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Título original: Bear – Desejo na Montanha

Copyright © 2022 Bruna Catein.

Todos os direitos reservados.


Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida em qualquer
meio ou forma – impresso, digital ou audiovisual – sem o consentimento
por escrito da autora.

1ª edição, setembro de 2022. Rio de Janeiro.

Revisão: Camila Brinck.


Capa: Bruna Catein.
Diagramação: Bruna Catein.
Imagens: Adobe Stock.
PRÓLOGO
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
CAPÍTULO 3
CAPÍTULO 4
CAPÍTULO 5
CAPÍTULO 6
CAPÍTULO 7
CAPÍTULO 8
CAPÍTULO 9
CAPÍTULO 10
CAPÍTULO 11
CAPÍTULO 12
CAPÍTULO 13
CAPÍTULO 14
CAPÍTULO 15
CAPÍTULO 16
CAPÍTULO 17
CAPÍTULO 18
CAPÍTULO 19
CAPÍTULO 20
CAPÍTULO 21
CAPÍTULO 22
CAPÍTULO 23
CAPÍTULO 24
CAPÍTULO 25
CAPÍTULO 26
CAPÍTULO 27
CAPÍTULO 28
CAPÍTULO 29
CAPÍTULO 30
CAPÍTULO 31
CAPÍTULO 32
CAPÍTULO 33
CAPÍTULO 34
CAPÍTULO 35
CAPÍTULO 36
CAPÍTULO 37
EPÍLOGO
Freya Larsen é uma leitora assídua que acabou de se mudar para a pitoresca vila alpina de
Havengreen, na Noruega. Ela pretendia levar uma vida pacata naquele refúgio ao pé da montanha e
se sustentar com o dinheiro dos quadros que pintava, só não esperava que encontraria naquele lugar a
personificação viva do seu homem dos sonhos — que até então ela pensou só existir entre as páginas
de papel.
Bear Dufour é incrivelmente idêntico ao personagem do livro preferido de Freya e desde o
momento em que a jovem pintora colocou os olhos no lenhador surge um desejo inevitável. Bear não
era um sujeito de muitos amigos. Ele levava uma vida solitária em uma casa na montanha e preferia
manter distância das pessoas do vilarejo, mas o destino deu um jeito de colocar Freya em seu
caminho.
Bear reluta, mas no fim não consegue negar a atração que sente pela doce garota que apareceu
em sua vida e os dois se envolvem em uma ardente relação que irá aquecê-los até mesmo nas noites
mais frias. Infelizmente, nem todos na vila ficaram felizes com a união do lenhador com a pintora e
agora a paz do casal está ameaçada.
Será que Freya conseguirá o seu final feliz ao lado de Bear ou a vida se mostrará dura o bastante
para a jovem perceber que nada é como nos livros?
Este livro não é recomendado para
menores de 18 anos.
É um romance adulto. Contém cenas de sexo
explícito e palavras de baixo calão.
O livro contém gatilhos como: tentativa de
estupro e violência. Se você é uma pessoa
sensível a esses temas, recomendo que
não leia ou pule as cenas.
Este é um livro único e independente que faz parte da duologia Mountain
Men, um projeto que eu e a autora A. E. Gabriel criamos quando nos
tornamos grandes amigas.
Os livros podem ser lidos separadamente e também não possuem ordem
cronológica. Então, sinta-se livre para escolher qual aventura nas
montanhas você quer viver primeiro.
Temos Bear, um lenhador gostoso e ranzinza, de olhos cinzentos e longos
cabelos dourados, que está há cinco anos sem ninguém por opção. E
também temos Kane, um quase quarentão gostoso de olhos glaciais que
também mora isolado em uma montanha e não gosta muito de receber
visitantes em sua propriedade.
Esse projeto é uma collab com a minha amiga Dri e eu adorei fazer parte
disso! Dar vida a um dos Mountain Men foi uma experiência única e
divertida que me rendeu boas risadas e alguns momentos de choro.
Prepare o coração, porque você irá se apaixonar pelos nossos homens da
montanha!
Para todas as pessoas que sonham ou que já
sonharam em viver um amor igual dos
livros.
PRÓLOGO

Fogo... Alguma casa está queimando! Pensei enquanto corria pela rua
de pedras ladrilhadas da vila. Apesar do clima frio daquela noite de outono,
um suor de nervosismo escorria pelo meu corpo. O coque que prendia o
meu cabelo se desfez com a velocidade dos meus passos e agora os fios
dourados se agitavam ao redor do meu rosto durante a corrida.
O cheiro de fumaça ficava mais forte à medida que eu me aproximava
da rua da minha loja e o pânico começava a sufocar o meu peito. Algo de
errado está acontecendo... eu posso sentir! Corri o mais rápido que eu
pude, indo em direção à luz alaranjada que iluminava parte do céu escuro
da noite. Depois de mais alguns minutos de agonia, finalmente cheguei ao
local.
Como sempre, a minha intuição estava certa. Havia um incêndio
naquela rua e o estabelecimento em chamas era a minha loja de esculturas.
Porra! Não era difícil imaginar o estrago que o fogo poderia fazer em um
lugar repleto de peças de madeira. Está tudo perdido... tudo! Levei as mãos
à cabeça, enquanto absorvia o choque daquele momento. Como isso
aconteceu?
Vários moradores de Havengreen se reuniram na rua em frente à loja
e agora observavam o fogo queimar, assustados, sem saber o que fazer.
Nossa vila, ao pé da montanha, era pequena, não havia um corpo de
bombeiros aqui e até que o batalhão da cidade mais próxima chegasse tudo
já estaria reduzido a cinzas. Algumas almas caridosas até enchiam bacias
d’água no chafariz da praça que ficava na rua de trás e corriam para tentar
apagar o fogo, mas era tudo em vão. As chamas já estavam chegando ao
teto, não havia como contê-las.
Olhei ao meu redor à procura da minha parceira, mas não a encontrei.
Meu desespero aumentou. Porra, ela é a única pessoa, além de mim, que
tem uma cópia das chaves da loja. Será que ela está lá dentro? Caralho!
Sem pensar duas vezes respirei fundo — apesar do ar ali fora estar
enfumaçado — e corri em direção ao estabelecimento o mais rápido que
pude. As labaredas estavam ao redor da porta fechada, mas não me
importei. Se existe a menor possibilidade da minha mulher estar lá dentro
eu não hesitarei em salvá-la. Não posso perdê-la. Jamais conseguirei viver
sem ela...
CAPÍTULO 1

Espiei a tela do celular antes de descer da minha caminhonete verde


de segunda mão. O vento frio que soprava naquela pitoresca vila ao pé da
montanha fez o meu cabelo preto escovado se agitar para trás, me causando
um arrepio pelo corpo. Estremeci levemente e subi o zíper da minha jaqueta
térmica até que a gola cobrisse o meu pescoço. Isso deve me manter
aquecida enquanto levo minhas coisas para dentro.
Eram nove e vinte da manhã e eu havia acabado de estacionar em
frente à minha nova casa. Era uma residência rústica de madeira que
provavelmente foi construída por volta dos anos 60 — quando Havengreen
foi fundada.
A vila alpina que a partir deste momento eu chamaria de lar era um
lugar pequeno, mas acolhedor. Havia apenas uma igreja, com uma torre do
sino que era visível à distância, uma mercearia que fornecia alimento o
suficiente para os 560 moradores da região, uma taverna, uma farmácia,
uma padaria, uma delegacia, uma escolinha primária e um hospital que
também servia como casa de repouso.
Havengreen era um lugar tranquilo e perfeito para uma pessoa que,
assim como eu, estava à procura de paz e sossego. Cansei de morar na
agitada capital de Oslo. O caos e a correria do dia a dia estavam destruindo
a minha criatividade e fazia semanas que eu não conseguia pintar um único
quadro. Tenho certeza que a calmaria desse lugar me ajudará a colocar as
ideias em ordem. Não vou dizer que foi uma coisa boa minha avó ter
falecido — longe de mim pensar dessa maneira, eu a amava —, mas a casa
que ela me deixou de herança nessa vila afastada não poderia ter vindo em
melhor hora.
Até onde eu sei minha avó foi embora de Havengreen pouco antes de
eu nascer, então o imóvel passou os últimos 24 anos abandonado e entregue
à poeira e teias de aranha. Mas agora que todo o processo de restauração
interna estava terminado, eu já podia me dar ao luxo de morar nessa pacata
e preservada vila ao pé da montanha onde o estilo rústico das construções
de madeira faz você pensar que está em um filme sobre vikings e
civilizações nórdicas antigas. É um lugar incrível.
A casa que herdei ficava localizada de frente para a praça, onde havia
um chafariz encantador e um espaço de lazer com bancos e brinquedos de
madeira, todos muito bem conservados. Imagino como Havengreen deverá
ficar encantadora no inverno — apesar do frio intenso que com certeza se
fazia presente aqui — quando a neve chegar daqui a alguns meses, cobriria
cada canto da paisagem de branco e tons azuis cristalinos. Só de imaginar
quase perco o fôlego, afinal, o inverno é a minha estação preferida. Ainda
estávamos no fim do verão, mas o clima frio da montanha já podia ser
sentido. Eu não tinha dúvidas que as temperaturas aqui eram baixas na
maior parte do ano.
Como se não bastasse o estilo encantador das construções
Havengreen também possuía uma vista de tirar o fôlego. Da praça onde eu
estava era possível ter uma visão privilegiada da alta e imponente montanha
de grama verde e pico nevado que cercava a vila — não consegui deixar de
pensar que essa seria uma ótima referência para uma pintura. Acabei de me
mudar e já estou me sentindo inspirada. Isso é um bom sinal!
Há alguns meses eu jamais imaginaria que a minha avó morou em um
lugar como esse. Tudo que eu sabia sobre o seu passado foi que ela nasceu
no Brasil e se mudou para a Noruega em meados dos anos 60 quando
casou-se com o meu avô que, infelizmente, faleceu antes de eu nascer.
Desde que me entendo por gente, lembro da minha avó morando
comigo na casa dos meus pais — inclusive, foi ela que me ensinou a pintar.
Minha mãe, que era enfermeira, não herdou os mesmos dons artísticos que
eu e sempre fazia piada sobre o talento para pintura ter pulado uma geração.
Meu pai era veterinário e quando a minha avó precisava sair de casa e não
podia ficar comigo, eu passava as tardes na clínica dele depois da escola.
Ficava lá desenhando os animais que ele atendia até a clínica fechar e ele
me levar para casa, já que o plantão da minha mãe no hospital acabava tarde
da noite.
Ganhei minha primeira aquarela aos 5 anos e aos 10 já estava
matriculada em um cursinho de desenho que foi oferecido pela escola.
Acabei seguindo esse caminho e há dois anos me formei em artes na
faculdade. Agora eu vivia da venda das minhas pinturas e não podia estar
mais feliz por trabalhar com o que eu amava. Só espero que as pessoas
dessa vila gostem de arte...
Um pouco relutante, dei às costas para a paisagem da montanha e
voltei minha atenção para as caixas de papelão que estavam na traseira da
minha caminhonete. Aquela mudança não seria guardada sozinha, então
peguei as caixas uma a uma e comecei a levá-las para o interior da minha
nova residência.
Depois de passar algumas horas guardando tudo em seu devido lugar,
fechei a porta do armário planejado em que eu havia acabado de guardar as
louças e saí da cozinha. O interior da casa não era muito grande, tinha
apenas um andar onde ficavam distribuídos sala, banheiro, dois quartos e a
cozinha, onde também estava a porta de entrada.
Graças ao aquecedor que mandei instalar no momento da reforma,
todos os cômodos da casa estavam quentinhos e aconchegantes. Quando
entrei no meu quarto, me vi obrigada a tirar a jaqueta térmica que eu usava
já que o calor da lareira acesa no cômodo, junto com o aquecedor, me fez
começar a suar. Ao menos, sei que não vou sofrer nas noites mais frias.
As únicas 3 caixas que restaram estavam em cima da minha cama,
cada uma guardando um pouco da minha coleção de livros. Com calma,
abri as embalagens de papelão e comecei a organizar meus amigos de papel
na estante que ficava ao lado do guarda-roupas.
Não vou negar que eu estava empolgada para aquela nova fase da
minha vida. Era um lugar novo, com novas possibilidades, novas pessoas
para conhecer e quem sabe até mesmo um novo amor. Fazia tempo que eu
não tinha um relacionamento de verdade com um homem de carne e osso.
Preciso confessar que nos últimos três anos todas as minhas paixões foram
por caras que só existiam entre as páginas de papel.
Sempre gostei de ler, e por passar muito tempo na companhia de
personagens perfeitos, criados por mulheres, acabei me tornando exigente
demais quando o assunto era encontrar um homem de verdade. Inclusive,
terminei o meu último namoro porque o meu parceiro não era intenso como
os mocinhos dos livros que estou acostumada a ler, eu sempre sentia que
havia algo faltando. Ninguém atendia aos meus requisitos de homem
perfeito então eu preferia permanecer com o coração entregue aos mocinhos
dos livros do que sofrer por um idiota do mundo real.
E o mocinho da vez, que estava dominando o meu coração — e
encharcando a minha calcinha todas as noites — era Bear, um lenhador
solitário de longos cabelos loiros, olhos acinzentados e barba por fazer que
morava no alto de uma montanha gelada em uma cidade isolada e esquecida
por Deus. Ele foi criado pela minha autora preferida, L. M. Mayer. Eu não
sabia quem ela era de verdade — ninguém sabia, já que ela usava um
pseudônimo, mas adorava as histórias contadas por aquela mulher.
Se um dia a L. M. Mayer resolvesse se revelar ao mundo e fizesse
uma sessão de autógrafos, com certeza, eu seria a primeira da fila. Imagino
como seria satisfatório ver o meu exemplar de Desire&Seduction
autografado pela rainha dos romances eróticos que enlouquecia seus
milhões de leitores ao redor do mundo cada vez que escrevia uma nova
história.
Às vezes acho que estou muito fora do chão. Se eu não parasse de
exigir perfeição dos meus parceiros, ficaria solteira pelo resto da vida e não
era isso que eu queria. Eu quero casar com um homem que me ame e me
faça feliz, quero ter uma família com ele e viver ao seu lado até que o meu
coração pare de bater. Talvez minha mudança para Havengreen fosse a
oportunidade perfeita para começar a pensar diferente e dar uma chance
para caras mais comuns. Estou cansada de ficar sozinha.
Enquanto eu terminava de organizar meus livros na estante, fiquei
pensando na paisagem lá fora, naquela praça com um chafariz no centro e
uma linda vista da montanha. Minha criatividade logo despertou e me fez
sentir uma incontrolável vontade de pegar uma tela em branco e reproduzir
a paisagem de Havengreen. Eu me sentia empolgada com esse lugar, como
se, de alguma forma, eu pudesse pressentir que coisas boas aconteceriam
com a minha mudança para essa vila.
Quando todas as minhas coisas já estavam em seu devido lugar, fui
até o quarto onde guardei meus materiais de pintura e peguei uma tela em
branco de tamanho mediano, colocando-a embaixo do meu braço esquerdo.
Peguei também o meu cavalete e a minha maleta onde estavam as tintas e
os pinceis, e, então, saí da casa.
Já eram 14h, o tempo estava nublado e o mesmo vento frio da
montanha soprava vez ou outra. Não havia ninguém na praça além de um
senhor sentado em um banco distante lendo um jornal e um garotinho que
brincava no balanço.
Depois de escolher o melhor ângulo para a pintura, posicionei meu
cavalete de frente para um banco de madeira que tinha uma vista
privilegiada do chafariz e da montanha ao fundo. Encaixei nele a minha tela
em branco, abri minha maleta de tintas, e depois de preparar tudo, comecei
a pintar.
Enquanto eu dava as minhas pinceladas, analisava cada trecho da
paisagem minuciosamente para tentar reproduzir tudo com o máximo de
semelhança. Detalhei cada entalhe de madeira das construções que estavam
em meu campo de visão, cada pedra falhada do chafariz e até encaixei na
pintura o moço com jornal e o garotinho no balanço.
Somente quando foquei o meu olhar detalhista na montanha para
colocá-la no quadro percebi que havia um fino véu de água branco
descendo pela encosta da colina. Ele se destacava entre o verde da grama
por vários metros e desaparecia através das folhas altas dos pinheiros que
cobriam o pé do morro. Era lindo.
Passei o resto da tarde ali, tentando recriar na tela aquela obra de arte
da natureza. Eu sabia que não ficaria exatamente igual, mas fiz questão de
detalhar as coisas mais importantes e que mais me chamaram atenção —
como a cachoeira na montanha. Vez ou outra eu me distraía da pintura para
ficar olhando para o véu de água que descia entre a grama verde, apenas
sentindo a energia de paz e calmaria que ela me transmitia.
Estava terminando os últimos detalhes da pintura quando ouvi passos
se aproximando e parando ao meu lado. Olhei na direção da pessoa que
chegou e me deparei com um homem alto de pele pálida, olhos castanhos e
cabelo preto cortado em um estilo degradê. Me pergunto se ele não sente
frio nas orelhas com esse vento da montanha. Ele usava calça jeans, botas
de caminhada marrons e um suéter preto de gola alta que fazia os músculos
de seus braços se destacarem. A dog tag em seu pescoço indicava que o
sujeito tinha servido ao exército em algum momento da sua vida, mas ele
não aparentava ser muito velho... eu diria que ele tinha, no máximo, uns 30
anos.
— Você é nova aqui? — o homem perguntou, com uma certa
curiosidade.
— Ah... sou sim — respondi, um pouco acanhada. — Cheguei hoje
em Havengreen.
— Se mudou para a casa que estava em reformas, não é?
Eu apenas concordei em silêncio e olhei brevemente para a minha
residência, que estava a alguns metros de distância.
— Me chamo Sven Herzog. Sou o atual dono da mercearia. — Ele me
estendeu a sua mão.
— Freya Larsen. Eu sou pintora. — Soltei o pincel que eu segurava e
o cumprimentei com um breve aperto.
— É um prazer conhecê-la, Freya.
Sven sorriu amigavelmente e logo o seu olhar se desviou do meu
rosto para encarar a minha pintura.
— A paisagem ficou linda.
— Obrigada. — Sorri para o homem, me sentindo um pouco
envergonhada.
Eu não gostava que as pessoas vissem as minhas pinturas sem que
elas estivessem terminadas, mas o que eu poderia esperar pintando um
quadro aqui na praça? Cedo ou tarde alguém viria comentar alguma coisa.
— Parece que temos um novo talento aqui em Havengreen — ele
disse, com admiração.
Sven colocou a mão direita no bolso da calça e observou o quadro em
silêncio por um tempo. Eu não sabia o que dizer, então apenas fiquei quieta
esperando que ele dissesse mais alguma coisa ou fosse embora. Sven
parecia ser um cara legal, mas eu estava com pressa para terminar a pintura
antes que o sol começasse a se pôr e eu ficasse sem luz natural.
— Freya, se as suas outras pinturas forem tão boas quanto essa você
pode colocá-las à venda na minha mercearia, se quiser.
Arregalei os olhos. Foi impossível não ficar surpresa com aquela
oferta repentina vinda de um desconhecido.
— Está falando sério? — indaguei com descrença.
— Estou. Havengreen inteira vai até lá, então todos da vila poderão
contemplar as obras de arte que você faz. — Ele olhava para o quadro com
admiração.
— Eu agradeço pela oferta... vou pensar a respeito.
— Faça isso. — Sven voltou seu olhar para mim e sorriu de um jeito
caloroso. — Se nos tornarmos sócios, te darei um desconto nas compras do
mês.
— Obrigada novamente.
Fiquei um pouco sem jeito, eu não sabia como reagir. As pessoas da
cidade grande onde eu morava não eram tão receptivas assim.
Na primeira vez que estive aqui, fui até a padaria fazer um lanche e a
dona de lá me deu um pãozinho de aveia por conta da casa só porque eu
disse que me mudaria para Havengreen em breve. Bom, preciso me lembrar
que essa é uma vila em uma área rural, com poucos moradores. Pessoas de
lugares assim costumam se ajudar sempre que podem.
— Foi mal... estou te atrapalhando. Sei que você quer terminar a sua
pintura. — Sven coçou a nuca, parecendo envergonhado. — Eu já vou
embora, com certeza vamos nos esbarrar por aí outra vez.
— Tudo bem. Até a próxima. — Acenei para ele.
— Bem vinda à Havengreen, Freya. — Sven acenou de volta e virou
as costas, caminhando para longe.
Sorri enquanto observava o homem se afastar. Espero que os outros
moradores da vila sejam tão receptivos quanto Sven e a moça da padaria.
CAPÍTULO 2

Duas semanas se passaram desde que me mudei para Havengreen. O


outono começou no domingo passado e, como já era de se esperar, trouxe
temperaturas frias que se tornariam mais frequentes com o passar dos meses
até o inverno.
Para a minha sorte e alívio, todos os moradores da vila se mostraram
hospitaleiros e bem-humorados. A dona da padaria, Sra. Ludwig, ainda me
dava pãezinhos de graça toda vez que eu passava por lá. O responsável pela
delegacia de polícia era o delegado Müller, um senhor de meia-idade muito
simpático que ficava andando à toa pela região já que quase nunca
acontecia uma ocorrência no lugar — e quando acontecia, normalmente
tinha a ver com o gado que ultrapassava os limites da cerca e se perdia na
imensidão da montanha.
No meu tempo aqui, até já vendi um quadro para a Sra. Grigory, a
costureira que era esposa do dono da farmácia. Ao que parece, todos em
Havengreen tinham uma função que contribuía para que aquela pequena
comunidade ao pé da montanha continuasse funcionando. Eu esperava que
as minhas pinturas pudessem contribuir de alguma forma com o
desenvolvimento do local.
Acabei aceitando a proposta de Sven e coloquei alguns quadros à
venda na vitrine da sua mercearia. Combinei de levar obras novas para ele
sempre que as remessas anteriores fossem vendidas e deixei que o homem
ficasse com 10% do lucro, já que ele estava me cedendo espaço para expor
as minhas pinturas. Sven era um cara legal — não como os mocinhos dos
livros que eu lia —, mas ainda assim eu me arriscava a pensar que ele era
bonitinho. Me surpreende o fato dele não ter nenhuma namorada.
Eu me encontrava sentada em uma mesa na padaria da Sra. Ludwig,
bebendo um iogurte de leite de cabra feito pelo marido dela e saboreando
um dos maravilhosos pãezinhos de aveia da casa. Era o meu lanche da tarde
e eu precisava admitir que já estava me sentindo culpada por passar lá todos
os dias e ela não me deixar pagar pela refeição completa.
O sino da porta tocou indicando que alguém havia entrado no local.
Ergui meu olhar e vi o delegado Müller se sentando em um dos banquinhos
de madeira próximo ao balcão. Ele passava na padaria todas as tardes e a
Sra. Ludwig sempre lhe dava um pãozinho de aveia também.
Depois de terminar o meu lanche, me levantei e fui até o balcão pagar
a conta. O delegado Müller estava imerso em uma conversa sobre o clima
com a Sra. Ludwig, mas logo cessaram o assunto para me cumprimentar.
— Freya. — O Sr. Müller me direcionou um sorriso amigável. —
Está tudo em ordem por lá? Nenhuma vaca rebelde invadiu a sua casa?
— Não... eu não vi nenhuma vaca rebelde por esses dias. — Deixei
uma risada escapar. O próprio delegado fazia piada sobre a calmaria
exacerbada de Havengreen.
— Ótimo. — Ele pareceu satisfeito.
— Sra. Ludwig, aqui está o dinheiro. — Entreguei-lhe a quantia
referente ao iogurte e ao pãozinho.
— Já disse que os pãezinhos são de graça, Freya — a senhora de
cabelos grisalhos resmungou, e me devolveu metade do valor que eu paguei
a mais.
— Tudo bem. — Suspirei um pouco sem jeito, e guardei o dinheiro
no bolso da minha calça jeans.
— Voltando ao assunto, vi na TV que amanhã vai cair uma
tempestade — disse o delegado Müller. — Precisamos pedir outro
carregamento de lenha ao Bear antes que a temporada de chuvas comece.
No ano passado não tivemos madeira seca por semanas.
— De hoje para amanhã? Duvido que ele entregue. — A sra. Ludwig
colocou as mãos na cintura. — Você sabe como o menino ficou
desequilibrado depois do que aconteceu.
— De quem estão falando? — intrometi-me no assunto.
Apesar de todos os estabelecimentos que existiam por aqui, o que
mais movimentava Havengreen eram as fofocas. É uma vila pequena com
línguas grandes.
— Ninguém, querida, não se preocupe. — A dona da padaria agitou
as mãos, como se o assunto não fosse interessante. Achei estranho, era a
primeira vez que ela não me passava um dossiê completo sobre a pessoa
que estava no tópico da conversa.
Olhei para o delegado Müller, atrás de alguma informação.
— Ele é nosso... lenhador, se assim podemos dizer — foi tudo que o
homem me passou.
Eu apenas assenti, me conformando que não receberia mais
informações. Melhor eu voltar para casa e deixar esses dois com as
fofocas.
— Já estou indo. — Acenei para a sra. Ludwig e o delegado Müller.
— Até amanhã! — despediram-se em uníssono.
Sorri para os dois e caminhei em direção à porta.
Quando saí da padaria o vento frio da montanha fez com que vários
fios do meu cabelo invadissem o meu campo de visão. Os penteei para trás
e puxei o meu gorro de lã mais para baixo, evitando que o meu cabelo
voltasse a se agitar com o vento.
Alguns segundos fora de um ambiente aquecido e as minhas mãos já
estavam ficando geladas. Fitei os meus dedos e percebi que a minha pele
estava levemente ressecada — um resultado do clima seco e frio. Acho que
seria bom comprar um hidratante. Pensando nisso, decidi ir até a
mercearia, já que ela ficava no caminho entre a padaria e a minha casa.
Posso aproveitar e ver se mais algum quadro foi vendido.
Enquanto eu seguia a rua de paralelepípedos até a loja de Sven, fiquei
reparando nas construções que vi pelo caminho. A maioria das casas
naquela parte da vila pertencia aos comerciantes. Todas estavam com as
vitrines enfeitadas com os produtos que os vendedores ofereciam. O
sapateiro ostentava a sua vitrine cheia de sapatos, na loja da costureira
vários modelos de roupas estavam em exibição e a padaria mostrava seus
doces e pães de dar água na boca.
Todos os estabelecimentos de Havengreen estavam sempre alegres e
cheios de vida... exceto um. Havia uma loja perto da esquina que estava
fechada desde que cheguei aqui. Uma corrente foi passada na frente da
porta de madeira e a vitrine de vidro estava tão empoeirada que mal dava
para ver o interior do lugar. Ao contrário dos outros dias em que passei por
aqui, hoje me senti tentada a dar uma bisbilhotada mais de perto.
Olhei ao meu redor para ver se não havia ninguém na rua e me
aproximei da vitrine até que o meu rosto ficasse a poucos centímetros do
vidro. Agora que eu estava mais perto, conseguia enxergar o ambiente
interno da loja. Lá dentro era possível ver parte de um balcão empoeirado e
uma caixa registradora sobre ele, no chão havia um totem inacabado de
madeira e algumas ferramentas espalhadas.
Infelizmente, a minha respiração quente deixou o vidro frio embaçado
e isso me impediu de ver mais coisas no interior do estabelecimento. Me
pergunto o que aconteceu com o dono desse lugar. Será que ele morreu?
Enquanto eu me perdia em pensamentos sobre o passado daquela loja
empoeirada, um vento frio soprou em minhas costas e o meu cabelo foi
jogado para frente, ficando em meu campo de visão outra vez. Me afastei da
vitrine, enquanto recuperava a compostura e decidi seguir meu caminho.

Na vitrine da mercearia não haviam alimentos à mostra, mas sim os


meus quadros. Um sorriso curvou ligeiramente a minha boca enquanto eu
admirava as pinturas que eu mesma fiz. Não é para me gabar, mas ficaram
divinas.
Entrei na mercearia e encontrei Sven atrás do balcão, mexendo na
caixa registradora. Ao me ver, ele acenou e sorriu amigavelmente.
— Freya, que bom te ver! Vendi mais um quadro — anunciou com
alegria. — Esse foi para a filha caçula do mecânico.
— É bom saber que as pessoas daqui estão gostando das minhas
pinturas — comentei, ao parar em frente ao balcão.
— Todo mundo que entra aqui elogia os seus quadros, Freya. Acho
que você devia investir em mais paisagens de Havengreen, os moradores
estão bem contentes com as suas representações da vila.
Concordei, enquanto pensava em silêncio. É uma boa ideia, mas
precisarei de mais referências para novas pinturas.
— Mas o que trouxe você aqui? Veio fazer compras ou só queria
checar se vendi mais um quadro e não fugi com o seu dinheiro?
Dei uma risada e mostrei minhas mãos ressecadas para o homem.
— Por acaso você teria algum hidratante para as mãos?
Sven me encarou por um tempo e sorriu com diversão.
— Só um minuto. — Fechou a caixa registradora e saiu de trás do
balcão.
Ele se dirigiu até um corredor da mercearia e logo voltou de lá
carregando um pequeno pote de creme branco.
Parando na minha frente, Sven abriu o pote e colocou um pouco de
creme nas minhas mãos. Ele sequer pediu permissão, apenas começou a
espalhar o produto de cheiro agradável em minha pele, massageando
suavemente enquanto fazia contato visual comigo. Ok, isso é estranho...
muito estranho.
— Ah... obrigada — falei sem jeito. — Eu vou levar.
Recolhi a mão que ele massageava e a coloquei dentro do bolso do
meu casaco.
Sven apenas sorriu e fechou o pote de creme, o colocando sobre o
balcão.
— Precisa passar hidratante na pele ou o frio da montanha vai acabar
com ela — o comerciante disse, enquanto se dirigia até a caixa registradora.
Fiquei em silêncio, aguardando Sven registrar a o produto.
— Posso descontar da venda do quadro?
— Claro — respondi, ainda me sentindo envergonhada pela
massagem que recebi.
Embora eu estivesse há muito tempo sem contato masculino, o toque
de Sven não me fez sentir nada além de um estranho desconforto.
Fiquei em silêncio e não disse mais nada até que ele me entregou a
nota fiscal do creme e a quantia de 300 coroas, referente ao valor do quadro
que vendi.
— Obrigada. — Guardei o dinheiro no bolso da calça.
— Não há de quê. — Sven sorriu amigavelmente e me entregou uma
pequena sacola de papel onde guardou o pote de creme hidratante. Por
sorte, ele não notou o meu desconforto.
Sem dar mais espaço para conversas, decidi que estava na hora de ir.
Acenei brevemente para o homem e lhe desejei boa noite antes de sair da
mercearia.
Ao chegar na praça, fiquei alguns minutos parada admirando o véu de
água distante que descia pela imponente montanha. Tenho certeza que essa
cachoeira seria uma ótima referência para a pintura, mas eu teria que vê-
la mais de perto.
Eu estava prestes a entrar na minha casa quando um pensamento
surgiu em minha mente: eu poderia subir a montanha e ir até a queda
d’água. A ideia me agradou e não houve nenhuma parte do meu cérebro que
protestou contra. Passei muito tempo lendo sobre aventuras nos livros,
queria viver a minha também — mesmo que fosse apenas subir a colina por
alguns metros até ver a cachoeira de um ângulo melhor.
Sei que seria loucura fazer isso sozinha se eu estivesse em qualquer
outro lugar, mas não na pacata Havengreen. Aqui, a única coisa que podia
acontecer era eu me cansar e decidir voltar no meio do caminho. Contanto
que eu leve água e algumas barrinhas de cereais, tudo vai ficar bem.
Mordi os lábios e olhei para a cachoeira, enquanto pensava mais uma
vez. De onde eu estava podia notar que a grama da montanha era baixa e a
superfície não parecia ser muito íngreme ou rochosa — eu conseguiria subir
usando botas de caminhada. Certo... vou fazer isso. Sairei de casa amanhã
cedo e passarei o dia fazendo esboços da queda d’água. Os moradores de
Havengreen iriam adorar qualquer pintura que saísse desses desenhos e eu
teria a minha satisfação pessoal ao ver de perto a cachoeira que passei as
duas últimas semanas admirando à distância nessa praça.
CAPÍTULO 3

— Querem mais lenha... — resmunguei, ao desligar o comunicador


do rádio que estava sobre a cômoda do meu quarto. — Já entreguei uma
pilha na semana passada. Nem fodendo que vou descer a montanha de
novo!
Eu não estava nem um pouco a fim de ir até a vila outra vez. Os
moradores não morrerão de frio se eu não entregar a lenha, ainda estamos
na primeira semana do outono. Enquanto eu pensava, ouvi Hati, o meu
cachorro da raça bernese, choramingar. Ele estava deitado em sua cama de
pele perto da lareira e me observava atentamente, como se pudesse sentir
que eu estava mais irritado que o normal.
Encarar Hati me fez lembrar que eu precisava juntar cada centavo que
conseguisse até a estação mais fria chegar. No inverno só haveriam metros
de neve sobre o chão e nenhuma madeira seca para cortar, então eu ficaria
sem trabalho até a primavera. Meu cachorro e eu ainda precisaríamos de
comida nesse período, ou seja, eu não tinha para onde correr... teria que
aceitar a encomenda de última hora do delegado Müller.
Bufei, irritado, e comecei a andar de um lado para o outro dentro do
meu quarto, tentando me preparar para voltar à vila pela segunda vez no
mês. Não importa quantos anos passem, eu não conseguia olhar para os
moradores de Havengreen sem lembrar do que aconteceu. Cada canto
daquele lugar me trazia memórias que eu gostaria de esquecer, por isso,
preferi me isolar nessa montanha.
A cabana de madeira em que eu morava ficava localizada em um
pequeno planalto na metade da montanha que cercava Havengreen. Não era
uma residência muito espaçosa, mas para mim, que morava sozinho, tendo
como companhia apenas o meu cachorro de 5 anos, estava aceitável. Os
únicos cômodos do lugar eram o meu quarto, um banheiro e uma área que
eu usava como cozinha e sala de estar. Lá fora, havia uma varanda com
minhas ferramentas de trabalho e nos fundos da cabana estava o gerador à
gasolina que eu usava para ter energia elétrica e manter as coisas
funcionando.
No meu quarto havia apenas uma cama de casal feita de madeira, uma
mesa de cabeceira do seu lado esquerdo, uma lareira que mantinha o
cômodo aquecido nas noites mais frias e uma cômoda velha onde eu
guardava as minhas roupas. Sobre o móvel de madeira, que eu mesmo
construí, também estava o rádio que eu usava como meio de comunicação.
Por sorte, o único naquela vila que sabia como me contactar era o
delegado Müller e ele não me chamava no rádio a não ser que fosse um
assunto de extrema urgência. Sinceramente, não acho que seja tão urgente
assim ter uma pilha de lenha sobrando durante a temporada de chuvas,
mas trabalho é trabalho...
Com um suspiro irritado, peguei o machado que estava encostado na
parede ao lado da porta e saí do quarto. Hati se levantou e me seguiu até a
sala de estar, mas ao ver que eu sairia de casa ele se espreguiçou e resolveu
pular em cima do sofá.
— Preguiçoso — rosnei para o cão, antes de abrir a porta da frente e
sair da casa.
Era nove da manhã e o dia estava ensolarado. Apesar do tempo
levemente abafado daquela manhã, as nuvens escuras que já eram visíveis
ao longe indicavam que teríamos chuva no final do dia. Melhor me
apressar.
Segurando o machado na mão direita, comecei a seguir meu caminho
em direção ao pé da montanha que era cercada por uma floresta de
pinheiros — era de lá que eu tirava madeira para o meu trabalho.
Infelizmente, a caminhonete que eu usava para transportar a lenha cortada
não conseguia subir a montanha, então eu era forçado a deixá-la no fim da
estrada de terra que havia na floresta, junto com algumas ferramentas de
trabalho mais pesadas. Havengreen era um lugar tranquilo, então não havia
perigo de deixar o veículo sozinho por lá.
Acima da minha cabeça era possível ver um céu azul com nuvens
acinzentadas em alguns trechos e um sol que ajudava a amenizar o frio da
manhã. A torre do sino da igreja de Havengreen era a única construção
visível no meio de todo aquele verde da montanha. Por sorte, os pinheiros
da floresta eram altos o suficiente para esconderem a minha humilde e
rústica cabana de madeira. Assim, qualquer pessoa que olhasse para a
montanha, estando na vila, jamais conseguiria imaginar que alguém morava
em um terreno tão elevado.
Haviam várias alterações no relevo da montanha — o que tornava
aquele cenário bonito e mortal. Qualquer pessoa desatenta poderia tropeçar
e se machucar nas pedras que estavam escondias sob a grama, tornando-se
um alvo fácil para os lobos que vagavam pela área e sentiam o cheiro de
sangue.
Era fácil se perder nesse cenário verde cheio de altos e baixos se não
conhecesse bem a região ou não estivesse acompanhado de um mapa.
Também era preciso ter cuidado ao passar perto das falésias — a terra do
solo costumava se desprender com frequência nesses locais e você podia
escorregar para uma morte terrível e dolorosa. Sinceramente, eu até gosto
desse terreno instável. É como ter um monte de armadilhas naturais
impedindo que qualquer pessoa entre no meu território...
Apesar dos perigos, a montanha que eu chamava de lar também tinha
suas belezas. A mais ou menos 1km da minha casa, atrás de um monte mais
elevado, estava o poço de uma magnífica cachoeira cuja água brotava de
uma rocha mais acima e descia montanha abaixo fazendo parecer que um
longo véu de noiva estava espalhado pela grama verde. Eu passava por lá
sempre que descia para ir até a floresta, pois o terreno naquela área era
menos inclinado — o que tornava a descia mais fácil.
Depois de alguns minutos de caminhada, já era possível ouvir o som
da queda d’água. Quando contornei a colina, avistei à distância a lagoa
onde as águas da cachoeira caíam, mas dessa vez havia algo diferente no
lugar. Uma linda mulher, que mais parecia uma miragem, estava sentada em
uma pedra enlodada às margens da cachoeira, admirando a paisagem.
Ela era negra e tinha cabelos lisos da cor da noite que iam até o meio
das suas costas. Em suas mãos havia um caderno onde ela desenhava, seu
olhar se desviava entre a queda d’água e a folha de papel. Era a primeira
vez em muito tempo que eu via outra pessoa na montanha. De onde essa
mulher veio? Fiquei tão distraído a observando que, por um instante, até me
esqueci que ela invadiu o meu território.
A mulher misteriosa franziu o cenho e virou o rosto na minha direção,
como se pudesse sentir a minha presença. Fui mais rápido e consegui recuar
alguns passos, voltando para trás da curva da colina antes que ela pudesse
me ver. Fiquei em silêncio e fechei os olhos por um tempo. Meu coração
estava acelerado, assim como a minha respiração.
De onde ela veio? Por que está sozinha aqui? Como subiu a
montanha sem se acidentar no caminho? Eu até pensaria que ela era uma
turista se Havengreen não fosse uma vila tão escondida que a maioria das
pessoas sequer sabia da sua existência. Nunca vi aquele rosto em parte
alguma — acredite, com certeza eu me lembraria se já tivesse encontrado
aquela mulher em alguma outra ocasião.
Talvez, seja filha de alguém que more na vila. Ela devia estar
estudando fora e agora retornou. Alguns pais mandavam as crianças para
outra cidade para que pudessem receber uma educação melhor.
Infelizmente, eu não tive essa oportunidade. Meus pais morreram quando
eu tinha 3 anos e me deixaram sob os cuidados do meu tio idiota que me
colocou para trabalhar assim que eu adquiri força para segurar um martelo.
Foi ele quem me trouxe para esse fim de mundo e, para ser sincero, eu
ainda o culpo pela maioria das merdas que aconteceram comigo — mesmo
que ele não esteja mais entre nós.
Abri os olhos e segurei com força o machado que estava em minha
mão direita. Eu precisava tomar alguma atitude. Não importa o quanto a
mulher na cachoeira seja linda, essa é a minha montanha, o meu território,
não quero gente perambulando por aqui. Até mesmo o delegado Müller
evitava mandar o seu pessoal para cá quando o gado de algum fazendeiro
idiota ultrapassava os limites da cerca. Ele conhecia o meu temperamento e
sabia como a presença de outras pessoas me irritava. Todo mundo naquela
vila sabe como eu sou. Porra, será que ninguém avisou para essa mulher
que não se deve subir a montanha?
Cerrei os dentes e criei coragem para me revelar. Vou expulsá-la
daqui. Saí de trás da colina em passos firmes, mas congelei no lugar quando
vi a mulher sorrir. Ela olhava para cima e parecia encantada enquanto
admirava a queda d’água, sem ter a mínima noção de que eu a observava a
poucos metros de distância. Porra. Tentei dar mais um passo na direção
dela, mas minhas pernas ainda não se moviam. Eu queria assustá-la para
que ela saísse dali, mas o meu corpo não me obedecia.
Segurei o cabo do machado com mais força para tentar conter o meu
nervosismo. Os nós dos meus dedos começaram a doer e eu franzi o cenho
com irritação. Talvez fosse o meu próprio instinto masculino que estava
falando mais alto e me impedindo de espantar aquela mulher para longe. Eu
estava há cinco anos sem sentir o calor macio de um corpo feminino, nem
lembrava mais do gosto ou de como era a sensação de me enterrar bem
fundo em uma boceta quente e molhada.
Eu era um homem adulto, tinha necessidades. Sempre que o tesão se
acumulava a minha mão direita estava lá para me ajudar a aliviar as coisas,
mas isso não era o suficiente. Nunca foi. E esse era apenas mais um motivo
para me lembrar que essa mulher bonita não podia ficar aqui. Não vou
conseguir ficar em paz sabendo que essa deusa perfeita está andando pela
minha montanha.
A mulher parou de admirar a cachoeira e voltou a prestar atenção no
que estava rabiscando em seu caderno. Apesar da instabilidade emocional
que crescia dentro de mim a cada segundo que eu passava ali, percebi que
ela não corria perigo e sequer parecia inclinada a se afastar para explorar
outro lugar — sua atenção estava fixa apenas na cachoeira e no caderno em
seu colo. Porra... não acredito que vou ceder.
Respirando fundo, segurei o machado com mais leveza e senti a
minha irritação desaparecer aos poucos. Caminhei para trás em passos
silenciosos até que consegui me esconder novamente atrás da colina. Por
enquanto, deixarei isso como está. Vou cortar a maldita pilha de lenha que
o Müller pediu, mas se essa mulher ainda estiver aqui quando eu voltar,
vou expulsá-la para longe e garantir que ela nunca mais volte a se
aventurar no meu território.
CAPÍTULO 4

Acordei com o susto ao ouvir o toque estridente do despertador


indicando que era 5:30h da manhã. Abri os olhos e tateei a mesa de
cabeceira até encontrar meu celular e desligar aquele maldito alarme.
Quando me sentei na cama, o livro que passou a noite aberto sobre o
meu peito caiu no colchão. Adormeci lendo outra vez. Isso tem acontecido
com muita frequência ultimamente.
Todos os dias antes de dormir eu relia algum trecho romântico de
Desire&Seduction. As cenas protagonizadas por Bear e sua amada sempre
me arrancavam suspiros, risadas e uma quantidade incontável de lágrimas.
Eu terminei de ler esse livro há semanas, mas ainda assim passava a maior
parte do tempo com ele nas mãos. Gostava de ficar reprisando as minhas
cenas preferidas.
Talvez eu estivesse muito obcecada com esse livro. Na noite passada
até sonhei que estava nos braços de Bear. Ah! Aquele lenhador forte, bruto
e gostoso, de longos cabelos loiros, barba por fazer e olhos acinzentados...
Esse homem é o meu sonho de consumo no momento, uma pena que ele só
exista nas páginas de papel.
Eu estava morando em Havengreen a tempo suficiente para saber
quem eram os homens solteiros da vila e podia afirmar que nenhum deles
chamou a minha atenção. Nem mesmo Sven que tinha uma aparência
encantadora e um corpo em forma da época que serviu ao exército
despertou meu interesse romântico — eu o via apenas como um amigo e
nada mais.
Pelo visto, eu levaria uma vida solitária por aqui, mas ao menos tinha
meus livros e a pintura para me distrair... O que me lembra da promessa que
fiz a mim mesma de que hoje irei subir a montanha até a cachoeira.
Criei coragem e empurrei o cobertor para o lado. Me espreguicei por
alguns segundos, levantei da cama e fui para a cozinha fazer café. Sei que
vou me sentir mais disposta depois de uma ou duas xícaras...
Após comer e tomar banho, vesti uma legging preta, um moletom
rosa de capuz e calcei minhas botas de caminhada. Peguei uma pequena
mochila dentro do meu armário e guardei nela apenas o essencial: meu
caderno de desenhos, estojo com lápis, barrinhas de cereais, uma garrafa
d’água e, é claro, o meu inseparável livro Desire&Seduction. Imagino a
experiência incrível que deve ser ler no alto da montanha enquanto admiro
a vista.
Quando saí de casa, não fiquei surpresa ao ver que Havengreen estava
completamente vazia. Nenhum dos estabelecimentos que ficavam perto da
praça estava aberto e não havia nenhuma pessoa andando pela rua além de
mim.
Espiei a hora no meu celular e vi que eram 6:45h. Bom, é hora de
iniciar a minha jornada. Guardei o smartphone dentro da mochila junto
com as chaves da minha casa e caminhei pelas ruas de paralelepípedos até
chegar na floresta de pinheiros que ficava ao pé da montanha.
A primeira coisa que notei ao chegar na entrada da floresta foi que
havia uma estrada de terra seguindo para dentro das árvores. Aquilo me
levou a crer que a região era visitada com frequência pelos moradores —
caso contrário, por qual motivo fariam uma estrada no meio da mata da
largura de um carro? Se eu soubesse que o local era de fácil acesso, teria
vindo com a minha caminhonete...
Deixando o arrependimento de lado, comecei a seguir a estrada de
terra, adentrando cada vez mais naquela floresta de pinheiros altos e
frondosos. O ambiente ali era úmido e mais frio que no resto da cidade.
Alguns pequenos galhos que estavam caídos na estrada se quebravam
sempre que eu pisava sobre eles. Aproveitei a caminhada para admirar os
pequenos animais silvestres que viviam ali. Avistei um esquilo em cima de
um galho roendo uma noz, um pica-pau batendo em um tronco e até uma
pequena lebre se escondendo em uma toca cavada no chão.
Por que nunca estive aqui antes? Esse lugar é maravilhoso. Até me
lembra a floresta em que Bear trabalha. Por um instante, imaginei um
homem alto e forte, com longos cabelos loiros e um machado na mão
saindo do meio das árvores e caminhando até mim. Melhor parar de sonhar
acordada! Com certeza eu não iria reclamar se encontrasse um lenhador
forte e bonito por aqui, mas infelizmente eu sabia que nenhum morador de
Havengreen ao menos chegava perto de se parecer com o mocinho do livro.
A realidade é uma merda!
Caminhei por 20 minutos até chegar no fim da estrada. Curiosamente,
havia uma caminhonete preta parada ao pé da montanha com várias
ferramentas dentro da sua carroceria. O veículo estava caindo aos pedaços e
eu desconfiei que ele foi abandonado ali porquê do jeito que a lataria
estava, provavelmente, o motor nem ligava mais. Que desperdício... se o
dono dessa lata velha a levasse para o mecânico da vila, o Sr. Norton,
tenho certeza que ela voltaria a funcionar em poucos dias de reparo.
Desviando minha atenção para longe do veículo abandonado, encarei
a montanha imponente que estava diante de mim. A cachoeira que eu tanto
queria ver não chegava até o solo da floresta, sua queda d’água terminava
em um aglomerado de pedras alguns metros acima de onde eu me
encontrava — o que significava que eu teria que andar um pouco mais antes
de chegar ao meu destino.
A subida não parecia ser muito íngreme e, por sorte, havia um rastro
de grama amassada que levava na mesma direção que eu pretendia ir.
Parece que alguém sobe até a cachoeira com frequência. Dei um nó duplo
nos cadarços das minhas botas para garantir que elas não ficariam frouxas
durante a subida, ajustei a alça da minha pequena mochila e segui em
frente, dando início a segunda parte da minha aventura.
A montanha inteira possuía grama verde e alguns arbustos com
frutinhas vermelhas que eu imaginei não serem comestíveis. Além de
pequenas elevações, o terreno também possuía alguns trechos
desbarrancados em que eu precisei tomar cuidado para não escorregar. Para
ser sincera, foi a trilha de mato amassado que me salvou em boa parte do
caminho, pois ela sempre seguia para a direção menos perigosa do percurso.
Quando finalmente cheguei na cachoeira, eu estava exausta. Minha
garganta estava seca e o suor escorria da minha pele como se eu tivesse
feito uma série de exercícios — o vento frio da montanha se tornou
refrescante naquele momento. Com a respiração cansada, peguei minha
garrafa d’água na mochila e bebi alguns goles enquanto admirava a vista. A
trilha foi difícil, mas valeu a pena.
Acima da minha cabeça estava a cascata que brotava de uma pedra
mais alta na montanha. O vento que soprava naquela altitude fez com que
respingos d’água caíssem no meu rosto ajudando a refrescar o calor que eu
sentia pelo esforço que eu fiz. À minha frente, estava o leito da cachoeira
rodeado por pedras enlodadas de vários tamanhos e formas. Isso vai dar
uma linda pintura...
Passei mais um tempo admirando o lugar até que decidi me sentar em
uma das pedras à beira da água, tomando cuidado para não molhar a minha
roupa. Coloquei minha mochila sobre a grama que havia ao lado da pedra,
peguei meu caderno e um lápis que eu costumava usar para fazer os
primeiros traços dos desenhos e comecei a fazer o esboço da paisagem.

Confesso que me deixei distrair pela beleza da paisagem várias vezes.


Quando acabei meu desenho já passava das 15h e haviam nuvens de chuva
acima da montanha. Eu sabia que devia ir embora antes que começasse a
chover, mas não queria sair dali sem antes ter a experiência de reler o meu
atual livro favorito da L. M. Mayer. Vou ler um pouco e depois retorno para
casa...
Tirei o livro da mochila e o abri em um trecho que deixei marcado
com um post-it azul. O som da cachoeira e o ar fresco me traziam uma
infinita sensação de paz. Admirei a vista onde era possível enxergar a torre
do sino da igreja, as folhas altas dos pinheiros esverdeados e um céu
cinzento com nuvens carregadas. Voltei minha atenção para as páginas do
livro e comecei a ler em pensamento.
“...O lenhador que estava na minha frente era de tirar o fôlego.
Longos cabelos dourados caíam por seus ombros musculosos, ele estava
sem camisa e exibia um peitoral suado pelas horas que passou cortando
madeira. Seus olhos cinzentos me encaravam de um jeito intenso e eu logo
soube o que ele queria: sexo. Bem aqui nessa floresta de pinheiros. Bear
quer o meu corpo outra vez e eu estou mais do que pronta para me lançar
nos braços desse bruto apaixonado...”
— Vou pedir só uma vez: dê o fora da minha montanha! — rosnou
uma voz grossa e masculina.
Meu corpo estremeceu com o susto e eu ergui o olhar para a pessoa
na minha frente.
Fiquei boquiaberta no instante em que a minha visão se fixou no
homem que falou comigo. A mais ou menos três metros de distância da
pedra em que eu estava sentada havia um homem forte, com no mínimo
1,90m de altura, sem camisa, cabelos de um tom loiro dourado soltos ao
redor dos ombros, olhos acinzentados e barba por fazer. Não é possível...
devo estar imaginando coisas. Esse homem é tão lindo que não pode ser
real. E, além de tudo, ele é idêntico ao mocinho de Desire&Seduction!
Perdi bons minutos encarando em silêncio — e completamente
embasbacada — o personagem fictício que havia se materializado na minha
frente. A essa altura ele me analisava de cima abaixo também, mas não
parecia muito contente. Seus músculos estavam tensos e a sua pele pálida
suada. Ele segurava um machado na mão direita e estava com uma
expressão irritada no rosto. Céus, ele também é um lenhador? Não... não
pode existir tal coincidência no mundo. Com certeza, estou alucinando!
— É a última vez que vou pedir com gentileza... — o homem falou
novamente, com um tom mais zangado. — Sai da minha montanha!
Porra! Ele é real sim!
Arquejei e levei as mãos até a boca. Não conseguia acreditar no que
estava diante dos meus olhos. A euforia que senti por saber que existia um
homem no mundo exatamente igual ao meu personagem preferido fez com
que eu ignorasse momentaneamente o aviso de retirada que ele estava me
dando.
— Porra! Você não está me ouvindo? — ele gritou, e passou a segurar
o machado com as duas mãos. Ok, agora estou ficando assustada. — Sai da
minha montanha. Agora!
Pisquei algumas vezes. Como assim ele chega do nada e acha que
tem o direito de me mandar sair daqui? Não há um aviso de propriedade
privada em lugar algum então essa montanha não é dele. Não importa se o
homem é lindo de morrer, não deixarei que ninguém fale comigo assim!
— Sua montanha? — debochei, enquanto fechava o livro em meu
colo. — Não vejo o seu nome escrito em parte alguma.
A versão ranzinza de Bear fechou a cara no instante em que eu
terminei de falar. Seu peito subiu e desceu com rapidez e as suas mãos
apertaram com tanta força o cabo do machado que os nós dos seus dedos
ficaram esbranquiçados. Merda! Acho que cometi um erro...
CAPÍTULO 5

Depois de entregar a pilha de lenha na vila, retornei para a floresta e


comecei a subir a montanha em passos largos. Eu queria chegar à cachoeira
o mais rápido possível para ver se a mulher misteriosa ainda estava lá, então
não me dei ao trabalho de seguir pela trilha mais segura. Cortei caminho
pelas encostas da montanha, usando o cabo do machado para me apoiar nos
trechos mais íngremes.
Parte de mim queria que aquela mulher ainda estivesse sentada na
rocha apenas para que eu pudesse vê-la novamente, mas a outra parte
desejava que ela tivesse retornado para o lugar de onde veio. Se a mulher
ainda estivesse lá eu teria que expulsá-la e mesmo que eu odiasse admitir,
eu não queria ser rude com ela.
Era a primeira mulher que aparecia nessa montanha desde que me
isolei aqui, eu devia ser mais gentil com ela. No entanto, do que adiantaria
ser gentil e ela me apunhalar pelas costas na primeira oportunidade? Não
estou procurando uma parceira, quero paz e sossego! Deixarei a gentileza
para os moradores de Havengreen.
Quando cheguei na cachoeira, senti uma certa ansiedade ao ver que a
mulher ainda estava sentada na pedra. Meu peito se aqueceu e um estranho
sorriso involuntário curvou a minha boca enquanto eu a observava em
silêncio. Ela havia parado de rabiscar em seu caderno e agora estava lendo
um livro. Não quero estragar esse momento, mas a minha montanha não é
área de lazer. Isso precisa acabar agora!
Respirei fundo para ganhar coragem e segurei firme o machado em
minha mão direita. Vou falar com ela. Dei um passo à frente e fiz o possível
para manter a postura autoritária.
— Vou pedir só uma vez... dê o fora da minha montanha! — rosnei
com a voz firme e observei a sua reação.
A mulher deixou de encarar o livro e virou o rosto na minha direção.
Ela ficou boquiaberta, sem se importar em disfarçar o quanto ficou chocada
ao me ver. Seus olhos analisaram minuciosamente o meu corpo, se
demorando ao passar pelos músculos do meu peito já que eu estava sem
camisa — acabei deixando a roupa na caminhonete quando comecei a suar
durante o trabalho e não me importei em vesti-la de volta, meu corpo já
estava acostumado com o clima da montanha.
Não foi difícil perceber que a mulher me observava com um certo
interesse, então achei justo tirar um tempo para encará-la também. Ela era
bem menor que eu — sua cabeça devia bater um pouco abaixo do meu
ombro — e por um momento, me peguei divagando que devia ser
extremamente fácil carregá-la nos braços. Seu rosto possuía traços
delicados, porém, marcantes. Suas sobrancelhas eram finas, as bochechas
saltadas, o nariz arrebitado e ela tinha uma boca carnuda que se
assemelhava um pouco ao formato de um coração. Ela era tão perfeita...
precisei de muito esforço para voltar a expulsá-la.
— É a última vez que vou pedir com gentileza... — vociferei
novamente. — Sai da minha montanha!
A mulher não disse nada, apenas arquejou e levou as mãos até a boca.
Por favor, não me obrigue a ser rude com você...
— Porra! Você não está me ouvindo? — gritei sem pensar, e segurei o
machado com as duas mãos. — Sai da minha montanha. Agora!
— Sua montanha? — Ela finalmente abriu a boca. — Não estou
vendo o seu nome escrito em parte alguma.
Franzi o cenho e apertei o machado com força. O deboche daquela
mulher foi como gasolina para a centelha de irritação que queimava dentro
de mim. Não vou permitir que uma coisinha que bate no meu peito venha
até a minha montanha e me trate desse jeito. A intrusa aqui é ela, sou eu
quem preciso me impor!
Se ser gentil não funcionou, talvez eu precise ser um pouco dramático
para expulsá-la.
Deixei a raiva falar mais alto e ergui o machado acima da cabeça, em
seguida, urrei o mais alto que eu pude — como apenas uma fera das
montanhas faria.
A mulher arregalou os olhos e se levantou da pedra, assustada. Ela
pegou o livro que estava em suas mãos e o enfiou dentro de uma pequena
mochila vermelha que logo foi colocada em suas costas.
— SAI DA PORRA DA MINHA MONTANHA! — gritei ao me
aproximar de onde ela estava.
A intrusa deu alguns passos para trás e ergueu as mãos em sinal de
rendição.
— T-tá bom... já entendi — gaguejou. — Estou saindo.
— AGORAAA! — Balancei o machado no ar, fingindo que iria
acertá-la.
Ela gritou e correu para longe, seguindo a trilha que descia a
montanha. Ao ver que meu plano estava funcionando, comecei a persegui-
la enquanto segurava o machado e gritava palavras ameaçadoras para que
ela se sentisse ainda mais assustada. Desse jeito a mulher nunca mais
voltará aqui. Pensar que eu não a veria novamente fez com que eu me
sentisse mal, mas a raiva que queimava em meu interior falou mais alto que
qualquer outro sentimento.
— Some daqui! — gritei, enquanto a perseguia colina abaixo.
Urrei novamente e quando ela virou o rosto para me encarar eu
balancei o machado no ar fazendo uma cena teatral. A intrusa ficou
aterrorizada e voltou a olhar para frente, correndo ainda mais rápido.
— É melhor correr, baixinha, porque se eu te alcançar vou cortar a
sua cabeça e pendurá-la em cima da minha cama!
— SOCORRO! — Ela apertou o passo. — Delegado Müller!
Precisei de muito esforço para controlar as risadas que queriam
escapar. Não me lembro quando foi a última vez que expulsei alguém da
montanha, mas sei que não foi tão divertido assim.
— Isso, corra bem rápido! — Dei uma gargalhada e percebi que
aquela atitude me deixou ainda mais parecido com um psicopata.
A intrusa virou seu rosto para me encarar outra vez e, em seguida, seu
corpo desapareceu do meu campo de visão. Porra, ela caiu!
Acelerei a corrida até me pegar olhando de cima da ribanceira em que
a mulher escorregou. Avistei alguns metros mais abaixo o seu corpo imóvel
e sujo de terra, caído entre os arbustos que haviam no fim do barranco. Seus
fios de cabelo preto estavam sobre o seu rosto — o que me impediu de ver
se ela estava acordada.
Deixei o machado cair no chão e levei as mãos à cabeça. Porra, o que
foi que eu fiz?
Embora uma parte de mim estivesse com receio, desci o barranco
com cautela, torcendo para que a mulher estivesse viva. A queda não foi
muito alta, mas ela ainda podia ter batido a cabeça em uma das pedras do
solo — pensar nisso quase me fez perder o fôlego de preocupação.
Quando cheguei perto dela, me ajoelhei no chão ao seu lado e retirei o
cabelo que estava em sua face. Meu peito se apertou quando vi um corte na
ponte do seu nariz e sangue escorrendo da sua testa. Isso é culpa minha.
Chequei o seu pulso e me senti aliviado por sentir o sangue correndo em
suas veias — ao menos era um bom sinal. Olhei rapidamente para o restante
do seu corpo e não notei nenhuma mancha de sangue na sua roupa, o que
indicava que não havia nenhum outro ferimento grave além do corte aberto
em sua testa.
Enquanto a culpa dominava o meu interior, eu só conseguia me
perguntar o que faria com ela agora. Não posso deixá-la aqui, ela será
devorada pelos lobos assim que a noite chegar, mas se eu a levar para a
vila nesse estado, o que os outros moradores vão pensar? Mesmo que eu
inventasse uma história e dissesse que ela escorregou sozinha, seria apenas
uma questão de tempo até que ela acordasse e contasse toda a verdade. Eu
não queria me encrencar com o delegado Müller.
Suspirei com aflição. Enquanto eu pensava, uma gota de chuva caiu
no meu ombro e outra nas minhas costas.
— Só pode ser brincadeira... — resmunguei, voltando meu olhar para
o céu.
Nuvens pesadas pairavam acima da montanha, o que significava que
aquelas eram apenas as primeiras gotas da tempestade que estava por vir.
Eu tinha que levar essa mulher para um abrigo o mais rápido possível e
cuidar dos seus ferimentos, mas não teria tempo de descer a colina sem ser
pego pela tempestade. Eu ficaria preso na vila com os moradores me
fazendo um milhão de perguntas enquanto esperava a chuva passar —
definitivamente eu não queria isso. Só havia uma alternativa...
Respirei fundo e fechei os olhos, já imaginando que iria me
arrepender por tomar aquela decisão. Sem ter para onde fugir, peguei a
mulher no colo e comecei a subir o barranco, torcendo para conseguir
chegar na minha cabana antes que a chuva começasse a cair em maior
quantidade.

