoma a
oferta pública da Educação Profissional prejudicada por políticas públicas que,
financiadas pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento- BID- nos anos 90 ,
suprimiu a oferta das “habilitações técnicas”oferecendo à comunidade escolar
somente o Ensino Médio em sua forma” propedêutica”.Retomar o Ensino
Profissional após ter sido “desmontado” não é algo simples. O grande desafio
de hoje, é pensar um currículo que seja capaz de articular formação geral e
específica, valorizando métodos e conteúdos. A escola pública, para atender de
fato, as necessidades do aluno trabalhador precisa promover a formação
humana, as pessoas devem ser mais importantes que as disputas políticas e
ideológicas, é preciso formar cidadãos/trabalhadores. É nesta perspectiva que
o currículo do Ensino Profissional precisa ser enfocado, o conhecimento
científico articulado ao processo de formação para o trabalho.
O objetivo do presente texto é discutir as possibilidades de uma organização
curricular que permita aos adolescentes, jovens e adultos transformar sua
realidade a partir do conhecimento histórico-social concreto, fundamentado na
compreensão do trabalho como princípio educativo. Nesta perspectiva,
entender o significado político, social, histórico e cultural do mundo
contemporâneo, assim como discutir metodologias pedagógicas que
possibilitem diferentes técnicas de trabalho, contribuem para o processo de
formação da consciência, uma vez que, está demonstrado que o atual sistema
educacional e cultural é elemento importante na manutenção das relações
existentes de dominação e exploração em nossa sociedade.

Palavras-chave: Ensino Médio Integrado, Política educacional, Currículo,


Educação Profissional.

INTRODUÇÃO

1 Professora PDE 2007 da Rede Estadual de Ensino.


O currículo do Ensino Médio Integrado à Educação Profissional, enquanto
proposta recente implantada na Rede Estadual de Ensino deve garantir ao
adolescente, jovem ou adulto trabalhador, o direito a uma formação completa
para sua atuação na sociedade pelo exercício efetivo da cidadania. Formação
esta , que supõe adentrar nas relações sociais articulando os conhecimentos
disciplinares, que explicam os fenômenos científicos, com aqueles trazidos
pelos alunos. Implica,no entendimento de que é através do direito à plena
existência humana, da qual a educação faz parte, que o indivíduo se constitui
como ser social e também cultural (RAMOS, 1990. p:108) .
Isto só acontece através de experiências indispensáveis, que o conhecimento
científico pode proporcionar no processo de investigação das relações entre
passado/presente/futuro e, da necessidade de perceber que não é necessário
adquirir um conhecimento pronto, mas entender as causas da situação de
desvantagem em que o aluno trabalhador e a escola pública se encontram.
Torna-se indispensável entender que nas entrelinhas de um discurso
humanizador, onde existe preocupação com a educação democrática gratuita e
universal, esconde-se toda uma ideologia que visa reproduzir fielmente a idéia
que o capitalismo sempre procurou disseminar nos meios sociais, que
transformam a educação e o aluno em objetos de produção para obtenção de
lucros e manutenção do “status quo”.
[...] Tem-se tornado crescentemente óbvio ao longo da última década que
nossas instituições educacionais não são instrumentos de democracia e igualdade que
muitos de nós gostaríamos que fossem. Sob vários aspectos esta crítica tem sido
salutar, uma vez que tem aumentado nossa sensibilidade para o importante papel que
as escolas – e o currículo explícito e o currículo oculto no seu interior - exercem na
reprodução de uma ordem social estratificada que continua sendo notavelmente
iníqua em termos de classe, gênero e raça.
Embora essa crítica tenha sido salutar, ela teve talvez dois efeitos
colaterais que são, paradoxalmente, o oposto um do outro. Por um lado, ela nos fez
dar demasia importância à escola. Podemos ser levados a ver a escola como o
problema, em vez de vê-la como parte de um quadro mais amplo de relações sociais
que são estruturalmente de exploração. O segundo efeito colateral, é quase a imagem
ênfase excessiva no poder da escola ( APPLE, 2002. p:27 ).

