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UNIVERSIDADE VEIGA DE ALMEIDA – UVA

BACHARELADO EM PSICOLOGIA
PSICOLOGIA DA INFÂNCIA E DA ADOLESCÊNCIA
PROFESSORA Ms. JAQUELINE MAIA DE MIRANDA

DÉBORA SANTIAGO DE AZEVEDO


PATHRYCIA SILVA SOARES

Problemáticas de aprendizagem em diferentes contextos e o papel


da Psicologia

Atividade Individual Avaliativa

RIO DE JANEIRO

1º Semestre de 2021
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Problemáticas de aprendizagem em diferentes contextos e o papel da


Psicologia

O objetivo deste texto é avaliar como a aprendizagem acontece de forma


distinta em três casos e como a psicologia pode contribuir para que essa
aprendizagem se dê de forma saudável e efetiva, contribuindo para o desenvolvimento
pleno dos sujeitos em questão. O primeiro caso envolve as mídias digitais, que são os
desdobramentos da precoce “carreira” como digital influencers de Juju Teófilo e
Andrielly Mendes, ambas com aproximadamente cinco anos de idade. O segundo é
como a escola tradicional se torna ineficaz em casos de transtornos que fogem o
padrão normativo esperado pela sociedade, exemplificado pelo filme Como estrelas
na Terra e seu protagonista Ishaan, um menino com dislexia. Já o terceiro caso é
sobre um ensino alternativo criado por Ben, personagem principal do filme Capitão
fantástico, que remove seus filhos do contexto social para ensiná-los numa
perspectiva ecológica e filosófica.
Antes que se possa analisar como a aprendizagem ocorre nesses contextos, é
preciso discorrer sobre o que se compreende por aprendizagem, e aqui se parte do
pressuposto que aprendizagem é o resultado da interação entre estruturas mentais e
o meio ambiente (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001). Vale relembrar o interesse
em compreender como o homem aprende e as reflexões acerca de sua natureza já
eram objetos de estudo desde a Antiguidade. Mas foi no século XIX que o
desenvolvimento das disciplinas científicas contribuiu para desenvolver teorias sobre
o processo de construção do conhecimento e demais teorias cognitivas (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 2001). No século XX, abre-se um campo de estudos que mais
tarde se estrutura em torno de diferentes teorias cognitivas ou teorias de
aprendizagem. Hoje se sabe que a Aprendizagem é um fenômeno ou
um método relacionado com o ato ou efeito de aprender, é um processo de mudança
de comportamento obtido através da experiência construída por fatores emocionais,
neurológicos, relacionais e ambientais, ou seja, é o processo de aquisição de
informações, conhecimentos, habilidades, valores e atitudes possibilitados através do
estudo, do ensino ou da experiência.
Levando em conta que a aprendizagem se dá ao longo de diversas
experiências da vida humana e não apenas no meio escolar, pode-se concluir que as
mídias digitais são fatores relevantes no processo de formação do eu. Juju Teófilo e
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Andrielly Mendes são crianças conhecidas nesse novo universo digital, que se
tornaram populares por fazerem “gracinhas” próprias de sua idade, mas acabaram
tronando-se influenciadoras “profissionais”, embora a atividade de digital influencer
não seja regulamentada e por isso não pode ser considerado um trabalho
propriamente dito. Utilizamos o termo profissionais pois é possível notar que há um
desenvolvimento nas postagens voltado para a atração de novos seguidores e mesmo
produção de propagandas para determinadas marcas. São muitas as possíveis
problemáticas a serem levantadas a partir desses casos.
É muito provável que o comportamento extrovertido e a comicidade das falas
dessas meninas tenham se dado antes de sua repercussão nas mídias, mas a partir
do momento em que esses comportamentos são registrados não apenas para a
memória da família e passam a ser publicizados com o objetivo de chamar a atenção
de terceiros, nota-se que há um ensejo por parte dos pais para que as crianças ajam
de determinada maneira. Assim um comportamento que antes poderia ter caráter
espontâneo acaba sendo premeditado por gerar aprovação dos pais. Talvez sem
perceber, esses pais acabam influenciando a mudança de hábitos através do reforço
positivo e modelagem, que são métodos utilizados para transformar comportamentos
utilizados na Terapia Comportamental (BORGES; CASSAS, 2012).
O reforço positivo, que também faz parte da visão Behaviorista, acontece
quando o sujeito recebe algo em troca por realizar determinada ação desejada, sendo
esse algo em troca um estímulo que traga uma sensação de prazer (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 2001; DEL PRETTE e DEL PRETTE, 1999), o que no caso
dessas meninas seria a aprovação dos pais e possivelmente maiores demonstrações
de afeto e apreço quando agem da maneira cômica percebida nos vídeos. Já a
modelagem é descrita por Borges e Cassas como “processo ou procedimento em que
respostas são reforçadas diferencialmente sob controle de critérios que mudam
gradativamente, levando ao desenvolvimento de novos comportamentos” (2012, p.
304). É um método que leva em conta os recursos que a pessoa já possui – que nesse
caso seriam o carisma, comicidade e a expressão de ideias e sentimentos – para que
a partir destes desenvolva outras capacidades ou comportamentos – que nesse caso
seria o desenvolvimento da personalidade em torno do que é esperado e desejado
pelos seguidores que acompanham as meninas. O reforço positivo é utilizado dentro
da modelagem de forma gradativa, aumentado conforme os comportamentos vão se
acumulando e consolidando (DEL PRETTE e DEL PRETTE, 1999).
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Graças ao avanço da psicologia do desenvolvimento, sabe-se que a infância é