A vida decidiu que naquele dia eu iria pagar por todos os meus
pecados. Eu estava a meio quilômetro de casa quando a tempestade me
pegou. Uma chuva grossa e gelada caía em minha pele e eu tentava curvar
meu corpo o máximo que podia para evitar que a mulher em meus braços se
molhasse, infelizmente, não tive muito êxito. Precisei de muito esforço para
subir o restante da colina em meio ao vento e aos trovões até chegar na
planície onde estava localizada a minha cabana de madeira.
Quando abri a porta Hati veio me receber choramingando e
balançando a sua cauda. Ele não deixou passar despercebido que eu levei
outra pessoa para casa e começou a farejar a mulher no instante em que eu
coloquei o seu corpo molhado sobre o sofá — felizmente, o revestimento de
couro do móvel impediria que a água penetrasse na espuma.
Deixei a cabeça dela apoiada em uma almofada para garantir que
ficaria confortável e retirei com cuidado a mochila das suas costas,
colocando-a atrás do sofá — por sorte, a bolsa era de um tecido
impermeável então imaginei que o que estava lá dentro não teria molhado
com a chuva.
Enquanto eu encarava a intrusa, sentia a água escorrer pelo meu corpo
e pingar no chão de madeira, formando uma poça onde minhas botas
pisavam. Peguei um pano e comecei a secar a água empoçada na sala de
estar, enquanto tentava decidir o que faria com a mulher desacordada. Ela
precisaria de roupas secas, cobertores e eu estava torcendo para que o corte
em sua testa não fosse fundo o suficiente para precisar de pontos. Não seria
nada agradável costurá-la sem anestesia.
Quando terminei de secar a poça, Hati se pendurou no sofá com as
patas dianteiras e lambeu uma gota d’água que escorria pelo rosto da
mulher. Ele a farejou um pouco e depois se afastou. Meu cachorro não tinha
contato com muitas pessoas e eu fiquei aliviado por ele não estranhar a
nova visitante — se é que eu podia chamá-la assim. A coitada só estava
aqui porque a persegui montanha abaixo gritando feito um louco e isso
quase a matou.
Senti um arrepio em meu braço e fui até o quarto vestir alguma coisa
seca. Hati me seguiu até o cômodo e resolveu ficar por lá, deitado em sua
cama de pele perto da lareira. Poucos minutos depois, retornei à sala usando
uma blusa de flanela xadrez, calça de moletom preta e com uma toalha
branca enrolada em meu cabelo molhado. Embaixo do braço direito eu
trazia um cobertor, toalhas secas, um suéter de lã azul e uma calça cinza
com cadarço na cintura.
Quando parei em frente ao sofá e encarei a mulher que ainda estava
desacordada, senti um baque interno pelo que eu teria que fazer a seguir.
Trocar a roupa dela seria tortura, mas eu bem que merecia esse castigo pelo
que fiz. Ela não estaria aqui se eu não bancasse o idiota territorialista a
expulsando da minha montanha. Tudo que vai volta e eu já estou recebendo
a minha punição...
A mulher estava ferida por minha culpa e por mais que eu temesse o
que poderia acontecer caso ela ficasse muito tempo por perto eu pretendia
mantê-la aqui até que ela estivesse bem o suficiente para voltar para a vila
por conta própria. Não vou me perdoar se algo de ruim acontecer com essa
pequena deusa. Me abaixei em frente ao sofá em que ela estava e deixei as
roupas que eu trouxe no chão.
O céu estava desabando lá fora. Eu me sentia pior a cada segundo que
eu passava encarando aquele rosto perfeito que agora estava cheio de cortes
graças à minha estupidez. Em uma tentativa de me redimir eu iria limpar
suas feridas, fazer curativos e dar pontos em sua testa — caso fosse
necessário —, mas primeiro, precisava tirar aquelas roupas molhadas antes
que ela pegasse um resfriado. Certo, eu consigo... seja forte, Bear.
Respirei fundo e resolvi começar pelas botas de caminhada que ela
usava. Desfiz o nó do cadarço de seu pé direito e quando comecei a puxar o
calçado a mulher gritou de dor. Parei imediatamente o que eu estava
fazendo e fitei o seu rosto. Ela estava de olhos abertos, confusa, tentando
reconhecer o ambiente.
— Está sentindo alguma dor? — indaguei, preocupado. Se essa
garota quebrou o tornozelo a sua estadia aqui não será de dias, mas sim de
semanas.
— V-você — ela gaguejou, aterrorizada. Seu rosto ganhou uma
expressão de desespero enquanto ela me encarava de cima a baixo. — Por
favor, fique longe de mim!
— Ei... eu posso explicar. — Segurei em seus ombros para que ela se
acalmasse.
— Me solte! — gritou, desesperada, e me deu um tapa no rosto.
Afastei minhas mãos dela por reflexo. Na primeira oportunidade a
mulher se colocou de pé, mas caiu no segundo seguinte enquanto gemia
com dor. Ela levou uma das mãos até seu pé direito e xingou, agoniada.
— O que você fez comigo, seu imbecil?
— Eu não fiz nada... — Abaixei-me para tentar ajudá-la a voltar para
o sofá, mas levei outro tapa.
— Fique longe! — gritou. — SOCORRO!
Mesmo com o tornozelo ferido, a mulher deu um jeito de sair de perto
de mim, rastejando pelo chão em direção à porta. Ela estava desesperada
para fugir e eu não a culpava — depois da cena que eu fiz com o machado,
até eu sairia correndo se estivesse em seu lugar. Parece que vou ter trabalho
para consertar essa situação.
CAPÍTULO 6

Acordei em um sofá de couro marrom sentindo uma dor aguda em


meu tornozelo direito. Gritei com o incômodo, mas levei as mãos à cabeça
quando senti uma pontada de dor na testa. Minha visão estava turva e eu me
sentia tonta. Olhei ao meu redor tentando identificar o lugar em que eu
estava, mas não consegui reconhecer nada.
— Está sentindo alguma dor? — Estremeci ao reconhecer aquela voz.
É o homem do machado!
Virei meu rosto para a frente e dei de cara com o loiro que me
encarava com um olhar preocupado. Fui consumida por um estado de
pânico que fez o meu coração acelerar.
— V-você — gaguejei com medo. Dei uma breve olhada em suas
mãos e fiquei um pouco aliviada ao ver que ele não estava mais com o
machado. — Por favor, fique longe de mim!
— Ei... eu posso explicar.
O sujeito me segurou pelos ombros para que eu não saísse do lugar.
Um alerta se acendeu em minha mente e eu não pensei em mais nada que
não fosse a minha segurança. Preciso sair daqui... tenho que fugir desse
monstro!
— Me solte! — Dei um tapa em seu rosto e ele tirou aquelas mãos
pesadas e gigantescas de mim.
Levantei do sofá com a velocidade de um raio, mas logo senti uma
dor terrível se espalhar pelo meu tornozelo direito. Meu corpo foi ao chão
imediatamente e a minha cabeça pareceu estar prestes a explodir.
— Caralho! — Levei as mãos até o meu pé dolorido, que,
infelizmente, não estava visível já que eu usava as minhas botas de
caminhada.
Percebi que meus cadarços estavam desamarrados como se alguém
tivesse tentado tirar as botas do meu pé. Foi isso que me acordou! O
homem do machado estava tirando a minha bota quando fui despertada pela
dor. Porra, o que ele teria feito se eu não tivesse acordado a tempo?
— O que você fez comigo? — disparei aquelas palavras, horrorizada.
Milhões de pensamentos perturbadores passavam pela minha mente
naquele instante e eu não conseguia afastá-los.
— Eu não fiz nada. — O loiro tentou se aproximar de mim para me
tirar do chão, mas eu lhe dei outro tapa.
— Fique longe! — gritei, meus lábios começavam a ficar trêmulos
pelo choro de desespero que ameaçava cair. — SOCORRO!
O homem do machado me encarou fixamente e eu decidi que
precisava sair dali — andando ou não. Usei a força dos meus braços e da
minha perna que não doía para começar a rastejar o mais rápido que eu
podia em direção até a única porta que avistei em meu campo de visão.
Lágrimas começaram a descer pelo meu rosto à medida que eu
avançava. Parecia até que eu estava protagonizando um filme de terror. Meu
tornozelo estava torcido — ou quebrado —, pois eu não conseguia ficar de
pé, uma tempestade caía lá fora e eu estava rastejando pelo chão da cabana
de madeira de um homem que me perseguiu com um machado.
Será que esse é o último dia da minha vida? O pensamento me fez
estremecer enquanto eu seguia até a porta de madeira, torcendo para que o
homem do machado não me alcançasse. Eu estava chegando ao meu
objetivo quando mãos pesadas seguraram os meus ombros e me ergueram
no ar. Gritei, desesperada, e desferi o máximo de golpes que consegui
contra o peito forte e duro em que eu fui pressionada.
— Me solta! — gritei, apavorada. — Eu não quero morrer hoje!
— Porra — o som da sua voz fez o seu peito vibrar enquanto ele
falava. — Fique quieta.
— Não! — protestei, enquanto batia os punhos na muralha de
músculos que me carregava. — Não me mate, por favor!
Era assustador o fato de que os meus socos sequer pareciam
incomodá-lo. Eu estava perdida, não tinha a menor chance contra esse
brutamontes. Não acredito que vou morrer pelas mãos de um psicopata que
anda pela montanha. O delegado Müller não sabia que tinha um sujeito
desses andando em Havengreen? Como pude ser tão burra por sair e
explorar uma região desconhecida sem antes perguntar aos moradores se era
seguro?
Merda... Nunca pensei que a vontade de fazer uma nova pintura me
custaria a vida. Vou morrer antes mesmo de encontrar o amor, me casar ou
ter filhos. A ideia me aterrorizou. Eu não conseguia aceitar que estava
sendo carregada naqueles braços fortes para encontrar o meu fim.
— Eu não posso morrer hoje! — gritei, tentando convencê-lo a me
deixar em paz. — Por favor...
Meu corpo aterrissou em uma superfície macia e eu percebi que
estava de volta ao sofá em que acordei. O homem do machado ignorou os
protestos que eu fazia e voltou a tentar tirar a bota do meu pé. Chutei ele
com a minha perna boa e ele grunhiu quando seu queixo, coberto pela barba
loira, foi atingido.
— Porra! Quer parar de lutar? — Ele segurou a minha perna.
— Eu quero continuar viva! Por favor, não faça isso. — Debati-me
novamente.
Ele franziu o cenho e me encarou no fundo dos meus olhos.
— Escute... eu não vou te matar, está tudo bem. Fique calma e confie
em mim.
Apesar do medo, eu ri com deboche.
— Confiar em você? Está louco? Você me perseguiu pela montanha
com a merda de um machado nas mãos. — Lutei para livrar a minha perna
do seu aperto, mas não tive sucesso. — Me solta!
— Te solto quando parar de tentar me bater! — exasperou-se. — Eu
já disse que não vou te matar. O que fiz na montanha foi apenas...
encenação.
— Encenação?
O homem ficou relutante em responder.
— Sim... porra, eu só queria te assustar para que saísse da minha
montanha. — Suspirou. — Não imaginei que você iria torcer o pé, rolar de
um barranco e bater com a cabeça.
Toquei a região dolorida da minha testa e senti algo pegajoso grudar
em meus dedos. Quando encarei a minha mão, vi que ela estava coberta por
um líquido vermelho. Merda!
— Foi isso que aconteceu? — balbuciei, enquanto fitava meus dedos
sujos de sangue. Eu só me lembrava de sentir uma dor aguda no pé direito
antes de cair. Tudo ficou escuro quando o meu corpo atingiu o chão.
— Basicamente, sim. — Seu aperto em minha perna se suavizou
gradativamente até que ele me soltou. — Preciso ver o seu pé para ter
certeza do tipo de lesão que aconteceu. Posso tirar a sua bota?
— Não vai me matar? — indaguei, desconfiada. Apesar dele estar me
tratando bem, o medo do que esse homem fez mais cedo ainda pairava em
minha mente.
— Se eu quisesse te matar, eu já teria feito isso.
Engoli em seco. Fiquei encarando o loiro por um tempo, analisando
cada centímetro da sua expressão para ter certeza de que ele não estava
tentando me passar a perna.
Enquanto esperava pela minha resposta, o homem também ficou me
encarando sem ao menos disfarçar. Nossos olhares se encontraram e eu
estranhei a rapidez com que me senti calma quando fitei seus olhos
acinzentados por mais tempo que o necessário. São da mesma cor que os
olhos do Bear de Desire&Seduction...
— E então? — Sua mão se firmou ao redor da minha bota direita. Ele
estava apenas esperando uma confirmação para puxá-la.
Respirei fundo e assenti.
O homem ficou com uma expressão séria no rosto e em um único
movimento puxou a bota para fora do meu pé. Eu gritei com a dor que senti,
sendo pega totalmente desprevenida.
— Porra! Por que não avisou que iria doer? — questionei com o
desconforto, enquanto apertava o braço do sofá para conter a dor.
— Achei que você já estava ciente que seria desconfortável.
Ele fez uma careta quando encarou o meu pé. Segui o seu olhar e
estremeci com o que vi. O meu tornozelo estava em um tom roxo
avermelhado e já começara a inchar. Ninguém merece...
— Isso está feio — resmunguei.
— É... está sim. Eu vou pegar a caixa de primeiros-socorros e darei
um jeito nisso. — O loiro suspirou e se colocou de pé na minha frente.
Tentei não arquejar quando vi todo o seu tamanho de perto. Enquanto
ele estava abaixado eu só tinha noção do quanto os seus ombros eram
largos, mas agora que ele se encontrava de pé eu tive o conhecimento de
que o seu corpo inteiro era forte e imponente — assim como a montanha.
Quando ele se afastou do sofá e caminhou em direção ao corredor,
pude ver o contorno dos seus músculos sob o tecido de flanela da camisa de
mangas compridas que ele usava. Fiquei admirando o loiro até ele entrar em
uma porta e desaparecer do meu campo de visão.
Eu suspirei e abanei meu pescoço. Me pergunto se ele é grande assim
em todas as partes do corpo... Aquele pensamento incoerente surgiu antes
que eu pudesse contê-lo. Comporte-se, Freya! Mesmo que ele seja idêntico
ao Bear do livro, o homem ainda te perseguiu pela montanha com um
machado.
Enquanto eu tentava controlar o lado malicioso do meu cérebro, ouvi
passos se aproximando e não demorou muito até que o homem forte se
abaixasse ao lado do sofá novamente. O loiro colocou a maleta vermelha no
chão e tirou de lá uma grande atadura branca. Seus olhos acinzentados se
fixaram na região inchada do meu tornozelo e ele tocou a área com
delicadeza o suficiente para não me causar mais dor do que eu já sentia.
— Você realmente é do bem? — perguntei, na intenção de acabar
com qualquer dúvida que pudesse ter me restado. — Não vai me matar e
pendurar a minha cabeça em cima da sua cama?
O homem negou e sorriu. Foi a primeira vez que eu vi um sorriso
sincero naquele rosto carrancudo e eu precisava confessar que até achei
atraente.
— Prometo que não vou te machucar, mulher, não precisa ter medo.
— Seu olhar se fixou no meu. — Enquanto estiver aqui, está sob minha
proteção.
Concordei em silêncio com as suas palavras e admito que a
intensidade com que elas foram ditas me causou um pequeno calor interno.
O olhar que ele me direcionou foi sincero, o que me fez perder o restante do
medo e da insegurança que eu sentia. Agora, o meu único desconforto era
causado pelas dores dos ferimentos que adquiri durante a queda — que por
sinal foi culpa dele.
— Qual é o seu nome? — perguntou, ao começar a enrolar a atadura
em meu tornozelo.
— Freya.
— Freya? — ele ficou nitidamente surpreso. — Como a deusa da
mitologia nórdica?
— Exatamente. — Revirei os olhos. — Minha avó era um pouco
fanática por lendas antigas, ela não sossegou até convencer minha mãe a me
batizar com o mesmo nome da deusa do amor. Minha avó dizia que sempre
gostou do que a Freya representa.
— Por acaso a sua avó sabe que a Freya também é a deusa do sexo e
da luxúria? — Sorriu com diversão.
Meu rosto queimou quando o homem fez aquela pergunta. Eu
definitivamente não esperava por isso.
— Eu... imagino que sim — gaguejei, desconcertada. — Ela já foi
professora de história, então entendia tudo sobre mitologias e civilizações
antigas. E além disso, a Freya também representa a beleza, o ouro e a
guerra.
O homem assentiu com um certo entusiasmo. Depois de passar um
tempo em silêncio apenas encarando o meu rosto ele voltou a enfaixar o
meu pé, colocando bastante pressão nas voltas da atadura para que a junta
do meu tornozelo ficasse imóvel. Tentei pensar em qualquer coisa para me
distrair da dor que pulsava e fazia lágrimas silenciosas descerem dos meus
olhos.
— E você? — chamei a atenção dele. — Como se chama?
— Bear — respondeu, meio a contragosto.
Bear? É isso mesmo que eu ouvi? Puta que pariu! Não basta ser
igual ao mocinho de Desire&Seduction, ainda tem que ter o mesmo nome?
Ok... não posso surtar, é apenas uma coincidência.
— Seu nome é Bear? Sério? — Tentei agir naturalmente. — Como
um grande urso irritado que mora no meio de uma montanha?
Ele apenas concordou, sem se dar ao trabalho de olhar na minha
direção.
Reprimi uma risada. Acho que não teria nome melhor para esse
homem grande e mal-humorado.
— Até que combina com você — deixei escapar, com um tom
levemente irônico.
Um silêncio não muito desconfortável pairou entre nós pelos
próximos minutos enquanto Bear imobilizava o meu tornozelo com todo o
cuidado do mundo. Ele colocou não apenas a atadura como também um
pequeno apoio de madeira na sola do pé para garantir que eu não sofreria
um impacto direto caso tentasse pisar no chão antes da hora. Mesmo
sabendo que ele foi a causa dos meus ferimentos, fiquei mexida ao vê-lo tão
preocupado enquanto cuidava de mim.
— Acabei aqui... agora vou olhar a sua testa e depois te deixarei
sozinha para que troque essas roupas úmidas e vista as roupas secas que eu
trouxe. — Bear apontou para uma pilha de tecidos no chão ao lado do sofá.
Concordei e observei em silêncio enquanto ele vasculhava a caixa.
Logo tirou de lá um pedaço de algodão e o molhou com álcool cirúrgico.
— Vai arder um pouco — avisou, antes de encostar o algodão no meu
ferimento da testa.
Fechei os olhos e cerrei os dentes enquanto deixava um suspiro
escapar por entre meus lábios. O ferimento parecia mais fundo do que eu
senti quando toquei a minha testa mais cedo.
— Já vai terminar, pequena deusa — ele sussurrou, na tentativa de me
acalmar.
Sua mão livre segurou o meu queixo para que eu não movesse o rosto
e eu senti quando o seu polegar roçou em meu lábio inferior. Fiquei em
choque, me perguntando se aquele toque foi acidental, mas não vou negar
que gostei da sensação — isso até me fez esquecer da ardência que eu
sentia pelo álcool em contato com a minha ferida.
Abri os olhos e surpreendi Bear me encarando fixamente, seus olhos
cinzentos estavam com um tom mais escuro, quase como o céu tempestuoso
lá fora.
— Ficará sem andar por um tempo... — quebrou o silêncio e desviou
seu olhar para a minha testa.
— De quanto tempo está falando? — Tentei manter o foco no
assunto.
— Não me parece uma luxação muito grave, então eu acho que ficará
com esse pé em descanso por umas duas semanas...
— O quê? Não posso ficar todo esse tempo de pernas para cima.
Tenho coisas para fazer!
— Suas coisas podem esperar — Bear retrucou com indiferença.
Apesar do tom irritado em sua voz, o seu toque em meu ferimento
permaneceu suave e contido. Ele deixou de pressionar o algodão em minha
testa e começou a limpar um corte na ponte do meu nariz.
— Não, elas não podem. Me leve de volta para a vila, Bear. —
Segurei sua mão enorme e afastei-a do meu rosto. — Sei que algum médico
do hospital dará um jeito nessa torção e eu voltarei a andar o mais rápido
possível.
Sem sair de onde estava, Bear jogou o algodão ensanguentado no
cesto de lixo que ficava ao lado de uma pequena geladeira bege. A sala de
estar e a cozinha ficavam no mesmo espaço — o que fazia com que a
estreita mesa de jantar de apenas uma cadeira ficasse praticamente ao lado
do sofá em que eu estava sentada. Dava para ver que Bear morava sozinho
naquela cabana e não gostava de companhia.
— O médico fará o mesmo que eu: ele vai imobilizar o seu pé e dizer
para você não levantar da cama pelos próximos quinze dias. — Bear ficou
de pé e cruzou os braços diante do peito, um olhar decidido cruzou o seu
rosto. — Caso não tenha percebido, está chovendo lá fora e você está
ferida. E mesmo quando o tempo estiver perfeito para eu descer a montanha
com você nos braços só vou te levar de volta para Havengreen depois que
estiver completamente curada dos seus ferimentos. Até lá, aproveite a
estadia no meu sofá de couro. — Gesticulou com os braços para o assento
em que eu estava.
— O que deu em você? Me perseguiu com um machado para que eu
saísse da montanha e agora quer que eu fique na sua casa por quinze dias?
Isso não vai acontecer!
— Não é como se tivéssemos muitas opções. — Bear parecia
impaciente. — A previsão do tempo noticiou que a próxima semana será de
chuvas intensas, o que deixará o solo da montanha ainda mais escorregadio.
Não vou correr o risco de descer até a vila com você nos braços, podemos
nos acidentar durante a descida e eu não quero te ver ainda mais
machucada.
— Estou assim por sua culpa!
— Minha culpa? — Arqueou uma sobrancelha. — Foi você que
olhou para trás enquanto corria.
Ah! Eu realmente não acredito no que estou ouvindo...
— Eu estava correndo porque tinha um idiota me perseguindo com a
porra de um machado nas mãos! — gritei, furiosa.
— Você foi desajeitada. Não teria caído se prestasse atenção no
caminho — resmungou. — Agora, vista roupas secas antes que pegue um
resfriado... e aproveite também para secar o meu sofá molhado.
Franzi o cenho. Eu quase podia sentir o meu sangue borbulhar nas
veias. Como ele pode não perceber o seu próprio erro? Quando eu puder
andar, a primeira coisa que farei será enforcá-lo com as minhas próprias
mãos!
— Escute aqui, homem, eu juro que... — Ele simplesmente ignorou a
minha fala e virou as costas, caminhando em direção ao corredor estreito
que era visível do sofá em que eu estava sentada. — Ei, não vá embora!
Você não pode me deixar falando sozinha, Bear!
— Na verdade, eu já estou fazendo isso. — Bear desapareceu pela
porta que ficava à esquerda do corredor.
— Filho da puta!
— Você tem dez minutos para trocar de roupa antes que eu volte para
fazer o jantar — gritou, em um tom impaciente.
Como posso ficar tanto tempo nessa cabana tendo como companhia
esse homem ranzinza da montanha? Eu vou surtar antes que a primeira
semana acabe!
CAPÍTULO 7

Dez minutos se passaram desde que entrei no quarto. Acho que Freya
já teve tempo o suficiente para trocar de roupa.
Levantei da cama e fui até a minha cômoda. Apertei a beirada de
madeira do móvel na tentativa de dispersar toda a tensão que corria pelo
meu corpo. Passei os últimos minutos tentando ignorar o fato de que tinha
uma mulher gostosa pra cacete trocando de roupa na minha sala.
É claro que eu estava agitado, essa era a primeira vez em anos que eu
ficava tanto tempo perto de uma mulher. Freya era linda — de tirar o fôlego
— e a parte carnal do meu corpo não conseguia parar de desejá-la, mas eu
precisava me controlar. Teria que passar dias na sua companhia e não podia
nutrir esse tipo de pensamento por ela, precisava cortar isso pela raiz antes
que ficasse fora de controle.
Adotei uma postura rígida, respirei fundo e resolvi sair do quarto.
Hati se levantou da sua cama de peles e me seguiu. Quando virei no
corredor, avistei Freya no sofá terminando de abaixar o suéter de lã que eu
lhe dei — se eu saísse 10 segundos mais cedo teria uma visão encantadora
da pequena deusa com os seios de fora. Porra, eu não posso ficar pensando
assim! Tenho que manter o foco.
Quando cheguei na sala de estar, Freya logo percebeu a minha
presença e se remexeu no sofá, um pouco insegura. O corte em sua testa
não estava mais sangrando e o do seu nariz já estava começando a coagular.
Voltei a me sentir mal pelo que fiz a ela e dessa vez não consegui manter o
arrependimento apenas para mim.
— Sinto muito pelo que eu fiz — confessei.
No fundo, eu me sentia um pouco perdido. Nunca fui do tipo que
pedia desculpas, não sabia como me portar nessas situações.
Freya ficou surpresa com o que ouviu. Ela pensou por alguns
instantes e então fez um gesto para que eu me aproximasse. Obedeci e me
abaixei ao lado do sofá para prestar atenção no que ela iria dizer.
— Você perdeu o juízo? — Ela franziu o cenho e me deu um soco no
peito. — Assustar uma garota daquele jeito!
Sua mão estava prestes a esbofetear a minha cara quando eu a segurei.
Essa mulher é irritada e teimosa. Me pergunto se ela também se
comportaria desse jeito na cama ou se deixaria que eu a domasse... Porra,
Bear... foco!
Soltei a mão dela e fiquei de pé. Acabei deixando a raiva me dominar
porque a única coisa que eu sentia além disso era desejo — um desejo
crescente pela mulher que estava no meu sofá a menos de 3 horas.
— Foi você quem perdeu o juízo por subir na minha montanha —
disparei, irritado. — Você é louca, mulher!
Freya me mostrou seu dedo do meio e cruzou os braços diante do
peito. Ela virou o rosto na direção oposta em que eu estava, era nítido que
ficou irritada.
Resolvi deixá-la sozinha com os seus pensamentos e me abaixei para
pegar as roupas molhadas que ela deixou aos pés do sofá. Quando levantei a
pilha de tecidos, algumas gotas d’água caíram no chão junto com um
pequeno pedaço de pano rosa que Hati logo pegou para brincar. Levei um
tempo até perceber que aquilo na verdade era uma calcinha. Caralho, eu
não acredito nisso.
Com uma expressão irritada, me abaixei e tirei a calcinha da boca de
Hati antes que ele começasse a mordê-la. Segurei o tecido úmido com a
minha mão livre e olhei de soslaio para Freya. Fiquei aliviado ao perceber
que ela ainda estava com o rosto virado na direção oposta — provavelmente
não viu o que aconteceu com a sua roupa íntima.
Passei um tempo desviando o olhar entre a mulher no meu sofá e a
calcinha que estava em minha mão. Me peguei imaginando o quão pequena
Freya devia ser naquela parte do corpo para usar uma peça de roupa tão
delicada. Antes que eu pudesse me apegar completamente ao pensamento,
meu cérebro acendeu um sinal de alerta e me trouxe de volta a realidade.
Encarei Freya por mais um tempo e suspirei para aliviar a tensão em
meu corpo. Estou na seca há mais de cinco anos e agora tem uma mulher
gostosa no meu sofá, vestida com as minhas roupas e ela não está usando
calcinha. Porra... isso é tortura. Tortura!
Saí da sala em passos largos. Eu só queria ficar longe dela por um
tempo para tentar colocar minha cabeça no lugar. Entrei no meu pequeno
banheiro e comecei a colocar os tecidos molhados dentro do cesto de roupa
que ficava atrás da porta. Assim que a chuva desse uma trégua eu lavaria as
roupas de Freya para que estivessem limpas quando ela fosse vesti-las —
até lá, a mulher teria que usar as minhas calças de moletom e suéteres de lã.
Eu não me sentiria tão incomodado com isso se ela não ficasse
extremamente sexy com as minhas roupas.
Quando estendi a mão para jogar a calcinha dela no cesto, uma ideia
terrivelmente suja passou pela minha cabeça. Tentei relutar, mas no fim cedi
à tentação. Coloquei o tecido rosa de algodão contra o nariz, fechei os olhos
e inspirei profundamente o seu cheiro. Meu coração acelerou, meus
músculos se tensionaram e um gemido rouco escapou da minha garganta.
Porra, há quanto tempo eu não sentia o cheiro de uma boceta. O gosto de
Freya deve ser ainda melhor.
Apertei a calcinha com força quando me imaginei enterrando a língua
bem fundo no calor molhado do seu corpo. Visualizei ela segurando em
meus cabelos e fechando as pernas ao redor do meu rosto enquanto gemia o
meu nome... Porra. Meu pau doeu com necessidade. Afastei a roupa íntima
do meu rosto e olhei para baixo. Não fiquei surpreso quando vi o volume no
meio das minhas pernas. É isso que pensar demais faz comigo. Preciso
parar de fantasiar com Freya ou não vou conseguir voltar para aquela
sala.
Ela ficaria aqui pelas próximas semanas e eu não poderia passar todos
os dias agindo como um adolescente desesperado só porque estava perto de
uma mulher bonita. Tinha que manter a calma, me controlar. Para todos os
efeitos, Freya ainda era uma desconhecida e eu sabia que ela pensava o
mesmo ao meu respeito — é claro que ela também estava queimando de
raiva por causa do que eu fiz. Eu seria louco se ficasse divagando que
poderia acontecer algo entre nós durante o seu período de estadia em minha
cabana. Honestamente, acho que terei sorte se Freya apenas me perdoar
por fazer ela rolar montanha abaixo.
Com uma grande relutância, joguei a calcinha dentro do cesto de
roupas e coloquei uma toalha por cima dela para que eu não me sentisse
tentado a cheirar aquela peça íntima toda vez que entrasse no banheiro. Ter
Freya por perto seria uma tentação constante, mas eu teria que resistir. Já
passei por coisa pior e sobrevivi. Eu aguentaria duas semanas com sede sem
poder beber da fonte mais refrescante e tentadora que existia. Talvez, se eu
me lembrar do quanto uma pessoa pode fazer a outra sofrer eu abandone
esse pensamento idiota de desejar tê-la em meus braços. Não posso me
esquecer do motivo pelo qual me isolei nessa montanha.
— Bear? — Freya chamou, trazendo-me de volta à realidade. — Você
vai mesmo fazer o jantar ou me trouxe aqui para que eu morresse de fome?
— Estou indo — respondi, tenso. Também estou com fome, mas não é
de comida.
Fui até a pia, lavei o rosto com água gelada e encarei meu reflexo no
espelho. O meu banheiro não era muito grande, mas tinha espaço suficiente
para que uma ou duas pessoas se locomovessem ali dentro. Havia uma
banheira rústica de madeira que foi feita por mim, ao seu lado estava um
vaso sanitário e na frente dele a pia de porcelana com um espelho pregado
na porta de um pequeno armário de madeira onde eu guardava os produtos
de higiene pessoal.
Eu consigo passar um tempo na companhia daquela mulher... será
difícil e tentador, mas eu vou sobreviver.
Criei coragem e saí do banheiro. Entrei na sala que era dividida pela
cozinha fazendo o possível para não olhar na direção do sofá. Abri minha
pequena geladeira bege e peguei ingredientes para fazer uma sopa — algo
quente cairia bem nessa noite de chuva.
Enquanto eu cortava os legumes e temperava a carne, eu podia sentir
o olhar de Freya sobre mim. Foi difícil manter a compostura e agir
normalmente. Tive êxito em ignorá-la nos primeiros minutos, mas depois
não consegui resistir e virei o rosto na direção dela. A mulher arregalou os
olhos ao ser pega me encarando e direcionou a sua atenção para Hati, que
estava deitado aos pés do sofá.
Ao sentir o toque de Freya, Hati lambeu a mão dela e virou de barriga
para cima. A mulher sorriu e coçou o peito dele com uma das mãos. Foi a
primeira vez que eu tive inveja de um cachorro — queria eu estar deitado
enquanto a pequena deusa acariciava o meu corpo.
Hati balançava a cauda e mexia uma pata traseira enquanto Freya
fazia cócegas em sua barriga, estava claro que ele ficou contente com o
carinho. Parece que meu cachorro também gostou da nova visitante.

Bear estava no fogão cozinhando um ensopado com um cheiro


delicioso e já havia colocado dois pratos fundos de porcelana sobre a mesa.
Hati — o adorável cachorrinho do homem ranzinza — estava dormindo aos
pés do sofá depois de ter passado a última meia hora brincando comigo.
Agora, a única coisa que eu podia fazer para esquecer da dor pulsante em
meu tornozelo era me distrair observando o homem do machado enquanto
ele estava de costas para mim.
Bear já me surpreendeu o encarando a minutos atrás e isso devia
servir como motivo para que eu deixasse de prestar atenção nele, mas eu
não conseguia evitar. O homem era gostoso, alto e idêntico ao mocinho do
meu livro preferido — porra, até o seu nome era igual. Suas costas e
ombros eram largos, a voz grossa e sedutora, seus olhos eram cinzentos
como um céu tempestuoso e ele tinha um lindo cabelo loiro que terminava
na altura do peito. Bear era um pedaço de mal caminho, mas infelizmente o
que ele tinha de beleza também tinha de arrogância.
Desde que acordei nessa cabana, toda conversa que tive com Bear
terminou em discussão. Ele era um cabeça dura e eu não podia esquecer da
parte que caí do barranco por culpa dele. O homem é bonito, mas também é
um imbecil... E parece que esse imbecil sabe cozinhar muito bem.
Meu estômago roncou quando Bear colocou a panela quente em um
descanso de madeira sobre a mesa. Com o auxílio de uma concha de metal,
ele despejou um pouco de ensopado em um dos pratos, colocou uma colher
e veio até o sofá para me entregar a refeição. Enquanto eu me posicionava
no assento, ele ficou encarando a parede atrás de mim para evitar fazer
contato visual. Aquilo me deixou entristecida já que passei a última hora
olhando para ele sem pudor algum.
— Está quente — avisou, ao me estender a travessa fumegante.
Concordei em silêncio e peguei o prato da sua mão. Meus dedos
roçaram nos seus e um arrepio excitante se espalhou por todo o meu corpo
— foi quase como se o atrito entre nossas peles tivesse provocado uma
pequena descarga elétrica. Quando Bear se afastou, notei que os pelos à
mostra do seu antebraço estavam levemente arrepiados. Ele também sentiu
isso, não fui a única.
Ergui minha cabeça e fitei o seu rosto. Nossos olhares se encontraram
por alguns segundos, ele abriu a boca como se estivesse prestes a dizer
alguma coisa, mas logo a fechou. Bear virou as costas para mim e caminhou
em passos largos até a mesa de jantar. Ele se sentou na cadeira, colocou
sopa em seu prato e começou a comer em silêncio, sem ao menos olhar na
minha direção.
Homem esquisito. Revirei os olhos e comecei a comer a sopa,
tomando o cuidado de assoprar antes enfiar a colher na boca para não
queimar a minha língua. Também mantive um pouco de amor próprio e não
olhei mais na direção de Bear pelo resto do jantar. Se ele quer fingir que
não estou aqui, perfeito... vou tratá-lo da mesma maneira.
No momento exato em que terminei a minha sopa, Bear veio até mim
e retirou o prato das minhas mãos rapidamente — ficou claro que estava
evitando que os nossos dedos se tocassem outra vez. Ele devia ser daquelas
pessoas que detestava qualquer tipo de contato humano, isso explicava
porque morava sozinho nessa montanha e parecia tão desconfortável com a
minha presença.
Depois de lavar a louça do jantar, Bear apertou um interruptor perto
da pia da cozinha e as luzes se apagaram, restando apenas o abajur que
estava aceso em uma mesinha ao lado do sofá. Lá fora ainda chovia, mas os
raios e trovões já haviam cessado.
— Eu vou dormir — anunciou. — Você pode usar uma das almofadas
do sofá como apoio de cabeça e se cobrir com o cobertor que eu deixei ali
no canto.
Olhei para o tecido grosso de lã que estava dobrado no braço do sofá.
— Como está o tornozelo? — perguntou relutante, seus olhos
finalmente se fixaram em mim.
— Ainda dói.
— Foi o que eu imaginei. Vai sentir dor por alguns dias. — Bear se
recostou na parede que ficava próxima do corredor, mantendo o máximo de
distância possível do sofá em que eu estava. — Amanhã vou até a vila e
compro alguns analgésicos.
— Por que não me leva também e me deixa no hospital? — sugeri
com ironia.
— Não vou descer a montanha escorregadia com você nos braços e
fim de assunto.
— Devia ter se preocupado desse jeito quando me viu naquela
cachoeira...
— Olha, Freya, eu realmente não quero discutir com você antes de ir
para a cama. — Ele ergueu as mãos em sinal de rendição. — Vou embora
antes que o assunto piore. O Hati ficará aqui para te fazer companhia. Se
precisar de alguma coisa grite.
Bear se virou e saiu andando pelo corredor.
— Nem me deu boa noite — bufei. — Esse homem realmente
desconhece boas maneiras.
Suspirei e decidi que iria dormir para tentar esquecer aquele dia
terrível. Quem sabe quando eu acordar isso tudo não passe de um
pesadelo?
Forrei o cobertor de lã sobre o meu corpo e coloquei uma das
almofadas do sofá embaixo da cabeça. Virei de lado, deixando que a perna
do meu tornozelo dolorido ficasse para cima e encolhi o corpo até encontrar
uma posição confortável para dormir.
Tudo estava perfeito para que eu pegasse no sono — exceto pela leve
vontade que eu sentia de fazer xixi. Pensei em levantar, mas lembrei que
sequer conseguia firmar os dois pés no chão e nem morta eu pediria ajuda
ao brutamonte arrogante. Eu aguento até amanhã de manhã, tenho certeza
que até lá o meu tornozelo já estará melhor para que eu possa ir ao
banheiro sem ajuda.
Acordei sentindo uma dor terrivelmente forte na bexiga. Virei no sofá
ficando de costas para cima e gemi com o desconforto quando senti meu
tornozelo latejar — ele parecia estar doendo mais do que ontem à noite.
Minha bexiga também doía tanto que parecia estar prestes a explodir. Não
vou conseguir segurar por muito mais tempo.
Criei coragem e me sentei no sofá. Com calma, coloquei meu pé
saudável no chão tomando cuidado para não pisar no cachorro de Bear,
Hati, que ainda dormia próximo ao móvel. Depois de alguns segundos de
hesitação, experimentei apoiar no piso o pé que estava torcido.
— Ah! — gritei, ao sentir uma dor aguda se espalhar pela parte
inferior da minha perna direita.
Fiz uma careta e levei as mãos até o meu tornozelo dolorido que
estava envolto pela tala que Bear colocou ontem à noite. Eu não conseguia
andar com as duas pernas e jamais poderia ir pulando em um pé só até o
banheiro — minha bexiga estava tão cheia que eu acabaria sofrendo um
“acidente” no meio do caminho. Merda... o que eu vou fazer?
Fechei os olhos e estremeci quando a solução para aquele problema
surgiu em minha mente. Não havia outra saída... eu teria que pedir ajuda ao
Bear para ir até o banheiro. Merda, que humilhação!
CAPÍTULO 8

Seria terrível pedir ao Bear que me levasse até o banheiro — ainda


mais depois do jeito que ele me tratou ontem à noite. Não acredito que eu
teria que me rebaixar a esse ponto, mas não tenho dúvidas de que seria
ainda mais vergonhoso fazer xixi na calça.
Engoli em seco e preparei o meu fôlego para chamá-lo. Eu até podia
imaginar o mau humor que o homem ficaria por acordar de manhã cedo
com os meus gritos de ajuda para fazer minhas necessidades. Bom, a culpa
não é minha... eu não estaria nessa situação se ele não bancasse o
engraçadinho tentando me expulsar da montanha. O Bear terá que
aguentar as consequências do que ele fez.
— Bear! — chamei, com a voz alta o suficiente para que ele pudesse
me ouvir do outro cômodo.
Não demorou muito até o homem aparecer no corredor. Seu cabelo
grande estava bagunçado e o rosto com uma expressão sonolenta — sem
dúvidas tinha acabado de acordar. Perdi o fôlego quando vi que ele estava
sem camisa, descalço, e a calça de moletom preta que usava pendia
tentadoramente na sua cintura. Caramba, apensar de arrogante, o Bear é
lindo...
— Aconteceu alguma coisa, Freya? — indagou, com um olhar
preocupado.
Ele caminhou até a sala enquanto seus olhos cinzentos analisavam
cada centímetro do meu corpo, como se quisesse garantir que tudo estava
em ordem.
Quando Bear parou em frente ao sofá, seu torso forte e esculpido
ficou em meu campo de visão. Involuntariamente meus olhos se fixaram
naquela parte do seu corpo e eu fitei seus músculos por alguns segundos. O
peitoral de Bear era um tanto peludinho e eu confesso que achei sexy o jeito
que seus pelos se espalhavam ao longo do abdômen e desapareciam na
barra da calça. Mordi os lábios quando imaginei para onde aquele caminho
da felicidade levava.
Bear pigarreou e eu voltei minha atenção para o rosto tenso que me
encarava. Eu quase havia me esquecido que precisava muito fazer xixi. Me
remexi no sofá com desconforto, meu tornozelo ruim estava suspenso para
que não me causasse mais dor do que eu já estava sentindo. Ok... tenho que
falar com ele.
— Meu tornozelo ainda dói, eu não consigo apoiar os dois pés no
chão e preciso muito fazer xixi. — Senti meu rosto queimar quando disse
aquela frase.
Bear arqueou uma sobrancelha, um tanto surpreso com o que ouviu.
Ele me encarou em silêncio e depois suspirou. A região do seu rosto que
não estava coberta pela barba ficou um pouco mais corada e eu percebi que
ele estava envergonhado com o meu pedido. Antes que eu tivesse tempo de
dizer alguma coisa para tentar amenizar a situação, Bear me pegou no colo
com extrema facilidade e caminhou em direção ao banheiro.