Assim, discutir o que cabe à escola pública, o porquê dos discursos,


massivamente veiculados pela mídia, que criticam a escola, seu atraso de
conteúdo, seu distanciamento da realidade em constante mudança,
despejando a culpa pelo insucesso escolar sobre os professores, colocando-os
como incompetentes para administrar o seu trabalho e o aluno como inábil,
sem vocação para o estudo e conhecimentos para o mundo do trabalho, sem
analisar a estrutura desigual na distribuição de meios e condições materiais de
subsistência, o desastre econômico que privilegia o capital em detrimento das
pessoas, o fim dos valores éticos, precisam ser minuciosamente analisados,
pois aí está o grande desafio contemporâneo a ser enfrentado.
Sabendo-se que a escola pública precisa modificar sua prática, rever seu papel,
oferecer conhecimentos que considera importantes, torna-se urgente fazer as
mudanças necessárias que fundamentem não só o conhecimento técnico e
tecnológico mas, sobretudo, a formação de sujeitos com compromisso e
responsabilidade individual e coletiva, próprios de uma dimensão formativa.

1. A EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO CONTEXTO HISTÓRICO


BRASILEIRO

Ao longo do século XX, é necessário observar a trajetória do ensino técnico-


profissional à luz das transformações ocorridas no Brasil nesse período. As
transformações nos sistemas educacionais – e em particular as reformas
educativas - expressam projetos políticos e constituem, por excelência, um
lócus de disputa de poder. Por essa razão, as reformas educativas só podem ser
entendidas nos marcos mais amplos de um sistema social, ou seja, uma
reforma educativa constitui-se como parte de uma reforma social. Assim, para
a apreensão das transformações que ocorrem em determinadas modalidades
educacionais deve-se atentar não somente para os objetivos, ações e metas
educacionais, mas também buscar os vínculos destes à legitimação de uma
determinada ordem social.
Para um breve relato da história do ensino técnico-profissional no Brasil e das
políticas públicas que lhe deram concepção e materialidade, abordaremos o
período que vai desde a criação das Escolas de Aprendizes Artífices (1909) à
reforma da educação profissional, iniciada em l995, e chegando à atualidade. 2