um momento crucial na formação da identidade, onde a maior parte das capacidades
cognitivas e afetivas são desenvolvidas (BLOOM, 2014; GOLEMAN, 2012). Talvez por
falta de conhecimento sobre o desenvolvimento da criança e por falta de uma reflexão
crítica sobre o processo formativo de suas filhas, esses pais não percebem que estão
formando suas filhas para a adequação a um meio marcado pelo comportamento
narcisista, ensinando-as a buscar validação em terceiros que nem mesmo fazem parte
de sua esfera social próxima. Como mostra o documentário O Dilema das redes
(2020), desde o advento das redes sociais há um aumento exponencial de transtorno
de depressão e ansiedade entre crianças e adolescentes, e até mesmo nos casos de
suicídio, visto que estes jovens buscam um modelo de representar suas
personalidades e corpos de acordo com um padrão inalcançável. Sendo assim, existe
o risco dessas meninas desenvolverem sua identidade em torno de um padrão que
pode não condizer com suas características prévias, perdendo assim a noção daquilo
que lhes é próprio, particular, singular e único.
Há também de se notar que a manutenção desse tipo de perfil nas redes sociais
é feita de forma praticamente diária, para que não haja um decréscimo no número de
seguidores. Sendo assim a exposição dessas crianças a câmera, algo que as impele
a agir de um modo diferente, acaba sendo algo frequente. É certo que esses pais
possuem um retorno financeiro envolta do sucesso e fama de suas filhas, o que em
breve pode gerar nessas crianças um grande senso de responsabilidade que não lhes
é próprio da idade, visto que esse não é o momento de contribuírem financeiramente
para o lar. Assim as atividades que são próprias da infância e as que são próprias da
vida adulta acabam se diluindo, contribuindo para uma confusão de papéis e inversão
de prioridades na vida dessas crianças.
A expectativa de adequação a padrões prévios, contudo, não é advento das
redes sociais. A história da humanidade é marcada pela exclusão de pessoas com
deficiências físicas e transtornos mentais que não se adequavam ao padrão do
concebido como “normal”. Tal fato reverbera nas estruturas sociais até os dias de hoje,
ainda que tenha havido um avanço na perspectiva e de direitos humanos e no conceito
de inclusão, sendo uma dessas estruturas o sistema tradicional de ensino. O filme
Como estrelas na terra (2007) exemplifica bem essa realidade ao contar a história de
Ishaan, uma criança com dislexia que não consegue acompanhar as aulas como as
demais, por mais que esforçasse para entender o conteúdo. O menino, apesar de ser
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extremamente criativo, acaba tirando notas muito baixas por não se adequar a um
sistema de ensino que não está atendo as diferenças no seu processo de aquisição
do conhecimento. Como consequência, Ishaan era excluído do convívio com seus
colegas e ainda era rotulado por seus professores como desinteressado, burro,
preguiçoso e desobediente, além das comparações constantes com o seu irmão mais
velho, que ao contrário dele se adequava às expectativas e aos padrões
estabelecidos. Os professores o ridicularizavam, perdiam a paciência e o colocavam
fora de sala, sempre na presença dos outros alunos, de forma a intensificar a
humilhação do menino.
Um dos problemas com a perspectiva de ensino tradicional é que esta não leva
em consideração a pluralidade dos saberes e dos modos de aquisição do
conhecimento, transferindo a culpa da limitação de seus métodos e bases para os
estudantes que não se encaixam em seus moldes rígidos. Apesar das múltiplas
abordagens pedagógicas que foram criadas ao longo do século XX, o ensino
tradicional continua sendo prevalente, o que acaba por influenciar o senso comum
acerca da infalibilidade de seus métodos. Assim, tanto os pais quanto os professores
de Ishaan nunca pararam para se questionar o que estava acontecendo com o menino
e se havia alguma falha no método aplicado, apenas o culpavam julgando-o por
indisciplinado. Partindo dessa crença equivocada, os pais acabam o transferindo para
uma outra escola com regras e disciplinas ainda mais rígidas, na crença de que seu
fracasso acadêmico seria resolvido. Paradoxalmente a esta expectativa, os problemas
de aprendizagem de intensificam, tanto por causa da rigidez metodológica quanto pela
ausência da família e falta de afeto, fazendo o menino desenvolver sintomas de um
transtorno depressivo.
No exemplo de Ishaan fica marcado a presença do reforço negativo, que é a
privação de determinado aspecto da vida da pessoa – nesse caso a convivência com
os colegas de turma e mesmo com a família – enquanto ela não agir de acordo com
o esperado. Todavia se reconhece que o reforço negativo pode ter efeitos nocivos e
não necessariamente contribui para uma aprendizagem efetiva, sendo inclusive
prejudicial para o aprendizado de habilidades socioemocionais (DEL PRETTE e DEL
PRETTE, 1999). O papel da psicologia dentro cenário escolar atualmente é
reconhecido como sendo de suma importância, visto que a escola é compreendida
como uma das principais instituições ativas na promoção da saúde mental, atuando
na promoção da diversidade através da inclusão e no combate aos estigmas
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(ESTANISLAU; BRESSAN, 2014). Estanislau e Bressan (2014) defendem que é papel