Entrei no banheiro tomando extremo cuidado para que o tornozelo


machucado de Freya não batesse na porta — eu odiaria vê-la sentindo mais
dores por minha culpa. Minha mente ainda estava atordoada pelo jeito que o
dia começou. Acabei de acordar e já precisei carregar Freya nos braços para
que ela fizesse as suas necessidades pessoais. Eu não tinha ideia de como
poderia sair daquela situação.
Coloquei Freya no chão devagar e só a soltei quando vi que ela
conseguiu manter o equilíbrio. A mulher ficou apoiada em seu pé esquerdo
e manteve uma das mãos na parede de madeira do pequeno cômodo. Espero
que ela consiga se resolver sozinha a partir daqui porque o meu corpo
inteiro entrará em colapso caso ela precise da minha ajuda para tirar a
calça e sentar no vaso.
— Você não quer que eu fique aqui, quer? — indaguei,
desconcertado.
Para o meu alívio Freya negou com a cabeça rapidamente.
— Acho que eu consigo me virar. — Ela parecia tão envergonhada
quanto eu.
— Ótimo. Use a pia como apoio, caso precise.
Freya olhou para a estrutura de porcelana que estava em frente ao
vaso e concordou.
— Obrigada pela ajuda, Bear — murmurou, quase como se não
quisesse dizer aquilo em voz alta.
— Quando terminar, me chame. Estarei do lado de fora. — Sem
esperar uma resposta saí do banheiro e fechei a porta para que Freya
pudesse ter a sua privacidade.
Recostei-me na parede e passei a mão pelo cabelo, notando que meus
fios estavam emaranhados pela noite de sono — sequer tive tempo de
penteá-los essa manhã. Quando acordei com a voz de Freya me chamando
eu levantei da cama com a velocidade de um raio apenas para ver o que a
mulher queria. Cheguei na sala descalço, sem camisa e despenteado, mas
Freya não pareceu se importar com a minha aparência de cansaço já que
passou um bom tempo admirando o meu tórax e abdômen sem ao menos
disfarçar o interesse. Fiz o possível para deixar aquilo passar despercebido,
mas não vou negar que fiquei feliz com a atenção que recebi. Se ela me
encarou daquele jeito foi porque gostou do que viu.
Senti um focinho gelado roçar no meu pé e olhei para baixo. Hati
estava acordado e, assim como todos os dias pela manhã, ele queria sair
para fazer suas necessidades. Acariciei a cabeça do cachorro e me afastei do
banheiro apenas para abrir a porta da frente para que Hati pudesse passar.
Felizmente, ele não precisava de ajuda para fazer xixi, o cachorro saía
sozinho e depois voltava para dentro da cabana ao terminar as suas coisas.
Voltei para perto do banheiro no momento exato em que Freya me
chamou. Esperei alguns segundos antes de abrir a porta para ter certeza de
que eu não iria vê-la com a bunda de fora — eu não queria começar o dia
passando por esse tipo de tentação, já bastava saber que eu teria que
carregá-la nos braços sempre que ela quisesse ir a algum lugar.
Quando abri a porta Freya estava de pé, apoiada na pia do banheiro e
se equilibrando apenas com a perna esquerda. Fui até ela e a peguei no colo
para colocá-la de volta no sofá. Eu estava acostumado com o trabalho
pesado, então conseguia carregá-la sem qualquer dificuldade.
— Obrigada — Freya agradeceu, quando a deixei no sofá.
— Não há de quê — suspirei.
Eu sabia que aquela não seria a única vez que eu teria que carregá-la
até o banheiro e preferia não pensar no que iria fazer quando ela dissesse
que queria tomar banho. Nunca me arrependi tanto de uma coisa que fiz. Eu
devia ter deixado essa mulher quieta lá na cachoeira.
— Vou fazer o café da manhã — anunciei, deixando o
arrependimento de lado. Eu não podia mudar o passado, mas podia
consertá-lo agora tentando me redimir pelas merdas que fiz.
— Sim, por favor... eu estou com fome. — Ela sorriu e massageou a
sua barriga.
Dei as costas para a mulher e fui até a parte do cômodo em que era a
cozinha. Abri a geladeira e tirei de lá uma caixa de ovos, colocando-a ao
lado do fogão.
— Como faz para ter energia elétrica aqui na montanha? — Freya
quis saber.
— Tenho um gerador à gasolina nos fundos da cabana — respondi
brevemente.
Tirei da geladeira um pequeno saco de gelo e o entreguei para Freya,
instruindo que ela o colocasse sobre o seu tornozelo. A mulher agradeceu o
meu gesto e sorriu. Ela parecia mais amigável do que ontem à noite, o que
me fez pensar que talvez fosse o momento ideal para falar sobre uma das
minhas preocupações.
— Agora que estamos começando a nos entender, será que podemos
negociar a história que você vai contar quando voltar para Havengreen? —
comecei, enquanto colocava uma frigideira sobre o fogão.
— Vou contar a verdade: que eu caí e bati com a cabeça porque você
estava me perseguindo com a merda de um machado nas mãos! — Julgando
pelo seu tom de voz ela ficou indignada com o meu pedido.
— Será que pode parar de jogar isso na minha cara? — resmunguei
com irritação e acendi o fogo. — Eu já pedi desculpas.
— Suas desculpas não anulam o que aconteceu. Não interessa se as
coisas saíram do controle e se você está arrependido agora, se eu não alertar
as pessoas da vila sobre o idiota que está morando na montanha, no
próximo mês pode ser outro morador de Havengreen que cairá de um
barranco enquanto tenta fugir de você.
— Os moradores de Havengreen sabem que não quero ninguém na
minha montanha. — Virei meu rosto na direção da mulher que estava
sentada no sofá e me encarava de braços cruzados. — O que não entendo é
como você não sabia disso.
— Me mudei recentemente. Ainda não sei de todos os boatos e lendas
locais. — Freya me direcionou um sorriso zombeteiro. — As pessoas da
vila ainda não tiveram tempo de me contar sobre o assassino do machado
que vaga pela região.
Minha boca se curvou em um sorriso involuntário e eu virei o rosto na
direção oposta para que Freya não percebesse que o seu comentário me
divertiu. Então ela é nova por aqui... isso explica porque nunca a vi antes.
Eu precisava convencer essa mulher a mentir sobre o que aconteceu
porque se a minha atitude chegasse aos ouvidos do delegado Müller ele
viria até aqui me dar uma dura e, na pior das hipóteses, eu passaria algumas
noites na cadeia de Havengreen — há muito tempo eu não fazia uma visita
nas celas daquele lugar e pretendia permanecer assim.
Bom, Freya ainda ficará algumas semanas por aqui até que o seu
tornozelo se recupere, então eu terei tempo de convencê-la a mudar de
ideia sobre o seu depoimento. Para que isso pudesse acontecer, ela teria que
parar de me ver como o cara que a fez cair da montanha e passar a me
enxergar como alguém que cuidou dela. Preciso ser amigável com a mulher
— não a ponto de virarmos melhores amigos, mas apenas para que ela
perceba que não sou tão mal assim.
Tirei quatro ovos da caixa e os quebrei dentro da frigideira que já
estava aquecida. Peguei uma espátula de plástico e comecei a mexer para
que a clara e a gema se dividissem em vários pedaços. Enquanto eu
preparava a refeição, me senti curioso para saber mais a respeito de Freya.
O rosto dela não se assemelhava a ninguém que eu conhecesse na vila,
então fiquei me perguntando se ela tinha algum parente por lá ou se estava
sozinha.
— Você é filha de quem? Está morando em Havengreen há muito
tempo? — tentei puxar assunto, torcendo para que Freya ainda não
estivesse irritada com a conversa anterior.
— Acho que você não conhece os meus pais, eu me mudei há apenas
duas semanas — respondeu. — Estou morando na antiga casa da minha
avó, em frente à praça.
Concordei em silêncio. Provavelmente Freya se mudou para a casa
que passou as últimas décadas abandonada. Lembro-me de ter visto a
residência em reforma da última vez que passei por lá. Eu tinha vagas
lembranças da antiga dona da casa, a Sra. Larsen. Ela era professora na
pequena escola de Havengreen, mas como não estudei lá, não tive a chance
de ser aluno dela. No entanto, já fugi várias vezes dos trabalhos que meu tio
me obrigava a fazer apenas para ouvir as histórias que ela contava. Então a
Sra. Larsen é a avó de Freya? Ou será que a casa mudou de dono ao longo
do tempo? Eu tinha 9 anos da última vez que a vi, não me lembro
perfeitamente do seu rosto para fazer alguma comparação.
— Você é neta da Sra. Larsen? — Deixei de prestar atenção nos ovos
que estavam no fogo para encarar a mulher sentada no meu sofá.
Freya arregalou os olhos com a pergunta e assentiu.
— Conheceu a minha avó?
— Conheci. — Sorri ao me lembrar daquela época distante. — De
manhã ela lecionava na escola da vila e à tarde se reunia com as crianças na
praça para contar lendas e histórias antigas.
— Ela gostava de me contar histórias também — a mulher divagou.
— Eu era um seguidor fiel da Sra. Larsen. Mesmo sabendo que
levaria umas palmadas do meu tio, eu escapava do trabalho sempre que
podia para ouvir as histórias que ela contava. Da última vez que a vi, ela
estava saindo da casa em que morava e entrando em um caminhão de
mudanças junto com uma mulher grávida.
— Provavelmente era a minha mãe. Sei que pouco antes de eu nascer
minha avó foi morar com os meus pais. — Freya pensou por um tempo. —
Quantos anos você tem, Bear?
Fiquei surpreso com a pergunta, mas decidi responder.
— Trinta e dois. E você?
— Vinte e três.
Um sorriso curvou a minha boca. Eu bem que desconfiei que ela não
tinha mais que vinte e cinco anos.
— E como está a sua avó? — prossegui com o assunto. — Ela virá te
visitar algum dia?
Eu podia ser um marmanjo, mas não me importaria de sentar no meio
das crianças no chão da praça para ouvir a Sra. Larsen contando histórias
mais uma vez.
Notei que os olhos de Freya lacrimejaram quando ela ouviu a minha
pergunta. A mulher respirou fundo e levou uma eternidade para me
responder.
— Bom... — ela encolheu os olhos — minha avó faleceu há sete
meses.
Senti um peso no peito quando ouvi aquela notícia. Mesmo que eu
não visse a Sra. Larsen há vinte e três anos, foi difícil saber que ela deixou
esse mundo e que eu nunca mais ouviria as suas histórias.
— Eu sinto muito — comentei, com sinceridade.
Freya me direcionou um sorriso fraco, mas logo em seguida franziu o
cenho e notei ela farejando o ar.
— Acho que tem alguma coisa queimando. — Ela apontou para o
fogão atrás de mim.
Dei um salto no lugar quando me lembrei dos ovos mexidos e olhei
para a frigideira. Agora, só havia carvão mexido ali dentro.
— Porra — resmunguei, enquanto apagava o fogo e colocava a
panela dentro da pia.
Ouvi Freya dando uma risadinha e meus músculos ficaram tensos.
Resolvi ignorá-la e me concentrei em fazer outro prato para o café da
manhã.
Depois de comermos torradas e bebermos suco de maracujá, lavei a
louça que se acumulou com o preparo da refeição e decidi que estava na
hora de ver como o tornozelo de Freya estava. Ela não se queixava das
dores, mas eu podia ver seu rosto se contorcendo com desconforto vez ou
outra.
Deixei as coisas na cozinha e fui até a sala, me ajoelhando em frente
ao sofá. Ela ficou confusa e pareceu tensa com a minha aproximação
repentina, mas logo relaxou quando eu disse que só queria examinar o seu
tornozelo.
Desenrolei a tala com cuidado e franzi o cenho ao ver a situação.
Estava pior do que ontem à noite. A área do tornozelo e metade do seu pé
estavam inchadas e com um tom roxo avermelhado que me causou
desconforto apenas por olhar. A torção foi mais séria do que pensei e Freya
precisaria de muito repouso nas próximas semanas.
Cogitei em levá-la para o hospital para que pudessem examiná-la com
mais cuidado, mas não queria correr o risco de me acidentar na montanha
com ela em meus braços. Por mais difícil que fosse, eu teria que ficar com
Freya aqui até que ela melhorasse. Porra, só de pensar em passar as
próximas semanas com uma mulher igual a ela me sinto feliz e assustado.
— É normal ficar assim? — Freya indagou, preocupada.
Suspirei e coloquei para trás uma mexa de cabelo que caiu em meu
campo de visão.
— Não está quebrado, mas a torção foi feia — admiti. — Não quero
te assustar, mas vai demorar mais que duas semanas para que consiga voltar
andando até a vila.
— Não posso ficar aqui muito tempo. As pessoas vão pensar que eu
morri! — ela se alarmou. — Não... eu preciso voltar para casa, Bear.
O olhar de preocupação que Freya me lançou acertou em cheio o meu
coração. Não consegui raciocinar direito e quando percebi, já estava
oferecendo uma solução.
— Se você quiser, posso descer até a vila e pendurar um aviso na sua
porta dizendo que houve uma emergência e que você vai passar um tempo
com a sua família...
— Que tal um pedido de socorro dizendo que estou aqui na sua casa?
— sugeriu com ironia.
Bufei com irritação.
— Se os moradores souberem que está aqui virão te visitar e eu não
quero ninguém subindo e descendo a minha montanha quando bem
entender. — Peguei a tala e comecei a enfaixar seu tornozelo outra vez.
— Tá! Já entendi que você é territorialista. — Ela revirou os olhos. —
Porra, está bem. Deixe um recado na minha porta avisando que saí de
viagem.
— Vou fazer isso assim que terminar de imobilizar seu pé —
respondi. Tentei conter o sorriso vitorioso que ameaçou curvar a minha
boca. Eu gostava de ganhar discussões. — Você teve sorte de não ter
realmente quebrado... foi apenas uma torção e dar feias.
— Tem certeza que vou voltar a pisar normalmente com esse pé? —
Freya me encarou com um olhar preocupado.
— Vai sim, não se preocupe. — Terminei de enrolar a tala e lhe
direcionei um sorriso para que ela se sentisse mais calma. — Eu vou cuidar
de você até que o seu tornozelo fique bom.
Ao ouvir minhas palavras Freya sorriu de um jeito estranhamente
emocionado e levou uma das mãos até o peito.
Eu ainda estava sem camisa e quando fiquei de pé na frente do sofá
Freya desceu o olhar até o meu tórax, rapidamente, antes de fixar sua
atenção em meu rosto. Ela pensou que eu não iria perceber, mas percebi, e
tive que me controlar para não fazer nenhum comentário sobre a sua atitude
— eu não queria deixá-la desconfortável.
— O-obrigada, Bear — Freya gaguejou, com um sorriso de canto.
Seus olhos castanhos encontraram os meus e dessa vez eu não
interrompi a nossa conexão. Fiquei sustentando o seu olhar por um longo
tempo e uma sensação de paz tomou conta de mim. Se eu pudesse, passaria
o dia inteiro parado em frente a esse sofá encarando essa mulher perfeita
que está sobre ele. Porra, Freya passou uma noite aqui e eu já me sinto mal
por imaginar ela indo embora. Eu realmente preciso controlar as minhas
emoções.
O latido que Hati deu anunciando que estava voltando para dentro da
cabana me fez desviar a atenção para a porta da frente que estava aberta. Vi
o cachorro entrando e se dirigindo até o sofá com um pedaço de madeira na
boca. Ele se pendurou no móvel e deixou o brinquedo que trouxe lá de fora
ao lado de Freya. A mulher sorriu e acariciou a cabeça dele.
— Hati trouxe um presente para você — comentei, com uma certa
diversão.
— Eu adoro pedaços de madeira... como sabia disso, Hati? — Freya
entrou na brincadeira, fazendo cócegas na barriga do cachorro quando ele
se deitou no chão.
Quando percebi, eu estava encarando os dois com um sorriso idiota
nos lábios. Hati foi a minha única companhia nesses cinco anos que passei
isolado aqui na montanha. Vê-lo brincando com Freya me trouxe um
sentimento de realização interna que eu não sabia que precisava até esse
momento. Pela primeira vez em muito tempo, tinha vida e alegria nesta
cabana.
Perdi a conta de quanto tempo passei observando Freya brincar com
Hati. Somente quando vi um sinal de desconforto cruzar a sua face foi que
me lembrei que precisava ir até a vila pendurar o aviso que ela me pediu —
eu poderia aproveitar a viagem e comprar alguns analgésicos para ajudá-la
com a dor.
Fui até o meu quarto e vesti uma roupa para o dia, penteei o cabelo e
o prendi em um coque samurai. Ao olhar para a parede ao lado da minha
cama, percebi que meu machado não estava ali e lembrei que o deixei caído
na ribanceira quando fui salvar Freya. Criei uma nota mental para me
lembrar de ir até lá e recuperar a minha ferramenta de trabalho, então saí do
quarto e voltei para sala.
— Freya, estou indo fazer o que você me pediu — anunciei. — Ficará
bem enquanto eu estiver fora?
— Não vou sair desse sofá. — Ela gesticulou para seu tornozelo
enfaixado.
— Certo... voltarei em algumas horas e trarei analgésicos para aliviar
a sua dor.
— Ei, você não disse que seria perigoso descer a montanha depois da
chuva de ontem à noite? — Ela arqueou uma sobrancelha, desconfiada. —
O terreno não está íngreme e escorregadio?
— Descer sozinho é uma coisa, se eu escorregar consigo me virar...
descer com você é que seria o problema. — Suspirei.
— Eu sou um problema?
— Não, Freya. — Caminhei até o sofá para acariciar Hati, que estava
ao lado dela. Embora minha mão estivesse no cachorro, meus olhos se
mantiveram fixos na pequena deusa que me encarava atentamente. — O
problema seria se você se machucasse. Eu não quero que nada de ruim
aconteça com você outra vez, quero que fique aqui onde é seguro e se
recupere perfeitamente.
Freya assentiu em silêncio, sem desviar seu olhar para longe do meu.
— Tome cuidado — pediu, com uma evidente preocupação na voz.
Fiquei surpreso, ela realmente parecia estar preocupada comigo.
Parece que estamos nos entendendo bem. Isso é bom, mas é perigoso... não
quero me magoar novamente.
Apesar da relutância que eu sentia por dentro, me afastei do sofá e
virei as costas para Freya. Caminhei até a porta e antes de sair da cabana
ouvi ela falar:
— Não demore, posso precisar de você para fazer xixi.
Virei o rosto em sua direção e vi Freya me encarando com um sorriso
que me deixou sem fôlego. Porra.
— Voltarei antes das onze — respondi, tentando ignorar o turbilhão
de sentimentos que surgiu em meu peito.
Antes que eu ficasse mais hipnotizado por aquele sorriso, desviei meu
olhar para longe e fechei a porta. Sabendo que Freya estava na companhia
de Hati, comecei meu caminho em direção à vila pretendendo voltar para a
cabana o mais rápido possível.
Eu odiava descer até Havengreen — não por causa do longo trajeto
que era a descida da montanha, mas por causa das pessoas que eu teria que
encontrar na vila. Aquele lugar me trazia nostalgia e ao mesmo tempo
memórias que eu gostaria de esquecer.
CAPÍTULO 9

Meu pé e tornozelo doíam a ponto de latejar e estava difícil fazer


qualquer outra coisa, em meu espaço limitado no sofá, para me distrair da
dor. Eu só conseguia torcer para que Bear voltasse logo da vila com os
analgésicos que ele me prometeu comprar.
Não sei quanto tempo passou desde que ele saiu, mas parecia uma
eternidade. Hati até já havia se cansado de brincar e fora dormir, me
deixando sozinha com meus pensamentos conflitantes. Eu queria ter algo
para passar o tempo além de olhar para cada canto daquela cabana de
madeira.
A essa altura, eu já tinha analisado cada detalhe da residência rústica
e aconchegante. O cômodo onde eu estava era metade sala e metade
cozinha e o sofá ficava de frente para o corredor, onde de um lado estava a
porta do banheiro e do outro o quarto de Bear. Com exceção do sofá, fogão,
geladeira e pia, todos os móveis que estavam em meu campo de visão
pareciam ter sido feitos de maneira artesanal.
Sobre uma mesinha de canto que ficava ao lado do sofá, havia uma
pequena escultura de madeira na forma de um cachorro idêntico ao Hati.
Fascinada com o trabalho, estiquei meu braço e peguei o objeto para olhar
mais de perto. Passei o dedo sobre o entalhe de madeira envernizada e
fiquei pasma com o acabamento perfeito da peça. Quem fez isso tem muito
talento.
Quando coloquei a escultura de volta na mesa, avistei uma parte da
alça vermelha da minha mochila do outro lado do móvel. Não acredito que
Bear a trouxe também! Ela estava no chão, entre os pés da mesa e a parede,
mas não havia como eu chegar até ela estando em cima do sofá. Se nada
caiu enquanto eu corria, o meu celular, meu caderno de desenhos e meu
livro preferido ainda estariam ali dentro. Todos esses itens serviriam como
um ótimo passatempo durante a minha estadia na casa do gostosão irritado,
então eu precisava pegar aquela mochila.
Comecei a ficar inquieta enquanto pensava em uma solução para o
meu problema. Eu podia descer do sofá e ir rastejando pelo chão até o local
em que a minha mochila estava, mas não queria correr o risco de bater meu
tornozelo em algum lugar — eu odiaria sentir mais dor. A solução mais
prudente seria esperar até que Bear retornasse e pedir para ele pegar a
minha bolsa, mas eu não sabia quando o homem iria aparecer e também não
queria esperar.
Olhei ao meu redor à procura de algo que eu pudesse usar para puxar
a bolsa até mim, mas não encontrei nada de útil. Já estava começando a
sofrer de ansiedade quando Hati surgiu no corredor. Ele saiu do quarto de
Bear e veio na direção do sofá com um brinquedo de corda na boca e
abanando o rabinho para chamar a minha atenção.
Eu sorri para o animal e acariciei a sua cabeça peluda. Esse cachorro
realmente era uma exceção ao ditado que dizia que todos os animais se
pareciam com seus donos. Hati era amigável e amoroso enquanto Bear
parecia ser do tipo que vivia de mau humor.
O cachorro deixou seu brinquedo sobre o sofá e latiu. Seus olhos se
desviaram entre o pedaço de corda amarrada e as minhas mãos.
— Quer que eu jogue para você pegar?
Hati parecia ter entendido o que eu falei e latiu de volta.
Deixei uma risada escapar e joguei o brinquedo. Ao ver que aceitei o
convite para a brincadeira, Hati latiu outra vez e correu até o local em que o
seu pedaço de corda caiu. Ele o pegou e trouxe até mim, colocando seu
brinquedo de volta no sofá para que eu pudesse arremessá-lo novamente.
Percebi que Hati era um cachorro treinado, o que me fez ter a ideia de
jogar o brinquedo próximo da minha mochila e pedir que ele a trouxesse até
mim. Será que daria certo?
Decidida a testar minha teoria, balancei o pedaço de corda no ar e o
arremessei ao lado da mesinha do sofá. Hati correu até o local e quando ele
estava prestes a abocanhar seu brinquedo eu o repreendi e apontei para a
alça da minha mochila. O cachorro me encarou por um tempo e eu decidi
reforçar o meu pedido em voz alta.
— Hati, pega! — Apontei novamente para a minha mochila.
Mantive o olhar fixo no animal pelos próximos segundos até que ele
mordeu a alça da minha mochila vermelha e começou a arrastá-la até o
sofá.
— Oh, bom garoto! — Bati palmas para ele.
Quando Hati deixou a mochila aos pés do sofá eu me inclinei e beijei
o topo da sua cabeça como recompensa. Ele se deitou no chão e virou de
barriga para cima, deixando claro que queria mais carinho.
— Acho que estou te deixando mal acostumado — comentei,
enquanto coçava a sua barriga peluda.
Eu estava há um dia aqui e Hati parecia gostar mais de mim que do
seu próprio dono. Não posso julgar o cãozinho, deve ser tedioso ficar aqui
em cima com aquele homem ranzinza que está o tempo inteiro de cara
fechada como se o mundo lhe devesse um favor. Se eu fosse Hati, também
ficaria feliz com qualquer outra pessoa que aparecesse na cabana.
Após minutos de carinho, Hati se deitou no meio do cômodo e
resolveu tirar mais um cochilo. Aproveitei o momento para pegar a mochila
e ver o que restou lá dentro. Fiquei aliviada por ver que o meu livro
Desire&Seduction estava intacto, assim como o meu caderno de desenhos e
o meu celular. Haviam também as barrinhas de cereais que sobraram, minha
garrafa d’água pela metade, o estojo de lápis e as chaves da minha casa.
Tudo estava em ordem e nada sofreu danos com a chuva, graças ao material
impermeável que revestia a mochila.
Quando peguei meu celular, tentei ligar a tela, mas um símbolo de
bateria cortada apareceu, indicando que ele havia descarregado. Merda!
Espero que Bear tenha um carregador disponível para me emprestar.
Coloquei o celular sobre a mesinha próxima ao sofá e tirei da mochila o
livro da L. M. Mayer. Comecei a me perguntar se a escritora conheceu o
Bear, assassino do machado, e se ele foi a sua inspiração para criar o
personagem fofo, bruto e perfeito do livro. Nunca pensei que pudesse
existir tal coincidência no mundo.
Eu me sentia mais aliviada por saber que agora eu teria o meu livro
preferido para passar o tempo, já que o personagem que conheci na vida
real era um poço de arrogância! Distraída, folheei algumas páginas de
Desire&Seduction e acabei encontrando um trecho hot. Não resisti à
tentação e li apenas um pouquinho.
“...Bear me ergueu em seus braços e eu entrelacei as pernas ao redor
da sua cintura. Minhas costas se chocaram contra a parede de madeira da
sua cabana e quando ele me penetrou, um grito de prazer saiu da minha
garganta. Bear tinha o pau mais perfeito do mundo — era grosso, firme, e
quando entrava em mim preenchia cada centímetro da minha vagina
fazendo com que eu me sentisse completa. Nossos corpos se encaixavam
perfeitamente, eu adorava a sensação das nossas peles suadas se tocando,
nossas línguas se entrelaçando, sussurros e gemidos de prazer se
misturando às respirações ofegantes...”
Parei de ler quando a minha mente traiçoeira fez com que eu me
imaginasse protagonizando aquela cena com o Bear da vida real. Loucura!
Ele pode ser lindo e desejável, mas é completamente arrogante! Tentei me
apegar aos seus defeitos na esperança de que isso me fizesse parar de
desejá-lo, mas o meu subconsciente já estava me fazendo imaginar uma
série de coisas promiscuas que eu poderia fazer com Bear enquanto
estivesse me recuperando.
Ficaremos sozinhos dia e noite nessa cabana pelas próximas semanas,
sem ninguém para nos atrapalhar. Bear poderia transar comigo neste sofá,
em cima da mesa da cozinha, no banheiro... céus, até mesmo lá fora se
levássemos em consideração que ninguém subia essa montanha. Minha
intimidade doeu quando imaginei aquele homem forte e malhado me
erguendo em seus braços, me colocando contra a parede e me penetrando
com força. Senti uma umidade entre as minhas pernas e mordi os lábios
com a luxúria que começou a se espalhar pelo meu corpo.
Não posso negar que Bear foi carinhoso comigo antes de sair e pensar
nisso me deixou ainda mais eufórica. Quando ele disse que se preocupava e
que cuidaria de mim até que eu me recuperasse, foi impossível não me
sentir abalada com as suas palavras. Ele me fez cair da montanha e isso foi
horrível, mas o homem já pediu desculpas e parecia disposto a reparar o seu
erro. Talvez, eu devesse lhe dar uma segunda chance e propor uma trégua.
Quem sabe alguma coisa picante aconteça entre nós no futuro? Ok... já
chega! Melhor voltar à realidade!
— Vou deixar esse livro de lado por um tempo antes que ele me
induza a fazer algo do qual eu me arrependa. — Coloquei
Desire&Seduction de volta na mochila e fechei o zíper.
— Falando sozinha?
Olhei na direção da porta e vi Bear entrando na cabana. Ele segurava
o seu machado com a mão direita e exibia um pequeno sorriso no rosto.
Senti-me envergonhada e neguei imediatamente.
— Também faço isso, às vezes — comentou, com naturalidade.
Fiquei em silêncio e observei Bear deixar seu machado ao lado da
porta. Ele colocou a mão no bolso da jaqueta jeans surrada e tirou de lá uma
caixa de comprimidos.
— Já pendurei o aviso na sua porta e comprei esse remédio para
aliviar a dor no tornozelo.
— Obrigada — agradeci, tentando levar para longe os devaneios
promíscuos que tive sobre o homem antes dele chegar.
Bear andou até a cozinha, abriu a geladeira e pegou uma garrafa
d’água de vidro transparente. Ele veio até o sofá, me entregou a caixa de
remédios e a água para ajudar o comprimido a descer.
— Não tem copo? — Arqueei uma sobrancelha.
Bear tirou a garrafa das minhas mãos e a levou até a boca, bebendo
um grande gole de água. Quando ele terminou, me devolveu a garrafa e
cruzou os braços diante do peito. Ok, ele quer que eu beba direto.
Suspirando, tirei um comprimido da caixa e o coloquei na língua, em
seguida, levei a garrafa até a boca e bebi alguns goles para ajudar o remédio
a descer pela garganta.
— Deixe a garrafa por perto caso queira beber água ao longo do dia.
Eu vou fazer o almoço. — Bear se virou em direção à cozinha.
— Espera. — O homem me olhou sobre o ombro. — Eu vi que você
trouxe a minha mochila... O meu celular estava lá dentro, mas descarregou.
Pode me emprestar o seu carregador?
— Eu não uso isso, não tenho celular.
Fiquei boquiaberta. Bear deixou de me encarar e foi até a cozinha. Ele
abriu um dos armários suspensos e tirou de lá duas panelas de tamanhos
diferentes.
— Não tem celular? — indaguei surpresa. — Que tipo de pessoa, em
pleno século 21, não tem um celular?
— Eu — respondeu friamente. — Odeio essas coisas.
Fiz uma careta involuntária.
Nesse momento Bear parecia um daqueles velhos neuróticos que
odiava qualquer tipo de tecnologia. Será que ele era do tipo que acreditava
em teorias da conspiração, discos voadores e espionagem do governo? Isso
explicaria porque mora isolado do resto do mundo nessa montanha.
Olhei para o meu celular em cima da mesinha da sala e me senti mal
por saber que ficaria sem usá-lo durante o meu período de recuperação.
Deixei a conversa de lado e, enquanto Bear preparava o almoço, fiquei
folheando o meu caderno de desenhos e tentando aprimorar alguns rabiscos
que eu fiz dias atrás. Por sorte, o analgésico que tomei diminuiu
consideravelmente a dor em meu tornozelo e permitiu que eu me distraísse
a ponto de esquecer da lesão.
Tudo estava indo bem, até eu sentir algo descendo pela minha
intimidade. Respirei fundo e fechei os olhos. Droga, eu conheço essa
sensação... Não pode ser! Qualquer coisa menos isso! Sem dúvida alguma,
a minha menstruação escolheu um péssimo mês para descer mais cedo.
CAPÍTULO 10

O desespero crescia em meu peito enquanto eu refletia sobre a minha


situação. Eu acabei de ficar menstruada, não conseguia andar e estava na
casa de um homem ignorante que morava sozinho — com certeza ele não
tinha nenhum absorvente sobrando no armário do seu banheiro. Não tem
como isso ficar pior. Terei que falar com ele...
— Bear? — chamei, um pouco receosa. — Preciso ir ao banheiro.
— Espere um pouco, não posso parar de mexer agora — respondeu,
com os olhos fixos na panela em cima do fogão.
Suspirei com impaciência, a minha situação não podia esperar.
— Por favor... é urgente. — Cruzei as pernas.
— Porra. — Ele apagou o fogo e veio em passos largos na minha
direção.
Bear se inclinou e me tirou do sofá, levando-me até o banheiro com
uma expressão carrancuda no rosto. Quando ele me deixou sozinha,
tranquei a porta e abaixei a calça enquanto me apoiava na pia. Por sorte, o
meu fluxo ainda não estava intenso a ponto de manchar as roupas que Bear
me emprestou, então um simples pedaço de papel higiênico iria segurar o
que estava descendo, mas eu teria problemas nas próximas horas se eu não
encontrasse algo para conter o sangue.
Mesmo sabendo que eu não encontraria nada de útil ali, vasculhei
cada porta do armário do banheiro atrás de algum absorvente. Quem sabe
Bear já teve uma namorada e ela o deixou para trás? A ideia me
incomodou mais do que eu gostaria de admitir, mas ignorei o sentimento
para me concentrar no problema em questão.
Em minha busca, encontrei produtos para manutenção de barba, um
pente de cabelo quebrado e até mesmo uma camisinha vencida há três anos
que parecia ter sido esquecida no topo do armário. Uau! Bear realmente é
um cara solitário! Ou ele se esqueceu que deixou a camisinha ali ou estava
há pelo menos três anos sem meter o seu “machado” em alguém.
Depois de procurar em todas as portas do móvel de madeira, cheguei
à conclusão de que encontraria qualquer coisa naquele armário, menos um
absorvente. Pensei por um tempo enquanto tentava aceitar a única solução
disponível: eu teria que pedir ajuda ao Bear outra vez. Porra, ele vai surtar
comigo!
— Já acabou, Freya? — o homem perguntou, um tanto impaciente.
Não respondi, apenas abri a porta e lhe direcionei um olhar de
cachorro que caiu do caminhão de mudança. Eu precisava convencê-lo a me
ajudar nem que fosse por pena.
— O que houve? — Ele me ergueu em seus braços fortes e me levou
de volta para o sofá.
Quando meu bumbum se acomodou no assento, respirei fundo e criei
coragem para falar.
— Mais cedo você disse que cuidaria de mim até que eu estivesse
recuperada, lembra?
— Claro que sim. — Ele assentiu, seus olhos cinzentos me
observavam atentamente.
— Bom, preciso que me faça um favor. — Mordi os lábios, insegura.
O olhar de Bear desceu até a minha boca quando eu fiz esse movimento.
— Qualquer coisa que quiser, Freya — balbuciou. Ele ainda fitava os
meus lábios e parecia distraído.
Pigarreei para chamar a sua atenção e Bear finalmente voltou a me
olhar nos olhos.
— Preciso que vá até a farmácia em Havengreen e compre... —
engoli em seco —, preciso que compre absorvente para mim.
Bear arqueou uma sobrancelha. Ele ficou nitidamente surpreso com o
pedido.
— Mas eu acabei de vir da vila, Freya. Você precisa disso agora? Para
hoje?
— Sim. É urgente, Bear... por favor.
O homem na minha frente suspirou e passou a mão por seu cabelo
loiro dourado, afastando do rosto alguns fios que se desprenderam do coque
samurai que ele usava.
— Está bem, Freya — concordou, depois de um tempo em silêncio.
— Eu vou até a vila outra vez.
Direcionei lhe um sorriso agradecido. Eu já não me sentia mais tão
envergonhada com o pedido que precisei fazer, felizmente Bear entendeu a
minha emergência feminina. Ok, já posso marcar um ponto a favor do
homem das montanhas.
— Eu volto logo — anunciou, enquanto se afastava do sofá e ia em
direção à porta.
Dessa vez, Hati se levantou de onde estava e seguiu Bear para fora da
cabana. Parece que vou ficar sozinha com o meu caderno de desenhos...

Eu estava descendo a montanha pela segunda vez naquele dia e ainda


era 11:30h da manhã. Durante o meu caminho em direção à vila, eu só
conseguia me perguntar quais surpresas eu teria pela frente em relação
àquela mulher. Enquanto Freya estivesse na minha cabana ela estaria sob
minha responsabilidade e cuidar dela era o mínimo que eu podia fazer
depois do acidente que ela sofreu por minha causa.
Descer a montanha para ir até a farmácia comprar uma caixa de
absorventes não parecia uma coisa tão ruim — apesar do solo estar
escorregadio devido à chuva do dia anterior —, mas eu já estava
começando a me preocupar com o que os moradores de Havengreen iriam
pensar.
Todos sabiam que eu morava sozinho, que eu não tinha mãe, irmã ou
namorada e não queria saber de ninguém. Por esse motivo, ser visto
comprando produtos de higiene feminina era algo muito suspeito. Porra, já
imagino as fofoqueiras da vila espalhando boatos de que há uma mulher
morando comigo na montanha. Esse povo não deixa nada escapar.
Quando cheguei na floresta aos pés da montanha, decidi que usaria a
minha caminhonete para chegar mais rápido na vila. Abri a porta do
motorista e Hati entrou no carro antes de mim, se acomodando no banco do
carona. Me sentei atrás do volante e girei a chave. O motor roncou e
ameaçou dar partida, mas logo desligou.
— Porra! — Bati as mãos no votante, com raiva.
Tentei girar a chave outra vez e nada do motor ligar. A caminhonete
era antiga, pertenceu ao meu tio antes de se tornar minha e estava caindo
aos pedaços. Já passou da hora de aposentar esse carro velho, mas se eu
fizesse isso, com o que entregaria as lenhas pela vila? Não podia me dar ao
luxo de comprar um carro novo, então teria que me virar com esse aqui.
Encostei a testa no volante e fechei os olhos. Fiquei refletindo sobre a
merda que estava a minha vida até que resolvi ligar o carro novamente.
Desta vez ouvi o ronco do motor e a lataria começou a balançar indicando
que o veículo estava ligado e pronto para partir. Pisei na embreagem e guiei
a caminhonete pela estrada da floresta que levava em direção à vila.
Hati aproveitou o passeio para colocar a cabeça na janela e pegar o
vento fresco da manhã. Através do retrovisor, eu podia ver a quantidade de
fumaça que saía pelo cano de descarga conforme o veículo avançava — a
sorte era que eu estava em uma floresta e aquela nuvem branca podia ser
facilmente confundida com neblina.
Ao chegar em Havengreen, estacionei a caminhonete na entrada da
vila e decidi que seguiria a pé. Enquanto eu fechava a porta do carro, Hati
começou a latir e eu olhei na mesma direção que ele. Franzi o cenho e
rosnei junto com o cachorro quando vi, à distância, o dono da mercearia,
Sven Herzog. O sujeito era debochado, mas apesar de tudo nunca me fez
mal diretamente, eu apenas espelhava nele o ódio que sentia pelo seu irmão
mais velho, Hector. O advogado filho da puta que não morava mais aqui foi
um dos motivos de eu sair da vila e me isolar na montanha.
Deixando o passado de lado, chamei Hati e segui pela rua de
paralelepípedos que levava até a farmácia. Quando entrei no
estabelecimento, um sino tocou indicando a minha chegada. Haviam dois
homens conversando no balcão: um deles era o Grigory, dono da farmácia,
e o outro era o delegado Müller.
Xinguei mentalmente ao ver o homem da lei ali. Ele era o cara mais
fofoqueiro de toda a Havengreen — até a esposa do padeiro, Sra. Ludwig,
perdia para ele quando o assunto era espalhar boatos.
Ao notarem a minha presença, os homens pararam de conversar e me
cumprimentaram com um aceno que respondi por educação. O delegado
Müller tentou brincar com Hati, mas o cachorro se afastou e veio para o
meu lado — ele não gostava muito das pessoas daqui, estou surpreso até
agora que tenha se dado bem com Freya desde que a levei para a cabana.
Criei coragem e me dirigi para o corredor da farmácia em que ficava a
sessão feminina. Eu podia sentir os olhares dos homens em minhas costas e
sabia que se virasse para o balcão os surpreenderia me encarando enquanto
cochichavam entre si. Certo, eu consigo ignorá-los...
Hati me acompanhou pelo corredor até que parei em frente à
prateleira onde estavam os absorventes. O cachorro se sentou ao meu lado e
aguardou pacientemente enquanto eu lia as embalagens e tentava entender
qual precisaria comprar. Eu não entendia nada, me senti perdido. Não fazia
ideia de que pudessem existir tantos produtos de formas e tamanhos
diferentes para aquela finalidade.
Olhei de soslaio para os homens no balcão e, como eu desconfiava,
ambos estavam me encarando com uma expressão de surpresa no rosto.
Passei a mão pelo cabelo e suspirei. Eu não podia ficar parado aqui por
muito tempo senão aqueles dois começariam a me fazer perguntas
desnecessárias.
Completamente perdido, decidi me guiar pelo tamanho dos
absorventes. A calcinha de Freya era pequena... sua boceta devia ser
pequena também. Pequena e apertada. Porra... Senti um aperto no interior
da cueca e puxei minha jaqueta jeans para baixo, tentando disfarçar a ereção
que ganhei com aquele pensamento. Caralho, aqui não!
Eu precisava ir embora, então peguei a embalagem de absorvente do
tamanho pequeno e caminhei até o caixa sem fazer contato visual com os
homens que estavam ali. Entreguei o produto para o farmacêutico e
aguardei que ele registrasse a compra. A porra do leitor de código de barras
falhou e o homem começou a digitar lentamente os números. Só pode ser
sacanagem. Pelo canto dos olhos eu percebi o desgraçado do Müller me
encarando sem ao menos disfarçar.
— Aconteceu alguma coisa, Bear? — o delegado perguntou. É claro
que ele não iria conseguir frear a língua.
— Não — respondi friamente, e voltei minha atenção para o
farmacêutico. — Pode ir um pouco mais rápido? Estou com pressa.
— Só vai querer isso? — o dono da farmácia sondou.
— Sim.
— Pela experiência que eu tenho com a minha esposa, sugiro que leve
um remédio para cólica... e talvez chocolates — Müller se intrometeu outra
vez.
Porra, ele já percebeu que estou com uma mulher.
— Vai querer? — O farmacêutico me mostrou uma cartela de
comprimidos.
— Tudo bem. Pode registrar essa merda — resmunguei. Eu estava
impaciente e nervoso com o olhar dos dois, queria sair dali o mais rápido
possível e voltar para a minha montanha.
Por sorte, o leitor de códigos funcionou na hora de registrar a caixa de
comprimidos e a compra foi finalizada com rapidez. Paguei ao farmacêutico
e assim que recebi o troco caminhei para fora da farmácia chamando Hati
com um assovio. Enquanto eu abria a porta para sair, foi impossível não
ouvir o Müller tagarelando sobre a minha compra.
— Bear não tem irmã e nem mãe... ele só pode estar comprando
absorvente para a...
— Namorada — o dono da farmácia completou, com um tom
surpreso.
Caralho. Revirei os olhos e saí do lugar, fechando a porta com força.
Até o final do dia, a vila inteira já estaria comentando o fato de que o Bear
solitário da montanha estava com uma companhia feminina em casa. Bom,
isso não deixava de ser verdade, mas não era do jeito que o Müller e o dono
da farmácia estavam pensando. Freya não era a minha namorada, era a
minha hóspede.
Um sorriso apareceu em minha boca. Bem que eu gostaria de ter uma
namorada bonita igual a Freya. Não... melhor não dar ideia para o que essa
gente está falando, eu não quero ter meu coração partido outra vez.
— Vamos embora, Hati — chamei o meu cachorro e caminhei com
ele de volta para a caminhonete.

Bear retornou cerca de uma hora e meia depois, com uma sacola de
papel nas mãos. Ele me entregou a embalagem assim que passou pelo sofá e
eu agradeci.
— Era isso? — perguntou, na intenção de confirmar.
Enfiei a mão na sacola e tirei de lá uma cartela de comprimidos para a
cólica e uma caixa de absorventes internos. Não acredito que Bear também
se preocupou em trazer algo para a dor sem que eu tenha pedido... mais um
ponto para ele.
Eu estava prestes a parabenizá-lo em voz alta quando li na
embalagem que os absorventes eram do tamanho pequeno. Aquele tipo
servia para conter o fluxo de uma adolescente, mas não o de uma mulher
adulta.
— E então? — Bear insistiu em receber a resposta.
— Ah... eu agradeço pelo remédio, mas você comprou o absorvente
errado. — Direcionei lhe um sorriso amarelo.
— Errado? Impossível... — Bear franziu o cenho, confuso. — Está
escrito absorvente na caixa. — Ele gesticulou para a embalagem nas minhas
mãos.
Senti meu rosto queimar com vergonha ao ver que eu teria que
prolongar a minha explicação. Esse homem nunca teve namorada na vida?
— Bear... o tamanho está errado — suspirei, aflita. — Você terá que
trocar porque esses absorventes não vão servir para mim. O meu fluxo é
intenso, esses aqui não vão dar conta.
Bear arqueou as sobrancelhas e cruzou os braços diante do peito.
— Vai me fazer descer a montanha de novo? Você só pode estar de
brincadeira, Freya — resmungou, aborrecido.
— Não tenho culpa se comprou o absorvente errado! — disparei.
— Ah, então a culpa é minha? — Gesticulou com as mãos para si. —
Como eu ia saber o tamanho da sua... — Bear se conteve e olhou
brevemente para o meio das minhas pernas, ele parecia envergonhado. —
Bom, eu pensei que fosse pequena... sua calcinha é pequena.
— Você não entendeu, não é assim que essas coisas funcionam e...
espera, como sabe o tamanho da minha calcinha? — alarmei-me.
Bear olhou de um lado para o outro e deu de ombros.
— Bom, eu a vi quando coloquei suas roupas molhadas para lavar
ontem à noite. — Ele estava estranhamente tenso. — Além disso, não
importa! Eu não tenho a obrigação de saber tudo sobre absorventes, já que
eu não tenho nenhuma mulher.
— Deve ser por isso que você é assim — disparei, incapaz de perder a
piada. — A falta de sexo acaba com o humor das pessoas. Devia procurar
companhia.
Pensar em Bear saindo com outras mulheres me deixou irritada.
Merda, o que é isso? Não posso sentir ciúmes de um cara que conheço há
menos de 24 horas. Tenho que controlar as minhas emoções!
Bear ficou em silêncio e me encarou de um jeito estranho por um
longo tempo. Seus olhos estavam em um tom grafite escuro que eu achei
absurdamente lindo. A cor pareceu se destacar em meio ao seu cabelo loiro
e pele pálida.
Enquanto eu divagava, a caixa de absorventes e a sacola de papel
foram tiradas das minhas mãos.
— Não quero ninguém na minha vida, eu não preciso de companhia
— ele disse, como um rosnado. — Volto logo.
— Ficarei aqui esperando. — Gesticulei para o sofá em que eu estava.
Bear deu as costas e caminhou relutantemente até a porta, levando
consigo o produto para fazer a troca. Antes que ele saísse da cabana, criei
coragem e gritei o tamanho certo do absorvente, para que não houvesse
erros dessa vez. O homem apenas assentiu e desapareceu do meu campo de
visão.
Tempos depois, Bear chegou na cabana visivelmente suado e sem
camisa. Sua blusa estava dobrada sobre o ombro e a jaqueta jeans amarrada
ao redor da cintura. Desviando minha atenção para as suas mãos, notei que
ele trazia uma sacola de papel onde eu esperava que dessa vez estivessem
os absorventes do tamanho certo.
Fiquei encarando o peitoral daquele homem enquanto ele caminhava
até mim. Ele parou em frente ao sofá e eu quase perdi o fôlego com a
proximidade que fiquei dos seus músculos. Não posso me culpar por isso,
estou há muito tempo sem um homem, acho que é normal ficar abalada por
um tanquinho à mostra.
— Só hoje eu desci a montanha mais vezes do que costumo descer em
um mês — resmungou, ao me entregar a sacola de papel.
Quando peguei o pacote, nossas mãos roçaram uma na outra e eu
senti o mesmo arrepio da noite passada. Desta vez, criei coragem e fitei os
seus olhos, ficando surpresa ao ver que Bear já me encarava fixamente. Sou
eu ou tem um clima rolando aqui?
— Obrigada, Bear — agradeci, completamente afetada pela situação.
— Você foi o meu salvador.
Bear sorriu com diversão e eu senti meu peito se aquecer.
— Engraçado, ontem você pensou que eu iria te matar e até me
chamou de assassino do machado — brincou. — Agora sou o seu herói?
— Não fique se achando por causa disso — fingi indiferença e tirei o
pacote das suas mãos.
Fiz um pequeno esforço e deixei de encarar o rosto de Bear para
conferir se o tamanho do absorvente estava correto.
— Vou ter que descer a montanha de novo? — perguntou, com um
leve tom de desespero na voz.
— Não. O tamanho está certo — respondi, enquanto lia a embalagem.
— Agora, se puder me levar até o banheiro...
Bear me ergueu em seus braços imediatamente, aconchegando o meu
corpo próximo ao seu peito. Um sorriso involuntário curvou a minha boca.
Eu me sentia animada por ficar tão perto daquele tórax grande e musculoso
— até conseguia sentir o cheiro de pinheiro cortado e suor que emanava da
sua pele. Era excitante.
Foi preciso muito esforço mental para controlar as minhas mãos e
impedir que elas tocassem Bear, enquanto ele me levava até o banheiro. Por
mais que eu estivesse inquieta para saber qual seria a sensação de acariciar
os seus músculos, deitar a cabeça naquele peito e inspirar o aroma da sua
pele com meu nariz roçando nela, eu sabia que não podia fazer aquilo. Bear
me acharia uma pervertida e eu não queria que ele pensasse isso de mim. O
homem não estava se comportando com segundas intenções comigo, então
não seria justo desrespeitá-lo com um avanço inesperado. Seria difícil, mas
eu teria que guardar os toques e carícias para a minha imaginação.
CAPÍTULO 11

Depois que a situação com os absorventes se resolveu, Bear foi tomar


banho para se livrar do suor que ganhou ao subir e descer a montanha 3
vezes no mesmo dia. Quando saiu do banheiro, ele voltou a fazer o almoço
e eu fiquei tentando desenhar Hati em meu caderno. Durante a tarde, Bear
passou um tempo lá fora cortando lenha para secar e quando entrou na
cabana, ao anoitecer, pegou um livro sobre lendas antigas e se sentou na
mesa da cozinha para ler.
Fiquei surpresa ao descobrir que um homem rude e volátil como Bear
sabia apreciar os prazeres de uma boa leitura — pelo visto, tínhamos algo
em comum. Me senti tentada a pegar Desire&Seduction para reprisar alguns
trechos, mas aquela história estava me fazendo ter pensamentos impuros a
respeito de Bear, então achei melhor deixá-la de lado por um tempo, pelo
bem da minha saúde mental.
Quando terminei de desenhar Hati, fiquei admirando o homem
sentado na mesa da cozinha. Ele encarava fixamente as páginas do livro e
em sua testa até havia uma linha de concentração. Fiquei observando Bear
por mais tempo que o necessário e quando percebi, estava riscando os
traços da sua silhueta em uma página do meu caderno.
Ele vestia uma blusa xadrez vermelha, mas eu resolvi ousar um pouco
na hora do desenho e optei por deixá-lo sem camisa naquela folha de papel.
Ressaltei os seus ombros largos e tórax malhado, além de tentar desenhar
fielmente cada gominho de músculo em seu abdômen. Marquei os traços do
seu rosto, não podendo esquecer do cabelo grande que caía ao redor dos
ombros e da barba que cobria o seu maxilar.
Tive sorte de Bear estar imerso na leitura, porque se ele erguesse o
rosto na minha direção me veria com uma cara de abestalhada enquanto o
desenhava. Eu odiaria ter que explicar porque estava fazendo aquilo, então
preferi ficar em silêncio e mantive o desenho apenas para mim. Aproveitei
para anotar no rodapé da folha uma frase para ler sempre que eu olhasse
aquele desenho: “Ele é lindo, mas me fez cair de um barranco e torcer o
tornozelo, então é melhor não me iludir.”
Passamos o resto da noite em silêncio, sem dizer uma única palavra
para o outro. Eu fiquei calada porque estava imersa em meu desenho erótico
do homem da montanha, e Bear, por algum motivo, estava com a cara mais
fechada que o normal e não parecia a fim de conversar. Ele ficou assim
desde o almoço e nem se importou em me desejar boa noite na hora de
dormir. Parecia que Bear estava tentando evitar que uma amizade surgisse
entre nós e eu não conseguia entender o porquê.

Eu estava do lado de fora da cabana, encarando o horizonte e tentando


esquecer, apenas por alguns minutos, a mulher que estava lá dentro no meu
sofá. Uma semana se passou desde que ela chegou aqui e a cada dia ficava
mais difícil tirá-la da minha cabeça.
O tornozelo de Freya não apresentou muita melhora — embora
estivesse menos roxo, ela ainda não conseguia apoiar o pé no chão sem
sentir dor. Eu sabia que iria demorar até que Freya se recuperasse por
completo e isso significava que ela teria que ficar mais tempo por aqui. Para
ser honesto, não sei se eu aguentaria passar outra semana com aquela
mulher sem perder a linha.
Eu havia acabado de ajuda Freya a ir ao banheiro pela quarta vez no
dia e já começava a me perguntar o que faria quando a mulher decidisse que
queria tomar banho. Ela não fez isso desde que chegou e eu também não
sugeri que Freya se lavasse, pois não queria que as coisas ficassem ainda
mais complicadas para mim. Com certeza eu teria que ajudá-la no banho, já
que provavelmente ela não conseguiria entrar ou sair da banheira sem
auxílio.
Inevitavelmente, me imaginei esfregando as costas nuas de Freya
enquanto ela se lavava na banheira de madeira que eu mesmo construí. Sua
pele negra molhada com água e espuma, ela suspirando de prazer
enquanto eu deslizava a esponja por todo o seu corpo... Senti meu pau
endurecer enquanto eu divagava sobre aquele momento.
— Porra! — exaltei-me, e acabei chutando um pedaço de lenha
cortada que estava próximo aos meus pés.
Estava cada vez mais difícil de controlar as minhas ereções — às
vezes, o simples fato de estar no mesmo cômodo que ela já me fazia ficar
de pau duro. Eu desejava Freya tanto quanto um lobo faminto desejava
carne fresca. No entanto, seguia firme fazendo o possível para que ela não
se aproximasse demais. Tinha medo de avançar e a mulher se sentir
ofendida, e também não queria entregar o meu coração e me magoar, caso
as coisas não dessem certo entre nós. Posso ser um bruto por fora, mas sou
mole por dentro.
Olhei para o céu nublado acima de mim e percebi que as nuvens
cinzentas estavam baixas. Em breve, choveria novamente — assim como
vinha acontecendo na última semana. Seria melhor levar a lenha que cortei
mais cedo para dentro da cabana ou então a lareira ficaria sem ter o que
queimar nas próximas noites.

Na hora de dormir, me sentei na cama e tirei o caderno de Freya


debaixo do meu travesseiro. Ela passava boa parte do dia com ele em seu
colo e na última semana eu fiquei extremamente curioso para saber o que
havia de tão interessante nele que fazia a mulher perder horas encarando
aquelas páginas.
Hoje à tarde, quando Freya resolveu tirar um cochilo depois do
almoço, vi seu caderno exposto na mesa ao lado do sofá e não consegui
resistir, o peguei e escondi no meu quarto para observá-lo quando estivesse
com mais tempo. E esse momento chegou.
Folheei o caderno e as primeiras páginas já entregaram que ele era
usado para desenhos. Assim que meus olhos pousaram nos riscos no papel,
fiquei maravilhado com a habilidade que Freya tinha, ela era uma excelente
desenhista. Passei algumas folhas e acabei encontrando um desenho em
preto e branco da cachoeira onde a vi pela primeira vez. Meu peito se
apertou e eu logo entendi que Freya subiu a montanha naquele dia para
fazer um desenho do lugar. Porra, ela só queria fazer um desenho e acabou
vindo parar aqui.
Deixei de lado a culpa que eu sentia e voltei a folhear o caderno. Um
desenho de Hati chamou a minha atenção e eu sorri ao ver o quanto ele se
parecia com o cachorro de carne e osso.
Quando passei para a próxima página meus olhos se arregalaram
instantaneamente. Freya também tirou um tempo para me desenhar e,
aparentemente, aquele foi o trabalho em que ela mais se empenhou. Minha
versão de papel estava sentada na mesa, sem camisa e lendo um livro. Meus
músculos foram destacados de forma precisa, mas também exagerada.
Arqueei uma sobrancelha ao me lembrar desse dia. Tenho certeza que eu
estava usando uma camisa xadrez, mas parece que Freya fez questão de
tirá-la na hora do desenho. No rodapé da folha, havia uma espécie de nota
que também chamou a minha atenção:
“Ele é lindo, mas me fez cair de um barranco e torcer o tornozelo,
então é melhor não me iludir.”
Porra, Freya acha que eu sou... lindo? Dei uma risada. Eu já peguei
ela me encarando algumas vezes, mas não imaginei que a mulher ficasse
com isso na cabeça a ponto de anotar em uma folha de papel depois de me
desenhar de uma forma quase sexual. Isso prova que não sou o único
interessado aqui.
Acabei ficando empolgado com a descoberta e deixei meu coração
falar mais alto que a razão. Estava na hora de levar Freya para a última ida
ao banheiro antes de dormir, então decidi lhe fazer uma pequena surpresa.
Tirei o suéter de lã que eu usava, deixei o caderno sobre a mesa de
cabeceira e fiquei de pé. Fiz algumas flexões para que meus músculos
ficassem mais evidentes e saí do quarto para ir até a sala.
Caminhei até Freya com uma postura confiante e ela arregalou os
seus olhos assim que me viu. Reprimi um sorriso ao ver que o olhar da
mulher estava fixo em meu tórax à mostra.
— Como está o tornozelo? — indaguei ao parar em frente ao sofá.
Me preocupei em ficar em uma posição estratégica para que ela pudesse ver
os meus músculos com mais clareza.
— Ah... eu... eu... a dor vai e volta — balbuciou, distraída.
A atenção de Freya estava concentrada em meu abdômen. Eu podia
falar alguma frase indecente agora, mas preferi ficar calado e seguir com o
assunto. Eu já sabia que ela sentia interesse por mim, agora precisava
decidir o que faria com essa informação.
— Você precisa ir ao banheiro antes de dormir, Freya?
Ao ouvir a minha pergunta, ela ergueu os braços imediatamente. Sorri
com diversão. A pequena deusa já está ficando mal acostumada.
Peguei Freya no colo e dessa vez, fiz questão de manter o seu corpo
aninhado contra o meu peito. O brilho em seus olhos entregou que ela ficou
feliz com a minha atitude e eu me senti ainda mais inquieto.
Quando a coloquei no chão do banheiro, deixei a minha mão deslizar
de propósito pela sua bunda, enquanto o seu corpo ficava de pé. Freya
suspirou com aquele toque e eu estremeci. Ela parecia louca para ter
qualquer tipo de contato comigo. Porra, eu poderia comer Freya bem aqui
nesse banheiro e tenho certeza que ela iria gostar.
Meus pensamentos foram interrompidos quando ouvi a mulher
pigarrear.
— Você não vai sair, Bear? — Arqueou uma sobrancelha, e apontou
para a porta do banheiro.
Tentei sair do banheiro, mas as minhas pernas simplesmente não
obedeceram ao meu comando. Antes que eu voltasse a ter controle sobre o
meu corpo, uma frase saiu da minha boca.
— Não vai precisar de ajuda para tirar a calça? — Porra! Eu quis
morder a língua por soar tão malicioso.
Freya arregalou os olhos e encarou o chão, envergonhada.
— Bom... eu não precisei de ajuda na última semana, então acho que
não vou precisar agora.
— S-sim... claro. Eu entendo — gaguejei, forçando minhas pernas a
saírem do banheiro antes que as coisas ficassem mais estranhas.
Quando Freya anunciou que já havia acabado, abri a porta
imediatamente e a peguei no colo. Um sorriso curvou os meus lábios
quando encarei seu rosto de traços delicados.
— Melhor não se acostumar, a carona do xixi será apenas até que
você consiga andar novamente — brinquei.
Freya deixou uma risada escapar e encostou a cabeça no meu peito.
Arregalei os olhos com aquela aproximação e meu coração se aqueceu no
mesmo instante.
Respirei fundo e a parte racional do meu cérebro voltou a funcionar
enquanto eu caminhava até a sala. Controle-se, Bear. Ela é uma mulher
bonita, meiga e simpática, mas essas são as piores... elas te deixam na
merda quando vão embora.
— O que houve? — Freya indagou, me olhando de forma
preocupada. — Por que fechou a cara de repente?
Porra, é claro que ela percebeu a minha mudança de humor. Odeio
fazer isso com ela, mas não há outra saída.
— Não é nada. — A coloquei de volta no sofá e logo me afastei. —
Fique quieta e vai dormir.
Freya ficou chateada com a minha atitude e aquilo partiu o meu
coração. Para impedir que a minha barreira emocional — que já estava
frágil — desmoronasse por completo, me forcei a dar meia volta e caminhei
para o meu quarto sem olhar para trás.
CAPÍTULO 12