Durante o período colonial e monárquico e ainda nos primeiros anos da

2 Texto apresentado ao II Congresso Paranaense de Educação Profissional, Faxinal do Céu-


PR,out.2004.
República a aprendizagem de ofícios, essencialmente pela prática, esteve
associada às atividades militares, ao trabalho servil e escravo e,
ocasionalmente, dirigida às crianças órfãs e desvalidas em reformatórios e
asilos.
A história da organização da educação profissional escolar no Brasil tem início,
efetivamente, com o Decreto n. 7.566, de 23 de setembro de 1909, que tratava
da criação de escolas de aprendizes artífices nas capitais dos Estados da
República ( BRASIL, 1909). A consulta à bibliografia especializada
( CUNHA,2000) demonstra que no momento de sua implantação as escolas de
aprendizes artífices eram muito semelhantes entre si. A instalação de unidades
em cada uma das províncias, e o seu formato, obedeceu mais a critérios
políticos que às necessidades e especificidades locais de mão-de-obra ou
formação escolar. Essas instituições cumpriram, a princípio
função assistencial segregacionista e correcional - mais do que propriamente
educacional. Seus alunos eram “ filhos desfavorecidos da fortuna”, crianças
pobres entre 10 e 13 anos, aos quais se ministrava cursos diurnos de prática de
oficina e cursos noturnos de escolarização elementar ( BRASIL,1909).
As transformações sociais e na estrutura produtiva nacional foram ao longo dos
anos de 1920 e 1930, determinando alterações nos objetivos, funcionamento e
clientela das escolas de aprendizes artífices, que passaram a denominar-se de
liceus industriais, dentre elas a do Paraná, que em 1937 transformou-se em
Liceu Industrial de Curitiba.
Em 1942 foram estabelecidas as bases da organização da rede federal de
instituições de ensino industrial em território nacional pelo Decreto-Lei n.
4.127, de 25 de fevereiro de 1942 ( BRASIL,1942). A essas instituições foi
atribuída a tarefa de preparação profissional da mão-de-obra necessária ao
processo de industrialização do país.
Com a gestão de Gustavo Capanema à frente do Ministério da Educação foram
editadas as chamadas “Leis orgânicas”,entre elas a Lei Orgânicas do Ensino
Industrial . A partir de então ficou dividido em primeiro ciclo (básico) e segundo
ciclo ( técnico) – com a organização escolar nacional,estando esta organizada
nos ramos secundário (ginasial ou comercial) , normal, industrial, comercial e
agrícola. Nesse período, diversos liceus industriais receberam a denominação
de escolas técnicas.
A Lei 3.552, de 16 de fevereiro de 1959, regulamentada pelo Decreto 47.038,
de 16 de outubro do mesmo ano, unificou o ensino técnico em todo o território
nacional, substituindo a organização por ramos de ensino . Foi concedida
autonomia didático-pedagógica, financeira e administrativa às escolas
industriais e escolas técnicas da União, que obedeciam a uma uniformidade
estrutural passando a denominar-se escolas técnicas federais.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional- Lei nº4.024, de 20 de
dezembro de 1961- garantiu ao ensino técnico industrial o estatuto de
equivalência aos demais cursos secundários, permitindo aos seus egressos o
acesso ao ensino superior.
Ao longo dos anos de 1960, as escolas técnicas federais tiveram significativo
crescimento em suas matrículas, ao mesmo tempo em que ampliavam e
diversificavam sua oferta educacional – no quadro de preparação intensiva e de
qualificação da mão-de-obra empreendido pela ditadura militar como
integrante do projeto nacional de desenvolvimento. Em função da qualidade
das instalações que possuíam, do seu quadro docente e de sua reconhecida
experiência na preparação para o trabalho, as escolas técnicas federais
passaram a ser consideradas instituições de referência para as demais escolas
de 1º e 2º graus na implementação compulsória do ensino profissionalizante,
conforme dispunha a Lei n. 5.692/71. Na busca de caminhos alternativos à
universidade foram criados os cursos de Engenharia Industrial, de duração
plena, e as Escolas Técnicas Federais do Paraná, Minas Gerais e Rio de Janeiro
os ofertavam, e então foram transformadas em Centros Federais de Educação
Tecnológica, conforme Lei n. 6.545 de 30 de junho de 1978.
O prestígio das Escolas Técnicas Federais foi crescendo, na década de 1970,
assim como a procura por seus cursos. Tal fato deveu-se, entre outros, à
implementação as equivalência aos cursos secundários; à demanda crescente
por níveis de escolaridade mais elevados para a ocupação de postos de
trabalho nas atividades produtivas industriais e de serviços; à escassez de
investimentos nas redes públicas estaduais de 2º grau e ao fortalecimento do
ensino privado pela Lei 5.692/71; à elevação da qualidade das escolas técnicas
em função dos investimentos realizados, permitindo a melhoria de suas
instalações e a capacitação se seu corpo docente.
A concepção educacional que norteou as reformas e políticas educacionais no
período de 1995 a 2002 se afinou à política de redução do papel do Estado, de
modo a favorecer o predomínio das regras de mercado no campo educacional.
Na atual conjuntura política e social do país colocam-se como desafios ao
governo federal e governos estaduais, a reversão das políticas de privatização
da educação e a construção de uma nova política que integre a educação
técnica e tecnológica, em âmbito nacional e estadual, no campo de um sistema
educacional público, universalizado e democratizado em todos os níveis e
modalidades.

2. DIMENSÃO HISTÓRICA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL NO


PARANÁ NO CONTEXTO DOS ANOS 90

A reforma da Educação Profissional apresentada pela nova Lei de Diretrizes e


Bases da Educação Nacional Lei 9394/96 e pelo Decreto n. 2208/97, definiram
a estrutura desta modalidade de ensino como complementar devendo,
portanto, a profissionalização de nível técnico ser ofertada de forma
concomitante ou seqüencial ao Ensino Médio.
No Estado do Paraná a implantação da reforma da Educação Profissional de
nível técnico ocorreu de forma impactante, como já foi apresentado em
diversos documentos, uma vez que a política educacional da época (1997), foi
decidida sob a influência da fase de negociações do Programa de Expansão,
Melhoria e Inovação no Ensino Médio do Paraná – (PROEM) - financiado, em
parte, pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento- BID.
Ao assumir a proposta do BID, o Estado do Paraná imediatamente suprimiu, a
partir de 1996, a oferta das chamadas “habilitações técnicas”, para que os
estabelecimentos de Ensino Médio passassem a ofertar na rede estadual o
Ensino Médio somente em sua forma “propedêutica”.
Neste período, ao mesmo tempo em que se desativava os cursos
profissionalizantes, também foi realizada a implantação da Reforma do Ensino
Médio, seguindo as orientações previstas no Parecer 15/98 e Resolução 03/98,
ambos do Conselho Nacional de Educação.
Com base na política de implantação do PROEM, foi instituída a Agência para o
Desenvolvimento da Educação Profissional-PARANATEC- a qual passou a ser
responsável pelo gerenciamento dos cursos de nível técnico na Rede Estadual
e, consequentemente, pelas diretrizes para esta modalidade de ensino, bem
como pelas implicações e conseqüências que hoje se apresentam. A proposta
desencadeada pela PARANATEC resultou na expansão dos cursos técnicos na
rede privada, em detrimento de sua oferta nos Estabelecimentos de Ensino da
Rede Pública Estadual.