da escola e do professor conhecerem os diversos tipos de transtornos mentais e seus
sintomas, a fim de que se possa dar o tratamento apropriado aos estudantes e que se
possa oferecer um currículo com atividades adaptadas ao modo de aprendizagem de
cada indivíduo. Tal importância é salientada no filme com a chegada de um professor
que oferece um olhar empático e atento para Ishaan, percebendo tanto suas
dificuldades como potencialidades, de forma que consegue contribuir para o
desenvolvimento cognitivo e emocional do menino. Além disso esse professor explica
a condição de Ishaan a seus pais, que passam a compreendê-lo melhor. Essa
comunicação com os pais é apontada por Estanislau e Bressan (2014) como tarefa
não apenas do professor, mas do psicólogo escolar.
Por causa dessas e outras problemáticas com o ensino tradicional, muitos pais
têm optado por escolas que adotem projetos pedagógicos e metodologias inovadoras
que colocam o aluno como sujeito ativo e principal dentro do seu processo de
aquisição de conhecimento. O filme Capitão Fantástico (2016) ilustra essa fuga do
ensino tradicional de uma maneira um tanto extremista. Na busca de ajudar sua
esposa a viver uma vida saudável longe das mazelas da sociedade contemporânea e
capitalista, Ben, um professor de filosofia, vai morar com sua família no meio da
floresta. Ele e sua esposa ficam sendo completamente responsáveis pela educação
de seus filhos e o fazem sob uma perspectiva distante da tradicional. O casal possui
seis filhos de diferentes idades, e todos são submetidos a conteúdos de filosofia que
para muitos educadores podem ser considerados avançados demais para suas
idades. A questão é que esses pais não subestimam a capacidade intelectual de seus
filhos e os criam distantes das distrações do mundo tecnológico, tornando mais eficaz
a apreensão dos conteúdos. Mais do que isso, os pais sempre convidam os filhos a
terem posições críticas acerca do que estudam. As crianças também são submetidas
a técnicas de sobrevivência na selva e a ritos de passagem que marcam etapas de
seu desenvolvimento.
O filme critica de maneira um tanto ácida a educação tradicional americana
comparando os filhos de Ben aos de sua cunhada, que claramente não possuem o
mesmo conhecimento acadêmico e o posicionamento crítico que os seus. Nesse
sentido o filme leva o espectador a questionar sobre a potencialidade de aprendizado
e capacidades cognitivas de crianças e adolescentes, e como uma educação centrada
no sujeito é capaz de desenvolver essas capacidades. Porém, ainda que de certa
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forma Ben tenha sido bem-sucedido ao desenvolver as capacidades cognitivas de