Não consegui dormir direito e passei grande parte da noite me


revirando no sofá. Eu estava cansada das mudanças de humor que Bear
estava tendo nos últimos dias e não queria mais ser tratada daquele jeito
rude.
Lembro-me da pergunta sugestiva que ele fez no banheiro e do jeito
que sorriu enquanto me carregava em seus braços, mas então o seu rosto se
fechou e ele ficou bravo como um urso que foi acordado durante o período
de hibernação.
Por um tempo, me perguntei se Bear não sofria de algum transtorno
de bipolaridade, mas depois descartei a ideia. O que ele tinha era aquele
comportamento que até então eu só tinha visto em personagens literários e
em adultos sem maturidade: o cu doce. E eu pretendia tirar isso a limpo
com Bear pela manhã.
Também precisava lembrar de perguntar se ele viu o meu caderno de
desenhos. Desde à tarde eu não o encontro e me pergunto se Hati o carregou
para longe achando que era algum brinquedo. Só espero que Bear não veja
a ilustração sensual que eu fiz dele dias atrás, porque eu não saberia onde
enfiar a minha cara!
Acordei com um barulho de panela caindo no chão. Abri os olhos e vi
Bear na cozinha, ele estava mexendo no armário onde guardava as panelas e
provavelmente deve ter deixado uma delas cair.
Esfreguei os olhos e me sentei no sofá, enquanto empurrava o meu
cobertor de lã para o lado. Levou um tempo até que eu me lembrasse do
objetivo que criei durante a noite e resolvi colocá-lo em ação logo nas
primeiras horas do dia. Vou fazer Bear enxergar o jeito que está me
tratando e ele vai se arrepender do que tem feito nos últimos dias...
Eu estava pronta para colocar meu plano dramático em ação, então
aproveitei que Bear estava de costas para mim, concentrado no que
preparava no fogão, e comecei a agir. Com cuidado para não colocar peso
em meu pé, que ainda estava um pouco inchado e roxo na área do
tornozelo, me levantei do sofá, equilibrada na perna esquerda, e sentei no
chão. Me acomodei em uma posição para fazer parecer que eu havia caído e
bati com as mãos no piso de madeira enquanto fingia um grito de dor. Bear
virou o rosto na minha direção e arregalou os olhos quando me viu.
— Freya?! — Ele apagou o fogo e correu até mim, se ajoelhando no
chão ao meu lado. — Está tudo bem?
Fiz o possível para controlar o meu riso de diversão com a cena. Ele
caiu direitinho...
— Eu estou bem, não se preocupe. — Tentei me levantar, apoiando as
mãos no sofá, mas Bear segurou os meus ombros e impediu que eu fizesse
qualquer movimento.
— O que aconteceu?
— Eu só estava tentando ir até o banheiro — respondi, forçando uma
expressão de tristeza.
— Sozinha? — Bear franziu o cenho, confuso. — Você ainda não
consegue andar, ficou louca?
— Eu não, mas você sim. — Ao ver que Bear ficou calado, iniciei a
segunda fase do meu plano. — É você quem tem mudanças de humor
constantemente, em um minuto está feliz e é um doce comigo, e no outro
você age como um verdadeiro cuzão. Se decida de uma vez como quer me
tratar, homem!
— Freya, eu...
— Não gostei do jeito que você tem agido nos últimos dias! — o
interrompi, deixando a minha indignação se mostrar. — Se não me quer na
sua casa, basta falar, e eu darei um jeito de descer essa montanha nem que
seja escorregando com um papelão na bunda. Mas se quiser que eu fique
aqui e tenha uma boa recuperação, então pare de me tratar como se eu
tivesse atirado do seu pé e batido no seu cachorro!
Bear passou um longo tempo em silêncio depois que eu terminei o
meu discurso. Ele parecia chocado com a minha explosão de raiva e era
nítido que não sabia como reagir.
— Eu... me desculpe, Freya — murmurou, atordoado. — Eu não
sabia que o meu comportamento estava te incomodando tanto assim. Vou
tratá-la melhor daqui para frente.
Cruzei os braços e lhe direcionei um olhar cético.
— Eu não acredito em você — disparei. — Você não fez nada para
merecer a minha confiança.
— Deixar que fique na minha casa, cuidar do seu tornozelo e não
fazer nada de ruim com você já não é o suficiente para que confie em mim?
— Você não está fazendo mais que a sua obrigação como ser humano
— fingi resistência. Eu não queria que Bear pensasse que eu acreditaria nele
de imediato.
O homem suspirou e esfregou as têmporas, pensativo.
— Eu tenho uma proposta para você: dou a minha palavra que
consigo passar um dia inteiro te tratando da melhor forma possível. Não irei
reclamar nenhuma vez sequer, Freya.
Arqueei uma sobrancelha. Interessante... muito interessante. Vamos
ver até onde ele conseguirá manter essa promessa.
— Isso é bom demais para ser verdade. — Sorri com ironia. — Está
bem, eu aceito a sua oferta.
Bear me estendeu a mão e eu a apertei para firmar o acordo.
— Agora que estamos tentando ser amigos, preciso perguntar uma
coisa: por acaso você viu o meu caderno de desenhos?
O homem balançou a cabeça negativamente.
— Caderno de desenhos? — Direcionou-me um sorriso sem graça. —
Não... eu não vi.
— Se o encontrar, prometa que vai me devolver sem olhar o que tem
dentro.
— Pode deixar.
Bear ficou de pé e me levantou do chão. Em poucos segundos eu
estava aninhada em braços fortes que me causavam todos os tipos de
sensações prazerosas.
— Vou te levar até o banheiro agora.
Concordei silenciosamente e Bear seguiu para o corredor.
Ao chegar no banheiro, decidi que testaria o homem para ver até onde
ele estava disposto a manter sua promessa. Eu queria fazê-lo arrancar os
cabelos de tanta inquietação porque era exatamente assim que ele me fazia
sentir sempre que me tratava bem e depois me ignorava. Quando eu queria
a minha vingança, eu era capaz de romper até mesmo os meus próprios
limites em nome da missão — e era exatamente isso que eu faria agora.
Assim que Bear me colocou no chão e se virou para sair, eu segurei o
seu braço e tomei coragem para falar:
— Fique aqui, Bear... eu vou precisar da sua ajuda.
Ele arregalou os olhos e eu me senti internamente feliz quando vi uma
sombra de desespero cruzar o seu olhar. É disso que estou falando!
— Como quiser, Freya — Bear me respondeu, com um sorriso
nervoso.
— Tire a minha calça. — Nesse ponto, eu já não acreditei mais nas
palavras que saíram da minha boca.
Bear arqueou uma sobrancelha, completamente espantado. Seus olhos
se desviaram do meu rosto até a minha calça e depois voltaram para cima.
Ele relutou, mas ao ver que eu realmente estava falando sério, respirou
fundo e colocou as mãos no elástico em minha cintura. Um frio surgiu na
minha barriga quando Bear deslizou o tecido da calça para baixo. Por sorte,
o casaco que eu usava era longo e largo, então evitou que as minhas partes
íntimas ficassem à mostra.
Fiz o possível para manter a calma e não deixar que o nervosismo da
situação me abalasse. Segurei no braço dele e fui inclinando para trás,
equilibrando-me com uma perna só até que sentei no vaso.
Bear virou o rosto na direção oposta. Ele estava evidentemente tenso,
sua respiração acelerada e pelo reflexo do espelho à minha frente eu pude
ver que seus olhos estavam tão escuros quanto um céu tempestuoso.
A energia ao nosso redor ficou intensa, quase sufocante, e eu comecei
a me arrepender de ter provocado aquela situação. Eu me sentia excitada
por estar no mesmo cômodo que Bear, nua da cintura para baixo, e
segurando em seu braço. Era nítido que ele também se sentia da mesma
forma e estava se controlando o máximo para não cometer um ato
impensado. Mas bem que eu queria que Bear fizesse alguma coisa...
Apesar do meu nervosismo e euforia, respirei fundo e obriguei o meu
corpo a funcionar — se eu não fizesse xixi logo, aquele momento duraria
para sempre. Foi difícil e demorou um pouco, mas consegui colocar a água
para fora do corpo.
— Bear? — chamei, eu ainda segurava o braço dele. — Poderia me
dar o papel que está sobre a pia?
Ele finalmente olhou na minha direção e seu rosto não estava nem um
pouco contente. Apesar da relutância, ele se soltou do aperto do meu braço
e pegou o papel higiênico para me entregar.
— Não vai querer que eu te seque também, vai? — indagou, com
ironia.
— Se você quiser... — as palavras me escaparam.
Bear cruzou os braços e encarou o chão.
— Eu queria fazer bem mais que isso — murmurou, achando que eu
não iria ouvir, mas ouvi.
Um fogo queimou em meu interior. Bear também me deseja? Eu
precisava de tempo para processar essa informação, mas essa era
definitivamente a melhor coisa que eu descobri na última semana. Parece
que tirá-lo do sério funcionou melhor que o esperado.
— O que você disse, Bear? — Fingi que não escutei, apenas para ver
se ele teria a ousadia de repetir aquela frase.
O homem endireitou sua postura e me encarou.
— Eu disse que você mesma pode fazer isso — mentiu. No fundo, eu
sabia que ele não tinha mesmo toda essa coragem. — Afinal de contas, não
foi o pulso que você torceu — ele completou.
— Do jeito bruto que você tem me tratado, eu estou surpresa que isso
ainda não tenha acontecido — devolvi. — É só uma questão de tempo até
eu quebrar algum osso.
— Não gosta de um homem bruto, Freya? — Bear arqueou a
sobrancelha e eu vi um brilho de malícia em seu olhar.
— Apenas na cama — provoquei, fingindo que entendia do assunto.
A verdade era que eu nunca conheci um homem assim. A maioria dos
caras com quem fiquei não sabiam transar e o meu ex-namorado fazia
carinho quando eu pedia para bater, nunca saí da cama completamente
satisfeita. Eu queria um homem ousado, que me pegasse com força sem ter
medo de machucar, que me fizesse gritar de prazer e não bocejar com tédio.
— Olha, Freya... se já terminou, levanta logo daí. Eu tenho mais o
que fazer, não posso ficar aqui no banheiro o dia todo vendo você sentada
no vaso.
Revirei os olhos e me coloquei de pé — desta vez, segurando na pia e
não no braço de Bear. Com a mão que estava livre, sequei as minhas partes
femininas e joguei o papel no cesto de lixo. O homem no banheiro ficou o
tempo todo encarando o chão. Dei uma risada interna e falei que ele já
podia levantar a minha calça. Bear me obedeceu sem questionar e eu não
vou negar que estava gostando de mandar naquele homem alto e forte que
mais parecia uma geladeira frost free.
— Que porra aconteceu com você hoje de manhã, Freya? —
perguntou, no instante em que terminou de subir a minha calça. — Bateu a
cabeça com força quando caiu no chão?
Eu apenas dei de ombros. Bear não fazia ideia que o meu tombo foi
encenado e eu preferia que ele permanecesse sem saber desse pequeno
detalhe.
— Espero que não tenha se esquecido da promessa que fez —
comentei.
— Então é por causa disso?
— Não sei do que está falando — tentei disfarçar, e ergui meus
braços pedindo silenciosamente para que ele me pegasse no colo.
Bear apenas revirou os olhos e me levantou, caminhando comigo para
fora do banheiro.
— Suas roupas já estão secas há dias, caso queira saber.
— Obrigada, mas as suas roupas são mais confortáveis... vou ficar
com elas por enquanto.
— É claro que vai... — murmurou para si, e me colocou no sofá. —
Fique com a bunda quieta aqui até eu voltar, está bem?
— Você vai aonde?
— Vou passar um tempo lá fora e tentar esfriar a cabeça — confessou
a contragosto.
Bear caminhou em passos largos até a porta. Quando ele a abriu, Hati
entrou com um pedaço de madeira na boca — provavelmente acabou de
fazer suas necessidades e agora voltou para o conforto do lar. O cachorro
veio até mim e eu afaguei a sua cabeça por um tempo. Quando olhei para a
porta novamente, Bear não estava mais lá.
CAPÍTULO 13

Saí de casa me sentindo atordoado pela situação que Freya me fez


passar. Porra, eu não sabia que tinha tanto autocontrole. A mulher fez
aquilo de propósito. Eu não sabia se ela queria me testar ou apenas se
vingar pelo jeito que a tratei nos últimos dias, mas seja lá qual foi a sua
intenção, ela conseguiu me tirar do sério.
Sentei-me na grama em frente à cabana e fiquei observando o
horizonte enquanto pensava. Oito dias... esse foi o tempo necessário para a
barreira que eu construí ao redor do meu coração cair. Porra, tentei evitar
me sentir atraído por Freya, mas hoje de manhã ela me colocou contra a
parede. Ver que o meu jeito de tratá-la estava a magoando fez com que eu
mudasse o meu comportamento da água para o vinho. Eu me senti horrível
por saber que estava ferindo os sentimentos dela.
Quando eu pensava em Freya, eu queria protegê-la e cuidar dela.
Tentar tratá-la mal apenas porque eu tinha medo de me apaixonar e ter o
coração partido era um ato covarde. Porra, dói mais saber que a magoei do
que pensar que existe uma possibilidade dela me magoar. Agora que pesei
os dois lados na balança, eu preferia deixar que Freya me ferisse do que
permitir que as minhas palavras e ações a machucassem de alguma maneira.
Caralho, lá vou eu outra vez...
Já passava do meio dia quando eu terminei o que eu estava fazendo:
um par de muletas de madeira para que Freya pudesse andar pela cabana
sem depender de mim completamente. Se eu a levasse ao banheiro e
precisasse abaixar a calça dela mais uma vez, eu iria perder o controle. É
mais do que um cara que está sem ninguém por cinco anos poderia
aguentar.
Eu não sentia vontade de estar com outra mulher desde que a vadia da
minha ex-noiva fugiu com Hector Herzog — o irmão mais velho do atual
dono da mercearia. Ele se formou em advocacia e então se tornou um
partido melhor do que um simples lenhador que fazia arte com madeira. Os
dois foram embora de Havengreen e eu nunca mais os vi. Por mim, aqueles
dois podem morrer, eu não me importo agora.
Nunca achei que eu fosse admitir isso algum dia, mas depois de anos,
eu finalmente superei a traição. Meu coração agora pertencia a outra e ela
estava me esperando lá dentro da cabana. Embora eu tenha me decidido em
relação aos meus sentimentos por Freya, eu ainda não queria fazer nenhuma
declaração. Ela podia ter interesse em mim, mas se algo entre nós tivesse
que acontecer, eu queria que fosse naturalmente, sem pressão da minha
parte. Por isso, decidi que continuaria a tratando com a mesma distância
respeitável de sempre —, mas é claro que agora eu seria mais amigável.
Depois que conheci Freya, eu senti que a minha vida ficou diferente,
estava mais alegre e menos sombria. A cada dia que eu passava sob o
mesmo teto que ela a minha necessidade de tê-la crescia ainda mais — e
por esse motivo, se eu tivesse que abaixar a calça de Freya outra vez para
ela ir ao banheiro, eu não a colocaria de volta até que tivesse compensado
todos esses anos de seca.
Fiquei fazendo hora na varanda da cabana antes de entrar com as
muletas para presentear Freya. Eu precisava conter os meus pensamentos e
parar de me imaginar transando com ela da próxima vez que a mulher
pedisse para ir ao banheiro. Isso definitivamente não irá acontecer... ao
menos, não sem que ela me peça e deixe bem claro que quer transar
comigo.
Enquanto eu esperava a mente clarear, olhei para o céu e percebi que
ele estava cinzento e repleto de nuvens carregadas. Um vento mais frio que
o normal para aquela época do ano soprou na montanha, bagunçando o meu
cabelo para trás. Cada centímetro de pele do meu corpo se arrepiou e eu
fechei a frente da jaqueta que eu usava.
Mesmo que estivéssemos no outono, aqui ainda era o norte e
estávamos no topo de uma montanha, então não descartei a hipótese de que
poderia nevar nas próximas horas, já que o clima estava frio o suficiente
para isso acontecer. Provavelmente, não seria uma tempestade de neve
severa a ponto de fazer o sol desaparecer durante o dia como acontecia em
alguns períodos do inverno, mas seria neve o suficiente para que o tempo
esfriasse por alguns dias.
Quando finalmente me senti preparado, entrei em casa segurando as
muletas e vi Freya no sofá lendo um livro com um lenhador loiro e sem
camisa na capa. Preciso admitir que a semelhança entre o sujeito e eu me
deixou atordoado. Freya gosta de ler sobre lenhadores fortões de cabelo
grande que têm uma pré-disposição para andar sem camisa? Me senti
curioso para saber o tema da história.
— O que está lendo? — puxei assunto, enquanto me aproximava do
sofá.
Freya se assustou ao perceber a minha presença e escondeu o livro
atrás de si. Deixei uma risada escapar com a sua reação. Não duvido que
seja um daqueles romances ardentes que as mulheres gostam de ler.
— O-oi, Bear. — Ela me direcionou um sorriso amarelo e fixou seus
olhos nas muletas que eu carregava. — Isso é para mim?
Concordei imediatamente.
— Considere como um presente de desculpas pelo modo que eu
estive te tratando nos últimos dias.
Parei em frente ao sofá e antes que eu lhe entregasse as muletas,
Freya me puxou para um abraço. Como ela não podia ficar de pé, ela
apenas entrelaçou os braços ao redor da minha cintura e colou o rosto no
meu abdômen. Sem saber como reagir, eu apenas sorri e afaguei o topo da
sua cabeça, até que ela se afastou.
Freya pegou as muletas para analisá-las de perto e ficou fascinada.
— Obrigada, Bear... de verdade. — Olhou-me nos olhos e sorriu.
— De nada. — Devolvi o seu sorriso. — Seu tornozelo não está
melhor?
— Não muito — suspirou, entristecida. Ela deixou as muletas
encostadas em um dos lados do sofá e acariciou o tornozelo que estava
enfaixado. — Ele parou de latejar, mas sinto muita dor quando piso no
chão.
— As muletas vão te ajudar por um tempo.
— Vão sim... — Freya mordeu os lábios e hesitou. Havia algo que ela
queria falar, mas estava receosa.
— O que houve? — tentei encorajá-la.
Freya encolheu os ombros e me encarou com um olhar inseguro. Ah,
não... essa é a mesma cara que ela fez quando me pediu para descer a
montanha e comprar absorvente na semana passada.
— Eu estava evitando pedir uma coisa porque não queria te atrapalhar
e nem sabia se conseguiria fazer isso sozinha, mas não posso mais continuar
nesse estado, então preciso falar com você...
— Fale.
— Bear, eu preciso tomar banho.
Arregalei os olhos e dei alguns passos para trás. Caralho, o pedido
que eu temia aconteceu.
Passei um longo tempo em silêncio e depois de refletir com muita
cautela e concluir que Freya já devia saber dos riscos que o seu pedido
acompanhava, eu finalmente dei uma resposta:
— Tudo bem, vou te ajudar a tomar banho. — Não acredito que esse
dia chegou. Agora não posso voltar atrás.
Dar banho em Freya significava ficar no mesmo espaço apertado com
ela, segurando-a e ajudando que ela se lavasse em todos os lugares do
corpo. Eu sabia que não aguentaria aquela tentação, então teria que me
preparar de maneira física e psicológica para hoje à noite. Tudo vai mudar a
partir daqui.
— Levarei você para o banho mais tarde e vou te ensinar a andar com
as muletas amanhã — decidi, fazendo o possível para não deixar o
desespero transparecer em minha voz. — Agora, eu preciso ir até a vila para
comprar algumas coisas.
— Tudo bem. — Ela sorriu de maneira amigável.
— Vai querer que eu traga algo? Se você confiar, posso ir até a sua
casa e pegar algumas roupas ou itens pessoais que precise...
— Quero que traga apenas o meu material de pintura, se não for
muito incômodo. Eu preciso ter um passatempo enquanto fico por aqui. —
Freya pegou a mochila que estava aos pés do sofá, tirou de lá uma chave
prateada e me entregou. — Vou precisar da minha maleta com tinta e de
algumas telas em branco. Você encontrará tudo isso no meu quarto, no
canto entre a cama e a janela.
Fiquei surpreso com um pedido tão simples como aquele. Imaginei
que ela fosse pedir o carregador do celular ou alguma peça de roupa, mas
pediu apenas telas e tintas. Eu não tinha ideia que Freya pintava quadros,
mas levando em consideração os desenhos que ela faz, eu podia imaginar
que as suas pinturas eram maravilhosas.
— Trarei a tinta e a tela para você — prometi. — Eu devo voltar antes
de anoitecer, ficará bem?
— Eu sempre fico. — Ela deu de ombros e sorriu. — Vou tirar um
cochilo.
— Então até logo. — Direcionei-lhe uma piscadela e saí da casa.

Quando cheguei na vila, resolvi passar na padaria e comprar alguma


coisa para agradar Freya. Entrei no estabelecimento e fui até o balcão,
agradecendo mentalmente por apenas a Sra. Ludwig e a costureira — que
era esposa do farmacêutico — estarem ali. As duas fofocavam entre si e eu
tive quase certeza de que ouvi o nome de Freya na roda.
— Bear? — A Sra. Ludwig ficou surpresa em me ver. Eu não a
culpava, era a primeira vez em muito tempo que eu entrava ali. — Por
favor, sente-se. Tome um pãozinho de aveia.
A mulher me serviu a massa em um pequeno prato de porcelana e eu
aceitei de bom grado, enquanto me sentava em um dos bancos em frente ao
balcão. Receber pãezinhos de aveia grátis não era para qualquer pessoa, a
Sra. Ludwig só os distribuía para quem ela realmente gostava — eu tinha a
sorte de ganhar um desses sempre que passava por aqui desde a minha
infância.
— O que vai querer, filho? — perguntou, a mulher de cabelos
grisalhos.
Olhei para o que estava à mostra no balcão e escolhi um pequeno bolo
redondo de chocolate que parecia ter acabado de sair do forno. Espero que
Freya goste. Comecei a comer o meu pão e a Sra. Ludwig voltou a fofocar
com a costureira. Foi inevitável não ouvir a conversa, já que ambas estavam
perto de mim.
— Como eu estava dizendo, não vi a Freya nos últimos dias. — A
dona da padaria começou a embrulhar o meu pedido. — Estou ficando
preocupada.
— Ela está na casa da família — falei sem pensar.
As mulheres viraram o pescoço na minha direção com uma rapidez
quase sobrenatural. Porra, eu devia ter calado a boca.
— Como sabe que ela está na casa da família? — indagou a
costureira, em um tom desconfiado.
— Bom... é o que diz no aviso na porta da casa dela — tentei
contornar a situação.
As mulheres se entreolharam por um tempo antes de voltarem a
atenção para mim.
— Como conhece a Freya? Você mal desceu a montanha desde que
ela se mudou para cá. — A sra. Ludwig arqueou uma sobrancelha.
Puta que pariu, lá vem o interrogatório. Eu poderia simplesmente
levantar e sair andando, mas isso seria extremamente suspeito. Preciso
terminar a merda que comecei.
— Eu a vi saindo de casa quando desci a montanha para entregar
lenha antes da tempestade, na semana passada. — Tentei agir naturalmente
e coloquei na boca o último pedaço do pão. — Ela estava com uma mala de
viagem.
As mulheres pareceram acreditar na minha mentira, pois nenhuma
delas fez mais perguntas.
— A Freya é uma boa menina — a costureira comentou, e me lançou
um sorriso de canto.
— E ela está solteira — completou a sra. Ludwig, enquanto colocava
o bolo embrulhado sobre o balcão.
— Vou fingir que não entendi o que vocês estão insinuando. —
Reprimi um sorriso.
Tirei dinheiro da minha carteira surrada e paguei à dona da padaria o
valor do bolo. Me levantei do banco em que eu estava e acenei com a
cabeça para as duas mulheres.
— Obrigado pelo pãozinho de aveia, sra. Ludwig — agradeci,
enquanto ia em direção à saída.
— Apareça mais vezes, querido — ela se despediu.
Quando abri a porta para sair da padaria, ouvi as mulheres
cochichando sobre a minha visita.
— Você também notou algo de diferente nele? — a costureira
sussurrou.
— Tirando o fato dele estar mais comunicativo que o normal?
— Tem alguma coisa acontecendo... O meu marido disse que Bear
apareceu lá na farmácia outro dia e comprou uma caixa de absorventes.
— Eu já sabia disso... o delegado Müller veio correndo me contar.
— E esse bolo de chocolate que ele levou? Tenho certeza que vai
dividi-lo com alguém.
— O Bear está mudado... — observou a sra. Ludwig. — Parece mais
feliz.
Resolvi deixá-las com as fofocas e saí da padaria.
Na rua, um vento frio soprava balançando o meu cabelo solto para
trás. Fiquei um tempo divagando sobre o que as mulheres falaram e percebi
que elas realmente tinham razão. Eu me sentia mais feliz e disposto a falar
com as pessoas, era como se Freya tivesse feito a minha parte humana
renascer. Ela realmente está me fazendo bem.
CAPÍTULO 14

Depois da minha visita à padaria, lembrei que teria que ir até a


farmácia. Eu precisava me preparar para o que aconteceria hoje à noite,
então teria que engolir o fato de que provavelmente ouviria piadinhas sobre
a compra que eu faria.
Não fiquei surpreso quando entrei na farmácia e vi o desocupado do
delegado Müller ali no balcão, conversando com o farmacêutico
novamente. Porra, Havengreen é movida à fofoca e um novo boato irá se
espalhar depois que eu sair daqui.
Apesar da raiva que eu sentia por antecedência, criei coragem e
caminhei até o corredor nos fundos. Parei em frente ao local em que
ficavam as camisinhas e peguei cinco pacotes — eu não sabia como as
coisas iriam se desenrolar com Freya nos próximos dias, então pensei que
seria melhor ter sobrando do que faltar e precisar descer a montanha para
comprar mais.
Segurei as embalagens nas mãos e respirei fundo. Porra, não acredito
que vou fazer isso, mas é impossível resistir à companhia de Freya... eu
estou pronto para ceder à tentação.
Caminhei até o caixa da farmácia para pagar aquela compra. Quando
coloquei as camisinhas sobre o balcão, o delegado Müller pigarreou.
— A noite vai ser boa, hein? — o homem da lei brincou.
Cerrei os punhos e decidi que iria provocá-lo também.
— Como estão as coisas na delegacia? Você já foi lá hoje? —
exagerei no tom sarcástico de propósito.
O delegado apenas me direcionou um sorriso sem graça.
— Eu estou com pressa, Grigory — reclamei com o dono da
farmácia. — Some essa merda na calculadora ao invés de tentar passar no
leitor de código que não funciona direito.
O farmacêutico estava digitando o código de barras lentamente e
parecia não saber onde ficavam os números do teclado — embora fizesse
aquilo todos os dias. Caralho!
— Tem alguém te esperando lá na cabana, Bear? — Müller puxou
assunto novamente. — Por isso está com pressa?
— Estou com pressa porque tenho coisas mais importantes para fazer
do que ficar bisbilhotando a vida dos outros.
— É... eu percebi que coisas são essas. — Olhou para as camisinhas.
— Está claro que o Bear tem tido companhia recentemente — o
farmacêutico se intrometeu. — Não se lembra de quando ele veio aqui para
comprar os absorventes? Admita, Bear... sabemos que você está com
alguém.
Olhei para ele com uma expressão irritada, só não explodi com o
sujeito porque ele já estava guardando as camisinhas dentro de uma
pequena sacola de papel. Essa tortura já vai acabar.
— Ela está morando com você permanentemente? — Müller quis
saber. — Porque não é qualquer uma que tem disposição para subir e descer
a montanha todos os dias.
— A minha vida particular não é da conta de vocês, porra!
Tirei a sacola de cima do balcão e paguei ao farmacêutico, deixando
que ele ficasse com o troco. Saí da farmácia em passos largos, sem dar mais
ideia para a dupla de fofoqueiros.
O vento frio ainda soprava do lado de fora e eu não tive dúvidas de
que teríamos neve durante a noite. Às vezes, os flocos não chegavam até a
vila, mas na montanha onde eu morava o gelo cobria parcialmente o verde
da grama e durava até que os raios de sol esquentassem o suficiente para
derretê-lo.
Eu precisava me apressar, mas antes de voltar para a montanha, tinha
que pegar as coisas que Freya pediu. Fui até a sua casa e destranquei a porta
da frente com a chave que ela me deu. Por sorte, o frio afastou as pessoas
da rua e fez com que a praça estivesse vazia, portanto, ninguém me viu
quando entrei na residência.
Não resisti à tentação e dei uma olhada pelo lugar, com a intenção de
descobrir um pouco mais sobre Freya. Na estante da sala, encontrei
fotografias dela em família e na sua formatura do ensino médio. Também
havia um quadro na parede da paisagem da vila, era uma vista da praça com
a montanha ao fundo — uma perfeita obra de arte. Será que foi ela que
pintou? É lindo. Perdi bons minutos observando aquele quadro até que
resolvi explorar o restante dos cômodos.
A casa de Freya era aconchegante e mais espaçosa que a minha
cabana na montanha. Logo na entrada estava a cozinha com uma mesa de
quatro cadeiras em seu centro e um corredor que dava para a sala, o
banheiro e os dois quartos.
Depois de perambular pelo local, percebi que os quartos tinham
tamanhos diferentes. O menor estava sendo usado como depósito de
bagunça e no maior havia uma cama de casal, estante com livros e uma
poltrona confortável próxima à lareira que estava apagada.
Entre a janela e a cama estava o material de pintura que Freya
mencionou. Era uma maleta azul de tamanho mediano que estava suja com
manchas de tinta e atrás dela haviam telas em branco encostadas na parede.
Vi também um cavalete de pinturas — Freya não me pediu, mas eu decidi
que iria levá-lo, pois com certeza seria útil.
Além do cavalete, resolvi levar mais coisas que ela também não havia
pedido, mas que eu sabia que ela precisava — como roupas mais quentes e
calcinhas. Vasculhei o seu armário e encontrei uma bolsa de viagem roxa
que usei para guardar as roupas que fui encontrando. Peguei agasalhos,
toucas, luvas, cachecóis e qualquer outra coisa que a manteria aquecida,
pois eu sabia que iria fazer frio naquela noite.
Abri a primeira gaveta do guarda-roupas e vi que era ali onde ela
guardava as calcinhas. Peguei uma vermelha de renda, mas antes de colocá-
la na bolsa fiquei imaginando Freya andando em minha cabana com ela.
Meu pau endureceu com o pensamento e eu respirei fundo para me acalmar.
Em breve eu terei essa mulher em meus braços, só preciso esperar mais
algumas horas...
Depois que peguei tudo o que tinha para pegar, coloquei a alça da
bolsa de viagem em meu ombro, as telas embaixo do braço esquerdo, a
maleta segurei com a mão esquerda e o cavalete levei na outra mão.
Olhando através da janela do quarto eu percebi que já estava começando a
escurecer então me apressei em ir embora. Saí da casa e a tranquei, um
pouco atrapalhado pela quantidade de coisas que eu carregava.
— Não acredito! A Freya é a sua companhia secreta? — o delegado
Müller estava chocado.
— Porra. — Virei-me, ficando de frente para ele.
Eu não conseguia acreditar, um momento de descuido e tudo foi por
água abaixo. Agora, o jornal nacional de Havengreen sabia que Freya
estava na minha cabana e a pior parte era que ele me viu comprando as
camisinhas na farmácia — com certeza estava supondo que eu e ela já
estávamos juntos.
Vivo aqui a tempo o suficiente para saber que a pior parte de uma
fofoca era quando os nomes das duas partes envolvidas eram revelados.
Agora, Freya também estava na mira do povo, e eu sabia que ela não
gostaria nem um pouco de descobrir isso. Porra! Só espero que esse homem
não invente de subir a montanha agora, porque se ele for até lá eu terei
problemas com Freya e com ele.
Depois que o Müller digeriu a descoberta, ele cruzou os braços e
começou a me encarar com um sorriso sacana.
— Eu sou um péssimo policial... nunca desconfiei que poderia ser ela
— admitiu. — Quando isso começou?
— Isso o quê? — Eu me sentia tenso demais para pensar com
coerência. Precisava dizer alguma coisa para espantar o homem e voltar
para a cabana.
— O seu namoro com a Freya... já estão até morando juntos. — Ele
arqueou as sobrancelhas. — Ela se mudou para Havengreen por sua causa?
Vocês namoravam pela internet ou algo assim?
— Não! — rosnei. — Freya e eu... porra, é complicado.
— Todas as mulheres são. — Müller deu tapinhas no meu ombro. —
Sinceramente, estou feliz por saber que conseguiu seguir em frente e que
até está namorando outra vez.
Por mais que eu quisesse, não podia admitir que Freya era a minha
namorada, porque seria mentira. Eu queria muito que ela fosse, mas ainda
não havia acontecido nada entre nós. Espero que isso mude em breve.
— Eu preciso ir — tentei desconversar.
— Claro... vá em frente. — Ele apontou para a montanha e sorriu. —
Divirta-se e mande lembranças minhas à Freya.
Eu apenas assenti e virei as costas, caminhando pela rua que levava
para a entrada da vila onde deixei a minha caminhonete. Fui pego em
flagrante pelo delegado Müller, não acredito nessa porra! Espero que não
dê merda...

Quando cheguei na cabana, Freya estava adormecida no sofá e Hati


deitado no meio do corredor.
Deixei as coisas que eu carregava na sala, colocando o cavalete e o
material de pintura ao lado do sofá. O bolo que comprei na padaria eu
guardei na geladeira e as camisinhas coloquei na gaveta da minha mesa de
cabeceira no quarto. Chegou a hora de preparar o banho de Freya.
Meu coração se manteve acelerado durante o tempo em que eu
arrumava as coisas. Coloquei a banheira para encher e deixei uma nova
muda de roupas e uma das calcinhas limpas que peguei na casa de Freya
sobre a tampa do vaso que estava abaixada. Também pendurei uma toalha
no gancho que havia na parede para que ela pudesse se secar e não sentir
frio ao sair da água.
Resolvi dar um jeito na minha aparência também e penteei o cabelo, a
barba e espirrei um pouco do perfume amadeirado que eu raramente usava.
Conferi meu reflexo no espelho até ter certeza de que estava apresentável e
voltei para a sala. Ao chegar no cômodo, vi Freya sentada no sofá mexendo
na maleta de tintas que eu trouxe. Ela ergueu seu olhar até mim e sorriu
amplamente.
— Obrigada, Bear! — Freya abriu os braços, sinalizando que me
daria um abraço.
Sorri e fui até ela. Quando passei meus braços ao redor do seu corpo,
a levantei no colo e ela deu um gritinho de surpresa, enquanto firmava as
mãos ao redor do meu pescoço.
— Você está animadinho, Bear... o que houve?
Fitei o seu rosto que estava tentadoramente próximo ao meu. Eu quis
beijá-la, mas me contive já que não tinha certeza de como ela iria reagir.
— Vem comigo, eu vou te levar para tomar o seu banho. — Caminhei
com Freya para o banheiro, fazendo o possível para ignorar a ereção que
começou a crescer no interior da minha calça.
CAPÍTULO 15

Minha boca se curvou em um sorriso largo quando Bear disse que me


levaria para tomar banho. Eu me senti aliviada por saber que iria me lavar
depois de todos esses dias.
Nunca fiquei tento tempo sem tomar banho e estava terrivelmente
incomodada com a situação, no entanto, passei os últimos dias com medo
de escorregar no banheiro e machucar ainda mais o meu tornozelo. Agora
que ele estava menos dolorido, talvez eu conseguisse me virar sozinha para
entrar na banheira.
Mesmo que eu não estivesse tão suada devido ao frio da montanha, eu
já estava começando a ficar com um cheirinho desagradável e me sentia
envergonhada por ficar assim perto de Bear. À essa altura, eu tinha certeza
que o homem já estava pensando que eu não gostava de banhos, mas isso
mudaria hoje.
Quando abri os braços para abraçar Bear em retribuição pela ajuda,
ele me surpreendeu erguendo-me no ar e pressionando o meu corpo contra o
dele. Dei um gritinho de surpresa e segurei em seu pescoço para me
equilibrar.
— Você está animadinho, Bear... o que houve? — Arqueei uma
sobrancelha. Nossos rostos estavam tão próximos que precisei lutar contra a
vontade que senti de beijá-lo. Se eu fizer isso, ele vai achar que eu sou
louca.
— Vem comigo, eu vou te levar para tomar o seu banho —
respondeu, com um sorriso torto.
Bear caminhou comigo em direção ao banheiro e quando entrou no
cômodo, me colocou cuidadosamente no chão. Mesmo depois que eu já
estava equilibrada em meu pé esquerdo, o homem permaneceu com as mãos
em minha cintura, como se não quisesse me soltar. Acabei me deixando
levar pelo momento e mantive meus braços ao redor do seu pescoço.
— Obrigada — agradeci, direcionando um sorriso tímido.
Bear piscou para mim e retribuiu o sorriso. Ele levou suas mãos até o
meu cabelo e o prendeu em um coque frouxo para que não se molhasse
durante o banho.
— A noite será fria, então é melhor não lavar o cabelo hoje — tentou
explicar a sua atitude.
Concordei em silêncio e desviei meu olhar para o ambiente ao redor.
A banheira rústica de formato retangular e feita de madeira estava cheia de
espuma. Um leve vapor da água quente pairava pelo cômodo, o deixando
aquecido e perfeito para que eu não sentisse frio. No gancho, ao lado da
banheira, estava pendurada uma toalha branca e sobre a tampa do vaso
fechada estava uma muda de roupas para que eu vestisse após o banho.
Bear preparou tudo isso. Parte de mim ainda não conseguia acreditar que
ele estava se mostrando um homem tão gentil.
— Viu só? Não doeu nada me tratar com gentileza por um dia —
brinquei.
— Acho que posso me acostumar com isso — admitiu, com um
sorriso tímido.
Estar tão perto de Bear, admirando o seu rosto e ouvindo a sua voz
fez o meu coração se aquecer. Não posso mais negar... eu realmente estou
gostando dele. Há algo nesse homem que me faz sentir a necessidade de tê-
lo por perto o tempo todo.
Por mais que o fato de Bear ser idêntico ao personagem do livro tenha
ajudado um pouco na atração que senti à primeira vista, agora isso não era
mais uma coisa que influenciava os meus sentimentos. Por isso eu fiquei tão
chateada com o modo que ele estava me tratando, doía saber que o homem
que eu queria não parecia ter o mínimo de consideração por mim. Mas
agora que eu estava vendo Bear fora da armadura de brutamonte ignorante,
eu percebi que ele tinha sim um lado doce e protetor, apenas não queria
mostrá-lo. Eu estava começando a sentir que ele realmente poderia ser o
homem dos meus sonhos, o homem por quem estive buscando todos esses
anos.
Deixando os meus pensamentos de lado, soltei-me dos braços de Bear
e me virei ficando de frente para a banheira. A encarei por um tempo,
enquanto analisava a melhor forma de entrar na água sem correr o risco de
me machucar. Será difícil, mas talvez eu consiga entrar apoiando meu peso
nos joelhos.
Eu estava prestes a tirar o suéter de lã que eu usava quando me
lembrei que não ouvi passos saindo do banheiro e/ou o som da porta se
fechando. Bear ainda estava aqui. Eu podia sentir a sua forte presença
masculina de 1,90 m presente no cômodo.
Olhei sobre o ombro e vi Bear com o quadril apoiado na pia e os
braços cruzados diante do peito. Ele me encarava fixamente, com um olhar
intenso, que me fez sentir borboletas no estômago.
Embora eu achasse a sua presença excitante, eu precisava tomar
banho antes que a noite caísse e o tempo ficasse mais frio, então não fui
capaz de sustentar aquela troca de olhares por muito tempo.
— Por que ainda está aqui, Bear?
— Vou te ajudar a tomar banho. — Ele parecia tenso.
Arqueei as sobrancelhas. Bear pretendia ficar aqui no banheiro
comigo? Oh, céus... por mais que eu ache a ideia de tomar banho na frente
dele excitante, sinto que ainda não estou preparada para isso.
— O-obrigada, mas eu não preciso de ajuda — respondi, por impulso.
— Acho que consigo tomar banho sozinha.
Ao me ouvir, Bear encolheu os ombros e uma sombra de tristeza
cruzou o seu olhar. A parte do seu rosto que não estava coberta pela barba
ganhou um tom avermelhado. Acho que ele ficou com vergonha.
Bear se virou e saiu do banheiro em passos lentos. Antes de fechar a
porta, ele me encarou uma última vez.
— Tem certeza que não quer a minha ajuda? — insistiu.
— Sim. Tenho certeza.
— Se precisar, me chame. Estarei do lado de fora. — Ele finalmente
fechou a porta e eu me vi sozinha no cômodo.
Um sorriso apareceu em meus lábios quando percebi que Bear estava
visivelmente relutante em sair do banheiro — por um instante, até tive a
leve impressão de que ele ficou decepcionado ao saber que eu não queria a
sua ajuda para tomar banho. Bear realmente pensou que eu teria a coragem
de ficar nua e me lavar na frente dele?

Encostei-me na parede ao lado da porta do banheiro e deixei o meu


corpo escorregar para baixo até que eu estivesse sentado no chão.
Eu me sentia triste e decepcionado. Me preparei para o banho de
Freya como se estivesse indo para uma batalha, mas descobri que ela nunca
pretendia me ter no banheiro enquanto lavava o seu corpo perfeito. De fato,
eu coloquei muita expectativa naquele banho. Eu devia ter imaginado que
ela jamais tomaria uma atitude assim.
A brincadeira que Freya fez comigo hoje de manhã mexeu com a
minha cabeça e atrapalhou o meu raciocínio. Agora, eu não passava de um
idiota iludido com várias camisinhas na gaveta que eu provavelmente nunca
iria usar. O Müller vai espalhar boatos de que estou com Freya e quando ela
descobrir, eu é que serei perseguido pela montanha sob ameaça de ser
decapitado por um machado. Porra.
Eu simplesmente não conseguia entender. Freya estava demonstrando
sinais claros de que estava interessada por mim, então pensei que ela me
deixaria ficar no banheiro e usaria isso como desculpa para que nós dois
pudéssemos nos aproximar. No fim das contas, a mulher só queria tomar o
seu banho em paz.
Fui tirado dos meus pensamentos quando um focinho molhado roçou
na minha mão. Hati queria brincar e eu acabei aceitando o seu convite para
tentar esquecer da confusão que pairava em minha mente.
Passei os próximos minutos na companhia do meu cachorro até que a
porta do banheiro se abriu. Fiquei de pé imediatamente quando vi Freya
pulando em um pé só para tentar sair do cômodo. Ela se desequilibrou, mas
eu consegui pegá-la antes que o seu corpo caísse no chão.
Freya apoiou suas mãos em meu peito e me direcionou um sorriso
sem graça. Seu corpo cheirava ao sabonete de erva-doce que coloquei na
água da banheira e ela também usava a muda de roupas limpas que deixei lá
no banheiro. Meu suéter de lã cinza e a calça de moletom branca ficaram
largos nela, como achei que iria ficar, mas também a deixaram
absurdamente sexy. Eu não sabia explicar o porquê, mas eu sentia tesão ao
ver Freya usando as minhas roupas.
— Não tente andar por aí sozinha, você pode cair — alertei. —
Amanhã vou te ensinar a se equilibrar com as muletas.
— Está bem... obrigada, Bear. — Ela entrelaçou seus braços ao redor
do meu pescoço e eu a peguei no colo para que fôssemos até a sala.

Enquanto eu preparava o jantar, Freya estava deitada no sofá,


enrolada no cobertor e me encarando em silêncio. Preciso admitir que
estava gostando de ter toda a sua atenção direcionada a mim.
Por diversas vezes naquela noite, tive vontade de confessar o interesse
que eu sentia por ela, mas me controlei — eu não queria que as coisas
ficassem estranhas entre nós. Por mais difícil que fosse, decidi manter o
silêncio e me concentrei na sopa que eu estava fazendo.
Como eu previ mais cedo, a noite estava fria e através da pequena
janela, que ficava na cozinha, era possível ver alguns flocos de neve caindo
lá fora. Freya estava com um cachecol enrolado em seu pescoço e um par
de luvas que peguei em sua casa. Eu realmente fiz bem em trazer roupas
mais quentes para ela, no entanto, sabia que aquilo não seria o suficiente
para mantê-la aquecida a noite toda.
Mesmo que Freya tentasse disfarçar, era possível ver o seu corpo
tremendo levemente sob o cobertor de lã. Eu já estava acostumado com o
clima daqui, mas ela não. Por esse motivo, comecei a me preocupar que ela
pudesse ficar doente caso passasse frio essa noite.
Quando terminei de preparar a sopa, fui até o sofá e a entreguei a
tigela com o caldo quente — ao menos, aquela refeição a manteria aquecida
por um tempo.
Coloquei um pouco de sopa no meu prato e sentei na mesa para
comer.
— Bear? — Freya chamou a minha atenção. — Por que você mora
nessa montanha? Aqui deve fazer muito frio no inverno.
— Não gosto de pessoas — respondi vagamente, eu não queria abrir
nenhuma brecha para falar sobre o motivo que me fez vir para cá.
— Me conta uma novidade, grandão — ela zombou e comeu mais
sopa. — Deve ser solitário passar o dia cortando lenha na floresta e depois
subir até essa cabana.
— Não sou apenas um lenhador... também faço esculturas de madeira
— levei o assunto à diante. — E você, Freya? O que você faz da vida para
conseguir dinheiro?
— Bom... eu pinto quadros. — Ela colocou uma mecha de cabelo
atrás da orelha. — Já consegui vender alguns desde que me mudei para cá.
Arqueei uma sobrancelha. Então ela é pintora? Eu pensei que fosse
apenas um passatempo. Agora, eu me sentia extremamente curioso para
saber mais sobre a sua profissão.
— Eu vi uma pintura na sua sala quando entrei lá mais cedo, foi você
que fez?
— Sim — concordou, com entusiasmo. — Você gostou?
— Eu achei linda. Você tem muito talento.
— Obrigada. — Freya sorriu timidamente e comeu mais sopa.
Tive a leve impressão de que o assunto estava encerrado, então
resolvi acrescentar:
— Eu aprecio muito os trabalhos artesanais. Até já tive uma loja de
esculturas na vila.
— Espera... não me diga que aquela loja fechada na rua atrás da
praça, com corrente na porta e vitrine empoeirada, é sua? — Freya estava
boquiaberta.
— Sim, a loja é minha. — Eu dei uma risada. — Algo me diz que
você já esteve bisbilhotando por lá.
— Sempre que eu passava em frente àquela loja ficava me
perguntando o que teria acontecido com o dono.
— Uma série de eventos infelizes — respondi a dúvida dela,
enquanto comia um pouco da sopa.
— Podia reabrir...
— Não, obrigado — disparei, sem conseguir disfarçar o mau humor
que apareceu em minha voz.
Freya pareceu um pouco acuada com a minha resposta rude e ficou
em silêncio enquanto terminava a sua sopa. Eu quis me bater por fazê-la
ficar daquele jeito, então resolvi iniciar outro assunto com a intensão de
deixá-la animada.
— Sabe, eu passei alguns minutos admirando o quadro na sua sala —
admiti. — Você tem muito talento com a pintura, Freya... eu adoraria que
pintasse algo para mim.
— Você não ficou bisbilhotando a minha casa, ficou?
— Não... claro que não — menti. — Eu jamais faria tal coisa.
Freya não acreditou muito na minha resposta, mas resolveu deixar
para lá.
— Eu posso fazer um quadro para você — concordou, com diversão.
— O que gostaria que eu pintasse?
Fiquei em silêncio por um tempo enquanto pensava. No fim, decidi
que seria melhor deixar que a criatividade da mulher falasse por si.
— O que você quiser... me surpreenda. — Direcionei-lhe um sorriso
de canto.
Freya assentiu com entusiasmo. Seus lindos olhos castanhos estavam
com um brilho empolgado que aqueceu o meu coração.
Passamos o resto do jantar conversando sobre pinturas e esculturas de
madeira. Foi a primeira vez, nos últimos 5 anos, que eu conversei por tanto
tempo com alguém sem que houvesse tédio em minha voz ou vontade de
encerrar a conversa.
Quando terminamos a sopa, me levantei da cadeira e fui até o sofá
para pegar a tigela de Freya. Meus dedos roçaram na sua mão e eu
estremeci ao sentir que ela estava gelada.
— Está com frio? — perguntei, encarando fixamente o seu rosto.
Freya negou com a cabeça.
É claro que eu não acreditei nela, mas decidi virar as costas e fui até a
pia para lavar a louça do jantar. Assim que terminei a tarefa, voltei minha
atenção para Freya e a vi enrolada ao edredom, com os braços ao redor do
corpo e estremecendo levemente. Me recostei na pequena geladeira bege
que havia na cozinha e cruzei os braços diante do peito.
— Está na hora de dormir, Freya — suspirei. — Você está sentindo
frio?
A mulher hesitou por um tempo, mas no fim, assentiu e se enrolou
ainda mais no cobertor.
Porra, eu terei que fazer isso, caso contrário, ela passará a noite
batendo os dentes no meu sofá...
CAPÍTULO 16

— Odeio ter que dizer isso, Freya, mas só existe uma solução para te
manter aquecida essa noite. — Bear caminhou em passos largos até o sofá e
me pegou no colo.
Fiquei confusa quando ele começou a andar. Pensei que me levaria ao
banheiro para o último xixi da noite, mas ao invés disso Bear virou à
esquerda no corredor e entrou no seu quarto. Meu coração acelerou e eu
arregalei os olhos, assustada. O que estou fazendo aqui?
Bear me colocou em cima da cama, do lado da lareira que estava
acesa. Embora eu tenha me sentido mais aquecida, o meu corpo inteiro
entrou em estado de alerta.
— O que é isso?! — indaguei alarmada.
— Ficará mais aquecida se dormir aqui perto da lareira.
Arregalei os olhos quando vi o homem se sentar do outro lado da
cama e tirar as suas botas.
Mesmo que o meu tornozelo estivesse ruim, usei meus braços e a
perna que estava boa para afastar meu corpo o máximo que consegui, só
parei quando percebi que eu estava à beira do colchão. Eu podia até sentir
um certo interesse sexual por Bear, mas dormir na mesma cama com ele era
repentino demais.
— Não se preocupe. — Bear virou o rosto na minha direção. — Eu
prometo que não farei nada.
— Como vou saber que está falando a verdade?
— Se eu quisesse fazer algo de ruim com você, Freya, eu já teria
feito.
Fiquei em silêncio, pois não consegui encontrar nada para dizer
depois do que ouvi.
Bear suspirou e deitou-se no colchão. Minha respiração ficou
acelerada e o meu coração bateu tão forte que eu pensei que fosse rasgar o
meu peito.
— Prometo que não farei nada contra a sua vontade, Freya — ele
reforçou suas palavras, desta vez olhando no fundo dos meus olhos. —
Pode dormir tranquila.
— Tudo bem... — balbuciei em concordância, e forcei meu corpo a se
deitar também.
Se isso tivesse acontecido na semana passada, eu daria um jeito de
levantar da cama e rastejar para fora desse quarto, mas agora, pensar em
ficar deitada ao lado de Bear com nossos corpos tão próximos me deixava
excitada.
Quando apoiei minha cabeça no travesseiro, Bear forrou sobre nós um
cobertor quente e pesado, depois virou seu corpo para o outro lado e ficou
de costas para mim. Entendi aquilo como um sinal de que ele me daria mais
privacidade. No entanto, o espaço da cama não era muito favorável. Apenas
alguns centímetros de colchão separavam os nossos corpos e se eu me
afastasse mais um pouco, cairia no chão.
Resolvi virar para o lado oposto e ficar de costas para Bear, mas
quando fiz isso, meu bumbum roçou no dele. O homem grunhiu irritado,
mas não disse nada. Decidi ignorá-lo e fitei a lareira onde pedaços de lenha
queimavam deixando o quarto com um leve cheiro de madeira queimada.
Meus olhos se desviaram para longe do fogo e focaram na mesa de
cabeceira que havia ao lado da cama. Imediatamente reconheci o meu
caderno de desenhos que estava sobre ela e o meu coração gelou. Quando
foi que Bear encontrou o meu caderno? Droga... será que ele viu o desenho
que fiz dele sem camisa?
— Onde você encontrou o meu caderno? — Fiz o possível para não
deixar que a preocupação transparecesse em minha voz.
— Estava atrás do sofá, encontrei hoje de manhã enquanto você
dormia — respondeu, após um tempo de silêncio. — Guardei para entregar
depois que você acordasse, mas acabei esquecendo.
— Por acaso viu o que tem dentro dele? — Eu quis morder a língua
naquele instante, era óbvio que perguntas demais levantariam suspeitas.
— Não, eu não bisbilhotei o caderno. — Bear deu uma risada nasal
que eu só fui capaz de ouvir porque estava ao seu lado. — Agora fique em
silêncio e vá dormir. Eu quero esquecer que você está aqui do meu lado.
Meu coração pesou quando ouvi aquela frase. Bear estava voltando a
me desprezar? Uma lágrima desceu pelo meu olho e eu respirei fundo. Não
posso chorar aqui. Mesmo estando de costas, ele vai perceber.
— Por que você quer esquecer que estou aqui? — Fui incapaz de
conseguir manter aquela dúvida dentro de mim, a dor começava a rasgar o
meu peito.
— Porque é difícil ficar deitado com você. — Bear suspirou e se
remexeu na cama. Mesmo que eu não estivesse o encarando, sabia que ele
continuava de costas para mim porque o seu bumbum estava roçando no
meu. — É difícil me deitar com você apenas para dormir quando o que eu
queria de verdade era te foder bem forte até quebrar essa maldita cama!
Meu queixo caiu. Eu simplesmente não consegui acreditar no que
ouvi. Caralho! Bear sente esse tipo de atração por mim? Pensar nisso fez a
minha intimidade doer com desejo e eu me dei conta do quanto eu queria
aquilo também. Fiquei excitada e comecei a me perguntar se devia tentar
alguma investida com ele.
Antes que eu pudesse decidir qual seria o meu próximo passo, Bear se
levantou da cama. Quando virei o rosto em sua direção, o vi saindo do
quarto em passos largos sem ao menos olhar para trás. Com certeza ele
ficou envergonhado pelo que admitiu em voz alta.
Eu estava chocada demais para pensar em chamar Bear e pedir que
ele não se afastasse, também não tinha como eu me levantar e correr atrás
dele. Não havia outra saída a não ser ficar aqui esperando o homem voltar.
Inevitavelmente, comecei a divagar sobre como seria transar com
Bear. Será que ele é tão intenso na cama quanto o mocinho de
Desire&Seduction? O lado malicioso da minha mente me fez imaginar Bear
segurando o meu quadril com firmeza, assumindo o controle. Nossas peles
quentes e suadas se encontrando enquanto nos entregávamos ao prazer. Ele
estocando com força dentro de mim, me arrancando gemidos profundos e
desesperados. Fechei os olhos e me permiti mergulhar naquela fantasia
erótica. Acabei adormecendo e, naquela noite, sonhei que estava nos braços
de Bear. Ele me beijava e dizia que me amava...
Fui para a sala porque não conseguia aguentar ficar tão próximo de
Freya. Tudo que eu queria era mantê-la aquecida durante à noite, mas o tiro
saiu pela culatra e agora eu estava a ponto de perder o controle. Ainda não
conseguia acreditar no que falei em voz alta. Imagino o quanto ela ficou
perturbada com o que ouviu.
Quando me sentei no sofá, ofeguei ao sentir o aperto no interior da
minha calça, meu pau estava duro e eu sabia muito bem o motivo. Meus
sentimentos por Freya estavam indo longe demais, eu sequer conseguia
controlar as reações do meu corpo quando estava perto dela. Se a mulher
sorria, eu ficava excitado, se falasse comigo, eu sentia vontade de ouvir a
doce voz dela gemendo o meu nome. Eu estava fora de controle.
Fechei os olhos e respirei fundo, torcendo para que o tempo fizesse
aquela maldita ereção desaparecer, mas não deu certo. Só consegui
imaginar Freya ajoelhada na minha frente, sorrindo, enquanto segurava o
meu pau e dizia que iria me ajudar a dar um jeito naquele problema. Porra.
Eu não conseguia mais aguentar. Precisava aliviar aquele tesão
acumulado e se eu não fizesse isso aqui na sala, acabaria fazendo no quarto,
com Freya. Puxei o meu pau para fora da calça e o segurei em um aperto
firme. Há anos ele não ficava tão duro assim.
Era diferente quando eu estava sozinho, dificilmente eu me sentia
excitado. Agora que havia uma mulher gostosa pra cacete aqui na cabana, a
minha imaginação viajava e me fazia fantasiar com ela praticamente 24
horas por dia.
Eu sabia que não havia outro jeito de fazer aquela ereção desaparecer,
então comecei a me masturbar, bombeando para cima e para baixo de um
jeito bruto e rápido. Fechei os olhos e me imaginei fodendo Freya com a
mesma intensidade, imaginei como seria a sensação de estar dentro do seu
corpo, reivindicando aquela mulher. Um gemido rouco me escapou e eu
inclinei a cabeça para trás.
Aumentei o aperto da minha mão e tensionei o braço. Comecei a
bombear com mais força, os músculos das minhas pernas se contraíram e
então eu gozei. Abri os olhos no momento exato em que o sêmen jorrou
para fora do meu corpo e vi algumas gotas caírem no chão de madeira. O
restante do líquido esbranquiçado se espalhou pela base do meu pau e sujou
parte da minha calça.
Fiquei um tempo calado, respirando fundo enquanto recuperava o
fôlego. Minha mão direita estava melada com o meu gozo e eu só não temi
que Freya me visse naquele estado porque eu sabia que ela não podia se
levantar da cama sem a minha ajuda.
Depois que me senti mais disposto, levantei do sofá e fui para o
banheiro me lavar. Enquanto eu caminhava pelo corredor, não consegui
deixar de pensar no que fiz. Foi bom, mas eu não devia ter ultrapassado
esse limite. Nos últimos dias eu lutei para não cair na tentação e bater
punheta pensando em minha hóspede gostosa. Agora que cedi a essa
vontade, eu havia entrado em um caminho sem volta. Se antes eu desejava
Freya, agora eu percebi que precisava tê-la, eu precisava sentir o calor do
seu corpo tanto quanto precisava de ar para respirar.
CAPÍTULO 17