3. A RETOMADA DA OFERTA PÚBLICA DA EDUCAÇÃO PROFISSIONAL


NO ESTADO DO PARANÁ

As primeiras iniciativas de execução de sua oferta pública foi de imediato à


criação na estrutura da Secretaria de Estado da Educação do Departamento de
Educação Profissional, dando por encerrada as atividades da chamada
PARANATEC- empresa de caráter privado que até 2002 vinha “gerenciando”
as atividades relativas à oferta da Educação Profissional no Estado, a qual foi
articulada e instituída no bojo da formulação, aprovação e implementação do
PROEM.
Com a desativação da PARANATEC instituiu-se na, Secretaria de Educação, o
Departamento de Educação Profissional - DEP - que vinha assumir a
capacidade gerencial e pedagógica necessária para implementar as ações que
iriam caracterizar o compromisso com a educação pública de qualidade. (SEED.
Superintendência da Educação. Departamento de Educação Profissional do
Estado do Paraná).
A gestão 2003/2006 da Secretaria de Estado da Educação do Paraná, ao definir
as políticas que irão nortear a Educação Profissional para a Rede Pública
Estadual, assume com convicção a diretriz de garantir a retomada desta
modalidade de ensino sabendo do enorme desafio que terá de enfrentar face,
principalmente, ao contexto que sempre caracterizou a manutenção e a
expansão desta oferta em nível público estadual.
A Educação Profissional foi a oferta educacional mais atingida pelas políticas
públicas equivocadas dos anos anteriores, as quais resultaram no desmonte da
Rede Pública de cursos profissionalizantes de nível técnico. As conseqüências
foram graves para a população paranaense em geral e em especial para os
adolescentes e jovens, aos quais foi negado o acesso à escola do trabalho.
(SEED. Superintendência da Educação. Departamento de Educação Profissional
do Estado do Paraná).
Assim, a política para a Educação Profissional- gestão 2003/2006 estabeleceu
sua linha de ação, priorizando a retomada da oferta da Educação Profissional
em nível técnico, a qual foi iniciada pela realização de estudos diagnósticos
que demonstrassem a real necessidade desta oferta de ensino, considerando
as tendências sócio-econômicas das regiões do Estado. (SEED.
Superintendência da Educação. Departamento de Educação Profissional do
Estado do Paraná).
Desta forma, a Educação Profissional objetivava oferecer a formação para o
trabalho, através de cursos de nível técnico, que viessem a favorecer a
formação do cidadão/trabalhador,que precisa ter acesso aos saberes técnicos e
tecnológicos requeridos pela contemporaneidade.
Com base nos estudos desenvolvidos pelo IPARDES/2003, apresentados no
documento “Paraná-Diagnóstico Social e Econômico”, foram destacados
os principais eixos e estratégias de ação que norteariam de forma adequada a
política de expansão da Educação Profissional de Nível Técnico na Rede
Estadual. Os critérios utilizados como referência para a expansão da oferta dos
cursos priorizaram: a política de desenvolvimento sócio econômico do Estado e
a característica de cada região. (SEED. Superintendência da Educação.
Departamento de Educação Profissional do Estado do Paraná).
Esses critérios passaram a compor então, os pressupostos básicos a serem
considerados na Política da Educação Profissional. Neste contexto, as relações
entre escola e trabalho, tornam-se elementos de suma importância na
elaboração de políticas públicas educacionais e principalmente para a
elaboração de currículos que se fundamentem nas relações entre trabalho,
cultura, ciência e tecnologia.