seus filhos, o filme mostra como eles se tornaram ineptos em suas relações sociais
com pessoas de criações distintas as suas, visto que foram privados do convívio com
outras pessoas que não sua família. Ao entrar na cidade as crianças sofrem um baque
cultural forte e tem dificuldades de se relacionar de maneira apropriada com outras
pessoas. Assim percebe-se que Ben acabou ignorando uma área muito relevante para
o pleno desenvolvimento psicológico de seus filhos: a troca proveniente das relações
humanas e seu impacto na formação da identidade.
Nos três contextos abordados é possível perceber como as escolhas dos pais
tem profundo impacto no processo de desenvolvimento de seus filhos e porque é
importante que os pais conheçam minimamente como acontece o processo formativo
do ser, tanto em sua esfera intelectual como afetiva, sendo esses conhecimentos
provenientes do campo de estudo da psicologia.
Também é possível dizer que as teorias de aprendizagem advindas dos
avanços na psicologia são majoritariamente divididas em dois grupos: as
comportamentais e as cognitivas. As teorias comportamentais defendem que a
aprendizagem acontece com base no comportamento dos indivíduos, desta forma
devem ser levadas em conta questões ambientais, que proporcionam a
aprendizagem, visto que nessa perspectiva a aprendizagem se dá através de uma
vinculação entre estímulo e resposta: aprendemos hábitos através da prática (BOCK;
FURTADO; TEIXEIRA, 2001). Já as teorias cognitivistas, defendem que a
aprendizagem acontece através da relação do sujeito com o meio que o circunda,
levando a uma organização interna como forma de interação com o mundo. Aprende-
se por uma associação entre informações já armazenadas e as novas adquiridas por
meio da experiência (BOCK; FURTADO; TEIXEIRA, 2001). Os exemplos descritos
nesse texto se favoreceriam de ambas as bases dessas teorias, visto que concluímos
que tanto os aspectos cognitivos quanto os comportamentais fazem parte do pleno
desenvolvimento humano.
Concluímos que a visão de mundo capitalista e competitiva da sociedade
moderna por vezes leva os pais a exigirem dos filhos um padrão muito alto e
inalcançável. É ignorada a importância das relações humanas e suas interações e seu
papel para a compreensão das diferenças. Também se nota que a psicologia da
educação se faz imprescindível na formação do professor, para que este tenha
capacidade para trabalhar técnicas e métodos de aprendizado específicos fazendo
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com que todos os alunos sejam inseridos no processo de aprendizagem e se sintam


capacitados para desenvolver suas atividades, mesmo que esse desenvolvimento não
se dê de forma homogênea entre toda a classe, assim aceitando cada estudante na
sua singularidade. Encerramos com a crença de que se todos que figuram no papel
de estimuladores tivessem a oportunidade de reavaliar suas atitudes como
mediadores da aprendizagem pautados nos conhecimentos da psicologia, certamente
tomariam outros caminhos.
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Referências

BOCK, Ana M. Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes. Psicologias:


uma introdução ao estudo de psicologia. 13.ed. São Paulo: Saraiva, 2001.

BLOOM, Paul. O que nos faz bons ou maus. Rio de Janeiro, RJ: Editora Best seller
Ltda., 2014.

BORGES, Nicodemos Batista, e CASSAS, Fernando Albregard. Clínica analítico-


comportamental: aspectos teóricos e práticos. Porto Alegre, RS: Artmed, 2012.

CAPITÃO FANTÁSTICO. Direção: Matt Ross, Produção: M. Levinson, J. Patricof, S.


Rawat, L. H. Taylor. Estados Unidos da América, DVD, 2016.

Como Estrelas na Terra, toda criança é especial. Direção: Aamir Khan, Amole Gupte.
Produtor: Aamir Khan.

DEL PRETTE, Zilda A.P. e DEL PRETTE, Almir. Psicologia das habilidades sociais:
terapia e educação. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.

ESTANISLAU, Gustavo M, BRESSAN, Rodrigo Affonseca (org.). Saúde Mental na


Escola: o que os educadores devem saber. Porto Alegre, RS: Artmed, 2014.

GOLEMAN, Daniel. Inteligência Emocional: a teoria revolucionária que redefine o


que é ser inteligente. 2ªed. – Rio de janeiro: Objetiva, 2012.

O dilema das redes (The Social Dilemma). Documentário, Estados Unidos, 2020, 89
minutos. Direção: Jeff Orlowski. Distribuição:Netflix.

VYGOTSKY, L. S. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1989.

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