Quando despertei do sono, me senti envolvida por um aperto firme de


braços fortes. Abri os olhos e percebi que estava de cara no peito de Bear
— que estava coberto por um suéter de flanela azul. Eu me sentia quente,
muito quente, e quando tentei me mexer percebi que o joelho dele estava
entre as minhas pernas, pressionando exatamente o ponto mais sensível da
minha intimidade. Uau... como foi que acabamos assim?
Passei um tempo em silêncio, observando aquele homem adormecido.
Seu rosto estava relaxado pelo sono e ele respirava lentamente, seu corpo se
aconchegava ao meu como se eu fosse um daqueles travesseiros de abraçar.
Imagino que Bear voltou para a cama em alguma hora da madrugada e se
mexeu enquanto dormia.
Mesmo que eu estivesse adorando ficar tão próxima de Bear, eu
precisava sair dali. Seu joelho pressionando no meio das minhas pernas me
deixou excitada e estava difícil controlar a vontade que eu sentia de me
esfregar contra ele. Tentador, mas não quero correr o risco de Bear acordar
e me flagrar em tal situação.
Tentando me desvencilhar, empurrei discretamente o seu peito para
longe, mas seus braços se apertaram ainda mais ao meu redor. Bear mal
abriu os olhos, apenas se aconchegou mais contra o meu corpo, enterrando
o rosto em meu cabelo e pressionando o joelho com mais força em minha
intimidade. Fechei os olhos e gemi com a sensação prazerosa.
Segundos depois, Bear mexeu o rosto e eu senti seus braços me
soltarem. Abri os olhos e me deparei com o homem me encarando com um
olhar atordoado. Droga... com certeza foi o meu gemido que o acordou!
Fiquei em silêncio e apenas lhe direcionei um sorriso envergonhado. O que
eu poderia dizer nessa situação?
— Eu vou tomar banho — balbuciou, sua voz estava rouca pelo sono.
Quando Bear se afastou para levantar da cama, o seu joelho deixou de
pressionar a minha intimidade. Precisei lutar contra a vontade que senti de
pedir que ele voltasse à sua posição anterior. Eu me sentia aflita e vazia
agora que o corpo dele estava longe do meu.
Fiquei observando Bear mexer na primeira gaveta da sua cômoda. Ele
tirou de lá uma muda de roupa que usaria durante o dia e saiu do quarto sem
olhar na minha direção. Fui deixada sozinha, deitada na cama, sentindo
minhas partes femininas doerem com o desejo não saciado.
Eu sabia que Bear iria demorar ao menos vinte minutos para voltar do
banho — o que me dava tempo o suficiente para me divertir sozinha. Há
uma semana eu jamais faria uma coisa dessas, mas agora eu sentia tanta
necessidade de ter algo tocando a minha boceta que pouco me importava se
eu estava deitada na cama de outra pessoa, tudo que eu queria era fazer
aquele desejo insano passar. Se eu não resolvesse isso sozinha, acabaria
perdendo o controle do meu bom senso e tentaria alguma investida com
Bear, da qual eu poderia me arrepender no futuro.
Não pensei em mais nada, apenas deslizei minha mão direita para o
interior da calça de moletom que eu usava e comecei a me acariciar. Meus
dedos tocaram o meu clitóris inchado e eu suspirei quando comecei a
brincar com ele, estimulando-o em movimentos circulares. Minha boceta
estava encharcada de excitação e eu só conseguia pensar em Bear e nas
palavras que ele me disse ontem à noite. Eu queria que ele as tornasse
realidade, queria que Bear viesse aqui agora e se enterrasse bem fundo no
meu corpo. Queria que ele me fodesse até quebrar a cama em que eu estava.
— Bear... — gemi baixinho e empurrei dois dedos pela minha
entrada, imaginando que fosse o pau dele me preenchendo.
Nunca desejei tanto o toque de um homem. Eu queria que ele
estivesse aqui comigo...
Tirei o meu suéter, deixando-o sobre o sofá da sala, e abri a porta da
cabana para que Hati pudesse sair e fazer as suas necessidades matinais. A
grama lá fora estava salpicada de branco pela neve que caiu na noite
anterior e quando eu respirava, saía fumaça da minha boca e nariz. Eu
estava sem camisa, mas não me importava com o frio da manhã — passei
tanto tempo nessa montanha que o meu corpo se acostumou com o clima
gelado.
Deixei a porta da cabana aberta e caminhei em direção ao banheiro.
Quando cheguei no corredor, ouvi suspiros entrecortados e gemidos baixos
vindos do meu quarto.
Parei na entrada do cômodo para ver o que Freya estava fazendo.
Quando meus olhos se fixaram na mulher em cima da minha cama, o meu
corpo inteiro ficou tenso. Sua mão estava no interior da calça, suas pernas
abertas e o rosto se contorcendo em expressões de prazer. Ela gemia de um
jeito necessitado, sem se importar que alguém pudesse ouvi-la. Porra!
Freya está se masturbando na minha cama, a essa hora da manhã? Não
acredito...
Não consegui desviar minha atenção para longe. Freya estava de
olhos fechados e parecia tão concentrada em dar prazer a si mesma que
esqueceu completamente do ambiente ao seu redor. Meu pau já estava duro
dentro da calça e a cada segundo que passava ficava mais difícil controlar a
vontade que eu sentia de ir até lá e ajudá-la a alcançar seu orgasmo.
Forcei-me a fechar os olhos e a lutar contra a tentação. Lutei o
máximo que pude até que ouvi o meu nome sair de sua boca.
— Bear... — Freya gemeu, em um tom necessitado.
Abri os olhos rapidamente. Eu estava certo de que fui pego
espionando, mas quando a minha visão se fixou na mulher, percebi que ela
ainda estava alheia ao que acontecia à sua volta. Freya gemeu o meu nome
porque me queria e não porque me viu. Porra.
— Bear! — ela ofegou.
Cerrei os punhos quando senti meu pau doer com necessidade. Não
dá! Caralho, esse é a gota d’água.
Quando percebi, eu estava atravessando o quarto em passos largos,
abandonando completamente a razão. Meu coração estava prestes a saltar
do peito quando me ajoelhei na beira da cama e segurei a mão de Freya,
puxando-a para fora da calça.
— Me deixe te ajudar com isso — pedi, com a voz rouca de
excitação.
A mulher abriu os olhos e se assustou com a minha presença.
Não dei tempo para ela entrar em pânico, enfiei a mão dentro da calça
que Freya usava e tateei ao longo da sua virilha até encontrar a fenda
molhada no meio das suas pernas.
Quando meus dedos tocaram sua pele macia, Freya gemeu e se
agarrou ao meu braço. Sorri lascivamente ao ver a expressão de deleite em
seu rosto e comecei a deslizar o dedo por suas dobras, para frente e para
trás, explorando cada centímetro daquela boceta quente e molhada.
Eu estava satisfeito ao ver as reações de prazer no rosto de Freya.
Cada gemido, cada olhar me implorando, silenciosamente, para que eu não
encerrasse as carícias, me deixava sedento por mais. Eu já não queria
apenas acariciá-la, queria vê-la, queria enterrar a minha boca em sua
umidade e me banquetear com o seu gosto.
Acabei me deixando levar pelas emoções e puxei sua calça para
baixo, junto com a calcinha que ela usava. Quando Freya ficou nua da
cintura para baixo, abri as suas pernas o máximo que eu pude para deixar
sua boceta bem exposta.
Fiquei um tempo admirando cada parte dela. O seu clitóris inchado
implorava por atenção e a entrada da sua vagina estava tão molhada que a
umidade já escorria para o lençol da cama. Eu podia transar com Freya
agora, ela estava mais do que pronta para isso, mas no momento o que eu
mais desejava era sentir o seu gosto, o seu cheiro...
Em um movimento rápido, enterrei a cabeça no meio das pernas dela
e lambi sua boceta lentamente, saboreando o seu gosto, inspirando o seu
cheiro... aquilo me excitou pra caralho. Apertei as mãos na beira do
colchão e um rosnado profundo ecoou pela minha garganta. Freya gemeu e
suas mãos agarraram os meus cabelos.
Sorri contra a sua pele molhada e comecei a lamber a protuberância
inchada que indicava exatamente onde o seu clitóris estava. O gosto de
Freya era maravilhoso, melhor do que eu imaginei. Se eu pudesse, passaria
o resto do dia com o rosto enterrado naquela boceta fazendo a minha
pequena deusa gemer e se contorcer de prazer contra a minha boca.
Não conseguia acreditar que eu estava fazendo isso — até parecia um
sonho. E mesmo se eu estivesse sonhando, eu pretendia aproveitar cada
segundo desse momento.
Passei a língua diversas vezes sobre o clitóris, brincando com ele, o
provocando. Os gemidos de Freya ficaram mais intensos à medida que o
tempo passava e quando percebi que ela estava perto de gozar, eu me afastei
para excitá-la de outra forma.
— Bear! — Freya choramingou, decepcionada. — Por que parou?
Ergui minha cabeça e a encarei com malícia.
— Porque quero olhar em seus olhos quando você gozar.
Enfiei meu dedo indicador na sua abertura, sem interromper o nosso
contato visual. Freya se contraiu e gemeu de um jeito necessitado. Meu pau
doeu novamente quando imaginei ela se apertando daquele jeito ao redor
dele. Porra, eu juro que ainda vou experimentar essa sensação.
Comecei a deslizar meu dedo, fazendo ele entrar e sair do seu corpo
com rapidez. Freya só sabia gemer e agarrar o lençol da cama como se a sua
vida dependesse disso.
— Era isso que você queria, não era? — rosnei, enquanto o meu dedo
a penetrava com mais intensidade. — Estava gemendo o meu nome
enquanto se masturbava, desejando que eu viesse até você... Estou aqui
agora e quero que continue gemendo, chamando por mim.
— Bear — Freya gemeu, atendendo prontamente ao meu pedido. —
Bear!
Sorri para ela e enfiei um segundo dedo em sua abertura. Freya estava
tão molhada e perfeita... eu estava me segurando para não tirar a calça e
enterrar o meu pau no seu corpo.
Quando me imaginei fodendo aquela mulher eu aumentei a
intensidade com que movia os meus dedos. Freya arqueou o seu quadril e
começou a rebolar contra a minha mão, tentando acompanhar o ritmo. Ela
gemia o meu nome, se contorcia na cama e implorava para eu não parar.
Eu estava completamente hipnotizado pelas suas feições de prazer,
não conseguia desviar o meu olhar para longe dela. Continuei o estímulo
em sua boceta até que o corpo de Freya ficou tenso. Seus olhos tremeram,
mas ela os manteve abertos e permaneceu com a atenção fixa em mim. Seus
músculos se apertaram ao redor dos meus dedos e ela gemeu languidamente
enquanto o seu corpo era atingido por pequenos espasmos.
— Bear! — ela gemeu com necessidade.
Um sorriso satisfeito curvou os meus lábios e eu observei atentamente
enquanto ela era consumida pelo orgasmo. Freya gemeu o meu nome uma e
outra vez até que a onda de prazer cessou e ela permitiu que o seu corpo
relaxasse. Seus olhos se fecharam e ela suspirou com satisfação.
Retirei meus dedos do seu corpo e antes de me afastar, inclinei meu
rosto para baixo e comecei a lamber a nova umidade que encheu a sua
boceta depois do orgasmo. Freya gemeu baixinho quando deslizei a língua
em sua pele sensível e suas mãos trêmulas afagaram a minha cabeça. Eu
não podia ver o seu rosto, mas tinha certeza que ela estava sorrindo.
— Você é deliciosa, Freya — murmurei, contra a sua pele. —
Deliciosa...
Não fui capaz de resistir e a lambi mais, enfiando a língua em sua
entrada para beber cada gota da sua excitação. Eu estava há tanto tempo
sem uma mulher que mal lembrava do gosto de uma boceta. O sabor de
Freya era perfeito, me excitava ainda mais e eu estava me segurando para
não ultrapassar outro limite e meter bem fundo nela.
Quando terminei de lamber toda a sua umidade, me forcei a ficar de
pé. Freya sentou-se na cama e ficamos nos encarando em silêncio. Eu não
sabia o que dizer e, com certeza, ela também estava do mesmo jeito que eu.
Afinal, o que se pode dizer em uma situação como essa?
Enquanto eu me perdia em pensamentos tentando encontrar algum
assunto para quebrar o silêncio que se instalou no quarto, senti mãos
delicadas se fecharem ao redor do meu pau endurecido. Apesar do tecido da
calça estar entre nós, eu pude sentir a delicadeza do toque de Freya.
Arqueei uma sobrancelha e olhei para baixo, onde a mulher me
tocava. Antes que eu pudesse dizer ou fazer qualquer coisa, Freya
movimentou suas mãos para cima e para baixo algumas vezes. Meu corpo
inteiro ficou tenso e eu gemi com necessidade. Porra. Senti a pressão do
sêmen subindo pelo pau e segundos depois, o interior da minha calça ficou
molhado com a minha libertação.
Ofeguei e segurei as mãos de Freya, levando-as para longe do meu
corpo. Eu não conseguia acreditar. Seu toque não durou mais que cinco
segundos e ela nem se deu ao trabalho de tirar o meu pau da calça, mas
aquilo foi o suficiente para me fazer gozar.
Senti-me envergonhado com aquele acontecimento, eu não queria que
Freya pensasse que eu não conseguia me manter por muito tempo. É a
primeira vez que isso acontece.
— O que foi, Bear? — indagou, preocupada com a minha reação. —
Eu quero te tocar também...
— Não precisa — tentei inventar uma desculpa. — Não quero que
pense que eu fiz isso apenas porque queria que você retribuísse.
— Mas...
— Eu estou bem.
Freya me encarou em silêncio. Seus olhos carregavam um brilho de
dúvida e preocupação.
— Tem certeza? — ela insistiu.
— Tenho — a voz saiu mais séria do que eu pretendia.
Minha resposta deixou Freya insegura e ela cobriu as suas partes
íntimas com o edredom que usamos na noite passada.
Eu queria me chutar pela minha atitude. Devia ter contado a verdade
para ela, mas simplesmente não consegui. Maldito orgulho masculino. Foi
mais fácil fazê-la me achar arrogante do que admitir que não consegui me
controlar.
— Vou tomar banho e... fazer o café da manhã — falei, com uma
extrema dificuldade.
Eu não queria sair do quarto. O gosto de Freya ainda estava em minha
boca e alguns vestígios da sua umidade restavam em minha barba. Eu só
pensava em enterrar o rosto entre as suas pernas e lamber suas dobras até
que ela gozasse outra vez. Queria continuar ali com Freya e lhe oferecer
todo o carinho e prazer que eu pudesse dar, mas a insegurança que eu sentia
falou mais alto que o meu coração.
Apesar da relutância, dei meia volta e saí do cômodo enquanto
tentava resolver aquele conflito interno.
CAPÍTULO 18

Depois do café da manhã, Bear cumpriu a promessa que havia feito


no dia anterior e me ajudou a andar com as muletas. Durante o meu
treinamento no interior da cabana, perdi o equilíbrio diversas vezes, mas ele
nunca me deixou cair no chão. Bear foi cuidadoso e paciente e eu conheci
um lado dele que jamais pensei que poderia existir.
Quando finalmente consegui me equilibrar nas muletas e caminhar
sozinha dentro de casa, convenci Bear a me levar para o lado de fora. Eu
queria sentir um pouco de ar fresco já que estava há dias limitada ao espaço
daquele sofá de couro.
Depois do almoço, saímos da cabana e Hati também nos seguiu. Eu
me sentia feliz por conseguir caminhar por conta própria — apesar de Bear
sempre manter a mão nas minhas costas para me pegar caso eu perdesse o
equilíbrio nos apoios de madeira. Ele estava sendo fofo e prestativo comigo,
porém, eu sentia o meu rosto queimar toda vez que me lembrava do que
aconteceu entre nós naquela manhã.
Parecia um sonho distante que Bear fosse me flagrar enquanto eu me
masturbava e resolvesse terminar o serviço por mim. Eu fiquei tão
emocionada com o acontecimento que sequer me deixei abalar quando ele
fugiu no instante em que comecei a lhe dar prazer. Acho que, no fundo, eu
já estou me acostumando as suas alterações de humor.
Embora eu conseguisse caminhar sozinha com as muletas, Bear achou
melhor que eu ficasse apenas na varanda da casa ao invés de me aventurar
pelo terreno íngreme da montanha. A neve que caiu na noite anterior ainda
era visível em alguns pontos da grama verde e isso provavelmente deixou o
chão escorregadio.
Não protestei quando Bear segurou o meu braço e me ajudou a sentar
no cobertor de pele que estava esticado sobre o piso de madeira da varanda.
Hati se acomodou ao meu lado e eu acariciei a cabeça dele enquanto
observava Bear se afastar. Ele pegou um machado que estava escorado na
parede e saiu da varanda, parando em frente a um tronco de árvore cortado,
a alguns metros de onde eu estava.
Havia uma pilha de lenha ali perto, Bear foi até ela, pegou um pedaço
de madeira roliça e o colocou sobre o tronco da árvore. Ele ergueu seu
machado no ar e quando o abaixou, a lenha foi cortada ao meio. Fiquei
impressionada com a facilidade que ele fez aquilo — tenho certeza que eu
mal teria força para erguer aquele machado acima da minha cabeça.
Eu sabia que Bear levaria algumas horas para terminar de cortar
aquela lenha, então desviei meu olhar para a paisagem que se estendia à
minha frente e passei um tempo admirando o horizonte. O céu estava
nublado e a grama verde em frente à cabana se encontrava salpicada de
branco com a neve que caiu ontem à noite.
A floresta de pinheiros altos que ficava ao pé da montanha impedia
que as construções de Havengreen fossem vistas daqui de cima — apenas o
topo da torre da igreja era visível. Isso explicava porquê eu não via a cabana
de Bear quando observava a montanha lá da praça, as folhas das árvores a
escondiam.
— É muito bonito aqui em cima — divaguei em voz alta, minha mão
ainda repousava na cabeça de Hati. — Agora entendo porque você não se
importa de morar nessa montanha, uma vista dessas compensa a solidão...
eu acho.
Voltei minha atenção para Bear e notei que ao seu lado já havia uma
grande quantidade de lenha cortada. Ele fez uma pausa e enxugou com a
mão as gotas de suor que escorriam pela sua testa. Como esse homem
consegue suar com o frio que está fazendo aqui na montanha? Quando eu
respiro até sai fumaça da minha boca...
Bear não respondeu o que eu disse, apenas deu um sorrisinho e
continuou com o trabalho, colocando pedaços de madeira no tronco,
erguendo o machado e os cortando ao meio. Em certo ponto, ele parou o
que estava fazendo e apoiou seu machado no chão. Com as mãos, puxou a
blusa para cima até ela sair do seu corpo e deixar o seu tórax musculoso e
suado à mostra. Não consegui me conter e arquejei com a visão do paraíso.
Ele realmente não se importa com o clima frio?
Minha reação atraiu a atenção de Bear e ele me encarou no exato
momento em que eu admirava os seus músculos. Fiquei envergonhada, mas
relaxei quando vi que o homem pareceu se divertir com o fato de que eu o
comia com os olhos. Ele me direcionou um sorriso torto e então voltou ao
trabalho.
Quando Bear ergueu o machado no ar, os músculos do seu braço se
tensionaram e assim que ele bateu com a lâmina na madeira, seus músculos
tremeram com o impacto do movimento. Acabei me esquecendo do
horizonte montanhoso de Havengreen e me concentrei unicamente na visão
privilegiada que eu tinha do viking da era moderna que estava cortando
lenha na minha frente.
Eu estava inquieta para conversar sobre o ocorrido daquela manhã.
Queria perguntar ao Bear o que aquele momento significou entre nós, se
iríamos mais a diante ou se o que aconteceu foi apenas um deslize que não
iria se repetir, mas não tive coragem. Eu simplesmente não conseguia
pensar em uma forma de abordar o assunto.
— Freya? — Bear chamou, me pegando de surpresa.
Despertei dos meus pensamentos e voltei meu olhar para o seu rosto.
Ele havia parado de cortar madeira e agora me encarava fixamente.
— Sim?
— Por favor, seja sincera... O que eu fiz nessa manhã te incomodou?
— Bear ergueu uma sobrancelha, indicando sugestivamente do que estava
falando.
Engoli em seco. Honestamente, eu não pensei que ele teria a iniciativa
de tocar nesse assunto, mas já que aconteceu decidi que o melhor a se fazer
seria abrir o meu coração para que não houvesse segredos entre nós.
— N-na verdade, Bear, eu adorei o que você fez — admiti,
envergonhada. — Honestamente, eu queria ir mais adiante, mas você saiu
correndo quando eu te toquei. Não gostou do que eu fiz?
Bear me direcionou um sorriso sem graça, como se não soubesse o
que responder. Merda... ele não gostou! Há muito tempo eu não tocava em
um homem, talvez tenha me esquecido como se fazia essas coisas.
— Você não gostou — concluí por conta própria, minha voz saiu mais
aflita do que eu pretendia.
Ao ver o meu desespero, Bear largou o machado no chão e veio até
mim em passos largos, ajoelhando-se à minha frente no cobertor de pele.
— Freya, não pense assim. O seu toque foi... porra, foi perfeito.
— Se foi tão perfeito, por que não me deixou continuar?
— Porque... — Ele suspirou e passou a mão pelo cabelo. — Aquele
único toque foi o suficiente para me fazer gozar.
— Não pode estar falando sério. — Arregalei os olhos.
Apesar da barba espessa em seu rosto, pude ver seu maxilar se
tensionando. Bear estava visivelmente relutante em prosseguir com o
assunto, até parecia envergonhado.
— Foi muito rápido, eu sei. Não pense que sou sempre assim, é que...
porra, Freya, eu estava há cinco anos sem sentir o toque de uma mulher —
confessou em voz baixa.
Não fiquei surpresa com a revelação de Bear — na verdade, eu já
imaginava que ele levava uma vida solitária aqui em cima. Afinal de contas,
que mulher faria o sacrifício de subir essa montanha íngreme para ir até a
cabana dele? Ok... talvez eu seja essa pessoa, mas em minha defesa eu só
queria ir até a cachoeira. De qualquer forma, Bear e eu estávamos no
mesmo barco: éramos dois solteiros solitários por opção.
Mesmo que fosse uma informação pessoal ao meu respeito, decidi
que iria compartilhá-la para que ele não se sentisse tão sozinho.
— Sabe... eu também estou sem companhia há algum tempo. —
Encolhi os ombros, envergonhada.
Bear arqueou uma sobrancelha e eu vi um misto de surpresa e
felicidade cruzar o seu olhar.
— De quanto tempo está falando? — ele indagou enquanto se sentava
de frente para mim no cobertor.
— Três anos. — Direcionei-lhe um sorriso amarelo.
— Uma mulher bonita como você está sozinha há três anos? — Bear
ficou incrédulo. — Não acredito que nenhum homem chegou até você nesse
tempo todo... deve existir algum motivo.
Hesitei por alguns segundos, antes de dizer a verdade.
— Sou exigente demais — admiti. — Eu não me interesso por
qualquer um.
Bear deixou uma risada escapar.
— Mas parece que acabou se interessando por um lenhador solitário
que mora na montanha — brincou.
— O que posso dizer? Você se parece com o... — Contive-me. Não
sei se eu teria coragem de admitir que esse Bear se parecia com o Bear de
Desire&Seduction.
— Eu pareço com quem? Com algum ex-namorado seu? — Ele ficou
descontente com aquele pensamento.
— Não! — Neguei com a cabeça. Acho melhor contar a verdade. —
Você se parece com... o mocinho do meu livro preferido.
— Aquele livro que tem um lenhador fortão na capa? — Ele riu.
Arregalei os olhos. Bear conseguiu reparar na capa do livro? Eu
sempre tomei cuidado de escondê-lo.
— Então gosta de mim só porque eu pareço com o lenhador fortão da
história?
— Não é isso — tentei me retratar. — Bom... no começo foi sim
porque você se parecia com o personagem do livro, que a propósito também
se chama Bear — ele arregalou os olhos, surpreso —, mas à medida que os
dias foram passando e você começou a me tratar com gentileza, eu percebi
que você também tinha um lado humano. Então, eu comecei a me sentir
atraída pelo homem que você é de verdade.
Ufa! Não acredito que botei para fora tudo o que estava entalado em
minha garganta.
Bear ficou nitidamente surpreso com a minha confissão, entretanto,
ele não disse mais nada. Apenas sorriu para mim e colocou uma mecha do
meu cabelo atrás da orelha, roçando as pontas dos dedos em minha
bochecha. Ele se levantou e caminhou até o local em que deixou o
machado. Após pegar a ferramenta do chão, Bear voltou para perto da pilha
de lenha e eu percebi que ele iria prosseguir com o trabalho.
Fiquei deprimida por fazer aquela declaração e não receber nada em
troca. Bear também sentia algo por mim, caso contrário ele não teria feito o
que fez naquela manhã, mas por que caralhos ele não me falou nada? Que
merda!
Respirei fundo e tentei me acalmar. Eu precisava lembrar que Bear
era um homem que passou anos isolado na montanha e que ele parecia ser
do tipo que se abria aos poucos. Talvez eu só precisasse ser paciente com
ele. No tempo certo, Bear vai abrir o seu coração para mim... eu espero.

A luz do dia já estava indo embora, mas Bear ainda não tinha acabado
de cortar aquela maldita pilha de lenha. Eu me sentia entediada por passar
as últimas três horas sentada naquele cobertor sem ter nada para fazer.
Nunca senti tanta falta do meu celular e estava arrependida por não lembrar
de pedir que Bear trouxesse o meu carregador quando ele desceu até a vila
ontem.
Hati dormia tranquilamente ao meu lado e eu não quis acordá-lo,
então me distraí observando o ambiente ao meu redor. Notei que no lado
direito da varanda havia uma mesa com ferramentas e lixas que pareciam
ser específicas para trabalhos com madeira. Bear me disse que não é apenas
um lenhador, que ele também faz esculturas de madeira. Deve ser ali que
ele cria as peças.
No canto da parede, ao lado da porta, a uma curta distância de onde
eu estava, havia uma pequena escultura inacabada de um corvo — ele foi
esculpido do peito para cima, mas seus pés e cauda estavam incompletos.
Estiquei o meu braço e peguei a peça para vê-la mais de perto. A escultura
de madeira parecia ter sido deixada ali há tanto tempo que já estava ficando
empoeirada.
Passei o dedo sobre o peito da ave para tirar o pó que se acumulou
sobre a madeira. Embora a peça estivesse suja, eu pude perceber que as
partes esculpidas eram perfeitamente detalhadas — ele se preocupou até
mesmo em fazer as penas do animal. Nunca trabalhei com madeira, mas
imagino que deva ser extremamente difícil.
— Você tem talento — falei, enquanto olhava na direção de Bear.
Ele colocou o último pedaço de lenha sobre o tronco da árvore,
ergueu o machado no ar e então o abaixou, cortando a madeira ao meio. Sua
atenção se voltou para mim e depois para a escultura do corvo que eu
segurava na mão direita.
— Você acha? — indagou, enquanto limpava o suor da testa.
— Sim, ficou perfeito. As muletas que fez para mim também ficaram
perfeitas.
Bear sorriu e caminhou na minha direção. O machado ainda estava
em suas mãos e conforme ele andava seus músculos suados se tensionavam,
me causando um calor excitante que surgia no peito e se espalhava até o
meio das minhas pernas.
— Que bom que você gostou. — Bear me encarou com um olhar
doce e sincero. — Eu não faço mais esculturas então faz muito tempo que
ninguém elogia os meus trabalhos. Estou vivendo apenas da lenha que corto
e entrego para os moradores da vila uma vez por mês.
— Você desce a montanha apenas uma vez no mês? — fiquei
surpresa. — Como faz para comer? E se os mantimentos acabarem antes da
hora?
— Eu sempre compro tudo sobrando para não faltar. Não vou até a
vila com frequência, eu não consigo andar por lá desde que... — ele se
conteve, e suspirou. — É complicado, Freya.
Estiquei a mão que não segurava a escultura e acariciei o seu braço,
em uma tentativa de confortá-lo. Eu não sabia o que estava assombrando os
seus pensamentos, mas desejei que ele se sentisse melhor.
— Está tudo bem, não precisa falar sobre isso se você não quiser.
— Eu quero falar — seus músculos ficaram tensos —, mas ainda não
consigo me lembrar do acontecido sem sentir raiva ou dor.
— Não tem problema... fale quando se sentir melhor.
Bear sorriu, agradecido, e se abaixou ao meu lado. Seu movimento
fez Hati despertar do sono e sair do cobertor de pele, indo perambular pelo
gramado que havia na frente da cabana.
Fui pega de surpresa quando Bear puxou o meu rosto para perto e
plantou um beijo delicado em minha testa. Sua barba roçando em minha
pele me fez sorrir.
— Me desculpe por ter sido tão arrogante quando te conheci. — Ele
me olhou nos olhos. — Eu achei que seria melhor daquele jeito. Quando vi
você na cachoeira, o meu coração bateu mais forte e eu tive medo...
— Medo de quê? — Deixei uma risada escapar. Como um homem
desse tamanho pode ter medo de mim? Sou quase quarenta centímetros
mais baixa que ele.
— Eu tive medo de me apaixonar — confessou, com um meio
sorriso.
Mantive-me em silêncio, surpresa com a revelação. Nunca imaginei
que a arrogância de Bear, quando me conheceu, fosse apenas uma armadura
que ele construiu ao redor do seu coração porque estava com medo de se
apaixonar por mim. Caramba.
— No fim das contas, parece que não adiantou muito bancar o durão.
Quanto mais eu lutava contra esses sentimentos, mais eles vinham à tona...
Eu me apaixonei por você, Freya.
Um sorriso curvou a minha boca. Por um momento pensei que eu
estivesse alucinando, mas quando notei o jeito doce que Bear me olhava eu
percebi que as suas palavras eram reais. Ele realmente confessou que está
apaixonado por mim.
Fiquei tentada a beijá-lo. Aproximei o meu rosto do seu e ele também
fez o mesmo, meu coração começou a bater mais forte e a minha respiração
ficou acelerada. Nossos lábios estavam quase se tocando quando Hati
começou a latir.
Bear virou seu rosto na direção do cachorro e eu acabei beijando a sua
bochecha. Ele riu, mas depois ficou sério e observou com atenção a
paisagem que estava à nossa frente.
— É melhor entrarmos, Freya — aconselhou, sem desviar seus olhos
do cachorro que ainda latia na frente da cabana.
— Por quê? — indaguei, confusa.
Eu quase senti raiva de Hati por seus latidos terem atrapalhado o meu
momento com Bear.
— Hati não late para o nada. — Ele se colocou de pé, mantendo uma
postura rígida. — Provavelmente, está sentindo o cheiro de algum animal.
— Que tipo de animal?
— Não sei, talvez um urso. — Bear segurou em meus braços e me
puxou para cima. Quando fiquei de pé apoiada na perna esquerda, ele me
pegou no colo, aconchegando o meu corpo em seu peito suado.
— Já tem um urso bem aqui. — Eu ri e dei alguns tapinhas no
músculo do seu tórax, que tremeu com o meu toque.
Bear achou graça da piada, mas só por alguns segundos.
— Estamos em uma montanha, Freya. Existem ursos de verdade
aqui... e lobos — explicou, com a voz tensa.
Engoli em seco e olhei para Hati, que latia e encarava a parte de trás
do terreno. Céus... será que realmente tem um predador ali?
— Bear... o que faremos? — sussurrei, amedrontada.
— Nós entramos.
Bear caminhou em direção à porta e chamou Hati com um assovio. O
cachorro hesitou, mas no segundo chamado correu em nossa direção e
entrou na cabana.
Bear fechou a porta com o pé — já que suas mãos estavam ocupadas
me carregando. Ele me colocou no sofá e, em seguida, voltou para girar a
chave na fechadura e garantir que a porta estivesse bem trancada. Minhas
muletas foram deixadas do lado de fora, mas eu não me importaria de ter
esse homem me carregando por mais um tempo, então decidi não tocar no
assunto.
Só espero que esses animais selvagens da montanha não saibam abrir
portas. Enquanto eu estiver aqui dentro, na companhia de Bear, sei que
estarei segura.
CAPÍTULO 19

Bear se ajoelhou em frente ao sofá e tocou o meu tornozelo


enfaixado. Eu já não sentia dor quando encostava nele de forma delicada,
no entanto, a pele da região ainda estava em um tom roxo avermelhado e eu
não podia firmar aquele pé no chão sem sentir pontadas quase
insuportáveis.
— Eu vou dar uma olhada no seu tornozelo, está bem?
Assenti em concordância e Bear começou a retirar a tala que
imobilizava o meu pé direito.
— Não está mais inchado — comentou, assim que a pele lesionada
ficou exposta. — Acho que na próxima semana já conseguirá andar, e
quando não estiver mais sentindo dor poderá ir para casa.
Senti um peso no peito quando ele falou aquilo. Pensar em sair
daquela cabana e deixar Bear e Hati para trás me causou uma angústia que
fez os meus olhos lacrimejarem. Fiquei triste por saber que eu teria que
partir em breve.
— Eu já volto. — Bear se colocou de pé e eu voltei à realidade.
Ele caminhou em direção ao corredor e entrou no seu quarto. Pouco
tempo depois, retornou com um pequeno frasco de vidro nas mãos que
estava fechado por uma rolha de madeira.
Ajoelhando-se na frente do sofá outra vez, Bear destampou o frasco e
um cheiro agradável de lavanda preencheu o ambiente. Agora que ele
estava perto de mim, percebi que dentro do vidro havia uma espécie de óleo
perfumado. Arqueei as sobrancelhas.
— Você não parece ser do tipo que usa óleo corporal. Como tem isso
em casa? — questionei com diversão.
Bear reprimiu uma risada.
— Esse óleo ajuda a diminuir as dores nas articulações — explicou.
— Eu uso quando faz muito frio. Às vezes o clima da montanha me deixa
um pouco travado.
Eu ri, apesar do calor que senti quando imaginei Bear massageando o
seu corpo com aquele óleo perfumado.
— Agora que o seu tornozelo está doendo menos, posso te fazer uma
massagem? Vai ajudar o sangue a circular melhor pela região.
Eu apenas concordei em silêncio, confesso que estava ansiosa para
receber uma massagem daquele homem.
Ele despejou um pouco do óleo em suas mãos e aplicou sobre o meu
tornozelo de forma delicada para não me causar dor. Suspirei e não resisti à
tentação de encarar seus músculos que estavam à mostra. Era uma visão
completamente erótica: Bear ajoelhado na minha frente, descalço e sem
camisa, vestindo apenas uma calça jeans surrada, seus fios de cabelos
dourados descansando sobre os ombros largos e fortes, os músculos
tensionados enquanto ele massageava o meu tornozelo, o cheiro suave de
lavanda que perfumava o ar...
Abanei o meu pescoço com uma das mãos. Eu me sentia quente —
muito quente. Minha intimidade começou a pulsar com excitação e eu pude
sentir a umidade se formando em minha calcinha. Eu só conseguia pensar
em como o Bear real estava parecido com o Bear de Desire&Seduction
nesse momento. Caramba, que calor!
Meu sonho se tornou realidade. Eu finalmente encontrei um homem
por quem eu me atraía — não só de maneira física, mas também de forma
sentimental. Como qualquer outra pessoa, Bear tinha seus momentos ruins,
mas eles estavam se tornando menos frequentes agora que nós dois
estávamos nos entendendo.
As mãos de Bear eram grandes, mas o seu toque era cuidadoso e
suave. Ele pressionava levemente a região do meu tornozelo e depois
levava a mão até o meu pé, o massageando em movimentos circulares.
Fiquei chocada que aquela massagem na área torcida não me causou
nenhum desconforto, mas sim calor. Muito calor.
Bear massageava o meu pé enquanto me encarava com um pequeno
sorriso nos lábios. Deixei minha mente divagar e imaginei ele me puxando
para um beijo ardente enquanto suas mãos grandes exploravam o meu corpo
com ousadia. Suspirei e abanei o meu pescoço outra vez.
Estranhamente, eu não me sentia envergonhada com o que aconteceu
entre nós essa manhã. Tudo que eu conseguia sentir era uma excitação
crescente cada vez que eu lembrava da sensação de sua boca me chupando,
da língua me lambendo e até da barba roçando no interior da minha coxa.
Fiquei me perguntando se faríamos alguma coisa novamente ou se
aquilo aconteceu por causa de um breve momento de luxúria. Bear estava
há 5 anos sem ninguém, foi normal que ele tenha se sentido tentado quando
entrou no quarto e viu que eu estava me masturbando na sua cama. Mas eu
preciso ser sincera comigo mesma, adoraria sentir o toque dele outra vez,
sentir o seu beijo, a sua boca...
— Acabei — Bear anunciou, ao se colocar de pé.
Ele tirou o excesso de óleo das mãos, esfregando-as em seus braços
musculosos — aquilo o deixou com uma aparência ainda mais tentadora.
Não dá! Eu preciso ter mais desse homem. Preciso saber como é a pegada
dele, como é o pau dele... eu quero mais, eu preciso de mais!
Fui tirada dos meus pensamentos quando Bear pegou o livro
Desire&Seduction que eu havia deixado sobre a mesinha ao lado do sofá.
Porra!
— Então é daqui que vem a sua queda por lenhadores? — Ele
analisou a capa e um sorriso divertido curvou a sua boca.
— Bear... me devolve o livro. — Estiquei as mãos para pegar, mas o
homem foi rápido e se afastou alguns passos. — Por favor!
Eu me sentiria envergonhada se ele descobrisse o tipo de conteúdo
que havia na história.
Bear apenas encarou o livro em silêncio e, em seguida, colocou a
capa ao lado do seu rosto, como se quisesse fazer algum tipo de
comparação.
— Que curioso... Então esse é o sujeito que se parece comigo?
— N-não... — menti, mas não fui muito convincente.
— Eu percebi que você sempre esconde esse livro quando eu chego.
— Ele analisou a capa de trás. — Me pergunto o porquê.
Eu não sabia o que responder, então fiquei em silêncio e franzi o
cenho.
Bear abriu o livro em uma página aleatória, arqueou as sobrancelhas
com surpresa e começou a ler:
— “...Ele pressionou o meu corpo contra a árvore da floresta. Minha
respiração estava acelerada e escorria suor da minha pele, apesar do clima
frio. Bear rasgou a minha calcinha com as mãos e...” — Ele arregalou os
olhos. — Bear... que porra de coincidência, não?
Fiz uma careta. Meu rosto queimava com vergonha. Tanta página
para ele ler e tinha que ser justamente o trecho em que eles fazem sexo na
floresta?
— Bear... me dá o livro! — Estendi os braços na sua direção.
Nunca odiei tanto não poder andar para ir até lá e arrancar o livro das
suas mãos — nem mesmo quando precisei ser carregada até o banheiro pela
primeira vez senti tanta indignação.
Ele me ignorou e seguiu com a leitura:
— “...Bear segurou em minhas coxas e me ergueu no ar. Entrelacei
as pernas na cintura dele e me apoiei em seu pescoço. Ele encaixou o pau
na entrada da minha boceta...” — O homem fechou o livro e começou a
gargalhar. Foi estranho ver Bear rir daquele jeito. Estranho e um pouco
assustador.
Isso não está acontecendo... espero que seja apenas uma alucinação!
— Caralho, Freya, eu não sabia que você gostava de ler sobre esse
tipo de coisa — gargalhou outra vez.
— Me devolve o livro, Bear! Que merda! — gritei, minha voz
oscilava com indignação e vergonha.
Depois de mais um tempo rindo, Bear finalmente se recuperou e
retomou o fôlego. Ele me entregou o livro com um sorriso irônico no rosto.
— Me responda apenas uma coisa: você disse que me achou parecido
com o personagem desse livro... quando estava lendo essas cenas de sexo,
me imaginou no lugar dele?
— E-eu... ah... — minhas palavras sumiram. Eu simplesmente não
sabia o que dizer.
— Me responda, Freya. — Bear se aproximou de mim. Ele parou a
poucos centímetros do sofá, deixando o seu abdômen perfeito em meu
campo de visão. — Ficou me imaginando fazendo esse tipo de coisa? Se
imaginou no lugar da mocinha da história? — Bear estendeu sua mão e
ergueu o meu queixo, para que eu o olhasse nos olhos. — Me imaginou
transando com você?
Abri a boca para responder, mas nada saiu.
— Bom... quem cala, consente. — Ele soltou o meu queixo e se
afastou com um sorriso convencido nos lábios.
Pensei que Bear sairia da sala, mas ele apenas se recostou na parede e
manteve o corpo virado na minha direção.
— Não fique envergonhada. — Ele cruzou os braços diante do peito.
— Só achei engraçado saber que você gosta de livros desse gênero.
— Vai dizer que nunca leu uma cena de sexo na vida? — minha voz
voltou, apenas para confrontá-lo.
— Honestamente, eu prefiro livros sobre civilizações antigas e
fantasia. — Deu de ombros. — Mas digo uma coisa, Freya, posso até
parecer com o lenhador desse livro e ter o mesmo nome que ele, mas
garanto que a minha pegada é mais forte.
Arregalei os olhos e senti a minha boceta doer. Fiquei louca com a
informação que recebi e agora queria saber se ela era verdadeira ou se Bear
só estava se gabando para não sair por baixo.
Eu tenho que ir para a cama com ele! Eu desejava sentir o corpo de
Bear mais do que tudo nesse mundo, mas não tinha coragem de dizer aquilo
em voz alta. Nunca convidei um homem para transar. Normalmente, eu
ficava apenas flertando até as coisas esquentarem, mas fazia muito tempo
que eu não paquerava e já estava ficando enferrujada nessa questão.
Eu estava insegura em tentar flertar com Bear, mas essa era a única
técnica que eu conhecia então decidi que iria usá-la. Vou provocá-lo até que
ele não resista e pule em cima de mim. O homem está há cinco anos sem
ninguém será fácil fisgá-lo.
— Bear, — falei com a voz suave, já colocando o meu plano em ação
— eu quero tomar banho agora, poderia me ajudar?
— Claro — aceitou sem pensar.
Reprimi um sorriso com a sua resposta. O ursinho não faz ideia, mas
acabou de cair na minha armadilha. Agora não tem mais volta!
CAPÍTULO 20

Eu me equilibrava em um pé só, apoiada na pia de porcelana,


enquanto Bear colocava os sais de banho na banheira que já estava cheia.
Um cheiro suave de erva-doce pairava no ar e os vapores da água quente
deixaram o espelho do banheiro embaçado.
Quando Bear voltou para perto de mim, ousei entrelaçar meus braços
em seu pescoço com a desculpa de que não queria perder o equilíbrio. Ele
ficou surpreso com a minha aproximação repentina.
— Freya, eu preciso sair para te dar privacidade. — Bear tentou se
desvencilhar dos meus braços, mas no fim desistiu e colocou suas mãos ao
redor da minha cintura.
Então... como eu explico para ele que hoje quero tomar banho
acompanhada? Criei coragem e ergui o rosto até nossos olhares se
encontrarem.
— Bear... eu quero que fique aqui comigo — pedi, sem desviar meus
olhos dos seus. — Ontem eu quase caí quando fui entrar na banheira.
Ele engoliu em seco e uma sombra de dúvida cruzou o seu olhar.
O que eu disse não foi mentira, eu realmente escorreguei quando
entrei banheira no dia anterior. Era uma coisa que eu pretendia manter em
segredo, mas decidi contar isso ao Bear porque queria que ele se
preocupasse a ponto de permanecer no banheiro comigo.
— Poderia ficar aqui e ao menos me ajudar a entrar na água? —
insisti.
Bear respirou fundo e concordou com a cabeça.
— Tudo bem — reforçou a resposta. — Você... você sabe que terá
que tirar a roupa para entrar na água, não sabe? Está bem com isso?
Hesitei por alguns instantes, mas assenti.
— Eu não me importo com esse pequeno detalhe, Bear, mas e você?
— Um frio pairou sobre a boca do meu estômago quando eu fiz aquela
pergunta.
Bear não me respondeu, mas também não se afastou. Então concluí
que ele estava de acordo com a situação.
Uma leve insegurança passou pela minha cabeça e eu comecei a me
questionar se realmente devia fazer aquilo. Sim, eu devo! Eu quero esse
homem e não posso desistir agora.
Bear já me viu nua da cintura para baixo hoje de manhã, então não
havia motivo para eu sentir vergonha de lhe mostrar o restante do meu
corpo. Reuni toda a coragem que consegui e levei as mãos até a barra do
suéter largo de lã que eu usava. Eu estava prestes a puxá-lo para cima
quando Bear segurou as minhas mãos. Encarei o seu rosto confusa.
— Me deixe fazer isso — pediu em um tom baixo.
Sem saber o que responder, eu apenas concordei em silêncio.
Bear me deu um sorrisinho de canto e puxou o meu suéter para cima
em um gesto rápido. Prendi o fôlego quando os meus seios ficaram à
mostra.
Eu estava prestes a colocar os braços ao redor do corpo para cobrir a
minha nudez quando vi o jeito que Bear estava me encarando. Seus olhos
permaneciam fixos nos meus seios — ele nem mesmo estava piscando.
Havia desejo em seu olhar, um desejo intenso e primitivo que fez a minha
calcinha ficar ainda mais molhada.
Seus músculos estavam tensos e a cada segundo que Bear passava
observando os meus seios a sua respiração ficava mais acelerada. Era nítido
que ele estava excitado, mas resolvi manter a compostura e aguardar em
silêncio para ver qual seria o seu próximo passo.
Depois de um longo tempo em silêncio, os olhos de Bear deixaram os
meus seios e desceram até a calça de moletom que eu usava. Ele segurou o
elástico que a mantinha presa em minha cintura e puxou a peça de roupa
para baixo, até que ela caiu no chão. Agora eu estava apenas de calcinha e
me equilibrava em um pé só, segurando em seus ombros para não cair.
Nossos corpos estavam tão próximos que eu podia ouvir o som da sua
respiração e até mesmo sentir o leve cheiro de lavanda que saía da sua pele
por causa do óleo que ele espalhou sobre si minutos atrás.
Bear deu uma boa olhada no meu corpo, de cima a baixo, sem ao
menos disfarçar. O brilho de excitação em seu olhar entregou que ele ficou
satisfeito com o que viu. Saber que aquele homem me achou atraente e que
ele me desejava afastou qualquer sombra de timidez que pudesse existir no
meu subconsciente. Mesmo que eu estivesse apenas de calcinha na frente
dele eu me sentia confiante e ousada, um mulherão da porra.
Eu queria me atirar nos braços de Bear e prendê-lo com um beijo
ardente até que ficássemos sem fôlego. No entanto, mesmo com o fogo da
paixão queimando dentro de mim, eu não fiz nada. Não tomei nenhuma
atitude, pois queria que Bear desse o próximo passo. Eu queria que ele me
puxasse para os seus braços, que me reivindicasse como sua mulher.
Precisava saber se a sua pegada realmente era mais forte, se ele era ainda
mais intenso que o Bear de Desire&Seduction.
— Acho que você esqueceu da calcinha — falei com um tom sedutor,
enquanto o olhava nos olhos. Bear precisava entender que eu estava pronta
para me entregar a ele.
O homem deixou seu olhar cair até os meus seios e sorriu. Meus
mamilos estavam quase roçando na pele dele devido à proximidade em que
estávamos. Não consegui resistir à tentação e me inclinei para mais perto
até que meus seios roçaram em seu corpo. Bear ofegou e voltou sua atenção
para o meu rosto. Direcionei-lhe um sorriso atrevido, deixando claro que fiz
aquilo de propósito.
— Vai mesmo me provocar, Freya? — Bear arqueou uma sobrancelha
e sorriu com lascívia.
Suas mãos apertaram a minha cintura com firmeza e ele inclinou o
rosto para o lado, como se estivesse pensando no que faria comigo.
Decidi responder aquela pergunta esfregando os seios nele outra vez.
Bear fechou os olhos e deixou um gemido rouco escapar. Eu ri com a
sua reação, mas quando ele me encarou novamente eu percebi que despertei
a fera adormecida em seu interior.
— Acha que pode me provocar desse jeito e eu não vou fazer nada?
— rosnou, olhando no fundo dos meus olhos. — Meus dias de
cavalheirismo acabaram, Freya. A partir de agora, você vai ter que me
compensar por cada minuto da sua estadia aqui.
Bear segurou na lateral da minha calcinha e puxou o tecido com força
até que ele se rasgou. Arquejei com surpresa quando os retalhos da minha
peça íntima foram puxados para longe do meu corpo. Agora, eu estava
completamente nua.
Fiquei encarando o homem, boquiaberta. Minha surpresa aumentou
ainda mais quando ele ergueu a mão até a altura do nariz e inspirou
profundamente o cheiro da calcinha. Porra! O Bear de Desire&Seduction
também é um cheirador de calcinhas assumido! Ainda não acredito que
esse tipo de coincidência aconteceu na minha vida.
Quando Bear se cansou de sentir o cheiro das minhas partes
femininas, ele jogou a calcinha de lado e me puxou para mais perto. Meus
seios se chocaram contra o seu corpo e eu arquejei quando senti algo grande
e duro cutucando a minha barriga. Parece que o meu plano de sedução
funcionou.
Ergui meu rosto para encarar Bear e no mesmo instante a sua mão
segurou o meu queixo para impedir que eu me afastasse. Ele inclinou seu
rosto para a frente, fechou os olhos e seus lábios tocaram os meus. Se Bear
não estivesse me segurando, eu teria caído no chão — não só pela surpresa
do momento, mas também porque as minhas pernas ficaram moles feito
gelatina e agora estava difícil me manter equilibrada um pé só.
O beijo começou lento e contido, como se ele quisesse testar qual
reação eu teria, mas no instante em que as nossas línguas se encontraram o
fogo se acendeu entre nós. Bear me ergueu no ar, sem separar nossos lábios
e pressionou as minhas costas contra a parede de madeira. Sua língua
explorava cada centímetro da minha boca, ele me segurava com apenas um
braço enquanto a outra mão deslizava pelas curvas da minha coxa e
bumbum, tocando cada centímetro de pele que estava pelo caminho.
Entrelacei os braços em seu pescoço e me apertei ainda mais contra o
seu corpo. Aquele movimento fez a minha boceta roçar no abdômen dele e
eu gemi contra a sua boca. Bear apertou a minha bunda com força e
aprofundou ainda mais o beijo. Era excitante sentir a sua barba roçando em
meu rosto enquanto nos beijávamos, isso me fazia lembrar da sensação de
tê-la no meio das minhas pernas, deslizando no interior das minhas coxas
enquanto a sua língua me dava prazer.
Não sei quanto tempo ficamos imersos naquele beijo. Podiam ser
apenas alguns minutos, mas também podiam ter se passado horas. Eu não
me importava, só queria que aquele momento de conexão entre Bear e eu
durasse para sempre.
Meu peito estava aquecido, meu coração palpitava de alegria e a
minha intimidade doía com desejo. Bear me segurava com firmeza e eu
sabia que não havia perigo dele me deixar cair, então ousei um pouco mais
e esfreguei a minha boceta contra o seu abdômen, dessa vez de propósito.
Gemi quando a minha pele roçou na dele e Bear interrompeu o beijo
imediatamente.
— Está querendo gozar antes de começarmos a brincadeira? —
indagou, ofegante.
Eu apenas sorri enquanto tentava recuperar o fôlego. Aquele beijo me
abalou completamente.
— Fique quietinha, porque ainda tem o seu banho para tomar. — Bear
me afastou da parede e caminhou em direção à banheira.
— Posso tomar banho depois — protestei, quando ele se inclinou para
me colocar na água. Eu queria continuar o beijo.
— Não. Vai tomar banho agora. — Bear me colocou gentilmente na
água. — E serei eu quem vai lavar o seu corpo, vou te deixar bem limpinha.
Opa... essa oferta eu não posso recusar!
— Como quiser — concordei imediatamente, me recostando para trás
na banheira.
Bear sorriu e passou um tempo me encarando em silêncio. Seus
braços estavam molhados e com um pouco de espuma, já que ele os
encostou na água quando me colocou na banheira. Pensei em convidá-lo
para tomar banho comigo, mas o corpo de Bear era grande e musculoso —
jamais caberíamos os dois nessa banheira sem quebrá-la —, então tive que
descartar a ideia.
Meus seios estavam cobertos pela espuma, e por mais que Bear não
pudesse vê-los, comecei a esfregá-los lentamente e deixei um sorriso
malicioso curvar à minha boca.
— Porra, você é mais bonita do que eu imaginei que seria —
confessou em um tom rouco, seu olhar estava fixo na região que eu
esfregava embaixo d’água.
— Então você costumava imaginar como eu seria pelada? —
provoquei.
Bear deu um sorriso de canto e se ajoelhou no chão, ao lado da
banheira.
— Freya, você não faz ideia de como eu a imagino em alguns
momentos do meu dia...
Revirei os olhos e sorri, sentindo uma grande satisfação interior.
Um silêncio pairou entre nós e Bear continuou me observando sem
dizer uma única palavra. Seus olhos cinzentos estavam mais escuros que o
céu durante uma tempestade e deixavam claro o desejo que ele sentia por
mim. Será que o loiro está esperando um convite para começar a esfregar o
meu corpo?
Eu estava prestes a provocá-lo outra vez quando Bear pegou a esponja
de banho que ficava pendurada na parede e a molhou na água da banheira.
Ele pediu que eu me inclinasse para a frente e começou a esfregar as
minhas costas de um jeito gentil. Deixei um suspiro escapar e aproveitei a
sensação.
Quando Bear terminou com as costas, passou para os meus braços,
pescoço e roçou a esponja nos meus seios imersos na água. Fiz questão de
forçar um gemido baixo. Minha provocação o fez largar a esponja e
começar a me esfregar com as mãos. Ele apertou os meus seios e eu gemi
com vontade dessa vez, o que o fez sorrir.
Enquanto Bear acariciava os meus mamilos com a desculpa de que
estava me lavando, estendi meu braço e toquei o seu abdômen. Felizmente,
ele não se importou com a minha mão molhada e não se afastou do meu
toque. Resolvi seguir a diante e deslizei a mão para baixo, até chegar no cós
da sua calça. Na região da virilha, estava o volume grosso do seu pau que
era visível mesmo sob o tecido da calça jeans. Não resisti e o toquei,
apertando meus dedos ao seu redor. Bear gemeu e fechou os olhos, parando
até mesmo de me acariciar.
Ele inclinou sua virilha para mais perto da minha mão e eu resolvi
tocá-lo de um jeito ainda melhor. Criando coragem, abri o botão da sua
calça e, em seguida, deslizei o zíper para baixo. O tecido branco da cueca
que Bear usava ficou à mostra e eu mordi os lábios.
Antes de prosseguir, encarei o rosto do homem para ter certeza que
ele estava de acordo com aquilo e não iria sair correndo. Bear ainda se
mantinha de olhos fechados, sua respiração estava irregular e seus músculos
tensos.
— Preciso que se levante um pouco — pedi, sentindo um frio de
ansiedade na barriga.
Bear finalmente abriu os olhos e me encarou. Ele ainda estava
ajoelhado ao lado da banheira e eu não poderia fazer o que tinha em mente
se o homem continuasse naquela posição.
— Fique de pé, Bear — minha voz soou um pouco autoritária.
Ele engoliu em seco e me obedeceu, ficando de pé na minha frente
com a sua virilha no meu campo de visão.
Mordi os lábios e prossegui com o que eu estava fazendo. Enfiei uma
mão dentro da calça dele e segurei o seu pau com força. Ele era grosso,
quente e estava pulsando de excitação por mim. Que delícia...
Criando coragem, puxei sua cueca para baixo e libertei o seu membro,
que ficou à centímetros do meu rosto. Minha boceta doeu quando o vi e
precisei me controlar para não pular em cima dele. Bear era grande e
imponente dos pés à cabeça e o seu pau não era uma exceção. Caramba,
imagino como deve ser gostoso ter tudo isso dentro de mim... Eu tirei a
sorte grande com esse homem!
Olhei nos olhos de Bear e percebi que ele me encarava com um misto
de nervosismo e excitação. Segurei seu membro sem interromper a nossa
troca de olhares e coloquei a ponta dele na minha boca. Bear cerrou os
punhos e rosnou de um jeito necessitado quando meus lábios o tocaram.
Ele inclinou o quadril para frente e eu coloquei mais do seu pau na
minha boca, fui acomodando até onde pude e depois tirei. Repeti esse
movimento algumas vezes e quando metade do seu membro já estava bem
molhado com a minha saliva, comecei a chupar a sua glande, onde eu sabia
que era mais sensível. Bear ofegou e segurou o meu rosto enquanto eu lhe
dava prazer com a minha boca. Minha mão começou a deslizar por sua
base, subindo e descendo com facilidade, já que uma boa parte estava
molhada.
Não demorou muito até eu sentir o corpo de Bear se tensionando, seus
gemidos ficaram mais constantes e a respiração mais acelerada. Ele estava
perto de gozar. Aumentei a intensidade com que eu o chupava, mas isso fez
o homem se afastar de mim rapidamente.
— O que houve? — indaguei, confusa.
— Não quero te sujar. — Bear segurou a base do seu pau com força e
respirou fundo, em uma tentativa de controlar o tesão.
— Mas e se eu quiser que você faça isso? — Gesticulei com meu
dedo para que ele se aproximasse de mim outra vez. — Vem aqui, Bear...
pode me sujar, eu deixo.
O homem sorriu maliciosamente e começou a se masturbar enquanto
me encarava. Ele voltou para perto da banheira e dobrou um pouco os
joelhos para que o seu pau ficasse mais perto de mim.
Mordi os lábios de um jeito travesso e fiquei desviando meu olhar
entre o seu rosto e o músculo maravilhoso que ele tinha no meio das pernas.
Fiquei apenas assistindo enquanto Bear se masturbava de um jeito bruto e
rápido bem na minha frente, ele devorava o meu corpo com os olhos,
deixando claro que me desejava de um jeito carnal, intenso e selvagem.
— Quer ficar sujinha com a minha porra, Freya? — ele rosnou
aquelas palavras enquanto a sua mão bombeava rapidamente, seu pau
estava apontado na direção dos meus seios. — Posso providenciar isso...
— Por favor, Bear. — Apertei meus seios com os braços para que
ficassem maiores, minha pele estava molhada e escorregadia com a água da
banheira.
Bear ofegou, tomado pelo prazer, e eu vi cada músculo do seu corpo
ficar tenso. Um jato de sêmen jorrou e atingiu o vale entre os meus seios,
depois veio outro que sujou um pouco acima do meu mamilo esquerdo e o
terceiro acabou acertando a minha bochecha. Ele terminou de gozar,
esfregando o pau no bico do meu seio direito para limpar o restante do
sêmen que ainda saía. Depois se afastou e ficou olhando para cada lugar
que me marcou com a sua libertação.
Ao perceber que Bear estava me encarando, passei um dedo entre os
meus seios e depois o levei até a boca, lambendo lentamente com o único
propósito de provocá-lo. O gosto dele me deixou ainda mais excitada.
Como eu quero sentir esse homem dentro de mim...
Bear ficou um pouco atordoado depois da provocação que eu fiz, mas
logo voltou a si. Ele guardou o pau dentro da calça e puxou o zíper para
cima, em seguida, se ajoelhou ao lado da banheira e tentou voltar ao que
estava fazendo minutos atrás.
— Bom, eu disse que iria te dar banho e te deixar bem limpinha —
ele olhou para as partes dos meus seios que estavam sujas com o seu gozo
—, preciso cumprir a minha palavra. Primeiro o banho e depois...
— Depois o quê? — o interrompi, me sentindo ansiosa para saber o
que ele tinha em mente.
Bear molhou a mão na banheira e esfregou a minha bochecha até que
ela estivesse limpa. Seu olhar se fixou no meu antes dele responder a minha
pergunta.
— Depois do banho, Freya, eu vou levar você para a minha cama e te
foder tão forte quanto o lenhador daquele livro estava fazendo com a
mocinha.
Fiquei boquiaberta, foi impossível disfarçar a minha cara de surpresa
e excitação depois do que acabei de ouvir.
Não consegui me conter e sorri maliciosamente, esperando que Bear
entendesse que eu aprovava a ideia. Para a minha surpresa, ele retribuiu o
sorriso e me deu uma piscadela antes de voltar a sua atenção para o meu
corpo.
Bear lavou os meus seios, depois minha barriga e então se concentrou
nas minhas pernas, deslizando lentamente a sua mão até o interior da minha
coxa, mas tomando cuidado para não tocar em minhas partes sensíveis —
era óbvio que ele estava fazendo isso de propósito. Bear queria me provocar
e estava funcionando.
— Não está esquecendo de nada? — Arqueei uma sobrancelha e abri
as pernas, deixando uma de cada lado da banheira.
Bear deu um sorrisinho travesso.
Ele pegou a esponja de volta e a pressionou delicadamente contra a
minha boceta. Gemi baixinho e segurei as bordas da banheira com força.
Bear começou a deslizar a esponja para cima e para baixo, de um jeito lento
e gostoso. Seus olhos estavam fixos no meu rosto enquanto ele me
provocava e um sorriso satisfeito curvava a sua boca toda vez que eu gemia.
Abri minhas pernas o máximo que eu pude, ficando totalmente à
mercê do seu toque. A esponja encharcada de água deslizava pelas minhas
dobras e quando chegava na altura do clitóris, Bear colocava mais pressão e
passava a investir com movimentos circulares, me levando à loucura.
Em certo ponto, ele deixou a esponja de lado e começou a usar os
dedos. Seu polegar tocou o meu ponto mais sensível e o seu dedo indicador
penetrou a minha abertura. Eu gemi e me apertei contra ele. Bear começou
a movimentar sua mão devagar e foi aumentando a velocidade
gradativamente. Perdi o controle e não consegui fazer mais nada a não ser
gemer e inclinar meu quadril para mais perto dele. Os nós dos meus dedos
já estavam brancos pela força com que eu me agarrava à borda da banheira.
Eu estava quase alcançando o orgasmo quando Bear cessou os movimentos
e tirou sua mão da água.
— Bear! — protestei, com descontentamento.
— Hoje você vai gozar no meu pau. — Aquilo não pareceu um
pedido, e sim uma ordem. Uma ordem que eu não tinha nenhuma intenção
de contrariar.
Bear mordeu a minha boca de um jeito possessivo e me tirou da
banheira. A água que escorria pelo meu corpo acabou fazendo com que o
homem se molhasse, mas isso não o incomodou. Ele me colocou de pé na
sua frente, mantendo uma mão ao redor da minha cintura, pegou uma toalha
branca que estava pendurada em um gancho na parede e começou a me
secar.
Quando passou pela minha intimidade, Bear pressionou o tecido da
toalha em meu clitóris e brincou com ele por alguns segundos, me
provocando outra vez. Me agarrei em seus ombros e choraminguei, eu não
aguentava mais aquilo. Bear me masturbava até que eu estivesse perto de
gozar e então parava, me causando uma grande inquietação.
— Isso é tortura — protestei, quando ele afastou a toalha da minha
pele.
— Agora entende o que eu tenho passado desde que você chegou
aqui. — Ele deu um beijo demorado em meu pescoço e me ergueu em seus
braços novamente.
Bear caminhou em passos largos para fora do banheiro e um frio se
instalou na boca do meu estômago. Não precisei de nenhum esforço para
adivinhar para onde ele estava me levando. Estava claro que iríamos para o
seu quarto. Finalmente, o desejo que eu sentia por Bear seria saciado — ou
talvez, ficaria ainda mais intenso.
CAPÍTULO 21