Para (Ramos,1990.p:116) O princípio do trabalho e da tecnologia, articulado ao


da ciência e da cultura, indicará possibilidades também metodológicas, a partir
da qual se compreendam os conceitos na sua construção histórica e com seus
múltiplos significados em termos da realidade na qual se desenvolveram e se
constituem força produtiva. O objetivo não é a formação de técnicos, mas a
formação de pessoas que compreendam a realidade e que possam também
atuar como profissionais. A presença da profissionalização ensino médio deve
ser compreendida, por um lado, como uma necessidade social e, por outro,
como um meio pelo qual a categoria “trabalho” encontre espaço na formação,
dada a desvalorização conferida pelo pensamento dominante (note-se que as
DCNs do ensino médio falam do trabalho como um contexto a orientar o
currículo do ensino médio sob os princípios da ciência,da cultura e do trabalho,
em que a profissionalização seja uma possibilidade).

“... É notório que, já há muito tempo, o forte crescimento de matrículas no ensino público
e privado não tem sido correspondido por crescimento análogo de resultados, tanto em termos
de número de formados como de grau de adestramento destes. É como se a desejável
massificação do ensino, que ao cabo de tantos anos de luta acabou sendo lograda, tivesse
reduzido a eficiência do sistema. A abertura das portas da escola à massa dos menos
afortunados não produziu os efeitos esperados e desejados, ou seja, o encaminhamento
daqueles a melhores oportunidades de inserção econômica, política e social. Em vez de a
escola elevar os filhos dos marginalizados, foram aparentemente estes que degradaram a
escola ao multiplicar as repetências e a evasão, ao introduzir nas salas de aula seu cotidiano
de violência e alienação.
Essa experiência não é apenas nossa. Demerval Saviani apresenta o seguinte quadro
do ensino público nos EUA”:

[...] escola mal equipadas, drop-outs, falta de professores e um número enorme de


diplomados do 2º grau que continuam sem saber ler, escrever e fazer contas, que não
passariam no mais tolerante dos testes de aptidão. O índice de evasão relativo aos alunos que
freqüentam a escola secundária se aproxima dos 30%. Mas o sintoma mais alarmante do
fracasso da escola pública talvez não esteja nos que pulam fora, e sim nos que permanecem
dentro e não aprendem nada. Os especialistas chamam-nos de “analfabetos funcionais”:
embora possuam diplomas, isto é, sejam nominalmente alfabetizados, na prática são incapazes
de entender, por exemplo, como funciona o metrô, e não conseguem consultar uma lista
telefônica ou ler uma bula de remédio. Em Nova York, segundo as últimas pesquisas, há 2
milhões de indivíduos nessas condições .(SINGER,Paul.Conferência de abertura da XVIII Reunião
Anual da ANPEd,out.de 1995).

“ [...] Tudo é mercantilizado. A vida é mercantilizada e como produto é padronizada. Não há


nenhum respeito para com as diferenças regionais, a cultura, o saber local. Instiga-se a
sociedade a exigir qualidade em educação. Os professores são culpados pela sua ausência,
mas os salários são miseráveis”.(AHERT,Ahori.EDUCERE-Revista da
Educação,p.129-148,vol.3,nº2).

Como diz Michael Apple (1995) :

“A escola virou supermercado. Porque as elites dominantes do mundo têm tratado a


educação como tal. Quem tem dinheiro entra e compra. Quem não tem fica do lado de fora,
olhando o grupo privilegiado aproveitar o que comprou“.

4. ENSINO MÉDIO INTEGRADO Á EDUCAÇÃO PROFISSIONAL

A educação profissional integrada ao ensino médio é um requisito importante


para a inserção no mundo do trabalho. A complexa realidade do mundo com o
trabalho em constante transformação, onde o desemprego é um dos mais
graves problemas sociais que atinge a juventude ativa do país, está a exigir
políticas públicas efetivas. Considerando que a maioria dos egressos no ensino
médio não ingressará no ensino superior, o mundo do trabalho deixa de ser
uma alternativa para tornar-se a única possibilidade de sobrevivência.
(RAMOS, p.116:190) O princípio do trabalho e da tecnologia, articulado ao da
ciência e da cultura, indicará possibilidades também metodológicas, a partir da
qual se compreendam os conceitos na sua construção histórica e com seus
múltiplos significados em termos da realidade a qual se desenvolveram e se
constituem força produtiva. O objetivo não é a formação de técnicos, mas a
formação de pessoas que compreendam a realidade e que possam também
atuar como profissionais.