Quando Bear me colocou na cama, o meu coração estava acelerado e


a cada segundo que passava, ficava mais difícil de respirar. Uma parte de
mim ainda tentava aceitar o fato de que eu finalmente iria transar com
aquele homem gostoso. Vai acontecer... finalmente vai acontecer!
Ciente de que eu estava faminta pelo seu corpo, o loiro sorriu
maliciosamente e tirou a calça jeans junto com a cueca. Minha boceta doeu
com necessidade quando eu admirei de cima a baixo o seu corpo grande e
musculoso. Que homem!
Em um movimento rápido, ele subiu na cama e empurrou o meu
corpo para baixo, pressionando-me contra o colchão. Abri as pernas para
que Bear pudesse se encaixar entre elas e assim ele o fez. Um gemido me
escapou quando senti o calor do seu pau roçar na minha boceta molhada.
— Bear, eu quero você agora! — implorei, quando nossos olhares se
encontraram.
Bear esticou seu braço até a gaveta da mesa de cabeceira, tirou de lá
uma embalagem de camisinha e a abriu. Enquanto ele a colocava, passei
minha mão pelo músculo do seu tórax e mordi os lábios. Meu corpo estava
em chamas. Eu nunca tive um homem tão forte assim, tão perfeito, tão
gostoso...
Enquanto eu divagava com a maravilha que era o seu corpo, Bear
deslizou o pau pela minha intimidade e ficou pincelando sobre o meu
clitóris por um tempo. Eu gemi com aquela provocação e ele se deitou
sobre mim. Alguns fios do seu cabelo loiro caíram em meu rosto,
provocando cócegas em minha bochecha, os afastei para o lado e Bear me
direcionou um sorriso safado.
— Estou esperando por isso há muito tempo — sussurrou, enquanto
olhava no fundo dos meus olhos. — É melhor se preparar, porque vou
compensar com você todos os anos que eu não estive com ninguém. — Ele
encaixou a cabeça do pau na minha entrada e fez pressão. — Vou te foder
com tanta força que vão ouvir os seus gritos lá da vila.
Bear moveu o seu quadril para frente e me penetrou com uma única
investida. Gemi alto e um rosnado saiu da garganta dele. Precisei de alguns
segundos para retomar o fôlego e me acostumar com o tamanho do seu
membro dentro de mim. Ele era longo e grosso, mesmo que eu não fosse
mais virgem parecia que estava rasgando a minha boceta.
Apoiando seus braços no colchão, ele começou a se mover. Seu pau
saía até a metade e depois entrava com força, fazendo as suas bolas se
chocarem contra a minha bunda. Eu gemia, afundava as unhas nas costas
dele e me apertava ao seu redor. Bear ofegava enquanto seus olhos
cinzentos contemplavam as minhas expressões de prazer.
Puxei seu rosto para perto do meu e lhe dei um beijo rápido,
mordiscando os seus lábios antes de me afastar. A intensidade com que ele
se movia aumentava mais a cada investida e isso impossibilitou que as
nossas bocas ficassem unidas por muito tempo.
O som dos nossos corpos se chocando, em meio a respirações
ofegantes, preenchia o ambiente da cabana. Bear estava me comendo com
vontade, saciando os anos que passou isolado nessa montanha sem
nenhuma mulher. Me senti feliz por saber que eu fui a escolhida, depois de
tanto tempo. Ele confiou em mim, me deixou entrar no seu coração e agora
eu o deixei entrar no meu corpo.
— Porra, Freya... sua boceta é tão gostosa quanto eu achei que seria
— rosnou, entre as investidas. — Fique de quatro, eu quero olhar para essa
bunda enquanto meto bem fundo em você.
Bear saiu do meu corpo e abriu espaço na cama para que eu me
colocasse na posição. Levei um tempo para voltar à realidade, minhas
pernas estavam trêmulas e a respiração ofegante. Depois de muito esforço,
eu finalmente consegui ficar de quatro na frente dele.
Quando Bear me penetrou novamente, suas mãos seguraram firme na
minha cintura e ele começou a estocar com força, de um jeito bruto e
selvagem. Meus seios balançavam na mesma intensidade das investidas e
eu agarrei o lençol que cobria o colchão, me entregando ao prazer que
aquele homem estava me proporcionando.
A cama rangia e balançava cada vez que ele se movia, mas os
gemidos que saíam da minha boca eram altos o suficiente para abafar o
barulho desconfortável da madeira sacudindo. Em um momento, Bear saiu
do meu corpo, deu um tapa em minha bunda e me penetrou com força outra
vez. De repente, um estalo de madeira ecoou pelo quarto e a parte superior
do lado esquerdo da cama pendeu para baixo. Ficamos imóveis por um
tempo, observando o que tinha acabado de acontecer.
— Quebramos a cama! — anunciei ofegante.
— Esqueça a cama, se concentre apenas em gemer para mim — Bear
ordenou com a voz rouca, e voltou a me foder.
Eu apenas mordi os lábios e assenti — era difícil falar quando tinha
um pau daquele tamanho deslizando dentro de mim. Quando me dei conta,
estava rebolando contra ele, acompanhando o ritmo da penetração e
gemendo feito uma louca, implorando por mais. Eu me vi imersa em um
prazer que jamais havia experimentado.
— Mais rápido, Bear... por favor! — implorei, languidamente. — Eu
quero mais!
— Você quer mais, Freya? — rosnou, enquanto movimentava o
quadril. — Eu vou te dar mais...
Bear emitiu um som profundo que pareceu uma mistura de gemido e
rosnado e começou a ir mais rápido. Meus olhos se reviraram de prazer.
Porra, que homem!
Ele me puxou para perto, colando minhas costas em seu peito suado.
Uma das suas mãos passou a segurar o meu seio esquerdo enquanto a outra
mexia em meu clitóris. Virei meu rosto para trás e Bear capturou a minha
boca com um beijo intenso, depois ele deslizou a língua pelo meu pescoço e
mordiscou o meu ombro, mantendo os lábios colados em minha pele.
— Goze para mim, Freya — ofegou, em meio às investidas. — Eu
quero sentir a sua boceta se apertando no meu pau.
Fechei os olhos e gemi outra vez. Suas palavras me excitaram, mas
foi a mão em meu clitóris e o membro grande deslizando dentro de mim
que me fizeram alcançar o orgasmo.
— Bear! — gritei, quando o êxtase me atingiu. Meu corpo inteiro foi
tomado por uma série de espasmos e eu me entreguei ao prazer daquele
momento.
Bear me apertou em um abraço por trás e rosnou alto, seus músculos
ficaram tensos e ele encerrou as investidas. Fui pega de surpresa quando o
homem deixou seu corpo cair no colchão e me levou para baixo junto com
ele.
Não sei por quanto tempo fiquei embaixo de Bear, mas foi tempo o
suficiente para que as nossas respirações se acalmassem e o cansaço do dia
começasse a me abater. Esqueci completamente da dor em meu tornozelo e
até mesmo da cama que quebramos. Naquele momento, tudo o que me
importava era o calor do corpo suado do homem que estava em cima de
mim, ele me fazia sentir viva.
Sem dúvida, esse foi o melhor sexo da minha vida. Eu sabia que
daquele momento em diante jamais conseguiria ficar com outro homem que
não fosse Bear. Uma vez que experimentei a transa perfeita eu não me
contentaria com as migalhas oferecidas pelos outros. Ah, que se foda a
razão... Quero ficar com Bear nessa montanha para sempre!

Quando ele rolou para o lado e o seu peso saiu de cima de mim, virei
na cama e deitei de barriga para cima. Fechei os olhos por um tempo e
quando os abri, surpreendi Bear me encarando com um sorriso no rosto.
Devolvi o seu sorriso e trocamos olhares silenciosos por um tempo. Nunca
fiquei tão satisfeita depois de transar. O homem realmente é tudo o que
disse ser e mais um pouco.
Bear interrompeu a nossa troca de olhares e encarou o seu membro,
ele tirou a camisinha que ainda estava usando e a jogou aos pés da cama.
Aquilo levantou uma questão que eu não consegui deixar guardada dentro
de mim.
— Bear? — chamei a sua atenção. — Como você tinha camisinha
aqui se não queria saber de ninguém na sua vida?
Ele pensou antes de responder e eu notei um leve rubor em seu rosto.
— Ah... era apenas por precaução.
Arqueei uma sobrancelha e controlei o riso.
— Apenas por precaução, sei... — Não resisti e dei um pequeno tapa
em seu peito.
Bear deixou uma risada escapar e me direcionou um olhar malicioso.
— Bom, tinha uma mulher linda e simpática debaixo do meu teto, foi
impossível não me sentir atraído por ela... Comprei as camisinhas para o
caso de, não sei, a paixão falar mais alto. — Era nítido que ele estava tendo
dificuldades para ser sincero, mas eu o parabenizei mentalmente por estar
começando a se abrir comigo.
Deitei minha cabeça em seu peito forte e suado. Bear suspirou e
deixou uma mão passear pelas minhas costas, seguindo a curva da minha
cintura e quadril. Fechei os olhos e sorri com a felicidade que senti naquele
momento.
Haviam muitas coisas sobre o passado desse homem que eu
desconhecia, mas, por enquanto, eu me contentava em ter a sua sinceridade
sobre a nossa relação, sobre essa chama que se ascendeu entre nós essa
noite. Se Bear for sincero quanto a isso e não esconder o que sente, o resto
eu deixarei passar. No momento, só quero ter esse homem perfeito e intenso
perto de mim.
CAPÍTULO 22

Quando acordei de manhã Freya estava em meus braços, dormindo


tranquilamente com o rosto colado em meu peito. Nenhuma roupa cobria o
seu corpo e isso me proporcionou uma visão do paraíso logo nas primeiras
horas do dia. Sorri enquanto a observava.
As feições do seu rosto estavam relaxadas e ela se aninhava a mim
como se eu fosse o seu porto seguro. A ideia me causou uma grande
satisfação, me senti realizado quando pensei em ser alguém com quem
Freya pudesse contar em seus momentos de fraqueza, alguém que poderia
protegê-la do mundo e cuidar dela. E eu vou fazer isso. A partir de agora,
Freya seria o meu tesouro. E eu protegeria esse tesouro até mesmo com a
minha vida, se fosse necessário.
Eu não queria que ela fosse embora, que voltasse para a vila. Eu
queria que Freya ficasse aqui comigo, me fazendo companhia junto de Hati.
Sinto que com ela eu poderia alcançar a felicidade que há muito tempo
desisti de procurar. Freya era a minha luz no fim do túnel.
Enquanto eu divagava, a mulher em meus braços abriu os olhos e
bocejou. Não resisti e puxei o seu rosto para perto do meu, lhe presenteando
com um intenso beijo de bom-dia. Freya ficou visivelmente feliz com a
minha atitude e sorriu contra a minha boca. Eu queria passar o tempo
inteiro olhando para cada centímetro do corpo dela. Queria gastar todas as
horas restantes da minha vida admirando os seus seios perfeitos, sua cintura
fina e a sua boceta carnuda que ontem me fez enlouquecer. Porra, como eu
quero comer essa mulher de novo!
Meu estômago roncou e eu percebi que não estava apenas com fome
de Freya, eu também queria comida.
— Vou preparar o café da manhã — anunciei, enquanto fazia um
grande esforço para me sentar na cama e abandonar o nosso momento de
paz.
Quando eu estava prestes a ficar de pé, Freya segurou o meu pau com
firmeza. Ofeguei ao sentir o seu toque e virei meu rosto na direção dela.
— Não levante agora, Bear... — Ela fez um beicinho para tentar me
convencer. — Vamos transar de novo.
Arqueei as sobrancelhas. Foi um pedido inusitado, mas quem sou eu
para recusar? Minha fome de comida pode esperar, agora, eu vou saciar a
minha fome de sexo. Lancei um olhar malicioso para Freya e aproximei o
meu rosto do seu até que os nossos lábios se encontraram. Minha língua
pediu passagem e começou a roçar na dela, nos envolvendo em um beijo
ardente e cheio de paixão.
Aproveitei que ela estava nua e coloquei a mão entre as suas coxas.
Deslizei lentamente o meu dedo em sua boceta e sorri ao perceber o quanto
estava molhada. Quando enfiei um dedo em sua abertura, Freya ofegou e
segurou em meu braço. Meu pau — que estava duro desde que eu acordei
— doeu com vontade de entrar nela.
Freya é minha mulher agora e farei com que cada parte do seu corpo
reconheça isso.
Tirei meu dedo da sua abertura molhada e espalhei as suas pernas na
cama, deixando-a totalmente aberta para mim. Quando me posicionei sobre
o corpo de Freya, ela levou um dedo até a boca e ficou me encarando com
uma expressão safada no rosto, implorando, silenciosamente, para que eu a
preenchesse com cada centímetro do meu pau. Com certeza eu não vou
negar esse pedido.
Abri a gaveta da mesa de cabeceira e tirei de lá uma camisinha.
Depois de colocá-la, me inclinei sobre o corpo de Freya até que o meu pau
tocasse a abertura da sua boceta. Ela gemeu quando fiz pressão para entrar e
eu ofeguei ao sentir o aperto do seu corpo se expandindo para abrigar o meu
tamanho.
Continuei empurrando o meu quadril para frente até que minhas bolas
encostaram na sua bunda. Ao ver que todo o meu comprimento já estava
dentro dela, passei a dar pequenas investidas que começaram lentas e foram
aumentando a intensidade gradativamente.
Freya agarrou meus ombros e revirou os olhos quando a penetrei com
mais força. Ela ofegava e se contorcia abaixo de mim toda vez que eu
entrava até o último centímetro e fazia a minha virilha roçar em seu clitóris.
Seu rosto se contorcia em expressões de prazer que me deixavam ainda
mais excitado e eu passei um tempo observando os seus seios perfeitos, que
balançavam no mesmo ritmo dos movimentos que eu fazia. Ela é linda.
Linda!
— Era isso que você queria, Freya? — rosnei, e comecei a me mover
mais depressa. — Queria sentir o meu pau em você outra vez?
— S-sim! — ela respondeu com um gemido ofegante.
Lancei minha cabeça para trás e firmei os braços no colchão. Usei
toda a energia que eu tinha para mover meu quadril o mais rápido que eu
podia. Estava perto de gozar e não conseguia pensar em mais nada a não ser
me enterrar naquela boceta com força e senti-la se contraindo ao meu redor.
Porra... não acredito que passei tanto tempo sem essa sensação.
— Você é minha mulher agora... só minha. — Meus dentes estavam
serrados e cada músculo do meu corpo já estava ficando tenso. — É minha
para amar, cuidar, proteger e foder.
— Sim, Bear! — Freya respondeu com um gemido agudo, sua voz
oscilava a cada investida que eu dava. — Só sua! Apenas... sua...
— Minha — rosnei, parecendo mais um animal do que um homem.
Naquele momento, Freya revirou os olhos e o seu corpo estremeceu.
Ela gemeu languidamente e arranhou as minhas costas, enquanto o orgasmo
a consumia. A ardência que as suas unhas causaram em minha pele me
excitou ainda mais. Freya estava me marcando como seu, então eu iria
marcá-la como minha também. Inclinei meu rosto para baixo e chupei o seu
pescoço com força até ter certeza que deixaria uma marca no local. Agora,
toda vez que eu olhasse para ela nos próximos dias poderia lembrar do
momento em que nos entregamos um ao outro.
Mantive a minha boca colada em sua pele suada e a penetrei com
força uma última vez. A pressão em meu pau cresceu e então eu senti o
sêmen sair do meu corpo. Fiquei um tempo em silêncio, enquanto esperava
as nossas respirações voltarem ao normal.
Quando finalmente me senti disposto a falar, saí do corpo de Freya e
rolei para o lado até estar deitado de costas no colchão. Retirei a camisinha
e a deixei aos pés da cama, onde ainda estava a outra que usei na noite
anterior. Mais tarde eu as jogaria no lixo, por enquanto eu só queria ficar
deitado aproveitando a companhia da minha pequena deusa.
Freya estava com as pernas esparramadas na cama e sorria como se
estivesse vendo mil estrelas em seu campo de visão. A puxei para perto até
que estivesse aconchegada em meu peito suado e deixei minha mão
acariciar o seu cabelo.
Ela suspirou e trouxe o corpo para mais perto de mim, colocando sua
perna esquerda sobre as minhas.
— Isso foi bom. — Sua voz ainda estava cansada, mas carregava um
tom de felicidade.
— Foi sim. — Um sorriso curvou a minha boca, enquanto um
flashback erótico passava pela minha cabeça. — E eu estava falando sério
quando disse que você é a minha mulher.
— Eu sei. — Ela acariciava o meu peito distraidamente. — E você é
o meu homem... meu ursinho.
— Ursinho? — Levantei minha cabeça para encará-la. — Mas que
porra é essa, Freya?
— Pensei em te dar um apelido carinhoso. — Ela sorriu com
diversão.
Franzi o cenho tentando parecer sério, mas não consegui conter a
risada que me escapou.
— Porra, mas ursinho? De onde tirou essa merda? — Arqueei uma
sobrancelha. — Por que ursinho?
— Porque você tem o peito peludo e é bom de abraçar. — Ela se
debruçou sobre mim e afagou o meu tórax de um jeito brincalhão, como
fazia com Hati. — E além disso, o seu nome é Bear... achei que iria
combinar.
— Mas por que tem que ser no diminutivo? Não podia ser ursão?
— Ursinho. — Freya teimou e me abraçou com força.
Um sorriso involuntário curvou a minha boca e minhas mãos
acariciaram as suas costas. Porra, não acredito que eu realmente vou ceder
e deixar que ela me chame assim.
Depois do café da manhã, Bear saiu da cabana para buscar madeira e
fazer um novo pé para a cama — já que quebramos o outro na noite
anterior. Hati o seguiu até lá fora e eu fiquei no sofá, na companhia das
minhas aquarelas e do meu caderno de desenhos.
Como o clima estava frio, deixei um edredom de lã sobre as minhas
pernas para me manter aquecida enquanto eu pintava. O tecido pesado e
azul estava arrastando no chão e eu precisaria ter cuidado para não tropeçar
nele caso quisesse me levantar e andar com as muletas.
Eu estava inspirada como nunca fiquei antes e tinha certeza que era
por causa da noite de paixão que tive com o Bear. Nada melhor do que
fazer sexo com um homem gostoso para começar o dia de bom humor.
Agora, um sorriso bobo aparecia em meu rosto sempre que eu me recordava
dos momentos que passamos juntos. Ter Bear dentro do meu corpo foi
maravilhoso e eu já estava me perguntando quando iríamos repetir. Talvez,
hoje à noite? Quem sabe...
A maior parte da minha atenção estava focada no quadro que eu
pintava de Hati. Passei um bom tempo distraída, imersa nas pinceladas e
tentando acertar os tons da pelagem do cachorro. A pintura estava ficando
linda e eu pretendia dar de presente para Bear quando terminasse. O quadro
ficaria perfeito pendurado aqui na sala, ou então no quarto, em cima da
lareira.
Uma tranquilidade sem fim pairava em minha mente. Tudo estava
calmo e quieto, até que de repente ouvi Hati latir lá fora. Segundos depois,
Bear começou a resmungar irritado e uma segunda voz masculina se
mostrou. Era uma voz estranhamente familiar, mas eu não consegui ouvi-la
perfeitamente já que Bear estava tagarelando também.
Parei de traçar o pincel na tela e comecei a prestar atenção nas coisas
que as vozes diziam. Estava claro que os dois homens discutiam, mas eu
não consegui entender o motivo da discórdia, pois era impossível
compreender uma única palavra que diziam.
De repente, a porta se abriu e eu arquejei ao ver o delegado Müller
entrando na cabana em passos largos. Ele não usava o seu habitual uniforme
da polícia, mas sim botas de caminhada, calça jeans e um casaco térmico —
aquela foi a primeira vez que o vi em roupas normais.
O olhar do delegado se fixou em mim e eu praguejei em pensamento.
Ah não! Agora ele sabe que estou aqui e não na casa da minha família...
merda!
— Olá, Freya. — O homem me cumprimentou com um aceno de
cabeça. Estranhamente, ele não pareceu surpreso por me ver ali.
— D-delegado Müller — foi tudo o que consegui dizer.
Bear entrou na cabana na velocidade de um raio, ele segurava o
machado na mão direita e foi direto até o homem da lei.
— Sai da minha propriedade, Müller! — gritou, enfurecido. Aquela
cena me trouxe uma pequena lembrança de quando ele tentou me expulsar
da montanha.
O delegado franziu o cenho e encarou Bear com um olhar zangado.
Era nítido o clima de tensão que havia entre os dois.
— É melhor tomar cuidado com o jeito que fala comigo, Bear. Hoje
pode ser o meu dia de folga, mas ainda sou o delegado de Havengreen.
Quer passar outra noite atrás das grades por desacato?
Outra noite? Então Bear já foi preso por discutir com um policial?
Reprimi uma risada. Por algum motivo, isso não me surpreende.
Fui desviada dos meus pensamentos quando ouvi o delegado
pronunciar o meu nome.
— Freya, então realmente era verdade? — O homem colocou as mãos
na cintura, seus olhos vagavam entre Bear e eu. — Você é a companhia
misteriosa do nosso lenhador ranzinza.
Companhia misteriosa? Abri a boca para tentar dizer alguma coisa,
mas não saiu nenhum som. Bear me encarava de braços cruzados e parecia
tenso.
— Eu vi o Bear saindo da sua casa há alguns dias. Não consegui me
conter e resolvi arriscar vindo até aqui para conseguir mais informações...
digo... para ver se estava tudo em ordem. — Ele fez o possível para
disfarçar a curiosidade
Revirei os olhos. Assim como a maioria dos moradores de
Havengreen, o delegado Müller era um fofoqueiro assumido. Como não
passou pela minha cabeça que alguém poderia ver Bear enquanto ele
visitava a minha casa? Fui uma idiota por não pensar nisso, só tem gente
bisbilhoteira naquela vila!
— Mas e então... o que aconteceu? Como ele te convenceu a ficar
aqui nessa montanha? — o delegado começou a pescar as informações.
Olhei brevemente para o meu tornozelo e fiquei aliviada quando vi
que o cobertor de lã o escondia. Ajeitei o tecido que estava sobre as minhas
pernas, somente para ter certeza de que o meu pé enfaixado não ficaria à
mostra, e comecei a pensar em uma desculpa.
Há um tempo eu pediria ajuda ao delegado Müller e imploraria que
ele me tirasse dessa montanha e me levasse de volta para a vila, mas agora,
eu queria ficar aqui com Bear. Estranhamente, eu nem me importava se
Havengreen inteira iria fofocar sobre nós dois estarmos juntos.
Eu tinha que inventar alguma coisa, se eu contasse a verdade sobre
como vim parar aqui, Bear teria problemas com a polícia. Já nos
entendemos quanto a isso, então achei melhor esquecer o passado.
— Bom... eu... eu vim para cá porque queria passar mais tempo com o
Bear. — Dei um sorriso amarelo.
Torci para que o delegado Müller acreditasse no meu relato ou ao
menos pensasse que eu estava envergonhada e não queria revelar muita
coisa. Espero que as fofocas diárias tenham atrapalhado o seu instinto
investigativo. Eu não queria ter problemas se o delegado desconfiasse que
eu estava mentindo para encobrir alguma coisa.
— E como vocês se conheceram? — Müller seguiu com as perguntas
e eu concluí que ele acreditou na minha mentira. — Foi em algum site de
namoro pela internet?
Olhei para Bear e percebi o quanto ele estava tenso. Seus olhos
possuíam um brilho de preocupação e não foi difícil adivinhar que ele
estava com medo que eu o entregasse por me fazer cair daquele barranco.
— Nos conhecemos na cachoeira da montanha. — Fiz uma pequena
pausa para pensar em mais detalhes da história que poderiam ser contados
sem comprometer a situação. — Eu subi até a queda d’água para pegar
referências de pintura e foi quando o encontrei.
— Engraçado... o Bear odeia que as pessoas subam a montanha.
— Parece que no meu caso ele abriu uma exceção. — Sorri, um
pouco sem graça.
O delegado ficou em silêncio por um tempo, mas no fim deu uma
risada e concordou com o que eu disse. Fiquei aliviada ao ver que ele
acreditou na minha história.
— Eu sabia que você não ficaria sozinho para sempre. — Müller deu
um soco no ombro de Bear, tentando parecer amigável. O loiro não entrou
na brincadeira e olhou para o delegado como se quisesse arrancar a cabeça
dele.
Müller percebeu a atmosfera hostil e se afastou alguns passos, se
aproximando mais de mim. Voltei a conferir se o meu tornozelo ainda
estava escondido sob o edredom.
— Freya, acho melhor eu ir — ele tentou se despedir. — Você está
bem?
— Estou sim. — Desta vez o meu sorriso foi sincero. — Só quero
ficar por aqui mais um tempo aproveitando a companhia do meu namorado.
— Bear arregalou os olhos quando falei a palavra com “N” e eu me
questionei se exagerei demais naquela resposta. — Voltarei para
Havengreen em algumas semanas.
O delegado Müller sorriu e concordou com a cabeça.
— Está certo... vou deixar vocês sozinhos então. — Ele se virou,
caminhando em direção à porta. — Até breve.
Fiquei acenando para o homem até ele sair da cabana. Quando Müller
não podia mais me ver, revirei os olhos e suspirei. Não dou duas horas para
Havengreen inteira ficar sabendo que estou transando com o homem que
mora na montanha.
Bear ficou um bom tempo me encarando em silêncio, eu já estava
começando a me sentir inquieta quando ele se aproximou e parou em frente
ao sofá.
— Então agora eu sou seu namorado? — Aquela pergunta me pegou
desprevenida.
— Não gostou do que eu disse? Ficou irritado? Talvez eu não devia
ter apressado as coisas e...
— Eu não fiquei com raiva, Freya. — Ele colocou as mãos no bolso
da calça jeans. — Na verdade, gostei de ouvir você dizendo aquilo.
— Gostou? — Arqueei uma sobrancelha. — Tem certeza?
— Bom, nós estamos morando sob o mesmo teto, dividindo a mesma
cama e agora começamos a transar igual dois coelhos. Acho que podemos
considerar que somos namorados. O que acha?
— Se isso foi um pedido de namoro eu com certeza irei aceitar.
Bear se ajoelhou no chão para que o seu rosto ficasse na mesma altura
do meu.
— Sim, isso foi um pedido, Freya. — Ele apoiou uma mão na minha
coxa, que estava coberta pelo edredom de lã. — Desculpe se não pareceu
muito romântico, ainda estou reaprendendo a lidar com essas coisas e... —
Não esperei que ele terminasse de falar, apenas puxei seu rosto para perto e
o beijei.
Eu queria que Bear soubesse o quanto o seu pedido me deixou feliz e
não havia nada melhor para demonstrar isso do que um beijo ardente e
cheio de paixão. A felicidade que eu sentia naquele momento era tão grande
que o meu coração acelerado parecia estar prestes a saltar para fora do
peito. Finalmente, o conto de fadas que eu tanto sonhei estava se tornando
realidade.
CAPÍTULO 23

Dois meses se passaram desde que resolvi me aventurar na montanha


e acabei vindo parar nos braços de Bear. O meu tornozelo se recuperou
perfeitamente e fazia algumas semanas que eu conseguia andar sem o
auxílio das muletas.
Eu não precisava mais da ajuda de Bear para ir ao banheiro, mas
ainda arranjava desculpas para que ele me desse banho na maioria das vezes
— eu gostava de sentir suas mãos fortes passeando pelo meu corpo
molhado. Era excitante e nós sempre acabávamos na cama, ou no sofá, ou
na varanda, ou em qualquer outro canto da casa que fosse possível transar.
Bear e eu não nos largávamos, éramos como unha e carne. A cada dia
que passava a minha conexão com ele aumentava e eu me sentia mais
apaixonada. O único momento do dia que não passávamos juntos era
quando ele precisava mexer com a madeira. Então, eu aproveitava esse
tempo para pintar.
A cabana ficou viva e alegre depois que dei um toque a mais na
decoração pendurando meus quadros e espalhando alguns arranjos de flores
pelos cômodos. O lugar ganhou um toque feminino e Bear não parecia se
importar com as flores espalhadas pela casa e nem quando eu o chamava
carinhosamente de ursinho. Quem poderia imaginar que o grandalhão
ranzinza tinha o coração tão mole?
Sempre que eu saía para explorar o terreno lá fora, Bear não me
deixava ir muito longe com medo de que eu pudesse me acidentar ou
encontrar algum animal perigoso na montanha. Na maioria das vezes ele
costumava me acompanhar e fazia questão de trazer o seu machado. Eu me
sentia tensa com todo o terror que o homem colocava na montanha, mas
felizmente nunca nos deparamos com nenhum predador.
Acabamos criando um hábito de fazer caminhadas matinais em dias
que não estavam tão frios. Era quando eu parava para colher flores ou fazer
esboços de paisagens para as pinturas.
Hati ficou mais apegado a mim e agora deixava de acompanhar Bear
para passar o tempo inteiro comigo. Até mesmo quando o seu dono saía
para cortar lenha na floresta o cachorro preferia ficar deitado
preguiçosamente ao meu lado, enquanto eu fazia as minhas pinturas. Criei
um grande afeto pelo animal e às vezes Bear até fazia piadinhas sobre Hati
ter trocado ele por mim.
Hoje eu me sentia animada e um tanto ansiosa, pois iria descer até a
vila pela primeira vez depois de passar os últimos dois meses nessa
montanha vivendo um conto de fadas com o meu loirão gostoso. Bear tinha
uma grande pilha de lenha na floresta esperando para ser entregue e eu
precisava ir até a mercearia ver se Sven vendeu todos os quadros, pegar o
meu dinheiro e também deixar à venda as novas pinturas que fiz em meu
período aqui na cabana.
Apesar de todo o tempo que passou, eu sequer me importava em dar
alguma satisfação sobre o meu sumiço. A essa altura, Havengreen inteira já
sabia que eu estava namorando o lenhador da vila, não havia razão para
explicar o motivo da minha ausência nos últimos meses.
Descer a montanha foi mais difícil do que subir, mas Bear
permaneceu o tempo inteiro ao meu lado, oferecendo apoio e me segurando
nas horas em que eu escorregava. Depois de longos 40 minutos de
caminhada, chegamos na floresta que ficava aos pés da montanha e eu vi a
caminhonete que estava caindo aos pedaços com uma grande quantidade de
lenha na carroceria. Não acredito!
— Esta lata velha é sua? — perguntei surpresa, meus olhos se
desviavam entre Bear e o carro.
Minha pergunta foi respondia quando Hati — que nos seguiu até aqui
— ficou de pé nas patas traseiras e raspou a porta do carona, querendo
entrar no veículo.
— Sim, a lata velha é minha — Bear respondeu com ironia e abriu a
porta para Hati.
O cachorro pulou dentro do carro e foi se acomodando no banco do
carona. Já vi que terei que dividir espaço com ele durante a viagem.
— Não achou que um lenhador humilde que mora na montanha
tivesse uma Ferrari, achou?
— Na verdade, pensei que você nem tinha carro.
— Como eu entregaria a lenha se não tivesse um carro? — Arqueou
uma sobrancelha.
— Não sei. — Dei de ombros. — Talvez em um trenó ou... com os
braços.
Bear deu uma risada.
— Sou forte, mas nem tanto.
— Então você corta lenha aqui na floresta para vender e a lenha que
corta lá na cabana é apenas para o seu uso pessoal?
Ele assentiu e gesticulou para que eu subisse no veículo.
Quando entrei, Hati foi para o banco do motorista e esperou que eu
me acomodasse no assento, depois veio até mim e se sentou no meu colo.
Levei um tempo para me acostumar com o peso do cachorro e os pelos que
ficaram em meu campo de visão, mas no fim consegui.
Bear fechou a porta e foi para o outro lado. Ele entrou no carro e se
sentou atrás do volante. Não fiquei surpresa quando o homem girou a chave
e o carro não ligou.
— Essa parte demora um pouquinho. — Bear me direcionou um
sorriso sem graça.
Ele continuou tentando dar partida no motor e, na décima tentativa, o
carro finalmente começou a andar, deixando uma nuvem de fumaça para
trás enquanto seguia pela estrada na floresta em direção à vila.
— Bear, eu tenho uma caminhonete mais nova. Posso te emprestar
para fazer as entregas, se você quiser — ofereci, enquanto cobria o nariz
para amenizar o cheiro de gasolina queimada que pairava no ar.
— Eu agradeço, mas não precisa. Consigo me virar com essa aqui. —
Ele deu um tapa no painel empoeirado do carro.
— Essa caminhonete deve ser mais velha que você. Quem foi que te
vendeu essa coisa? Devia pegar seu dinheiro de volta.
— Para falar a verdade, ela era do meu tio. Fiquei com ela quando ele
morreu.
— Oh, eu sinto muito... não queria falar mal do carro do seu falecido
tio.
— Não tem problema, o meu tio era um cuzão — disparou.
Arqueei as sobrancelhas. Eu pensei em perguntar mais a respeito, mas
Bear ficou com uma expressão tensa no rosto e eu senti que a conversa o
deixou desconfortável. Ficou claro que ele não gostava do tio. Decidi ficar
quieta e não tocar mais no assunto. Passei o resto da viagem em silêncio
aproveitando a paisagem com Hati, que colocou sua cabeça na janela para
pegar o ar fresco da manhã.
Bear me deixou em frente à padaria e disse que sairia com o carro
pelas casas para entregar lenha aos moradores que fizeram suas
encomendas. Peguei na carroceria a minha bolsa sustentável onde estavam
quatro pinturas em tamanho mediano e me despedi dele com um selinho.
Hati desceu da caminhonete para vir comigo, deixando o seu dono sozinho.
Bear acenou para mim e seguiu o seu rumo pela rua de
paralelepípedos, deixando um grande rastro de fumaça para trás. Fui
obrigada a tapar meu nariz enquanto observava ele indo embora. Será que
aquela coisa é movida a carvão?
Quando o carro velho desapareceu na esquina, caminhei até a
mercearia de Sven que ficava alguns metros à frente. É bom estar de volta à
vila depois de tanto tempo. Mesmo com toda a paz que havia na montanha e
a paisagem verde de tirar o fôlego, eu senti falta da arquitetura nórdica e
aconchegante das casas de Havengreen.
Quando abri a porta da mercearia, um sino tocou anunciando a minha
presença. Sven estava atrás do balcão mexendo no celular e percebi que ele
torceu um pouco a cara quando me viu. Estranhei aquele comportamento,
mas decidi ignorar e fui até o homem. Hati me seguiu sem protestar.
Coloquei a bolsa com meus quadros novos sobre o balcão e suspirei
para chamar a sua atenção.
— Olha só quem apareceu. — Ele deixou o celular de lado para me
analisar de cima a baixo, seu tom de voz não estava muito contente. —
Vendi todos os seus quadros no mês passado.
— Que boa notícia. — Sorri. — Eu trouxe mais quatro.
— Só quatro? — Sven estranhou. — Ficou tanto tempo sem aparecer
que eu pensei que você me traria uma exposição completa.
Eu apenas sorri, um pouco sem graça.
Sempre que Bear descia até a montanha, eu pedia que ele pegasse
mais telas na minha casa. Pintei muitos quadros nas semanas que passaram,
mas a maioria deles tinha a ver com Bear, Hati ou a cabana na montanha,
então achei melhor não os colocar à venda porque tinham muito valor
sentimental. No fim, só fiz quatro pinturas que considerei boas para a
venda.
— É verdade o que estão dizendo? — Sven cruzou os braços diante
do peito. — Você está mesmo morando com o lenhador na montanha?
— Sim. Eu estou — respondi, um pouco cautelosa.
Sven estava com uma expressão descontente, como se tivesse bebido
leite azedo no café da manhã.
— Aquele homem é louco, Freya.
— O quê? — Fiquei surpresa com o que ouvi. — O Bear não é louco,
Sven... tenho certeza que você está enganado.
— A única pessoa que está se enganando aqui é você. Por que acha
que ele não quer ficar perto de ninguém?
— Você não o conhece como eu...
— Tenho certeza que não — ele me interrompeu, com ironia.
O ignorei e prossegui com a minha defesa:
— Bear é um homem bom, ele apenas não gosta muito de socializar
com as outras pessoas.
— Tanto faz, ele não é flor que se cheire — bufou, irritado.
Eu fiquei em silêncio, não sabia o que responder. Não esperava que
Sven tivesse uma reação dessas ao descobrir sobre o meu relacionamento
com Bear. Será que mais alguém na vila está descontente assim? Será que
nem todos aqui gostam do Bear?
Sven passou um tempo com o olhar perdido, imerso em seus
pensamentos. Quando ele voltou à realidade, parecia mais calmo e a sua
expressão de desgosto havia desaparecido.
— Aqui está o dinheiro dos quadros que você vendeu — mudou de
assunto, enquanto abria a caixa registradora e me entregava um bolo de
notas que estavam presas por um elástico.
Eu me sentia tão confusa que não contei o dinheiro, apenas guardei no
bolso do meu casaco e agradeci com um pequeno sorriso.
— Você trouxe mais quadros, não trouxe? — Sven abriu a minha
bolsa que estava sobre o balcão e tirou de lá uma pintura. Era uma linda
paisagem da vista de Havengreen do alto da montanha. — Seus quadros são
lindos. Você podia aumentar o preço, tenho certeza que as pessoas ainda
continuariam comprando — sugeriu, enquanto admirava a pintura.
— O preço que eu deixei está ótimo — recusei a oferta. — Não
precisa aumentar.
— Como quiser. — Sorriu e deixou o quadro sobre o balcão. Agora
que a sua irritação passou, ele parecia o mesmo de antes.
Fiquei me questionando se a reação que Sven teve ao saber do meu
namoro estava relacionada aquela parte do passado que Bear ainda não se
sentia pronto para me contar. Será que Sven está envolvido nessa história?
Os dois já tiveram alguma rivalidade?
— Ei, Freya? — Sven chamou a minha atenção.
Quando o encarei, percebi que ele estava me oferecendo uma
embalagem de bolinho recheado.
Minha barriga roncou e eu acabei aceitando de bom grado.
— Obrigada. — Sorri e abri a embalagem.
— Não me agradeça. É só uma pequena cortesia. — Ele piscou para
mim.
Ouvi Hati rosnar e desviei minha atenção para o cachorro, ele olhava
para Sven e não parecia muito contente. Afaguei sua cabeça para que se
acalmasse e comi o bolinho. Quando terminei, olhei para o relógio que
ficava atrás do balcão e percebi que fazia quase uma hora que Bear me
deixou em frente à padaria. Logo ele iria retornar, então achei melhor me
despedir de Sven.
— Bom, eu já vou indo. — Acenei para o homem atrás do balcão e
caminhei até a saída, fazendo sinal para que Hati me seguisse.
— Espera, Freya — Sven chamou, antes que eu pudesse abrir a porta.
Virei meu rosto para encará-lo. — Quando vamos nos ver outra vez?
— Eu não sei — admiti. — Talvez, quando Bear descer a montanha
de novo. Virei com ele e trarei mais quadros.
O homem fechou a cara quando terminei de falar.
— Vai ficar morando naquela montanha agora? E a sua casa aqui na
vila? — Ele saiu de trás do balcão e veio até mim. Sven só não se
aproximou muito porque Hati, que estava ao meu lado, começou a rosnar
para ele.
— Ninguém invade casas por aqui, então ela está segura. — Dei de
ombros. — Estou gostando de passar um tempo com o Bear.
Sven concordou à contragosto e colocou uma mão no bolso frontal da
calça.
— Bom, eu queria saber se... — engoliu em seco — você aceitaria ir
até a taverna comigo mais tarde. Podemos beber alguma coisa ou apenas
passar um tempo juntos colocando a conversa em dia.
Arqueei uma sobrancelha. Eu não era ingênua e percebi o interesse de
Sven no instante em que ele fez o convite. Fiquei chocada com a sua
ousadia de me chamar para sair mesmo sabendo que eu estava
comprometida. Para ser sincera, mesmo que eu não estivesse com Bear,
ainda assim eu não iria aceitar. Sven era legal, mas eu não sentia nenhum
interesse amoroso por ele, o via apenas como um amigo.
— Sven, eu agradeço o convite, mas não vou aceitar — respondi,
tentando manter um tom amigável. — Eu estou com o Bear... você e
Havengreen inteira sabem disso. Se alguém me visse saindo sozinha com
você não seria muito bom.
Sven ficou descontente com a minha resposta.
— Freya, aquele lenhador é louco! Sempre que o vejo ele me olha
como se quisesse me matar.
— O Bear olha assim para todo mundo — argumentei.
É claro que eu era uma exceção. Bear jamais olhou com ódio para
mim — a não ser naquela vez que ele tentou me expulsar da montanha, mas
isso são águas passadas.
— Só estou tentando te fazer perceber que — ele tocou o meu ombro
— você merece coisa melhor.
Oh, céus... e Sven acha que ele é a coisa melhor?
— Eu já vou. — Tirei sua mão do meu ombro e abri a porta da loja.
Quando saí para a calçada, Hati me seguiu sem hesitar.
— Só estou falando para escolher melhor as suas companhias.
Cuidado para não se magoar no futuro. — Ele cruzou os braços diante do
peito.
— Tchau, Sven. — Fechei a porta e o deixei sozinho lá dentro.
Segui o meu caminho, fazendo o possível para esquecer o que
aconteceu. Hati andava à minha frente e eu mantive os olhos fixos no
cachorro por um tempo. Quando ergui meu olhar, vi a caminhonete de Bear
estacionada em frente à padaria, no mesmo lugar que ele me deixou antes
de sair para fazer as entregas.
Bear estava do lado de fora do carro, recostado no capô com os
braços cruzados diante do peito e me encarava fixamente. Mesmo à
distância, pude ver que o seu rosto estava irritado. Eu engoli em seco. Um
mal pressentimento surgiu em meu peito, mas ignorei a sensação e caminhei
em passos firmes até o meu namorado.
CAPÍTULO 24

— Oi, ursinho. Como foram as entregas? — Sorri para o homem que


ainda me encarava com uma expressão ranzinza. — Aconteceu alguma
coisa?
Bear não me respondeu, ele apenas caminhou em silêncio até a porta
do carona e a abriu. Entendi que era para eu entrar no veículo. Quando me
sentei no banco da caminhonete, Hati entrou e se acomodou no meu colo.
Bear fechou a porta e foi até o lado do motorista.
Fiquei em silêncio enquanto tentava repassar os últimos
acontecimentos. Eu não me lembrava de nada que pudesse ter deixado Bear
de mau humor. Será que aconteceu algo enquanto ele entregava lenha?
Talvez alguém não o pagou ou houve algum desentendimento com um
cliente?
Mesmo quando Bear ligou a caminhonete e começou a dirigir para
fora da vila, ele se manteve irritado e com os olhos fixos na estrada. Passei
os próximos minutos quieta com os meus pensamentos, enquanto acariciava
distraidamente a cabeça de Hati.
Quando chegamos na estrada da floresta, eu me sentia tão
incomodada com o silêncio entre nós que resolvi me manifestar.
— Aconteceu alguma coisa, Bear? Por que está com essa cara?
Ele suspirou e apertou o volante.
— O que você estava fazendo conversando com o dono da mercearia?
— Ele me encarou com uma expressão de descontentamento.
Fiquei surpresa com a pergunta. Foi isso que o incomodou?
— Sven é meu amigo — expliquei.
Bear suspirou e voltou seu olhar para a estrada à nossa frente. Notei
que o aperto da sua mão no volante ficou mais forte e a tensão que saía do
seu corpo começou a me afetar.
Eu entendi que Bear estava com ciúmes e comecei a me questionar
sobre o passado que ele tinha com Sven. Os dois não se davam bem — isso
ficou claro quando Sven começou a falar mal do meu namorado mais cedo
—, o que eu não conseguia entender era o motivo da rivalidade.
Pensei em perguntar sobre o assunto, mas Bear estava tão tenso e
descontente que eu decidi que o melhor a ser feito naquele momento seria
acalmá-lo. Meu namorado estava com ciúmes e eu precisava fazê-lo
entender que não havia razão para se preocupar com Sven.
— Ei, ursinho, não fique com raiva — chamei a sua atenção. — Não
importa quantos amigos eu tenha, o meu coração pertence somente ao
lenhador gostosão que se parece com o meu personagem preferido. Por que
acha que eu iria querer outra pessoa?
— Tenho medo de te perder, Freya — confessou, desviando seu olhar
até o meu.
— Eu não vou te deixar — prometi com sinceridade. — Você é o meu
ursinho. — Em uma tentativa de deixar a conversa mais divertida, estendi
minha mão e baguncei o topo do seu cabelo.
Bear sorriu e tirou uma mão do volante para segurar o meu pulso,
seus olhos desviavam entre mim e a estrada quando ele plantou um beijo
demorado no dorso da minha mão. Fiquei aliviada ao ver que o meu
namorado estava mais calmo.
Durante o resto do caminho, deixei minha mão repousada sobre a
coxa de Bear enquanto a outra acariciava a cabeça de Hati. Esses dois
conquistaram o meu coração de um jeito que eu não sabia explicar. Estar
com eles me deixava feliz, eu me sentia segura e amada.
— Você fica me chamando de ursinho... vou te mostrar já, já quem é
o ursinho — ele disse, ao estacionar a lata velha no fim da estrada ao pé da
montanha.
Arqueei uma sobrancelha, me perguntando o que aquilo significava.
Bear desceu da caminhonete e veio até o meu lado para abrir a porta.
Hati pulou do carro antes de mim, ele estava animado e pegou um graveto
para brincar, deitando-se em uma pilha de folhas secas a alguns metros do
veículo.
A vegetação outonal estava mais presente nessa altura da estação e a
maior parte das árvores da floresta exibiam tons de laranja, vermelho e
amarelo. As folhas secas espalhadas pelo chão possuíam uma coloração
amarronzada que se confundia com a cor da terra. Não consegui deixar de
pensar que seria uma ótima paisagem para pintura.
Com aquilo em mente, puxei o celular do bolso da minha calça jeans
e tirei uma foto para usar como referência mais tarde. Bear acabou
buscando o meu carregador em outra das suas visitas à vila e agora eu
conseguia usar o telefone para falar com a minha família e mandar notícias
— embora o sinal na montanha fosse péssimo nos dias de chuva.
Enquanto eu analisava a foto que tirei, senti as mãos de Bear
segurarem o meu ombro. Guardei o celular no bolso do casaco e me virei
para olhar o meu namorado. Ele me encarava de um jeito intenso que fez o
meu ventre estremecer.
— Sabe, eu fiquei curioso e andei lendo alguns trechos de
Desire&Seduction enquanto você dormia — confessou, em um tom
malicioso. — O que você acha de reproduzirmos a cena da página 122?
Arregalei os olhos.
— Sexo na floresta? — indaguei, com uma certa empolgação. Aquela
era uma das minhas cenas preferidas e foi a mesma que Bear leu no dia em
que pegou o livro pela primeira vez.
Ele concordou e eu sorri.
— Mas faremos do nosso jeito. — Bear colocou as mãos ao redor da
minha cintura. — Não vou te colocar contra a árvore, vou te foder bem
aqui. Você vai gozar no meu pau, encostada na minha caminhonete.
Minha boceta doeu quando imaginei a cena.
Mordi os lábios e olhei ao meu redor para ter certeza de que
estávamos sozinhos. Não havia ninguém ali, a não ser Hati, que ainda
estava distraído brincando com o graveto a alguns metros de distância.
Quando voltei meu olhar para Bear, ele me empurrou contra o carro e me
beijou. Nossas línguas se encontraram e eu senti o meu coração derreter.
Com uma mão ele segurou a minha nuca e com a outra puxou a
minha cintura para que eu ficasse mais perto do seu corpo. Sua língua se
apossava da minha boca, explorando e tomando cada centímetro para si.
Não fiquei surpresa quando senti um volume rígido roçando em minha
barriga, Bear parecia um animal faminto quando o assunto era sexo. Não
importava o lugar ou o que estávamos fazendo, se a vontade batesse e
estivéssemos sozinhos, ele tirava as minhas roupas e entrava bem fundo no
meu corpo.
Gemi baixinho contra a sua boca e enterrei os dedos em seu cabelo.
Pouco me importava se estávamos na floresta ao ar livre, eu só queria sentir
o pau desse homem entrando em mim até que eu alcançasse o orgasmo.
Enquanto nos beijávamos avidamente e as mãos de Bear passeavam
pelo meu corpo, explorando cada curva de um jeito possessivo, resolvi
deixar claro o que eu queria. Com as mãos, empurrei a sua jaqueta para trás
e ele me ajudou a tirá-la do seu corpo.
Bear fez uma pausa no beijo para retomar o fôlego e enterrou o rosto
em meu pescoço, espalhando uma trilha de beijos e pequenas mordidas até
a minha mandíbula. Eu gemi e me apertei contra o seu corpo, puxando o
homem para mim de um jeito desesperado.
Ele levou as mãos até o cós da minha calça e abriu o primeiro botão,
depois deslizou o zíper para baixo e então puxou o tecido jeans e a calcinha
pelas minhas pernas até chegar na altura dos meus tornozelos. Não consegui
tirar as roupas, pois estava usando minhas botas de caminhada, então acabei
com a calça presa aos meus pés — o que limitou parte dos meus
movimentos.
Minha boceta estava exposta e não demorou muito até eu sentir o
toque de Bear naquela região sensível. Ele manteve o seu olhar fixo no meu
rosto enquanto me tocava de maneira suave e provocante. Bear esfregava a
sua mão lentamente em minhas dobras, indo até minha abertura molhada e
espalhando a umidade por toda a minha boceta até chegar ao clitóris.
Eu queria abrir mais as minhas pernas, mas não consegui por causa da
calça em meu tornozelo, então apenas me agarrei nos braços dele e comecei
a gemer enquanto o seu dedo provocava o meu ponto inchado e sensível.
Bear sorria com satisfação enquanto me via ofegar e me contorcer de
prazer com as sensações que ele estava me causando. Eu estava prestes a
gozar quando ele parou de me estimular e abriu a sua calça, colocando o seu
membro para fora.
Meus olhos se fixaram no seu pau e eu o segurei com uma das mãos.
Bear ofegou e eu comecei a masturbá-lo lentamente, assim como ele fez
comigo. Eu sorria enquanto observava o homem imerso em seu prazer,
lançando a cabeça para trás e inclinado o quadril para mais perto do meu
toque. Quando Bear estava quase alcançando o êxtase, encerrei os
movimentos e me inclinei para sussurrar em seu ouvido.
— Eu quero que me leve à loucura, meu lenhador fortão. —
Mordisquei o lóbulo da sua orelha e me afastei.
Quando encarei o seu rosto, percebi o brilho intenso de desejo e
luxúria que havia em seu olhar. Bear sorriu lascivamente para mim, segurou
em meus ombros e me virou. Ele me fez debruçar sobre o capô da
caminhonete até que o meu rosto ficasse colado na lataria gelada.
Bear segurou minhas mãos e as manteve atrás do meu corpo, deu um
tapa em minha bunda e me penetrou com um movimento duro. Gemi
enquanto o seu pau preenchia centímetro por centímetro da minha boceta.
Eu adorava senti-lo dentro de mim.
Sem avisar, ele começou a mover o quadril com intensidade, fazendo
seu membro grosso entrar e sair do meu corpo com rapidez. Uma das suas
mãos mantinha os meus pulsos para trás, enquanto a outra segurava firme
em meu quadril.
As investidas ficaram mais fortes e a caminhonete começou a
balançar no mesmo ritmo dos nossos corpos. Eu gemia e rebolava contra o
seu pau, querendo que Bear enfiasse em mim até o último centímetro. O
lenhador me fodia com força, ofegando a cada investida, tão imerso no
prazer quanto eu.
No fundo, eu sentia uma leve preocupação que alguém da vila
resolvesse perambular pela floresta e nos visse ali, mas estranhamente a
ideia de ser flagrada enquanto Bear me tomava como sua me deixou mais
excitada. O perigo daquele momento foi como gasolina no fogo que
queimava entre nós.
Bear deu outro tapa em minha bunda e rosnou quando entrou no meu
corpo com mais força. Gemi e contraí minhas mãos em um ato involuntário,
mas ele não as soltou. Bear permaneceu me segurando enquanto estocava,
mantendo-me presa, deixando que o meu corpo ficasse completamente ao
seu dispor.
— Sou o único homem que vai te comer daqui para frente — ele
estava rouco e ofegante. — O único. Você me entendeu?
— Sim — respondi com um gemido agudo. Foi impossível disfarçar
o prazer que eu sentia.
— Só eu posso foder essa boceta gostosa. — Ele soltou minhas mãos
para segurar o outro lado da minha cintura. — Porra... esse rabo gostoso é
todinho meu.
Bear puxou o meu quadril para si e começou a me penetrar de um
jeito rude e bruto, sem pena. Cada vez que ele investia contra mim um novo
grito saía da minha garganta e ecoava pela floresta. Eu ofegava enquanto
tentava puxar o ar para os pulmões e manter o controle da minha respiração.
Esse homem estava acabando comigo.
O prazer que eu sentia foi aumentando até me consumir por inteiro.
Minha boceta se apertou ao redor do pau dele e um orgasmo intenso me
atingiu. Bear rosnou atrás de mim e me deu outro tapa, ele seguiu com as
investidas fortes, enquanto espasmos de prazer varriam o meu corpo.
Ele ficou tenso e saiu de mim com rapidez, arfando de um jeito
desesperado. Seu pau bateu em minha nádega esquerda e um líquido quente
se espalhou em minha pele. Bear rosnou e me deu outro tapa. Mais sêmen
saiu e começou a escorrer pela minha bunda, descendo em direção à coxa e
depois para as pernas.
Fechei os olhos e respirei fundo. Me permiti descansar por alguns
segundos enquanto meus batimentos e a minha respiração voltavam ao
normal. Bear ainda ofegava atrás de mim, tentando recuperar o fôlego
depois daquele momento intenso que compartilhamos.
Sorri comigo mesma enquanto pensava na sorte que tive. Encontrei
um homem idêntico ao personagem do meu livro preferido e ele me faz
sentir a mulher mais amada e desejada do mundo. Estou vivendo o meu
próprio conto de fadas moderno e não quero voltar para a realidade.
Quando voltamos para a cabana, fui tomar um banho para tirar o suor
que se acumulou em meu corpo depois do nosso momento erótico na
floresta. Ao sair do banheiro, vi Bear parado na sala, encarando o quadro de
Hati que estava pendurado na parede. Meu peito se aqueceu. Não era a
primeira vez que eu o surpreendia admirando as minhas pinturas.
— Esses quadros deviam estar em uma galeria de arte, Freya —
balbuciou, distraído.
Eu sorri com o elogio, mas a ideia não soava nem um pouco atrativa
para mim.
— Não quero colocar minhas pinturas em uma exposição de arte —
divaguei, parando ao seu lado.
Bear finalmente deixou de olhar o quadro e me encarou, ele estava
surpreso.
— Por que não? Seria uma grande oportunidade.
— Eu já recebi alguns convites quando morava em Oslo, mas recusei
todos.
Ele arregalou os olhos.
— Você é louca, Freya.
— Apenas não é o meu sonho. — Dei de ombros. — Eu odiaria viver
na correria de pintar quadros rebuscados e viajar para acompanhar as
exposições ao redor do mundo. Só quero ter paz, morar em um lugar
acolhedor, pintar o que eu sentir vontade e vender minha arte para pessoas
comuns a um preço que elas possam pagar.
Bear pensou por um tempo e então assentiu em concordância.
— Já me sinto realizada aqui. As pessoas de Havengreen gostam do
meu trabalho e para mim, isso basta.
— Ainda assim, acho que você devia ter um lugar para deixar seus
quadros à mostra — opinou. — Terá mais clientes desse jeito do que apenas
pintando e levando para as pessoas que encomendaram.
Eu apenas lhe direcionei um sorriso amarelo. Não cheguei a contar
para Bear que eu pintava os quadros e os deixava à venda na mercearia.
Agora que eu descobri que ele e Sven tinham uma certa rivalidade, achei
melhor não mencionar — não queria estragar o bom humor que Bear
ganhou depois que transamos na floresta.
— Eu tive uma ideia — ele me afastou dos meus pensamentos. —
Estive pensando sobre isso nos últimos dias, mas agora eu finalmente me
decidi: vou reabrir a minha loja de esculturas na vila.
Arquejei com a notícia.
— É uma excelente ideia, Bear!
— É sim — ele sorriu e acariciou o meu rosto —, mas estou fazendo
isso por você.
— Por mim? — fiquei confusa.
Bear assentiu.
— Se eu reabrir a loja, você terá um lugar perfeito para deixar seus
quadros à mostra. Assim, todos os moradores de Havengreen poderão
admirar e comprar as suas obras de arte.
Eu sorri para ele, demonstrando que concordava com a ideia, mas foi
um sorriso que não chegou até os meus olhos.
Lembrei que para deixar os quadros à mostra na loja de Bear eu teria
que retirá-los da mercearia. Temi que isso pudesse me trazer problemas com
Sven — que já estava se comportando de maneira estranha depois de
descobrir que Bear e eu estávamos juntos. Só espero que eu não fique em
um beco sem saída por causa dessa situação.
CAPÍTULO 25

Uma semana se passou desde que eu decidi que iria reabrir a minha
loja. Freya e eu estávamos descendo até a vila todos os dias desde então,
para arrumar as coisas e deixar tudo pronto para o dia da inauguração.
Eu já não me sentia mais tão incomodado por voltar a conviver no
meio dos outros moradores de Havengreen. As lembranças ruins que eu
tinha meses atrás, pouco a pouco foram sendo substituídas por momentos
bons ao lado de Freya. Ela mudou minha vida para melhor.
A minha loja estava quase pronta para reabrir. Freya e eu passamos
três dias fazendo a limpeza do lugar e tirando toda a poeira que se
acumulou por lá nos últimos anos.
Hoje, eu estava transportando algumas ferramentas de trabalho que eu
iria precisar para voltar a fazer esculturas de madeira enquanto estivesse
tomando conta da loja. Como este era um trabalho que eu podia fazer
sozinho, deixei Freya na cabana da montanha pintando alguns quadros que
já seriam colocados para a venda quando a loja inaugurasse.
Eu estava voltando da padaria. Fui até lá para dizer à Sra. Ludwig que
a minha loja reabriria na próxima segunda. Agora, eu só precisava esperar
que ela e o delegado Müller se encarregassem de espalhar o boato pela vila.
Eu caminhava pela rua de paralelepípedos, com as mãos no bolso da
minha jaqueta verde-musgo, meu cabelo estava preso em um coque e um
vento frio soprava em meu pescoço naquela tarde nublada. Infelizmente, a
padaria ficava na mesma rua que a mercearia. Eu odiava passar por ali,
tanto que uma vez por mês pegava a minha caminhonete caindo aos
pedaços e ia comprar comida no mercado da cidade mais próxima, apenas
para não entrar na espelunca dos Herzog.
Bufei com irritação e caminhei apressadamente para passar o mais
rápido possível em frente à mercearia. Apesar da velocidade dos meus
passos, avistei pelo canto do olho uma pintura familiar na vitrine.
Olhei na direção da loja vi um dos quadros que Freya pintou, à mostra
na vitrine ao lado de mais três das suas pinturas. Franzi o cenho e me
aproximei. A cada passo que eu dava o meu coração ficava mais acelerado.
Quando parei em frente ao vidro, vi que os quadros estavam com etiquetas
de preços.
Como caralhos essas pinturas vieram parar aqui? Será que o
desgraçado do Sven comprou e estava revendendo? Ou será que os quadros
que Freya entregou na vila semana passada eram para cá? Que porra! Meu
sangue ferveu e antes que eu tivesse tempo de pensar com coerência, entrei
na mercearia enfurecido.
O sino da porta tocou, anunciando a minha chegada. Avistei o filho da
puta do Herzog caçula atrás do balcão, mexendo no celular. Ele ergueu o
olhar até mim e ficou visivelmente surpreso com a minha visita.
Caminhei em passos largos até o balcão, pronto para tirar satisfação
com o infeliz.
— Quem trouxe aqueles quadros que estão à venda na sua vitrine? —
exigi saber e não me preocupei em disfarçar a raiva em minha voz.
Sven Herzog arqueou as sobrancelhas, surpreso com o jeito que eu
falei.
— É a primeira vez que você entra aqui em cinco anos e já vem cheio
de marra? — o homem provocou.
Franzi o cenho.
— Quem trouxe os quadros? — desta vez, a minha voz saiu mais alta.
Sven não ficou afetado com a minha atitude, ao invés disso, ele sorriu
com deboche e me encarou de cima a baixo.
— Foi a nova pintora que se mudou para a vila — respondeu, com
ironia. — Provavelmente você conhece aquela gostosinha, já que ela está
dando para você...
— Filho da puta! — Puxei o homem pela gola da blusa e dei um soco
forte em seu rosto.
Ele arquejou e se soltou do meu aperto, cambaleando para trás e
levando as mãos até a boca. Quando ele as tirou, vi um corte em seu lábio
inferior e sangue escorrendo pelo seu queixo. Me senti satisfeito, mas a
minha mão ainda coçava para bater nele outra vez. Se eu estivesse com o
meu machado poderia arrancar a cabeça desse infeliz.
— Ficou doido? — Sven questionou, enquanto tentava conter o
sangramento.
— Se falar da minha mulher outra vez eu te mato! — Apontei um
dedo para ele. — Eu juro que te mato, Herzog!
O homem riu, apesar da boca ensanguentada.
Peguei uma lata de milho em conserva que estava na prateleira ao
meu lado e joguei na direção dele. Sven desviou, mas aquilo foi o suficiente
para dar o meu recado. Era melhor sair daqui antes que a minha raiva
ficasse maior e eu fizesse alguma besteira. Não poderei ficar com Freya se
eu for preso por assassinato.
Caminhei até o expositor da vitrine e tirei os três quadros dali,
ignorando os gritos de Sven ao fundo. Coloquei as pinturas de Freya
embaixo do braço e saí da mercearia.
— Isso não vai ficar assim, Bear! — ele gritou, mas não me dei ao
trabalho de olhar para trás.
A fúria queimava em minhas veias enquanto eu andava pela rua até a
entrada da vila onde deixei minha caminhonete estacionada. Eu pretendia
voltar para casa e ter uma conversa bem séria com Freya, ela tinha algumas
coisas para explicar.

Ao chegar em casa, vi Freya sentada no sofá pintando outra paisagem


da cachoeira, Hati estava deitado aos seus pés. O quadro era lindo — assim
como todos os outros que ela fez —, mas a raiva falou mais alto que
qualquer outro sentimento de admiração.
Fui até ela e coloquei no sofá os quadros que estavam na mercearia.
Ela desviou seu olhar para eles e depois para mim.
— O que é isso? — indagou, confusa.
Cruzei os braços diante do peito.
— Que porra os seus quadros estavam fazendo na mercearia do
Herzog? — exaltei-me.
Freya ficou um pouco assustada com o meu tom, mas respirou fundo
e se recompôs.
— Eu falei que Sven era meu amigo. Quando cheguei na vila, ele me
ofereceu o espaço da vitrine para deixar meus quadros à venda — tentou se
defender. — Eu iria tirá-los de lá depois que você reabrisse a sua loja.
— Aquele homem não é de confiança, Freya. A família inteira dele é
desequilibrada! — exclamei com irritação. — Não quero você envolvida
com ele! — Meus gritos acordaram Hati, que ficou assustado e correu para
trás do sofá.
Meu subconsciente me alertava que eu estava exagerando, mas eu não
conseguia evitar, era como se o resto do meu corpo estivesse em modo
automático. Eu só conseguia me lembrar que Sven era irmão do homem que
me tirou a sanidade ao roubar minha ex-noiva, Darlla. Hector Herzog sabia
que estávamos juntos e ainda assim a seduziu com presentes caros até que
ela me trocasse por ele. Depois de anos eu aceitei que Darlla era uma
interesseira e se me trocou era porque não me amava de verdade, mas isso
não me fez sentir menos raiva daquela família.
Eu não queria Freya perto de Sven, não depois do jeito que ele falou
dela hoje. Freya podia achar que eles tinham apenas uma amizade, mas o
filho da puta estava de olho nela. Eu fiquei com essa suspeita dias atrás
quando a vi sair da mercearia e pensei que fosse apenas uma paranoia, mas
hoje tive a confirmação que a minha intuição estava certa.
Sven queria a minha mulher e eu não podia deixar a situação se
repetir. Eu não aguentaria passar por tudo de novo, não com Freya. Ela me
salvou da escuridão, era a minha luz. Eu não podia correr o risco de perdê-
la.
— Seus quadros ficarão apenas na minha loja! — rosnei, irritado.
Freya me encarou com a expressão furiosa e se levantou do sofá. Ela
ficou de pé na minha frente, mas ainda assim era vários centímetros menor
que eu — precisei inclinar meu rosto para baixo para conseguir encará-la
nos olhos.
— Vai se foder, Bear! — ela gritou, me pegando de surpresa. — Você
não manda em mim. Vou deixar meus quadros onde eu quiser!
Fiquei sem ação naquele momento. Eu não esperava que Freya fosse
gritar comigo e discutir de volta.
Finalmente, percebi a merda que eu tinha feito. Se eu levasse a
discussão a diante, poderíamos dizer coisas da qual iríamos nos arrepender.
Senti vontade de arranjar um jeito para acabar com aquela briga, mas eu
não estava calmo o suficiente para engolir o meu orgulho e dizer que Freya
podia fazer o que quisesse, contanto que ficasse comigo. No fundo, eu tinha
medo que ela decidisse permanecer com a venda dos quadros na mercearia
apenas por vingança.
Freya e eu ficamos nos encarando em silêncio por um longo tempo,
com as respirações aceleradas e expressões irritadas no rosto. Como não
consegui encontrar outra solução para acalmar os nervos, dei meia volta e
saí da cabana em passos largos. Eu iria andar pela montanha e esfriar a
cabeça, só pretendia voltar depois que a minha raiva se dissipasse.

— Idiota — bufei irritada, enquanto olhava para a janela da cozinha.


Já estava escurecendo e Bear ainda não tinha voltado.
Fiquei com raiva pela crise de ciúmes que ele teve e há algumas horas
até desejei que o desgraçado morresse, mas à medida que a noite caía e o
meu namorado não voltava, a preocupação começou a crescer em meu
peito.
Eu estava sentada no sofá, acariciando Hati que se encontrava deitado
no assento ao meu lado, com a cabeça em meu colo. Passei a última meia
hora tentando me consolar mentalmente, pensando que Bear devia estar por
aí socando alguma árvore ou pedra para descontar a sua raiva.
Embora eu tentasse manter o pensamento positivo, também não
consegui deixar de pensar nos animais perigosos que viviam na montanha.
Nunca os vi, mas Bear sempre dizia que haviam lobos e ursos nessa região
e que eles apareciam para caçar no fim da tarde e à noite. Merda... eu não
estava falando sério quando desejei que ele morresse.
Uma pequena lágrima desceu pelo meu olho e eu a sequei com a
manga do meu casaco de lã. Bear podia se comportar como um homem das
cavernas algumas vezes, mas era o meu homem das cavernas. Não vou
conseguir viver sem ele...
Comecei a chorar em silêncio. A cada lágrima que descia, minha
preocupação ficava maior que a raiva. Não consegui me aguentar e levantei
do sofá. Hati me seguiu até a porta e eu saí na varanda para olhar ao redor e
ver se era possível enxergar Bear no horizonte.
Ouvi um barulho vindo de trás da casa e me assustei. Hati farejou o ar
e quando pensei que ele iria latir, o cachorro balançou a cauda alegremente
e correu na direção do som, fazendo festa. Um grande alívio me atingiu,
Bear estava chegando.
Eu nem precisava vê-lo para ter certeza de que era ele, Hati só reagia
assim quando o seu dono voltava para casa. Enxuguei minhas lágrimas e
respirei fundo. Pensei em seguir o cachorro e ir de encontro a Bear, mas
então voltei a me sentir irritada. Lembrei das palavras que ele disse mais
cedo e, mesmo que elas não doessem mais, eu ainda tinha o meu orgulho.
Entrei na cabana e me sentei no sofá novamente, tentando parecer
alheia à saída dele. Peguei o pincel e mesmo que a tinta da aquarela já
estivesse ficando endurecida pelas horas que passei sem pintar, comecei a
colorir de verde musgo uma área em branco da tela.
A porta se abriu e eu me controlei o máximo para não virar o rosto na
direção da entrada. Ouvi os passos pesados de Bear no piso de madeira da
cabana e alguns segundos depois a porta se fechou. Hati veio até mim e eu
afaguei a sua cabeça, me distraindo com o cachorro para não olhar na
direção do homem das cavernas.
— Estou em casa — Bear pigarreou para chamar a minha atenção.
Mordi a língua para conter minha vontade de falar e permaneci em
silêncio, como se não me importasse.
Bear suspirou e atravessou o meu campo de visão. Ele andou pelo
corredor e entrou no banheiro, deixando a porta aberta. Ouvi o som da água
caindo na banheira e eu percebi que ele estava se preparando para tomar
banho. Respirei fundo para permanecer no controle das minhas emoções e
cruzei as pernas. Não. Eu não irei até lá!
Fiquei tanto tempo com o olhar perdido no corredor que não me dei
conta dos minutos que se passaram. Bear saiu do banheiro com a calça preta
de moletom que ele usava para dormir, uma camisa de flanela aberta
revelando o peitoral forte e o cabelo molhado que ele secava com o auxílio
de uma toalha branca. Não consegui desviar meu rosto a tempo e ele
percebeu que eu o encarava.
Meu coração acelerou quando Bear caminhou até mim. Ele jogou a
toalha molhada nas costas do sofá e se sentou ao meu lado. O cheiro do seu
sabonete de lavanda perfumou o ar à nossa volta. Me remexi, inquieta.
Aquela era a primeira vez que brigávamos desde que começamos a namorar
e eu não sabia como reagir, não fazia ideia se Bear era do tipo orgulhoso,
que guardava rancor e não assumia a culpa. Será que teremos um segundo
round de discussões?
— Freya, me desculpe — falou, em alto e bom som.
Arregalei os olhos, deixando evidente a minha surpresa.
— Eu sinto muito por ter gritado e falado daquele jeito com você —
suspirou. — A verdade é que eu estava com ciúmes. Sei que isso não
justifica o meu modo de agir, mas...
— Bear, se quisermos ter um relacionamento saudável, você precisa
ser menos mandão e controlar a porra do ciúme! — exasperei-me.
— Eu sei, mas não consigo baixar a guarda quando o assunto é você.
— Bear encolheu seus ombros largos e ficou perdido em pensamentos. —
Não vou permitir que roubem a minha mulher de novo.
Arqueei uma sobrancelha, não deixei de notar a informação escondida
em sua última frase.
— De novo? Como assim de novo? — indaguei, chocada.
Bear ficou tenso e suspirou — acho que ele nem percebeu que deixou
aquilo escapar.
— É uma longa história... do passado — foi tudo o que ele disse.
Eu fiquei inquieta, a minha raiva acabou dando lugar para a
curiosidade. Queria saber mais a respeito dessa história, mas Bear não
parecia à vontade para falar sobre o assunto.
— Essa história faz parte das coisas que você não está preparado para
me contar? — tentei adivinhar o óbvio.
Bear apenas concordou em silêncio. Seus olhos se desviaram para
Hati, que estava deitado no meio da sala.
— Eu quero muito contar, Freya, mas quando penso nesse assunto,
perco o controle das minhas emoções. Viu como fiquei mais cedo?
— Você precisa de terapia — comentei, enquanto afagava o seu
ombro. — Ouvi dizer que tem um psicólogo muito bom lá no hospital, você
podia marcar uma consulta...
— Não — ele recusou a ideia imediatamente. — Esqueça isso, Freya.
— Mas...
— Não vou me deitar na porra de um sofá e contar a minha vida para
um desconhecido. Sem chance.
— Só acho que isso poderia te ajudar a lidar com essas situações que
você tenta esquecer — opinei. — Sou sua namorada e tem um milhão de
coisas que não sei a seu respeito.
— Vou contar quando eu me sentir pronto. — Bear ficou tenso e
esfregou as têmporas. — Por favor, Freya, não me pressione. Minha mente
sempre está uma zona.
Eu estava curiosa, queria saber o que ele não estava me contando,
mas ficou claro que eu não conseguiria respostas naquele momento. Bear
era um homem com traumas e não se pode exigir que uma pessoa
traumatizada fale sobre o que a magoou, contra a sua vontade. Não há nada
que eu possa fazer além de ser paciente.
Em uma tentativa de confortá-lo, deitei minha cabeça em seu ombro e
segurei a sua mão. Bear relaxou com o meu toque.
— Me perdoe, Freya — ele se desculpou outra vez e beijou o topo da
minha cabeça. — Me perdoe por não conseguir ser o namorado perfeito, o
homem que você merece.
Levantei minha cabeça do seu ombro para encará-lo. Eu percebi em
seu olhar o quanto ele se sentia culpado por achar que não era bom o
suficiente para mim.
Sei que todas as pessoas tem falhas — algumas mais do que outras.
Caberia a mim decidir se queria conviver com as falhas de Bear ou se elas
seriam motivo para que eu o deixasse. Eu sentia em meu coração que não
era hora de desistir dele, na verdade, eu o amava e queria dizer isso em voz
alta. Porra, eu amo o Bear mesmo com esse jeito de homem das cavernas
que ele tem. Ah, que se dane!
— Ninguém é perfeito, Bear. — Acariciei o seu rosto, sentindo sua
barba espetar a minha mão. — Eu amo você e também amo as suas falhas...,
mas não vou mentir, tem horas que você é um pé no saco!
Ele arregalou os olhos e, em seguida sorriu.
— Porra, eu também te amo, Freya. — Sua voz, que antes era tensa e
melancólica, agora estava mais animada. — E se sou um pé no saco
algumas vezes é porque tenho medo de te perder.
— Você não vai me perder — prometi.
Bear segurou o meu rosto entre as suas mãos e me puxou para perto,
me dando um beijo lento e cálido que selou nossas palavras de amor. Seu
gesto fez desaparecer qualquer vestígio de raiva que pudesse ter restado em
meu coração e tudo que eu consegui sentir naquele momento foi a paixão.
CAPÍTULO 26

Era domingo. Bear e eu estávamos na loja, organizando os últimos


detalhes para a inauguração que aconteceria no dia seguinte. Embora já
estivéssemos perto do fim do outono, o tempo hoje não estava muito frio e
eu usava apenas uma blusa branca de botões e manga comprida,
acompanhada por uma legging preta e sapatilhas sem meia.
Eu estava no balcão, terminando de instalar a máquina de cartões para
que ninguém aparecesse por aqui com a desculpa de que pagaria as compras
na próxima semana. Atrás de mim havia uma escada de madeira em espiral
que levava até o andar de cima da loja. Bear estava lá organizando as
minhas telas de pintura e os pedaços de madeira que ele usaria para fazer
suas esculturas.
Fiquei a semana inteira pensando que seria uma boa ideia se Bear
trouxesse algumas coisas pessoais para morar no andar de cima — ao
menos ele não precisaria subir e descer a montanha todos os dias para
cuidar da loja. Não seria uma mudança permanente, Bear poderia dormir
aqui durante a semana e voltar para a montanha no sábado de manhã. E é
claro que eu ficaria por aqui também, fazendo companhia para ele.
Quando Bear desceu a escada, resolvi falar sobre o meu plano antes
que ele voltasse para o andar de cima com outra caixa de coisas para
organizar.
— Ei, ursinho, eu estava pensando em uma coisa... — chamei a sua
atenção.
Bear desistiu de ir até o canto em que estavam as caixas de papelão e
veio até mim, parando em frente ao balcão.
— Estou ouvindo, minha deusa.
— Será exaustivo descer a montanha todos os dias de manhã e
teremos que fechar a loja cedo se quisermos chegar em casa antes dos
animais saírem para caçar, então pensei que poderíamos dormir no andar de
cima da loja durante a semana. O que acha?
Bear negou com a cabeça, descartando a minha ideia sem ao menos
pensar a respeito. Fiquei surpresa com a sua resposta.
— A parte de cima da loja será apenas depósito — ele decidiu. —
Morei aqui por muito tempo desde que vim para Havengreen ficar sob os
cuidados do meu tio, não tenho boas lembranças.
Eu não sabia o que responder. Jamais imaginei que Bear tinha
lembranças ruins dessa loja. Será que ele morou aqui até decidir que iria se
isolar na montanha?
— Se você não quiser subir e descer a montanha todos os dias,
podemos ficar na sua casa — sugeriu, aproveitando para mudar de assunto.
— É claro, se estiver disposta a dividi-la comigo.
Concordei em silêncio.
Sim, Bear e eu poderíamos ficar de segunda à sexta na minha casa e
subir a montanha nos finais de semana para ficarmos a sós na calmaria da
natureza. Eu podia ter sugerido desde o início que fôssemos morar na minha
casa, mas pensei que ficar aqui na loja, onde era um lugar familiar para
Bear, seria melhor para que ele se adaptasse a viver aqui na vila novamente.
Parece que me enganei.
Não consegui esquecer o que Bear disse sobre ter lembranças ruins
daqui. Preciso saber o que aconteceu... espero que ele me conte.
— Bear — toquei a sua mão —, por que você tem lembranças ruins
desse lugar? O que aconteceu? Quer falar comigo sobre isso?
Ele hesitou por um momento, mas assentiu.
— Meus pais morreram em um acidente quando eu tinha três anos de
idade. — Ele suspirou e passou a mão pelo cabelo solto. — Até onde sei,
um caminhoneiro bêbado bateu no nosso carro. Eu estava no banco de trás
sentado na cadeirinha e saí apenas com alguns arranhões, mas a frente do
carro, onde os meus pais estavam, ficou destruída.
— Bear, eu sinto muito — tentei lhe confortar. Eu não fazia ideia que
o começo da sua vida tinha sido tão ruim. Há tanta coisa sobre o passado
dele que eu não sei...
— O irmão mais velho do meu pai era o familiar mais próximo, então
ele foi nomeado como o meu responsável legal e me trouxe para morar em
Havengreen — prosseguiu. — Ele era um homem muito sério e rígido, me
colocou para trabalhar desde cedo. Essa loja pertenceu a ele e nós
morávamos no andar de cima. Antes era uma carpintaria. Meu tio fazia
móveis de madeira... ele me ensinou tudo o que eu sei. — Bear ficou em
silêncio por um tempo, dava para ver em seu olhar o quão difícil era reviver
aquelas lembranças. — Quando o meu tio morreu, acabei transformando
esse lugar em uma loja de esculturas. Sempre gostei mais de esculpir do que
de fazer móveis, embora eu mesmo tenha feito os móveis da cabana e a
própria cabana.
Arregalei os olhos. Fiquei me perguntando como Bear conseguiu
fazer tudo aquilo sozinho, ele era um homem forte, mas ainda era só um.
Provavelmente, levou meses até ele terminar a construção da cabana.
— O meu tio não era uma pessoa fácil. Honestamente, fiquei aliviado
quando ele morreu — confessou.
Meu coração estava pesado, eu me sentia triste por Bear. Imagino o
quão difícil foi crescer sem os pais, com um tio mandão que o colocava
para trabalhar quando devia estar brincando. Nenhuma criança merece
passar por esse tipo de coisa.
— Não tinha ninguém com quem você podia contar? E os seus
amigos na escola?
— Eu não fui para a escola — admitiu. — Meu tio me ensinou o
básico em casa. Sei ler, escrever e fazer contas, mas isso foi tudo.
Céus...
— Você realmente não teve infância? — indaguei, perplexa com a
situação.
Agora eu entendia porque Bear relutava em falar sobre o seu passado,
devia doer muito lembrar de coisas tão ruins.
— Não, Freya, eu não tive infância — falou, com pesar. — Eu não
podia nem mesmo sair para brincar na rua com as outras crianças, ficava as
observando pela vitrine da loja e levava um puxão de orelha do meu tio
quando ele percebia que eu não estava trabalhando. Nunca brinquei de
pique-pega ou esconde-esconde.
Respirei fundo quando senti as lágrimas arderem em meus olhos. Era
difícil pensar que o homem que eu amava sofreu tanto. Que tipo de pessoa
sem coração priva uma criança de brincar, de crescer feliz e sem
preocupações?
A dor que eu sentia não se comparava com a que eu podia enxergar
nos olhos de Bear, falar daquelas lembranças o abalou mais do que ele
deixou transparecer. Seu olhar estava distante e sem esperança enquanto ele
relembrava o passado. Eu precisava fazer alguma coisa para trazê-lo de
volta ao presente, precisava mostrar a Bear que aquela dor ficou para trás.
Tenho que fazê-lo sorrir.
— Bear... — Afaguei a sua mão, esperando que aquilo lhe trouxesse
algum conforto. — Você quer brincar comigo?
Ele arqueou uma sobrancelha e seu rosto ganhou uma expressão
divertida. Parece que funcionou...
— Não somos mais crianças, Freya — respondeu com um meio
sorriso nos lábios.
— E quem disse que apenas as crianças podem brincar?
— Não foi isso que eu quis dizer... É só que esse tipo de coisa perde a
graça quando se é adulto.
Uma ideia passou pela minha cabeça. Se Bear não acha mais graça
em brincadeira de criança, então deixarei as coisas um pouco mais adultas.
Saí de trás do balcão e caminhei até a porta da loja para conferir se ela
estava trancada, depois fui até a vitrine de vidro e fechei a persiana que
instalamos no começo da semana. Isso nos dará privacidade. Quando me
virei de volta para Bear, notei que ele me encarava com um olhar curioso.
— Por que fechou a persiana, Freya? Ainda estamos no meio da tarde
e... — Ele parou de falar quando levei as mãos até a cintura da minha
legging preta e a deslizei pelas minhas pernas até tirá-la do corpo.
— Já que não gosta de brincadeira de criança, vamos brincar de uma
coisa mais adulta.
Desabotoei os três botões superiores da blusa e o meu sutiã de renda
lilás ficou à mostra, também tirei a calcinha e a joguei na direção de Bear.
Minha intimidade só não ficou exposta porque a blusa que eu usava era
grande o suficiente para cobrir até o meio das coxas.
— O que você tem em mente, Freya? — Bear deu um passo em
minha direção, mas eu fiz sinal para que ele parasse onde estava.
Tirei minhas sapatilhas e pisei descalça no chão de madeira.
— Vamos brincar de pique e fode. — Desabotoei os botões que
restaram em minha blusa e a tirei do meu corpo, agora eu estava apenas de
sutiã. — Eu vou correr e se você conseguir me pegar, você me fode onde
nós estivermos.
Bear ficou me encarando de cima a baixo com um olhar intenso e
cheio de desejo. Sinceramente, fiquei surpresa que o homem ainda não
estivesse babando.
— Pique e fode, é? — Um brilho malicioso surgiu em seus olhos e eu
fiquei satisfeita por saber que a tristeza que ele sentia foi embora.
Concordei com a cabeça e me preparei para correr.
— Um... dois... três... já! — Saí em disparada pela loja e Bear veio
logo atrás. Seu olhar estava faminto pelo meu corpo, até parecia um animal
durante a caça.
Eu corria em zigue-zague ou em círculos, fazendo o possível para
Bear não me alcançar. Em um momento, quando vi que ele estava quase
chegando até mim, tirei o sutiã e o joguei em sua direção. Minha peça de
roupa íntima acabou atingindo o rosto do homem, mas aquilo não o parou.
O interior do estabelecimento era grande, mas haviam algumas
esculturas espalhadas aqui e ali — o que acabou criando pequenos
obstáculos em meu caminho. Bear continuava correndo e eu gargalhava ao
ver seu empenho em tentar me pegar. Derrubamos algumas peças durante a
correria, mas não nos importamos, estávamos imersos demais naquela
brincadeira para pensar nos estragos que aconteciam pela loja.
Olhei sobre o ombro para ver a que distância Bear estava de mim,
mas acabei tropeçando em uma escultura que estava caída no chão. Meus
pés se embolaram e eu desequilibrei. Antes que o meu corpo atingisse o
chão, braços fortes me seguraram e eu soltei um gritinho ao perceber que
fui pega.
Bear me abraçou por trás, pressionando o meu corpo contra o seu.
Suas mãos apertaram os meus seios com força e eu gemi.
— Trato é trato. Eu te peguei, agora vou te foder — sussurrou em
meu ouvido, sua voz estava ofegante pelos minutos de correria.
Minha boceta doeu com aquela promessa.
O meu coração estava acelerado, minha pele suada e eu me sentia
quente. Não consegui dizer nada, pois estava ocupada demais recuperando
o fôlego. Nunca fui do tipo fitness e eu raramente fazia exercícios físicos,
então não estava acostumada a correr por tanto tempo.
Levaria alguns minutos até que eu me recuperasse por completo, mas
o meu namorado impaciente não queria esperar. Ele mordiscou o meu
pescoço e um arrepio gostoso se espalhou pelo meu corpo. Gemi com a
sensação gostosa dos seus dentes roçando a minha pele e Bear me virou
para que eu ficasse de frente para ele. Suas mãos seguraram o meu rosto e
ele me beijou com vontade, sua língua invadiu a minha boca sem pedir
permissão e tomou posse de cada centímetro.
Entrelacei meus braços ao redor do seu pescoço e me entreguei aquele
beijo apaixonado. Bear me ergueu em seus braços e caminhou comigo, sem
separar nossas bocas. Senti minha bunda aterrissar em uma superfície de
madeira e eu logo percebi que estava sentada em cima do balcão da loja.
Ele separou minhas pernas e se encaixou entre elas, mantendo a menor
distância possível entre os nossos corpos.
Enquanto nossas línguas se entrelaçavam, eu apertava o meu corpo
contra o dele, puxava as suas roupas desejando rasgá-las e esfregava a
minha boceta no volume da sua ereção.
Bear interrompeu o beijo e inclinou seu rosto até a altura dos meus
seios. Sua boca foi diretamente até o meu mamilo esquerdo e ele começou a
me chupar, enquanto sua mão estimulava o meu seio direito. Ele passava a
sua língua em movimentos circulares enquanto os seus lábios me sugavam
lentamente, a sua barba roçando em minha pele me causava arrepios
deliciosos e eu só conseguia pensar em senti-la mais embaixo, entre as
minhas coxas...
Sedenta para sentir mais prazer, segurei a cabeça de Bear e a empurrei
sutilmente para baixo, em direção à minha barriga. Ele parou de chupar o
meu peito e ergueu o rosto para me encarar.
— Mais embaixo, Bear — sussurrei ofegante, meu coração palpitava
com uma ansiedade crescente.
Bear sorriu com malícia e obedeceu ao meu pedido. Ele se ajoelhou
no chão e enterrou o rosto entre as minhas pernas, sua língua quente e
macia deslizou pela minha boceta e eu ofeguei com o prazer delicioso que
se espalhou por todo o meu corpo.
Afundei minhas mãos em seu cabelo quando ele começou a lamber o
meu clitóris. Não havia nada que eu pudesse fazer além de gemer e me
esfregar contra o seu rosto enquanto a sua boca alternava entre chupar e
beijar o meu ponto mais sensível. Bear continuou me lambendo
avidamente, sem se importar quando eu puxava o seu cabelo com força ou
prendia o seu rosto entre as minhas pernas para impedir que ele saísse dali
sem terminar o serviço.
Ele seguiu com as provocações até que alcancei o orgasmo. Eu
ofegava enquanto o meu corpo estremecia contra a boca de Bear, que estava
bebendo a nova umidade que saía da minha boceta. Quando se deu por
satisfeito, ele ficou de pé e permaneceu com o corpo entre as minhas
pernas. Bear tirou sua camisa e a jogou no chão, em seguida, abriu a calça
apenas o suficiente para que o seu membro pudesse sair.
Mordi os lábios no instante em que ele puxou o pau para fora, seu
músculo estava duro e pronto para me tomar como sua. Não resisti e o
segurei com uma das mãos, esfregando-o em minha boceta molhada
enquanto fazia contato visual com o homem à minha frente. Bear rosnou e
sorriu de um jeito malicioso.
Quando esfreguei seu membro na minha entrada, Bear moveu o
quadril para frente e fez pressão para entrar na abertura. Gemi ao sentir a
cabeça do seu pau invadindo o meu corpo e o soltei do meu aperto para que
ele pudesse assumir o controle.
Bear me penetrou com força e eu tive que segurar em seus braços
para não perder o equilíbrio. Quando seu membro estava completamente
dentro do meu canal, nossos olhares se encontraram e ele sorriu
lascivamente.
— É melhor se segurar, eu não serei delicado — alertou, com a voz
rouca.
— E quando é que você foi delicado, Bear? — Arqueei uma
sobrancelha.
Ele não respondeu à minha pergunta, apenas segurou minhas pernas,
entrelaçando-as ao redor da sua cintura, e começou a estocar de forma
brusca, saindo e entrando no meu corpo com força. Eu gemia alto a cada
investida dele. Seu pau rígido e grosso deslizava em meu interior, abrindo
espaço em minha boceta apertada e chegando até o fundo do meu canal.
Suas mãos seguravam a minha cintura e o seu rosto estava enterrado
em meu pescoço enquanto ele estocava de um jeito bruto, rosnando o meu
nome cada vez que entrava em mim.
Segurei a borda do balcão e a apertei com força quando senti meu
orgasmo se aproximar. O prazer que eu sentia foi aumentando, ficando mais
forte e urgente até que transbordou.
— Bear! — gritei e me agarrei às costas dele, enquanto minha boceta
estremecia ao redor do seu pau.
Ele deu uma última estocada forte e saiu do meu corpo.
Olhei para baixo no momento exato em que Bear gozou. Vi o sêmen
esbranquiçado sair da cabeça do seu membro e cair no chão de madeira da
loja.
Bear ofegou, exausto, e colou sua testa na minha. Ficamos em
silêncio e de olhos fechados, enquanto esperávamos que nossas respirações
voltassem ao normal.
Quando o fôlego retornou para os meus pulmões, sorri um pouco
cansada e encarei Bear, que havia acabado de guardar seu membro dentro
da calça.
— Melhor começarmos a levar camisinhas quando formos sair de
casa — comentei em um tom brincalhão. — Se continuarmos assim, vou
acabar engravidando.
— Até que isso não seria uma má ideia. — Bear sorriu para mim,
enquanto fechava o zíper da calça jeans. — Imagine só, pequenas versões
nossas correndo pela loja...
Dei uma gargalhada. Por algum motivo imaginei um garotinho de
cabelo grande, correndo por ali com um machado de brinquedo nas mãos.
Não posso negar que o meu coração se aqueceu com a ideia, mas estava
cedo demais.
— Acho que seria bom nos estabelecermos e juntarmos um bom
dinheiro antes de qualquer coisa — sugeri. — Não quero que nada falte
para as nossas futuras crianças.
Bear sorriu com ternura e acariciou o meu rosto.
— Tem razão, Freya... Vamos nos estabelecer primeiro antes de fazer
uma pequena versão de nós dois.
Concordei em silêncio e sorri. Eu nem me importava se ainda estava
nua, sentada sobre o balcão de madeira e com a parte interior das coxas
melada, tudo que eu conseguia sentir naquele momento era uma grande
felicidade ao imaginar o meu futuro com Bear.
Enquanto eu me perdia em pensamentos imaginando quantas crianças
teríamos e se a nossa família iria morar na minha casa na vila ou na cabana
da montanha, Bear segurou o meu queixo e me beijou com paixão. Naquele
instante, eu soube que não precisava me preocupar com o futuro, contanto
que estivéssemos um ao lado do outro, tudo daria certo.
CAPÍTULO 27

Chegou o dia da inauguração da nossa loja. Era segunda-feira,


estávamos no fim da manhã e muitos moradores já passaram aqui para
desejar boas vendas e ver as mercadorias.
Estávamos indo bem até o momento. Três esculturas e um quadro já
tinham sido vendidos e eu me sentia confiante de que mais produtos sairiam
até o final do dia.
Fiquei tomando conta da loja enquanto Bear estava no andar de cima
restaurando algumas esculturas para deixar à venda. Muitos dos seus
trabalhos de madeira ficaram fechados aqui, acumulando poeira nos últimos
cinco anos, e precisavam de polimento e de uma pintura nova antes de
serem vendidos.
Eu estava atrás do balcão, com os braços apoiados sobre o tampo de
madeira, encarando a rua pouco movimentada pela vitrine. Hati estava
deitado no chão atrás de mim, próximo ao primeiro degrau da escada que
levava para o andar superior, e dormia profundamente.
Perto da vitrine de vidro da loja, estava o meu cavalete com várias
telas em branco ao seu lado. Era um canto bem iluminado que recebia muita
luz natural e Bear o deixou reservado para que eu fizesse as minhas
pinturas. Estava pensando em começar algum quadro novo quando o sino
da porta tocou, indicando a chegada de um cliente.
— Então o desequilibrado do Bear voltou para a cidade.
Ergui meu rosto na direção da voz e vi Sven de braços cruzados,
parado perto da porta, encarando cada centímetro da loja. Fiquei irritada
com o comentário que ele fez.
Não conseguia entender porque Sven estava tão empenhado em falar
mal de Bear para mim. Os dois com certeza tiveram alguma rivalidade no
passado e Sven estava com ciúme porque fiquei com o homem da montanha
ao invés de dar uma chance para as cantadas de tiozão que ele me passava
sempre que eu visitava a mercearia.
— Por acaso existe algum problema entre vocês? — questionei com
um certo tédio na voz.
— O homem com quem você está saindo é louco! — Sven repetiu o
mesmo discurso de dias atrás. — Outro dia, ele entrou na mercearia e me
espancou apenas porque viu os seus quadros na vitrine.
— O quê? — Arqueei a sobrancelha, incrédula.
Sven se aproximou do balcão e eu percebi que ele estava com um
corte na boca — já estava cicatrizando, mas uma parte dos seus lábios ainda
estava com sangue preso.
Fiz uma careta e desviei o olhar para longe da lesão. Bear realmente
fez isso? Sinceramente, eu não duvidava — considerando o jeito que ele
ficou irritado no dia em que viu as minhas pinturas na mercearia —, mas
também não consegui acreditar que Sven foi espancado. Bear tem seus
surtos de vez em quando, mas não a esse ponto. Talvez ele tenha dado
apenas um soco ou dois... De qualquer forma, melhor não dar crédito às
provocações de Sven.
— Não acredito que Bear tenha feito uma coisa dessas. — Forcei uma
expressão de descrença. — Ele é irritado, mas não faria isso com alguém.
— Então não o conhece direito, Freya. — Sven me direcionou um
sorriso irônico. — Devia escolher melhor para quem você vai abrir as
pernas.
Fiquei boquiaberta com o que ouvi, eu não conseguia acreditar na
ousadia dele. Isso foi baixo. Muito baixo.
— Parece que o único desequilibrado aqui é você, Sven! — exaltei-
me, falando mais alto do que pretendia. — Seja lá qual for o motivo de você
e Bear se odiarem, eu não quero ficar no meio dessa merda toda. Vá
embora!
Apontei para a porta esperando que o homem saísse, mas ele apenas
cruzou os braços e deu uma risada.
— Tarde demais, Freya. Você já está envolvida nisso até o pescoço.
Franzi o cenho.
— Como eu me envolvi? Nem sei o porquê dessa disputa idiota! —
Bufei, irritada. — Vai embora, Sven!
— O que esse porra está fazendo aqui? — Bear rosnou, irritado.
Olhei para trás e o vi descendo da escada espiral, seus olhos estavam
fixos em Sven.
— Dê o fora da minha loja! — gritou, enquanto ia na direção do
homem parado em frente ao balcão.
Arregalei os olhos ao perceber que Bear estava segurando uma das
facas afiadas que ele usava para entalhar.
— Você não me ouviu? Some daqui, porra! — Ele voltou a expulsá-
lo.
Sven ficou em silêncio e o sorriso presunçoso em seus lábios
desapareceu. Ele encarou Bear e a faca que estava em suas mãos, depois me
analisou de cima a baixo e franziu o nariz. Já estava esperando algum
comentário irônico, mas Sven apenas deu meia volta e saiu da loja, batendo
a porta com força.
Bear suspirou e passou a mão livre pelos cabelos. Ele foi até a porta e
a trancou, em seguida, caminhou para trás do balcão e parou ao meu lado,
me entregando as chaves da loja.
— A porta vai ficar trancada, se algum cliente quiser entrar ele vai
bater. Não abra se for aquele puto da mercearia — exigiu. — Pode ficar
com essa chave, eu tenho outra cópia lá em cima.
Concordei silenciosamente e guardei a chave no bolso da minha calça
jeans.
— Ei, ursinho, não deixe que as provocações do Sven acabem com o
seu dia.
Ele me deu um sorriso relutante e acariciou a minha bochecha de um
jeito terno.
— Eu ficarei bem, Freya. Não deixarei que aquele idiota fique entre
nós.
Dei um tapinha em seu ombro e sorri para ele. Achei melhor não
prosseguir com o assunto, pois sabia que Bear ficaria ainda mais irritado se
continuasse falando sobre Sven.
— Vou voltar para o trabalho. — Bear me deu um beijo delicado e
subiu a escada espiral que levava para o andar de cima.
Fiquei na companhia de Hati, que ainda dormia aos pés da escada,
alheio ao que acontecia ao seu redor. Cachorrinho preguiçoso... se eu
precisasse dele para me defender, acho que estaria acabada.
Decidi aproveitar aquele tempo para pintar um novo quadro e
esquecer das coisas que Sven disse quando passou aqui.

Não tivemos mais nenhum problema além do inconveniente com


Sven no primeiro dia de abertura da loja.
Se passaram algumas semanas desde que inauguramos o nosso
cantinho de artesanato. Todos os dias vendíamos esculturas e quadros e a
nossa situação financeira estava começando a decolar.
Depois de muito esforço, eu finalmente convenci Bear a aposentar a
sua lata velha. Ele passou a usar a minha caminhonete para fazer as
entregas de lenha pela vila. Haviam encomendas toda semana já que agora
os moradores viam Bear com mais frequência e o inverno estava cada vez
mais próximo.
Tudo estava indo bem. Bear, Hati e eu passávamos os dias da semana
na minha casa na vila e nos sábados de manhã subíamos a montanha para
passarmos um tempo longe das outras pessoas. Precisávamos desse
momento sozinhos para recarregar as energias e enfrentar mais uma semana
de trabalho pela frente.
Em uma noite fria de domingo, Bear e eu estávamos sentados no chão
da varanda, enrolados em um cobertor de pele e admirando o céu. Eu estava
entre as suas pernas, com as costas apoiadas em seu peito e as mãos
descansando sobre as suas coxas musculosas. Hati estava deitado ao nosso
lado. Uma fogueira foi acesa em frente à cabana para espantar qualquer
animal selvagem que tentasse se aventurar por ali.
Ao longe, no céu da noite, era possível ver as luzes esverdeadas com
pequenos nuances roxos da aurora boreal. Era a terceira semana de outubro
e Bear me disse que as luzes começavam a aparecer com mais frequência a
partir dessa época do ano.
Era a primeira vez que eu via a aurora desde que cheguei em
Havengreen e eu estava encantada. Bear, por outro lado, parecia
acostumado com aquela paisagem de tirar o fôlego.
— Sabia que os vikings achavam que as Luzes do Norte eram a
Bifrost? Aquela ponte de arco-íris que liga o mundo dos humanos e o
mundo dos deuses? — Bear divagou.
— Eu sei. Já vi ela nos filmes do Thor.
— Fizeram filmes sobre o Thor? O deus do trovão?
— Vai me dizer que não sabia? — Virei o rosto para encará-lo. — O
primeiro filme lançou há uns dez anos.
Bear negou com a cabeça, ele estava com uma expressão incrédula.
— Você nunca assistiu Vingadores? — indaguei com descrença.
— O que é isso? — Ele franziu o cenho. — É o nome do filme do
Thor?
— Não! — Eu dei uma risada. Era difícil acreditar que Bear estava
tão desligado da cultura pop. Preciso lembrar que ele não tem celular ou
TV. — É um filme sobre heróis e o Thor está entre eles.
Bear ficou confuso com a informação, mas não fez mais perguntas.
— Vamos tirar um dia para maratonar todos os filmes de heróis na
minha casa — sugeri. — Tenho certeza que você vai gostar.
— Nunca fui muito de assistir TV.
— É, já percebi isso — comentei com ironia. — Você passou cinco
anos aqui na montanha e o único aparelho eletrônico que tem é um rádio
velho.
— Não era muito diferente quando eu morava na vila — suspirou. —
Meu tio dizia que essas coisas atrasam a vida e nos deixam preguiçosos...
acabei crescendo com isso na cabeça.
— Vou fazer você perder esses hábitos. Eu gosto de ir ao cinema e
quero que esteja comigo da próxima vez que eu for.
— Caso ainda não tenha percebido, não tem cinema em Havengreen.
— Vamos para outra cidade. — Dei de ombros. — Você já faz isso
para ir ao supermercado.
— Não costumo me abrir para coisas novas, Freya — Bear ficou um
pouco relutante —, mas farei esse sacrifício por você.
— Garanto que não vai se arrepender, ursinho. — Eu sorri para ele e
voltei a encarar o céu, recostando a cabeça em seu peito.
Bear deu uma risada e depois ficou em silêncio. Passamos um bom
tempo calados, apenas observando as luzes que dançavam no céu. Era
lindo.
— Em algumas culturas essas luzes também podem significar o
presságio de que algo ruim está para acontecer — ele quebrou o silêncio
quando retomou o assunto sobre a aurora.
— Prefiro a história da ponte — respondi, apreensiva.
— A lenda mais conhecida é de que essas luzes refletem dos escudos
das valquírias que estão levando os guerreiros para Valhalla. — Eu podia
sentir o seu peito vibrar no ritmo da sua voz enquanto ele falava. — Mas na
minha opinião, essa história perdeu o sentido ao longo dos anos. Não
existem mais guerreiros hoje em dia, então por que as luzes continuariam
lá?
— Eu discordo. — Virei o rosto para encará-lo outra vez. — Nas
lendas, diz que Valhalla abriga as almas das pessoas que tiveram uma morte
honrosa. Hoje em dia, algumas pessoas ainda morrem de um jeito honroso,
eu acho...
— Não sabia que você conhecia tantas lendas antigas. — Bear
arqueou uma sobrancelha, nitidamente surpreso.
— Minha avó não parou de contar histórias quando saiu de
Havengreen. Aprendi muita coisa com ela, além da pintura — recordei,
com saudade.
Bear não disse mais nada, ele apenas afagou meus ombros em um
gesto terno e depois deixou as mãos repousarem ao redor da minha cintura.
Passamos as próximas horas da noite ali na varanda, abraçados ao lado de
Hati e observando a aurora boreal até ela desaparecer por completo.
Depois que o show de luzes acabou, entramos na cabana para dormir,
já que teríamos uma longa semana pela frente administrando a nossa loja de
artesanato na vila.
CAPÍTULO 28

O clima naquela segunda-feira estava frio e nublado — algo normal


para Havengreen. Aqui na montanha raramente tínhamos dias em que o sol
estava presente o tempo inteiro, já que havia muitas nuvens por conta da
altitude e da umidade da floresta. Quando saí de casa no início da manhã,
vesti a calça jeans mais grossa que eu tinha e um casaco xadrez revestido
com pele sintética para me manter aquecido.
Minhas botas pesadas faziam barulho ao se chocarem contra os
paralelepípedos da rua em que eu caminhava. Eu estava indo até a padaria
comprar um bolinho de chocolate para Freya. Ela passou a manhã inteira
tagarelando que estava com vontade de comer um dos bolinhos que a Sra.
Ludwig fazia, e como eu estava me esforçando para ser um bom namorado,
iria atender ao seu pedido.
Ao passar pela mercearia, olhei de soslaio para a vitrine e o meu
corpo inteiro ficou tenso, haviam algumas pinturas de Freya à mostra no
expositor de vidro. Parei de andar no mesmo instante. O que aqueles
quadros estavam fazendo ali? Até onde eu sei, Freya não deixou mais
pinturas para o idiota do Sven vender.
Bufei com irritação, já podia sentir a raiva tomando conta do meu
corpo. Eu não conseguia pensar com coerência quando se tratava de Sven.
Freya era a minha namorada e vê-la ligada aquele homem fazia um
flashback doloroso surgir na minha cabeça.
Só conseguia pensar em Freya me deixando e indo embora da cidade
com aquele idiota. Eu sabia que isso não iria acontecer, mas uma parte do
meu subconsciente não conseguia deixar esse medo de lado. Não quero
passar por aquela dor outra vez, não quero que Freya me abandone. Eu
não vou conseguir viver sem ela. Não dá! Preciso acabar com qualquer
ameaça que possa existir entre nós dois.
Quando dei por mim, eu já estava dentro da mercearia, com sangue
nos olhos, indo em direção a Sven que organizava uma prateleira de
enlatados no canto da loja.
— Quem colocou aquelas pinturas na vitrine? — rosnei.
Sven me encarou e sorriu com deboche.
— Aquelas pinturas são minhas, eu as comprei e pendurei lá porque
eu quis — respondeu com ironia e seguiu colocando mais latas na
prateleira.
Bufei, irritado. A expressão de deboche no rosto do filho da puta
indicava que ele deixou as pinturas à mostra de propósito, apenas para me
provocar.
— Isso não vai ficar assim. — Ergui os punhos.
Sven deixou de organizar as latas e virou o corpo de frente para mim.
— Se me bater de novo vou falar com o delegado Müller — ameaçou.
— Sou um cara que respeita a lei, não quero te agredir.
Eu ri e me aproximei do sujeito, mantendo um punho fechado e
erguido no ar. Sven deu alguns passos para trás e só parou quando esbarrou
na prateleira.
— É tão covarde assim, Herzog? Não se garante no soco e precisa
chamar o delegado para te defender? — Olhei para a dog tag militar que
sempre ficava pendurada em seu pescoço. — De que adianta ficar exibindo
isso por aí se você é um fracote? Deve ser por isso que te expulsaram do
pelotão e você teve que voltar para Havengreen com o rabinho entre as
pernas. Nunca será homem o suficiente para a Freya.
Sven fechou a cara e antes que eu pudesse fazer qualquer coisa, senti
seu punho bater na minha boca. Dei alguns passos para trás, sentindo meu
lábio inferior doer. Porra. Agora ele morre!
Com uma mão, agarrei Sven pela gola da blusa, puxando o seu corpo
para perto do meu e dei um soco em seu nariz. Ele arquejou com dor e se
livrou do meu aperto.
— Desgraçado! — Uma mistura de raiva e dor estava presente em sua
voz. — Eu vi a Freya primeiro!
Sven tentou me acertar outro soco, mas eu me esquivei para o lado.
— Não interessa quem a conheceu primeiro, ela me escolheu —
rosnei, irritado. — Não vou permitir que você faça igual o puto do seu
irmão, que roubou a Darlla de mim.
— A Darlla fugiu com o meu irmão porque ela quis — Sven cuspiu
aquela frase com desprezo. — Os homens da família Herzog sempre foram
melhores que você. Com o passar do tempo, Freya perceberá isso também.
— Filho da puta!
Abandonei o último vestígio de autocontrole e parti para cima de
Sven, socando o homem onde minhas mãos conseguiam alcançar, ele até
podia ter servido o exército no passado, mas eu ainda era mais forte, mais
bruto e estava louco de raiva. Sven tentou se defender colocando um braço
sobre o rosto, mas meu joelho atingiu o seu estômago, o fazendo cambalear
sem fôlego e esbarrar na prateleira. A estrutura de metal balançou e
algumas latas de ervilha caíram no chão.
Agora que ele estava naquela posição vulnerável recuperando o
fôlego, percebi que a minha surra o deixou com a boca cortada e o nariz
sangrando. Fiquei satisfeito com a cena, mas a centelha de raiva que
queimava em meu interior me fez querer mais sangue.
Fui para cima dele outra vez, mas antes que a minha mão encontrasse
a sua cara, alguém segurou em meu casaco e me puxou para trás.
— Bear, já chega! — Era Freya.
Na mesma hora em que ouvi a voz eu abaixei a mão. Virei o rosto
para encarar a minha namorada e percebi uma expressão de raiva e espanto
em seu rosto. Atrás dela estava Hati, o cachorro que era meu, mas que
passou a segui-la fielmente como se ela fosse a sua dona.
— F-Freya,... foi ele que começou — Sven gaguejou, ainda apoiado
na prateleira.
Revirei os olhos ao ver que o filho da puta estava forçando a voz para
parecer mais ferido do que realmente estava.
— Não interessa quem começou! Será que os dois poderiam agir
como adultos e parar com essa disputa idiota? — ela gritou.
Sven ficou em silêncio e abaixou a cabeça, parecendo envergonhado.
— Vamos para casa, Bear — Freya ordenou com irritação e segurou o
meu braço, me puxando em direção à porta.
Minhas pernas cederam e a acompanharam para fora do
estabelecimento. No entanto, a irritação que eu sentia ainda não tinha
passado. Eu queria continuar batendo em Sven até que ele me prometesse
que não iria sequer olhar para Freya outra vez. Em meu peito só havia raiva
e adrenalina, eu precisava extravasar de alguma forma ou então iria
explodir.