A educação profissional com organização curricular integrada ao ensino médio,


tem a intenção de construir um percurso que contribua para a superação de
dicotomias antigas do sistema educacional brasileiro – articular teoria e prática
valorizando o saber científico e o saber tácito. Não há mais como separar
conhecimentos gerais de específicos , pois os conhecimentos se articulam e se
complementam .

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de globalização e o neoliberalismo estão em nossa sociedade e


isso é um fato incontestável. A escola não é auto-suficiente para lutar contra o
poder do capital, a alta competitividade e, consequentemente, a exclusão
violenta das classes trabalhadoras da Revolução Científico-Tecnológica.
(KUENZER, ano 2003 p.27).
Por sua vez, a ruptura do vínculo entre o ensino médio e o profissionalizante e
a implantação de cursos de curta duração oferecidos pelas escolas privadas
trouxe um grande prejuízo para a escola pública. Portanto, resgatar aquilo que
foi tirado do jovem trabalhador nos últimos anos não é algo tão simples. A
escola precisa readquirir a confiança da sociedade, precisa retomar sua
identidade e sua verdadeira função social que é possibilitar o acesso ao saber
científico.
Está claro para os educadores que no atual contexto da reorganização do
processo produtivo - da acumulação flexível - trabalhadores mais
escolarizados, com qualificação mais ampliada têm melhores chances no
mercado de trabalho. Entretanto, conseguir atender a expectativa daqueles
que procuram a escola pública numa perspectiva de formação integral -
formação humana, conforme requer os fundamentos pedagógicos do Ensino
Médio Integrado, exige investimento na formação continuada dos professores,
na reorganização curricular, com base no resgate do verdadeiro papel da
escola e dos profissionais que nela atuam e, sobretudo, um olhar diferente dos
dirigentes sobre os reais problemas da escola aliados à vontade política de
realmente fazer da escola pública uma escola de qualidade.
Como diz Victor Paro (2001, p.123), “A escola estatal só será verdadeiramente
pública no momento em que a população escolarizável tiver acesso geral e
indiferenciado a uma boa educação escolar”. Isto traduz, em última instância, o
objetivo da abordagem do tema de estudo.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

APPLE, Michael W. Educação e Poder; trad.de Maria Cristina Monteiro. Porto


Alegre: Artes Médicas, 1989.

BANCO MUNDIAL. Prioridades y estratégias para la educación. Estudo


Sectorial del Banco Mundial.Washington,1995.

BRASIL.MEC. Documento-base. Seminário Nacional de Educação


Profissional:concepções, experiências,problemas e propostas. Brasília,junho de
2003.

FRIGOTTO,G.; CIAVATTA, M. (Orgs.). Ensino Médio: ciência, cultura e


trabalho. Brasília,MEC,SEMTEC,2004ª.

KUENZER ,Acácia. As propostas de decreto para regulamentação do Ensino


Médio e da Educação Profissional: uma análise crítica. Curitiba,26 de outubro
de 2003, mimeo.

LIMA FILHO,D. L., A reforma da educação profissional no Brasil nos anos


noventa. Florianópolis,2002.Tese ( Doutorado em Educação)-Programa de Pós
Graduação em Educação. Universidade Federal de Santa Catarina.

PARO,Victor H. Escritos sobre educação. São Paulo: Xamã, 200l.

RAMOS,Marise. Integração Curricular dos Ensinos Médio e Técnico:Dimensões


Políticas e Pedagógicas. Texto elaborado para discussão com docentes do
sistema estadual do Paraná.

SAVIANI,Demerval. A nova lei da educação: LDB/9394/96, trajetória, limites e


perspectiva. Campinas: autores associados,1997.

SEED. Superintedência de Estado da Educação. Departamento de Educação


Profissional. Governo do Estado do Paraná.

SINGER,PAUL. ANPEd. Conferência de abertura da XVIII Reunião Anual, out. de


1995. Entrevista com Michel Apple,Zero Hora, p.40).

Você também pode gostar