Bear ficou em silêncio durante todo o caminho até a cabana na


montanha. Achei melhor levá-lo até lá para que ele ficasse longe da vila por
um tempo. Eu queria saber o que se passava na sua cabeça e o motivo de
terem começado aquela briga, então quando entramos na casa eu perguntei:
— O que aconteceu entre você e o Sven? Por que brigaram?
Bear bufou e tirou seu casaco xadrez, ficando apenas com uma
camisa preta de manga curta que parecia deixar os seus músculos ainda
mais definidos.
Ele jogou o casaco sobre o sofá e me olhou torto, dava para ver que
ainda estava irritado pela briga.
— Seus quadros, Freya! — Ele gritou, me fazendo dar um pulo para
trás. — O filho da puta ainda tem suas pinturas e as deixou à mostra para
me provocar!
— Ei, por que caralhos está gritando comigo? — exaltei-me também.
— Foi Sven que te irritou, não eu!
Bear bufou e começou a andar de um lado para o outro na sala. Seus
músculos estavam tensos e ele passava as mãos pelos cabelos, em uma
tentativa falha de se acalmar. Parecia um urso enjaulado com sede de
sangue.
— O filho da puta disse que comprou os quadros e os pendurou na
vitrine porque quis — resmungou, enquanto andava em círculos na minha
frente.
— Bom, se os quadros que estão lá pertencem ao Sven, não há nada
que você possa fazer. — Dei de ombros.
Bear me encarou com a fúria queimando em seu olhar.
— Porra, é por isso que estou irritado, Freya! Eu não quero que ele
tenha nada seu. NADA!
Arregalei os olhos. Confesso que fiquei assustada com os seus gritos.
O ciúme de Bear estava passando dos limites. Nunca o vi tão
enfurecido e eu não estava gostando de conhecer esse lado dele. Preciso me
impor e deixá-lo saber que não irei aceitar esse tipo de comportamento.
— É melhor você parar com isso, Bear! — Coloquei uma expressão
furiosa no rosto e apontei um dedo para ele. — Se não colocar um fim nessa
maldita disputa territorialista com o Sven, quem não terá nada de mim será
você!
Bear parou de andar e me encarou. Seus olhos se arregalaram com
surpresa ao ouvir o que eu disse.
Percebi que eu exagerei um pouco nas minhas palavras e até mesmo a
minha voz soou mais irritada do que eu pretendia. Mas agora não tinha
volta. Eu não iria me arrepender e muito menos pediria desculpas pelo tom
que usei em minha ameaça. Bear não pode ser o único estressado da
relação.
Ele franziu o cenho e deu às costas para mim. Pegou o seu machado
que estava escorado na parede ao lado da porta e saiu da cabana em passos
duros, sem dizer uma única palavra.
Suspirei e encarei Hati, que estava deitado aos pés do sofá,
acompanhando toda a discussão.
— Ele é um idiota — resmunguei para o cachorro.
Fiquei de pé no meio da sala por alguns minutos até que decidi sair da
cabana. Hati veio logo atrás de mim.
Sentei no degrau de madeira da varanda e fiquei observando o
horizonte me perguntando qual pobre árvore Bear escolheu para descontar a
sua raiva. Hati ficou sentado ao meu lado e eu passei um tempo perdida em
pensamentos enquanto afagava os pelos da sua cabeça. Em certo momento,
o cachorro se levantou e correu para longe, em direção à parte de trás da
cabana. Estranhei o seu comportamento, mas deixei passar. Talvez, ele
tenha sentido vontade de ir ao banheiro...
Conforme o tempo passou e Hati não retornou, comecei a ficar
preocupada. Me levantei e fui até os fundos da cabana para ver se o
cachorro estava por lá, mas o que vi fez minhas pernas congelarem. Hati
estava encurralado contra a parede da cabana e rosnava para dois lobos
gigantescos de pelo acinzentado. Os animais eram o dobro do tamanho do
cachorro e não pareciam nada contentes.
Meu coração acelerou e, por mais que o desespero estivesse
começando a surgir, obriguei meu cérebro a funcionar para pensar em uma
saída daquela situação. Eu não sabia o que fazer. Precisava distrair os lobos
para que Hati pudesse fugir, mas o único jeito de fazer isso seria se eu
atraísse a atenção dos animais para mim. Droga, se ao menos o idiota do
Bear estivesse aqui...
CAPÍTULO 29

Enquanto eu pensava em soluções para o meu problema, Hati tomou


impulso com as patas traseiras e pulou em um lobo, fechando a boca em seu
pescoço. O animal de pelo cinzento choramingou, mas conseguiu se livrar
da mordida e virou a briga a seu favor.
— Hati! — gritei quando vi o cachorro e o lobo se transformarem em
um borrão de presas, rosnados e uivos de dor. Merda! Eu precisava tirar
meu cãozinho dessa luta antes que fosse tarde demais.
Empurrei o medo para o fundo da mente e procurei por qualquer coisa
que pudesse servir como arma. Para o meu desespero, atrás da casa só havia
um gerador à gasolina, um tanque para lavar roupas e um varal de corda
onde algumas cuecas de Bear estavam estendidas para secar. Quando meu
rosto se desviou para o chão, avistei algumas pedras do tamanho de um ovo.
Elas terão que servir.
Peguei as pedras e comecei a jogá-las no lobo enquanto gritava, na
esperança de que ele se afastasse do meu cachorro. Concentrei tanta atenção
no animal que brigava com Hati que acabei me esquecendo do outro lobo.
Quando percebi, o predador estava atrás de mim, rosnando, com as presas
afiadas à mostra. Engoli em seco. Esse é o meu fim.
— Freya! — Bear gritou, ao surgir no meu campo de visão.
Ele estava sem camisa, com o machado nas mãos e os cabelos soltos
ao redor dos ombros. Sua pele suada e a respiração ofegante indicavam que
ele correu para chegar até aqui — provavelmente ouviu meus gritos
enquanto eu tentava espantar o lobo para longe.
Bear correu até mim e acertou com o machado o lobo que me
cercava. O animal caiu no chão choramingando e eu vi uma faixa vermelha
brotar em meio ao pelo cinzento do seu pescoço. Estremeci e me afastei
alguns metros, o sangue jorrava para fora do corpo dele e já começava a
manchar a grama. Fiquei imaginando o quão afiado o machado de Bear
estava para ferir um animal desses com um único golpe.
Desviei o olhar para o outro lobo a tempo de ver Bear indo para cima
dele. Levei as mãos até o peito e observei o homem lutando contra o lobo,
tentando tirá-lo de cima do seu cachorro. A cada golpe de machado eu dava
um pulo no lugar e um grito saía da minha garganta.
Depois de vários rosnados — tanto do lobo quanto de Bear —, golpes
de machados e patas, arranhões e gritos furiosos, o lobo de pelo cinza caiu
no chão e agonizou por alguns segundos antes de morrer.
Meu coração ficou apertado quando o meu olhar se voltou para Hati.
O pobre cãozinho estava deitado no chão e parecia não ter forças para se
levantar. Corri até eles, desesperada, e me ajoelhei ao lado do animal.
Hati estava com grandes marcas de dente no pescoço de onde escorria
sangue o suficiente para me deixar assustada. Toquei delicadamente a
região e ele choramingou. Lágrimas desceram dos meus olhos e eu senti o
ar sair dos meus pulmões. Fiquei com medo... medo de Hati morrer.
— Temos que levá-lo para dentro — murmurei, sem me preocupar
em esconder o choro.
Bear não falou nada, apenas largou seu machado no chão e pegou o
cachorro no colo com cuidado. Somente naquele momento eu percebi que
Bear também foi ferido durante a luta. Haviam arranhões avermelhados em
suas costas e um corte em seu braço esquerdo, mas fiquei aliviada ao ver
que não era nada grave, em comparação ao ferimento de Hati.
Ele caminhou em passos largos na direção da cabana e eu o segui,
precisando correr para alcançá-lo. Quando entramos, Bear levou Hati para o
quarto e o colocou sobre a cama de peles em que o cachorro costumava
dormir todas as noites. Ele ficou em silêncio, abaixado ao lado do animal
enquanto o acariciava, perdido em pensamentos.
— Devíamos levá-lo para o veterinário — sugeri, com preocupação.
— Ele não vai aguentar até chegarmos lá embaixo — Bear respondeu
de forma rude, seus ombros estavam tensos enquanto ele observava o
cachorro. — Que porra vocês estavam fazendo lá fora?
— Saí para pensar um pouco depois da nossa discussão. — Limpei as
lágrimas que desciam pelo meu rosto. — Hati me seguiu, correu para os
fundos da cabana e quando percebi ele estava encurralado pelos lobos.
Bear ficou de pé e veio até mim, parando a alguns centímetros de
distância. Ele me encarou como se eu fosse o seu pior inimigo e eu fiquei
tensa.
— Isso é culpa sua! — gritou, enquanto apontava na minha direção.
— Se você não tivesse saído da cabana, Hati não teria se ferido.
Arquejei com descrença diante daquela acusação. Como ele pôde?
— Não jogue a culpa em cima de mim, foi você que saiu primeiro! —
O empurrei para trás. Esse tempo todo eu aguentei o mau-humor de Bear,
chegou a vez dele aguentar o meu! — Se não fosse a sua crise de ciúmes,
Hati não estaria desse jeito agora. Você é um idiota, um egoísta, um cuzão
que não sabe dar valor ao que tem! — Parei de falar e levei as mãos até a
boca. Eu soluçava e chorava, por causa de Hati e também pelas palavras
dolorosas que ouvi do homem que dizia que me amava.
Bear olhou para o cachorro por um longo tempo. Uma sombra de
desprezo se abateu sobre o seu olhar quando ele voltou a me encarar. Seus
olhos cinzentos estavam frios como o gelo, distantes e sem esperança.
— Para falar a verdade, o erro foi meu sim — o tom calmo da sua voz
me assustou mais do que os gritos anteriores. — Eu errei quando trouxe
você para cá. — Bear apontou para o chão do quarto e se aproximou um
passo. — Quando você caiu daquele maldito barranco, eu devia ter te
deixado lá. E daí que poderia morrer? Ninguém conseguiria provar que eu
estava te perseguindo... Te trazer para a minha casa foi o maior erro que eu
já cometi.
Mais lágrimas arderam em meus olhos quando ouvi aquilo e o meu
coração se quebrou em milhões de pedaços, se ele enfiasse uma faca em
meu peito teria doído menos.
— É, Bear... você tem razão. As coisas deviam ter ficado como
estavam. — Minha boca tremeu por causa do choro que ameaçava sair. Me
odiei pelo pensamento que eu tive, mas eu me recusava a ser a única a sair
ferida dessa situação. Se Bear me magoou, vou magoá-lo também. — Você
devia ter ficado aqui na montanha, com o Hati... e eu devia ter ficado lá na
vila, rebolando em cima do Sven. Deixando ele tocar nesse corpinho aqui.
— Dei um tapa em minha bunda para soar ainda mais dramática.
Bear arregalou os olhos, surpreso. Nem eu acreditava no que acabei
de dizer, mas agora era tarde. Joguei gasolina no fogo e teria que aguentar o
incêndio.
— Então vai lá! — Bear gritou furioso, e apontou para a porta do
quarto. — Sai daqui, Freya!
— O-o que disse?
— Foi o que você ouviu — disparou, irritado. — Pegue as suas coisas
e saia da minha montanha! Vai rebolar no pau daquele filho da puta, como
você mesma disse.
Arqueei as sobrancelhas. Ok, as coisas foram longe demais. Deixei a
raiva falar mais alto e agora já não sabia como consertar o estrago que ela
fez.
Passei as mãos pelo cabelo e fechei os olhos, tentando assimilar a
situação. Bear está me expulsando daqui? Estamos terminando? É isso
mesmo? Mais lágrimas caíram dos meus olhos, meu peito ficou apertado e
um nó de angústia se formou em minha garganta.
Quando abri os olhos novamente, vi Bear sentado na beira da cama.
Seu olhar estava fixo em Hati, seus ombros tensos e ele estava perdido em
pensamentos.
— Desde o começo eu soube que seria um erro permitir que você
entrasse na minha vida. Eu sentia que iria me magoar, mas ignorei a minha
intuição. — Ele fechou os olhos e respirou fundo. — Deixei a cabeça de
baixo falar mais alto e agora o meu melhor amigo corre risco de vida e eu
não sei o que fazer com ele.
— Bear, eu...
— Apenas saia daqui. Nos deixe em paz, Freya.
Abri a boca para tentar dizer alguma coisa — qualquer coisa — que
pudesse fazê-lo mudar de ideia, que pudesse consertar essa situação, mas
não consegui pensar em nada. Não havia o que fazer. Estava acabado. Tudo.
Todos os momentos que passamos juntos nos últimos meses, tudo isso foi
por água abaixo por causa de um surto de raiva e ciúme.
Desviei meu olhar para longe de Bear e observei cada canto daquele
quarto até que fixei minha atenção em Hati. Ele estava sangrando muito e
seu ferimento precisava ser estancado antes que fosse tarde. Eu sabia
algumas coisas sobre primeiros socorros em animais, graças ao meu pai que
era veterinário, mas não sabia se meu conhecimento limitado seria o
suficiente para aquela situação.
Enquanto meus olhos encaravam Hati, que choramingava com a dor
dos seus ferimentos, um único pensamento passou pela minha cabeça:
Preciso ajudá-lo. Não me importava se Bear me expulsou daqui, eu lidaria
com aquele idiota depois que o cãozinho estivesse fora de perigo.
Respirei fundo e saí do quarto para ir até o banheiro. Lavei meu rosto
na pia para tentar me acalmar e peguei no armário o kit de primeiros
socorros que Bear usou em meu tornozelo na primeira noite em que cheguei
aqui. Carregar aquela maleta até o quarto me trouxe boas recordações, mas
elas desapareceram quando Bear tentou tirá-la das minhas mãos em um
gesto bruto. Dei um tapa nele e o fiz se afastar.
Bear ficou surpreso com o meu comportamento rude, mas eu decidi
ignorá-lo. Fui até o lugar em que Hati estava deitado e me ajoelhei ao seu
lado. Abri a maleta e peguei alguns pedaços de algodão e um antisséptico.
— O que vai fazer? — Bear indagou, atrás de mim.
Não o respondi, apenas me concentrei em limpar com cuidado as
feridas de Hati. Depois que todo o sangue superficial havia desaparecido eu
percebi que as mordidas não eram tão profundas quanto pareciam ser. O
pobrezinho deve estar quieto assim porque está sentindo dor.
Vasculhei a maleta até encontrar uma caixa de analgésicos. Não era
recomendado dar remédios de humanos para cães, mas como eu não tinha
outra escolha para parar a dor de Hati, fiz o cachorro engolir um
comprimido.
Havia uma mordida mais profunda que as outras na região da costela
e assim que bati os olhos nela eu soube que precisaria de dois ou três
pontos. Por sorte, Bear tinha material para sutura na maleta. Peguei a agulha
e a desinfetei com álcool, coloquei linha nela e respirei fundo, me
preparando para costurar.
Quando enfiei a agulha em sua pele, Hati choramingou um pouco
mais alto e eu o acalmei, afagando a sua cabeça. Ele não se contorceu mais,
então comecei a costurar sua ferida até que ela estivesse fechada. Senti um
certo orgulho de mim naquele instante, eu nunca havia feito aquilo, apenas
repeti o que via meu pai fazer com alguns animais feridos que recebia em
sua clínica.
Examinei Hati uma última vez para ter certeza de que todas as suas
feridas estavam desinfetadas e então as cobri com gaze e esparadrapo. Elas
precisariam ser limpas todos os dias, mas Bear seria capaz de fazer isso
sozinho, afinal, eu não estaria mais aqui. Hati estava fora de perigo, graças
a mim, e agora era hora de eu seguir o meu rumo.
Voltei à realidade, lutando contra a vontade que eu sentia de chorar.
Me inclinei e dei um beijo no focinho de Hati enquanto afagava a sua
cabeça. Eu até sentia pena por deixá-lo sozinho com o idiota do Bear, mas
infelizmente eu não tinha outra escolha, não podia levar o cãozinho para a
vila comigo — por mais que eu quisesse.
Respirei fundo e fiquei de pé. Eu podia sentir o olhar de Bear sobre
mim, mas fiz o possível para não o encarar. Fui até a cômoda onde estavam
as minhas coisas, peguei minha bolsa de viagens e coloquei nela as roupas
que estavam dobradas dentro das gavetas que Bear separou para mim
quando decidi que ficaria aqui.
— Troque os curativos de Hati uma vez ao dia e se ele piorar, leve-o
até o veterinário da vila — instruí, enquanto socava dentro da bolsa as
minhas últimas peças de roupa.
Quando fechei o zíper, atravessei a alça da bolsa no ombro e senti as
lágrimas voltarem a descer pelo meu rosto. Respirei fundo e as sequei com
as mãos. Virei meu corpo na direção da porta e caminhei para fora do
quarto sem olhar para Bear uma única vez.
Eu já estava chorando histericamente quando saí da cabana, tudo que
eu conseguia sentir era raiva e tristeza. Minha visão começou a ficar turva
pelo choro e o meu coração doía com uma angústia que eu jamais senti na
vida. Eu me sentia vazia, desolada, sem perspectiva alguma do que faria de
agora em diante. Seria difícil, mas eu precisava seguir em frente, precisava
superar. É isso, o meu conto de fadas acabou. Fui uma idiota por pensar que
poderia viver um romance igual ao dos livros. Sinceramente, onde eu estava
com a cabeça? Essa é a merda do mundo real, não existem finais felizes
aqui!
CAPÍTULO 30

Eu estava deitado na minha cama, encarando o teto de madeira


envernizada. Meu coração doía e eu não podia fazer nada para amenizar
aquela maldita dor. Tudo acabou.
Faz quinze dias que voltei a ficar sozinho nesta cabana. Hati estava se
recuperando bem e as suas feridas já começaram o processo de cicatrização.
Ele estava vivo graças à Freya. Freya... Mesmo que eu não quisesse admitir,
eu sentia falta dela. Porra, muita falta. E Hati estava na mesma situação
que eu. O cachorro fazia greve de fome na maior parte do dia. Com
frequência, eu o surpreendia farejando os lugares da casa em que Freya
costumava ficar, como se estivesse à procura dela. Quando percebia que ela
não estava, Hati se sentava em frente à porta e passava horas ali, na mesma
posição, com a esperança de que a qualquer momento ela entraria na
cabana.
Ver meu cachorro sofrer desse jeito fazia o meu coração doer ainda
mais. Ele choramingava algumas vezes durante o dia e não sentia mais
vontade de brincar com os seus brinquedos. Dava para ver em seu olhar que
ele estava sofrendo tanto quanto eu.
Eu também não comia direito há quinze dias. À noite, eu mal
conseguia dormir, passava a madrugada inteira me revirando na cama,
sentindo falta de ter o corpo de Freya entrelaçado ao meu, me mantendo
aquecido. Cada vez que eu fechava os olhos, ficava revivendo a discussão
que tivemos e o momento em que eu a expulsei. Fui um idiota. Porra, um
completo idiota! Minha raiva estragou tudo e me fez perder a mulher mais
importante da minha vida. Eu jamais iria me perdoar por isso.
Eu não sabia o que Freya estava fazendo nesse tempo desde que saiu
da cabana. Não sei se ela estava na loja mantendo-a funcionando, e não me
importei de ir até lá para descobrir. Uma hora depois de Freya sair naquela
tarde, dei uma volta na montanha apenas para ter certeza de que ela não se
acidentou enquanto descia o terreno íngreme sozinha. Como não vi nenhum
sinal da mulher, concluí que ela chegou em segurança na vila e voltei para a
cabana.
Passei os últimos dias em casa cuidando do meu cachorro, eu trocava
os seus curativos e aplicava uma pomada de ervas que fiz para que as suas
feridas não inflamassem. Hati estava bem. Ele já estaria pulando e
correndo, se não fosse pela tristeza que sentia com a ausência de Freya.
Não fui mais à vila desde então. A comida estava acabando, mas eu
não estava nem um pouco a fim de ir até a outra cidade com a minha
caminhonete caindo aos pedaços para fazer compras. Eu só queria ficar
quieto, sem interagir com ninguém. Sinceramente, eu poderia morrer de
fome aqui que não me importaria nem um pouco. Já perdi Freya, não me
importava com mais nada. Eu não tinha mais motivos para continuar nesta
vida, nem mesmo Hati me alegrava. Porra, Freya era a minha razão de
viver.
Fui tirado dos meus pensamentos quando ouvi alguém bater na porta.
Hati, que estava deitado em sua cama de peles, se levantou na velocidade de
um raio e saiu do quarto. A reação do cachorro fez meu coração acelerar, eu
só conseguia pensar em uma pessoa que faria ele ter esse tipo de
comportamento: Freya. Será que ela voltou e Hati sentiu o seu cheiro?
Levantei-me da cama rapidamente e fui até a porta, sem me preocupar
que o meu cabelo estivesse bagunçado, ele não via um pente há quinze dias
e se eu fosse tentar penteá-lo agora, perderia tempo demais. Não posso
deixar Freya esperando. Vou tentar consertar essa merda.
Quando abri a porta da frente, meu coração se aqueceu. Freya estava
parada ali, com as mãos na cintura e batendo os pés no chão de maneira
impaciente. Ao olhar para o seu rosto, percebi que ela estava com um
semblante sério e o olhar distante.
— Bear — ela disse, com um tom seco que fez meu coração doer.
— F-Freya... o que está fazendo aqui? — gaguejei.
Hati passou por baixo das minhas pernas e foi para cima dela. Freya
me ignorou completamente e direcionou sua atenção para o cachorro.
— Oh, Hati! — Ela se abaixou e deu um beijo no focinho dele,
enquanto afagava a sua cabeça. — Que bom ver que você está melhor!
Fiquei em silêncio, observando-a brincar com o meu cachorro. O
animal parecia ter recuperado todo o seu entusiasmo em poucos segundos,
ele balançava a cauda e lambia o rosto de Freya, enquanto recebia afagos no
pescoço e na cabeça.
Depois de um tempo, Freya se colocou de pé e entrou na cabana,
passando entre o vão que havia entre meu corpo e o batente da porta. Ela
não olhou mais para mim, nem mesmo por um mísero segundo, ficou
agindo como se eu fosse invisível. Hati a seguiu pela casa e eu resolvi fazer
o mesmo. Fiquei confuso quando ela entrou no meu quarto.
— O que está fazendo? — perguntei, ao vê-la abrir a primeira gaveta
da cômoda e vasculhar lá dentro.
— Esqueci uma coisa aqui — respondeu, sem se dar ao trabalho de
olhar na minha direção. — Não se preocupe, vou pegar e já estou indo
embora. Você nunca mais vai me ver.
Suas palavras me atingiram como lâminas e a esperança que eu tinha
de tentar fazer as pazes desapareceu. Meu peito se apertou e eu me assustei
ao sentir meus olhos arderem com as lágrimas. Porra, ela não pode me ver
chorar... preciso sair daqui.
— Faça o que quiser, eu não me importo — cuspi aquelas palavras
com o máximo de desprezo que eu consegui.
Era tortura ficar no mesmo cômodo que Freya. Não me aguentei e saí
do quarto em passos largos, deixando a mulher na companhia do meu
cachorro. Eu daria uma volta pela montanha para tentar acalmar meus
pensamentos e ficaria fora tempo o suficiente para que ela encontrasse o
que quer que estivesse procurando. Quando eu voltar, Freya terá ido
embora.
Saí da cabana e caminhei até a cachoeira, onde a vi pela primeira vez.
Fiquei um tempo por lá, sentado em uma pedra à beira d’água, ouvindo o
som da cascata e sentindo os respingos de água gelada atingirem o meu
rosto. Nesse meio tempo, fiquei refletindo sobre a merda que estava a
minha vida.
Eu queria muito ter dito que estava arrependido pelo modo que agi
com Sven, queria pedir desculpas por tudo que a fiz passar, até imploraria
para que ela me desse uma segunda chance, mas quando vi o olhar frio em
seu rosto, eu recuei. Freya não parecia disposta a conversar e eu não queria
ficar mais machucado do que já estava.
Meia hora depois, eu voltei para casa e encontrei a porta escancarada.
Depois de vasculhar cada centímetro de cada cômodo, constatei que Freya
não estava mais lá. Nem ela e nem o meu cachorro.
Saí para a varanda da casa e me debrucei sobre a mureta de madeira
que a cercava. No horizonte, há mais ou menos 100 metros de distância, vi
a inconfundível estatura de Freya descendo a colina e mais atrás estava
Hati, que balançava a cauda e a seguia sem ao menos olhar para trás.
Pensei em correr até lá e recuperar o meu cachorro, mas desisti da
ideia. Hati passou as últimas semanas aqui comigo, ambos estávamos
sofrendo com a ausência de Freya e se ele continuasse a se alimentar mal,
logo teria problemas de saúde. Achei melhor deixar que ao menos um de
nós fosse feliz ao lado dela. Porra, perdi a minha mulher e agora o meu
cachorro. O que vem depois?

Assim que girei a maçaneta para abrir a porta de casa, comecei a


chorar. Ver Bear outra vez me desestabilizou por inteira. Pensei que eu seria
forte e conseguiria vê-lo uma última vez sem desmoronar, mas percebi que
eu estava profundamente enganada.
Fui até a cabana para buscar o meu caderno de desenhos. Eu podia
simplesmente comprar outro, mas aquelas folhas possuíam mais do que
apenas rabiscos, nelas haviam lembranças de uma época feliz. Por mais que
eu estivesse disposta a recomeçar de novo e voltar para Oslo, eu não
poderia partir sem levar aquele caderno comigo.
É claro que eu também subi a montanha com a esperança de rever
Bear — mesmo depois dele ter sido um cuzão comigo quando me expulsou
da cabana. Eu queria olhar para ele uma última vez e gravar cada detalhe do
seu rosto, já que não tiramos nenhuma foto quando estávamos juntos
porque ele odiava tecnologia — Bear falava mal do seu falecido tio, mas
em alguns aspectos era igualzinho a ele.
O idiota me fez sofrer, mas também me proporcionou os dias mais
felizes da minha vida. Eu sabia que jamais seria completa sem estar ao lado
dele, mas não podia aceitar viver com um homem que tem crises de ciúme
cada vez que me vê interagindo com um sujeito que ele não gosta.
Por mais que eu não quisesse, estava na hora de abandonar o mundo
fantasioso onde eu estive com a cabeça nos últimos anos. Finais felizes só
acontecem em livros e a vida real é uma merda. A partir desse momento,
iria parar de ficar sonhando com homens perfeitos, eles não existiam e o
Bear... bom, o Bear era um cuzão!
Quando entrei em casa, as lágrimas desciam dos meus olhos. Um ódio
profundo misturado com tristeza queimava dentro de mim. Bear não me deu
a mínima, ele saiu da cabana apenas para não ficar no mesmo ambiente que
eu. É isso... vou embora amanhã e nem lhe disse adeus, ou dei um abraço
de despedida.
Encostei-me na porta já fechada e deixei que o meu corpo
escorregasse até o chão. Abracei meus joelhos, enquanto sentia mais
lágrimas saírem. Eu me sentia desolada. Passei os últimos quinze dias
dentro de casa sem falar com ninguém e hoje foi a primeira vez que saí na
rua desde que terminei com Bear.
Fui até a montanha pela manhã e agora estava criando coragem para
ir até a vila me despedir de todos com quem interagi nos últimos meses. Eu
precisava ser forte, porque os fofoqueiros de plantão fariam inúmeras
perguntas sobre o motivo de eu estar deixando a vila e o porquê de Bear e
eu não estarmos mais juntos. Embora eu estivesse preocupada com essa
questão, fiquei mentalizando que seria uma despedida rápida, eu iria falar
apenas o necessário e voltaria para casa antes do anoitecer. Amanhã, a essa
hora, eu estaria em minha caminhonete voltando para Oslo.
Enquanto eu chorava, Hati veio até mim e começou a lamber o meu
rosto. Eu sorri em meio aos soluços do choro e afaguei a sua cabeça. Fiquei
tão atordoada com o meu reencontro com Bear que só percebi que o
cachorro me seguiu quando cheguei na estrada da floresta e o vi pegando
um graveto para brincar. Não fui louca de subir a montanha outra vez
apenas para devolver o cachorro, então decidi que ele poderia passar esse
último dia comigo aqui na vila.
Olhei para Hati e me perguntei onde eu poderia deixar o cãozinho
quando fosse partir. Por mais que eu sentisse vontade, eu não iria levá-lo
embora comigo, Bear ficaria ainda mais puto se eu desaparecesse no mundo
e levasse o seu cachorro. Talvez eu possa deixar Hati com o delegado
Müller e pedir que ele o leve até Bear.
O cãozinho estava bem, embora os seus machucados ainda estivessem
cobertos com gaze e esparadrapo — dava para ver que Bear fez um
excelente trabalho ao cuidar dele para evitar que as feridas infeccionassem.
Eu sentiria falta de Hati e, porra, também sentiria falta do seu dono
arrogante e cabeça-oca, mas eu não podia ficar com eles. Não queria passar
o resto da vida em um relacionamento tóxico apenas porque eu não
consegui desapegar. Vai doer, assim como está doendo agora, mas com o
tempo eu ficarei bem...
CAPÍTULO 31

Quando a noite caiu, eu estava na loja. Hati me seguiu até lá e ficou


deitado em frente ao balcão enquanto eu pegava os meus quadros e
materiais de pintura e os colocava na carroceria da minha caminhonete que
estava estacionada em frente ao estabelecimento. Era a primeira vez que eu
vinha aqui desde que Bear e eu terminamos.
Infelizmente, era difícil passar um tempo na loja sem lembrar de
todos os momentos românticos que vivemos aqui. Éramos tão felizes. Uma
lágrima saiu do meu olho esquerdo quando tracei com o dedo os entalhes
feitos em um pequeno totem de madeira que estava sobre o balcão.
As coisas já estavam acumulando poeira, o que significava que Bear
também não esteve aqui nos últimos dias. Céus, talvez ele nem volte mais
nesta loja e deixe o lugar abandonado, como estava quando cheguei na
vila.
Segurando o choro, caminhei até o canto próximo à vitrine onde Bear
havia colocado o meu cavalete de pintura. Retirei a tela em branco que
estava sobre a estrutura de madeira e olhei ao meu redor. Meu coração doía
por saber que aquela era a última vez que eu pisaria ali. Amanhã de manhã
eu partiria de Havengreen e nunca mais iria voltar.
Eu pretendia contratar algum corretor de imóveis para que ele
vendesse a casa, assim não teria mais nenhum pretexto para vir aqui
novamente. Já me despedi de todos os moradores por quem criei afeto e
recebi inúmeros pedidos para ficar, mas tive que ignorá-los.
A sra. Ludwig chorou e até me deu uma cesta de pãezinhos para a
viagem. Eu sentiria falta dela, do delegado Müller, de Hati e das pessoas
simpáticas que me cumprimentavam sempre que me viam na rua. Mesmo
que eu não queira admitir em voz alta, sentirei falta até do Bear.
O único de quem eu não me despedi foi Sven. Eu sabia que seria rude
ir embora sem falar com ele depois da amizade que tivemos, mas eu não me
sentia confortável em ir até a mercearia para vê-lo uma última vez. Não
queria que ele fizesse piadinhas sobre Bear, já estava me sentindo mal o
suficiente para ter que ouvir algum comentário idiota a respeito da situação,
então achei melhor evitá-lo. Eu não voltarei mais aqui, não terei que me
explicar sobre essa atitude.
Quando comecei a desmontar o cavalete para colocá-lo na
caminhonete, ouvi o sino da porta tocar e passos pesados caminharem na
minha direção. Olhei sobre o ombro para ver quem era e senti um frio na
barriga.
— O-olá, Sven. — Deixei de mexer no cavalete e me virei para
encará-lo.
Ele parou alguns centímetros à minha frente e cruzou os braços diante
do peito. Seus olhos pousaram em uma caixa de papelão próxima, onde
estavam alguns quadros que empacotei para a viagem.
— Tirou as coisas da minha mercearia e agora está tirando as coisas
da loja do Bear também? — Ele me direcionou um sorrisinho debochado.
— Você é bem indecisa, sabia?
Eu não respondi, estava ocupada demais pensando em alguma coisa
para dizer que o fizesse ir embora. Definitivamente, eu não estava a fim de
ouvir as piadinhas que Sven tinha para fazer.
— Ah, é... eu também soube que você vai sair da cidade. — Ele olhou
brevemente para a minha caminhonete estacionada lá fora, que estava
visível através da vitrine de vidro. — Vai embora e nem se despediu de
mim, Freya? Isso magoa.
Meu rosto queimou com vergonha. Não pensei que ele ficaria
sabendo da minha partida antes que eu estivesse bem longe da vila. Com
certeza o delegado Muller ou algum outro morador fofoqueiro espalhou o
boato até chegar nos ouvidos de Sven.
— Bom, eu pretendia falar com você de manhã antes de partir. —
Direcionei-lhe um sorriso amarelo e torci para que ele acreditasse na minha
mentira. — Imaginei que estivesse ocupado na mercearia.
Sven suspirou e deu um passo em minha direção.
— Eu avisei que o Bear não era um sujeito legal. Devia ter me
escutado.
Revirei os olhos e fui até o canto da parede onde estava a caixa de
papelão com os quadros que empacotei. Talvez, se Sven perceber que estou
ocupada, ele crie vergonha na cara e vá embora para não me atrapalhar.
Me abaixei e peguei a caixa nos braços. Ela estava um pouco pesada, mas
fiz o possível para não deixar transparecer.
— Estou falando sério, Freya — ele insistiu no assunto.
— Não quero falar sobre isso — resmunguei. — Se veio aqui para
falar sobre o Bear, é melhor ir embora. Não quero saber dele, nós
terminamos e eu não faço mais parte dessa briguinha entre vocês.
Caminhei em direção à porta para colocar a caixa na caminhonete,
mas Sven ficou no meu caminho e me impediu de sair da loja, segurando o
meu braço. Me assustei com aquela atitude e derrubei a caixa no chão,
alguns quadros caíram e eu bufei com raiva.
— Espera aí, Freya, não vou deixar que vá embora sem se despedir.
— Sven segurou em meus ombros e me colocou contra a parede que havia
ao lado da porta.
Meu coração acelerou e eu comecei a me sentir em pânico. Sven
colou seu corpo no meu e me pressionou com mais força contra a parede.
— Que porra você está fazendo? — exaltei-me. — Me solta, caralho!
Eu me debati para tentar sair de perto dele, mas não consegui. O filho
da puta era forte.
— Vou provar para você que eu sou mil vezes melhor que o Bear. —
Ele sorriu de um jeito malicioso. — Não vá embora, Freya, fique aqui na
vila comigo. Você não vai se arrepender.
Fiquei boquiaberta, não conseguia processar o que estava
acontecendo. O pânico e o medo de que Sven pudesse fazer algo horrível
estavam me impedindo de pensar com clareza. Porra, eu quero sair daqui.
— Eu jamais ficaria com você — cuspi aquelas palavras, deixando
claro o meu desprezo por ele e pelas suas atitudes. — Me solte, Sven. Saia
de perto de mim!
— Não critique antes de provar, Freya. — Ao terminar aquela frase,
Sven tentou me beijar. Virei o rosto para o lado e a sua boca acertou a
minha bochecha.
Senti a bile subir pela minha garganta. Eu estava tão desesperada que
começava a ficar difícil de respirar. Preciso sair daqui. Em um momento de
adrenalina, levantei meu joelho com força o suficiente e atingi a sua virilha.
Sven me soltou enquanto se encolhia com dor e eu aproveitei a
oportunidade para me afastar.
Toda aquela movimentação fez Hati acordar do seu sono e se levantar.
Ele olhou para Sven e começou a rosnar na direção do homem, que estava
inclinado com as mãos na virilha tentando superar a dor.
Apesar das minhas pernas estarem trêmulas, corri até a porta e girei a
maçaneta para abri-la, mas percebi que estava trancada. Caralho... não pode
ser! Deixei a minha cópia das chaves na fechadura, o que aconteceu?
Tentei abrir a porta outra vez, mas não obtive sucesso.
— Está procurando isso aqui? — Sven perguntou em um tom
debochado, embora a sua voz ainda oscilasse por causa da dor.
Olhei para ele e o vi com as chaves na mão.
— Você não vai sair, Freya. — Ele começou a rir ao perceber meu
olhar de desespero.
— Socorro! Alguém me ajuda! — gritei, e comecei a bater na
madeira da porta de um jeito desesperado. Eu sabia que seria impossível
alguém me ouvir, considerando que àquela hora da noite as ruas de
Havengreen ficavam vazias, mas eu precisava tentar. Preciso dar um jeito
de sair daqui!
Eu não conseguiria roubar as chaves de Sven sem que ele tentasse me
agarrar novamente. Pensei em correr até a escada atrás do balcão e tentar
sair pela janela do segundo andar, mas ela era pequena demais até para o
meu corpo — eu não queria correr o risco de entalar na passagem e ficar à
mercê do louco que estava aqui na loja. Para piorar a situação, deixei meu
celular no painel da caminhonete e não havia como ligar para a polícia.
Nunca pensei que Sven fosse capaz de agir dessa forma. Caralho...
Olhei ao meu redor, desesperada para encontrar alguma coisa que
pudesse me salvar daquela situação, eu me recusava a aceitar que estava
sem saída. Minha respiração estava acelerada enquanto eu analisava todos
os cantos da loja em busca de algo que pudesse usar como defesa.
Avistei a prateleira com esculturas de tamanho mediano e imaginei
que elas seriam perfeitas para bater em alguém. Não pensei duas vezes,
corri até lá e peguei um totem de madeira que era pesado o suficiente para
causar dor e deixar um galo na cabeça de um filho da puta.
Engolindo em seco, segurei o totem com as duas mãos como se
estivesse segurando um bastão de baseball e me virei na direção de Sven.
—S-se der mais um passo eu te bato — ameacei.
Parte de mim sabia que aquilo não seria suficiente para impedi-lo,
mas erguer aquele objeto de madeira me fez sentir uma falsa confiança de
que eu conseguiria lutar contra ele, caso fosse necessário.
Eu fazia o possível para não deixar transparecer o nervosismo que eu
sentia, mas minhas mãos trêmulas e respiração acelerada entregavam que eu
estava em pânico.
— V-vá embora, Sven, por favor — implorei, minha voz estava
trêmula pelo pânico. — Você quer dinheiro? Te dou a quantia que quiser,
contanto que saia daqui.
— Dinheiro? — Sven riu como se eu tivesse dito a coisa mais absurda
do mundo. — Eu não preciso de dinheiro, Freya. Só tem uma coisa que eu
quero nesse momento. — Ele me olhou de cima a baixo com uma lentidão
que me deixou ainda mais perturbada.
Entendi o que Sven queria: eu. E entendi também que ele pretendia
fazer qualquer coisa para conseguir. Não... eu não vou deixar esse idiota se
aproximar de mim. Segurei o totem com tanta força que meus dedos
começaram a doer.
Deixando claro que o desconforto do meu chute não o incomodava
mais, o homem deu um passo na minha direção e Hati se colocou entre ele e
eu, rosnando. Sven ignorou o aviso e se aproximou mais de mim, o
cachorro rosnou outra vez e mordeu a canela dele.
— Porra! — Sven gritou e chutou Hati para longe.
O cãozinho rolou pelo chão de madeira e ficou encolhido perto da
porta, choramingando com a dor do chute que levou. Meu coração pesou ao
ver Hati daquele jeito, ele ainda estava se recuperando dos ferimentos
causados pela briga com os lobos.
— Seu idiota! — gritei, com os dentes cerrados. Lágrimas brotaram
dos meus olhos e a minha visão ficou turva.
Apesar do borrão que eu enxergava, percebi Sven se aproximar de
mim. Reuni toda a força que eu tinha e tentei acertá-lo com o totem de
madeira, mas o filho da puta segurou a escultura antes que ela atingisse o
seu rosto.
Soltei a peça e dei alguns passos para trás, assustada. Acabei
tropeçando em uma elevação do piso e caí de costas, batendo a cabeça no
chão. Gemi com dor e me senti um pouco tonta, mas lutei para me manter
acordada.
Antes que eu me preparasse para levantar, senti o peso de outro corpo
sobre o meu e entrei em desespero. Tentei empurrar Sven para longe, mas
ele segurou meus braços com apenas uma mão e os imprensou contra o
chão de madeira. Tentei chutá-lo, mas ele estava com o corpo entre as
minhas pernas e eu não consegui acertar em nenhum lugar que pudesse lhe
causar dor. Em outras palavras: eu estava imobilizada.
— Socorro! — gritei, sabendo que isso era tudo que eu conseguiria
fazer naquele momento. — Alguém me aju...
Sven me deu um tapa na cara com a sua mão livre.
— Cala a boca, porra! — ordenou, com arrogância na voz.
Engoli em seco e mais lágrimas começaram a sair dos meus olhos de
um jeito descontrolado. Eu sentia ódio, pânico e tristeza, não conseguia
acreditar que estava passando por esse tipo de situação.
Por mais que eu tentasse me debater, Sven era mais forte que eu e
mantinha meu corpo preso ao chão sem qualquer esforço. Ele me encarava
com um sorriso maléfico, quase como se sentisse prazer em me ver naquele
estado de desespero. Filho da puta!
— Vai pagar por isso — minha voz saiu rouca, tanto pelo choro
quanto pelo ódio que eu sentia.
Sven apenas riu com escárnio e segurou o meu queixo com a sua mão
livre. Ele aproximou seu rosto do meu e eu tentei virar a cabeça para o lado
oposto, mas não consegui, seu aperto era forte demais.
Ele lambeu a minha bochecha e eu choraminguei com repulsa. Me
debati novamente e tentei livrar minhas mãos do seu aperto, mas não
consegui.
— Não faça isso, Sven... por favor... me deixe ir — implorei, mesmo
sabendo que ele não iria me ouvir.
Lágrimas desciam pelo meu rosto e já molhavam o meu pescoço
fazendo com que os fios de cabelo grudassem em minha pele. Sven ainda
segurava o meu queixo com força e eu não consegui me afastar quando ele
beijou a minha boca. Protestei e acertei um chute em sua perna, mas isso
não o parou.
Fiz o possível para lutar, para impedir que ele me violasse, e à medida
que o tempo passava eu ficava mais desesperada e com medo de fracassar.
Eu me recusava a aceitar que não havia saída, precisava haver alguma coisa
que eu pudesse fazer. Eu tinha que reagir.
Passei momentos de pânico, forçando o maxilar para que a minha
boca se mantivesse fechada enquanto Sven tentava me beijar à força.
Quando senti sua língua tentando passar entre meus lábios me surgiu uma
ideia, uma última tentativa de esperança, e eu me apeguei a ela com toda a
vontade que eu tinha. Se meu plano falhasse, Sven ficaria furioso e iria
descontar toda a sua raiva em mim, mas eu precisava lutar até o último
segundo possível.
Criando coragem, reprimi a náusea que eu sentia e abri os lábios,
permitindo que a sua língua adentrasse. Quando ela passou pela abertura,
fechei o maxilar com tanta força que senti meus dentes estalarem. Ele
grunhiu contra a minha boca e tentou recuar, mas eu não o soltei, mantive
meus dentes fechados ao redor da sua língua até que senti o gosto metálico
de sangue.
Depois de lutar com muita força, Sven deixou de segurar os meus
braços e me deu outro tapa. Soltei aquela maldita língua e ele finalmente
afastou sua boca da minha, aproveitei o momento e arranhei o seu rosto
com força, enquanto tentava empurrá-lo para longe.
Sven colocou uma mão na boca e eu notei que o seu rosto estava com
as marcas avermelhadas das minhas unhas. Ele ficou com uma expressão
furiosa e um brilho maligno surgiu em seu olhar. Me encolhi
instintivamente. Eu senti medo, muito medo.
— Não vale à pena — falou arrastado, pela língua ferida.
Ele ergueu a mão livre na altura do rosto e quando cerrou o punho eu
soube o que viria a seguir. Fechei os olhos e ergui os braços para tentar me
defender, mas não adiantou. Senti uma dor aguda em minha têmpora direita
e logo perdi a consciência.
CAPÍTULO 32

A noite caiu e eu andava de um lado para o outro na minha pequena


sala de estar. Minhas mãos estavam para trás do corpo e, vez ou outra, eu
suspirava com irritação. Desde que Freya esteve aqui nesta manhã eu não
consegui pensar com coerência, eu não conseguia afastar o rosto dela dos
meus pensamentos, não conseguia esquecer da sua voz... Porra, eu estou
enlouquecendo!
Não adiantava passar mais tempo negando o óbvio: eu não
conseguiria viver sem Freya. As semanas que passamos afastados foram as
piores da minha vida — nem mesmo quando a minha antiga noiva me
deixou eu fiquei tão mal assim. Se antes eu me isolei na montanha, agora eu
sentia vontade de cavar um buraco bem fundo e me enterrar. Preciso fazer
alguma coisa.
Fiquei muito tempo sozinho nesta cabana e durante anos acreditei que
queria levar uma vida solitária, mas quando Freya cruzou o meu caminho
eu percebi que precisava da companhia dela. Agora que ela se foi e o meu
mundo voltou a ficar vazio, percebi que não era essa vida que eu queria. Eu
preciso ter Freya ao meu lado, preciso dela ou não vou conseguir viver.
Enquanto eu andava, meu joelho bateu no sofá.
— Porra! — xinguei, e me sentei para massagear a região.
Depois que o incômodo passou, olhei para o assento de couro em que
eu estava e meu coração pesou. Freya dormiu aqui por dias antes de
ficarmos juntos. Passei a mão pelo encosto do sofá, distraído, e acabei
encontrando um fio de cabelo escuro que só podia pertencer a ela.
Segurei o fio de cabelo entre os dedos e passei bons minutos
observando-o, perdido em pensamentos. Uma voz vinda direto do meu
coração implorava para que eu engolisse o orgulho e fosse até a vila pedir
desculpas à Freya. Mesmo que ela tenha me tratado de um jeito frio hoje de
manhã eu sentia que precisava tentar, precisava ir até ela e implorar seu
perdão. Não consigo mais viver assim.
Suspirei e olhei para a janela que ficava na cozinha. Já estava escuro
lá fora e o mais lógico a se fazer seria esperar até a manhã seguinte, mas eu
sabia que não conseguiria dormir ou comer, eu não teria paz enquanto não
falasse com Freya. Precisava ir até ela e implorar o seu perdão e tinha que
ser agora. Prefiro abrir mão do meu orgulho do que da minha mulher.
Respirando fundo, deixei o fio de cabelo no lugar exato em que o
encontrei e levantei do sofá. Estava decidido: eu iria até a vila.

Quando desci a montanha, tentei ligar minha caminhonete, mas não


consegui. Depois de muitas tentativas de fazer o motor ligar, eu desisti e
resolvi seguir a pé pela floresta.
Conforme eu caminhava pela estrada de terra cercada de pinheiros
altos à luz da lua, comecei a sentir um cheiro de fumaça que ficava mais
forte à medida que eu me aproximava da vila.
Ao chegar na entrada de Havengreen, percebi um clarão laranja à
distância. Infelizmente não pude ver a fonte daquela luz já que haviam
algumas casas na frente, mas no céu era possível enxergar uma nuvem de
fumaça subindo e ficando cada vez mais alta. Meu peito se apertou e eu
fiquei com um terrível sentimento de que alguma coisa errada estava
acontecendo. Porra, é um incêndio!
Quando percebi, minhas pernas já estavam se movendo e eu corria à
toda velocidade em direção ao local que aparentemente estava em chamas.
Uma sensação ruim crescia em meu peito à medida que o tempo passava.
Fogo... Alguma casa está queimando! Pensei, enquanto corria pela
rua de pedras ladrilhadas da vila. Apesar do clima frio daquela noite de
outono, um suor de nervosismo escorria pelo meu corpo. O coque que
prendia o meu cabelo se desfez com a velocidade dos meus passos e agora
os fios dourados se agitavam ao redor do meu rosto durante a corrida.
O cheiro de fumaça ficava mais forte à medida que eu me aproximava
da rua da minha loja e o pânico começava a sufocar o meu peito. Algo de
errado está acontecendo... eu posso sentir! Corri o mais rápido que eu
pude, indo em direção a luz alaranjada que iluminava parte do céu escuro
da noite. Depois de mais alguns minutos de agonia, finalmente cheguei ao
local.
Minha intuição estava certa. Havia um incêndio naquela rua, e o
estabelecimento em chamas era a minha loja de esculturas. Porra! Não era
difícil imaginar o estrago que o fogo podia fazer em um lugar repleto de
peças de madeira. Está tudo perdido... tudo! Levei as mãos à cabeça,
enquanto absorvia o choque daquele momento. Como isso aconteceu?
Vários moradores de Havengreen se reuniram na rua em frente à loja
e agora observavam o fogo queimar, assustados, sem saber o que fazer.
Nossa vila ao pé da montanha era pequena, não havia um corpo de
bombeiros aqui e até que o batalhão da cidade mais próxima chegasse tudo
estaria reduzido a cinzas. Algumas almas caridosas até enchiam bacias
d’água no chafariz da praça que ficava na rua de trás e corriam para tentar
apagar o fogo, mas era tudo em vão. Do lado de fora, era possível ver
através do vidro da vitrine que as chamas já estavam chegando ao teto, não
havia como contê-las.
Olhei ao meu redor à procura de Freya, imaginando que ela também
estaria ali para ver o ocorrido, mas não a encontrei. Meu desespero
aumentou quando reparei que a caminhonete dela estava estacionada em
frente à loja com caixas de papelão na carroceria aberta. Porra, Freya é a
única pessoa, além de mim, que tem uma cópia das chaves da loja. Será
que ela está lá dentro? Caralho!
Sem pensar duas vezes, respirei fundo — apesar do ar ali fora estar
enfumaçado — e corri em direção ao estabelecimento o mais rápido que
pude. As labaredas estavam ao redor da porta fechada, mas não me
importei. Se existe a menor possibilidade da minha mulher estar lá dentro
eu não hesitarei em salvá-la. Não posso perdê-la, jamais conseguirei viver
sem ela...
Em um momento de adrenalina, reuni toda a força que eu tinha e
lancei meu corpo contra a porta. Ela tremeu, mas não abriu, estava trancada.
Me afastei alguns passos e tentei arrombá-la novamente. As dobradiças
começaram a se soltar da parede.
— Freya?! — gritei, preocupado. — Você está aí?
Não houve resposta. Lancei o meu corpo contra a porta outra vez e foi
quando ouvi um latido. Era Hati e ele estava lá dentro. Porra!
Uma parte do meu corpo fraquejou diante do pânico e da preocupação
que eu sentia. Meu cachorro não estaria na loja sozinho, tenho certeza que
seguiu Freya até aqui. Caralho, ela está lá dentro sim... e se não respondeu
quando chamei, isso é um péssimo sinal.
Respirei fundo e enrijeci os músculos do meu braço. Eu precisava
abrir aquela porta. A cada segundo que passava poderia ser tarde demais —
se à essa altura já não fosse tarde para salvá-la. Não! Não posso pensar
assim. Vou abrir aquela maldita porta e tirar Freya de lá!
Tomei impulso e corri em direção à porta novamente. Quando meu
braço atingiu a madeira, cerrei os dentes ao perceber que ela estava quente.
Meu braço ardeu, mas ignorei a dor da queimadura e me lancei outra vez
contra a madeira, ela rangeu, as dobradiças se soltaram e a porta finalmente
se abriu.
Entrei na loja sem hesitar e precisei cobrir o nariz com o braço devido
à quantidade de fumaça que havia lá dentro. As chamas cercavam as
paredes e já estavam começando a se alastrar pelo teto e parte do chão.
Quando dei um passo à frente, o vidro da vitrine fez um estalo e então
se quebrou, espalhando milhares de pedaços pelo chão de madeira —
provavelmente, não aguentou o calor que fazia aqui dentro, parecia até que
eu estava em um forno gigante.
— Freya? — chamei novamente e a minha garganta ardeu por conta
da fumaça.
Olhei para o local em que ficava o balcão e vi a estrutura de madeira
em chamas, assim como a escada que levava até o segundo andar. Perto da
porta havia uma caixa de papelão caída com várias pinturas espalhadas,
algumas já estavam sendo consumidas pelo fogo. O que aconteceu aqui?
— Freya? — gritei o mais alto que pude enquanto olhava ao redor, à
procura de qualquer sinal dela.
Hati latiu novamente e eu virei o rosto na direção do som.
No instante em que avistei o cachorro, o meu mundo desabou. Ele
estava com Freya e ela estava caída no chão, desacordada, e com sangue
escorrendo de sua testa. Hati se esforçava para arrastar o corpo imóvel da
minha mulher para um canto da loja que ainda não estava tomado pelas
chamas.
O calor do fogo já não me incomodava, pois tudo que eu conseguia
sentir era dor e medo. Porra, se Freya estivesse morta eu jamais iria me
perdoar, não poderia viver com isso. Caralho, eu não pensarei duas vezes
em deixar o meu corpo queimar nessa loja junto com o dela.
— Freya? — chamei, torcendo para que ela abrisse os seus lindos e
delicados olhos castanhos. Infelizmente, Freya não demonstrou nenhuma
reação.
Corri até ela e pulei as chamas que estavam entre nós. A barra da
minha calça pegou fogo e eu bati até que a chama se apagou, mas senti a
ardência da queimadura que ficou na região. Não me importei com a dor ou
com a madeira do piso que estava tão quente que já começava a incomodar
as solas dos meus pés, me ajoelhei ao lado de Freya e toquei delicadamente
o seu rosto. Sua pele estava quente e suada, fazendo com que a fuligem do
ar ficasse grudada em suas bochechas. Em sua testa havia uma área
arroxeada de onde o sangue escorria e, agora que eu estava perto, também
percebi que havia sangue em sua boca.
— Freya? Por favor, não me deixe — implorei, segurando uma das
suas mãos.
Meu peito estava pesado e eu senti lágrimas saírem dos meus olhos.
Da última vez que chorei eu era apenas um garotinho assustado que foi
castigado pelo tio depois de fugir pela primeira vez do trabalho para ouvir
histórias antigas na praça da vila. Eu não derramei uma lágrima sequer
desde aquele dia, até agora.
Ver Freya nesse estado e o medo que eu sentia de perdê-la, fez com
que uma parte sensível de mim viesse à tona. Eu me senti estranho,
vulnerável, como se qualquer coisa pudesse me ferir. Quando percebi,
estava com o rosto enterrado em seu pescoço, chorando e implorando entre
soluços desesperados que ela não me deixasse.
Hati começou a latir e eu respirei fundo, voltando o meu foco para a
realidade. Eu sabia que ele estava me avisando para sair dali, mas eu não
sairia se Freya estivesse... morta. Preferia queimar nesse inferno em que eu
me encontrava do que viver a minha vida sem estar ao lado dela.
Criei coragem e levei meu rosto até o seu peito, encostei o ouvido no
lado esquerdo e torci para ouvir qualquer sinal do seu coração batendo. As
vozes das pessoas lá fora e o som do fogo consumindo a madeira ao meu
redor atrapalharam um pouco a minha percepção. Eu fiquei em silêncio e
me concentrei em Freya, ouvi o que me pareceu ser um pequeno batimento
e logo veio outro. Aquilo foi o suficiente para me fazer suspirar de alívio.
Ela estava viva — por um triz —, mas isso me deu esperança.
— Vou tirar você daqui, minha deusa — sussurrei, acariciando o seu
rosto sujo de fuligem e sangue seco. — Vai ficar tudo bem.
Antes de eu me levantar, fitei seus dedos delicados e percebi que
havia sangue embaixo das suas unhas. Franzi o cenho e olhei mais de perto.
Junto com o sangue também havia algo muito parecido com pele. O que
aconteceu? Ela tentou arranhar alguém?
Hati latiu outra vez e eu abandonei os meus pensamentos confusos.
Teria minhas respostas quando Freya acordasse, agora, precisava tirá-la
daqui e levá-la para o hospital. Fiquei de pé e peguei o seu corpo,
aconchegando-o contra o meu peito. Isso me fez lembrar de quando eu a
carregava para ir até o banheiro nos dias em que ela estava com o tornozelo
inchado.
O teto acima de mim estalou e eu dei um passo para a frente, já estava
mais do que na hora de sair dessa loja. Não havia nada que pudesse ser
recuperado, tudo estava em chamas, mas eu me sentia aliviado por saber
que consegui salvar o que eu tinha de mais precioso no mundo: Freya.
Caminhei com ela em meus braços e precisei passar sobre os cacos de
vidro da vitrine quebrada para desviar do fogo. Conforme eu andava, os
estilhaços estalavam sob os meus pés. Gemi com dor quando um deles
atravessou a sola da minha bota e furou o meu calcanhar. Apesar do
empecilho, não parei e segui mancando em direção à porta.
Não precisei chamar Hati para que ele viesse, assim que me
aproximei da saída, o cachorro saltou uma área do chão que estava em
chamas e correu para fora da loja, ficando em segurança junto com os
outros moradores da vila.
Minha panturrilha e meu antebraço ardiam com queimaduras e a cada
passo que eu dava, sentia o vidro entrar cada vez mais na pele do meu
calcanhar. Fiquei com os dentes cerrados e fiz o possível para controlar a
dor, naquele momento, tudo o que me importava era levar Freya até o
hospital e garantir que ela tivesse os melhores cuidados.
No instante em que saí da loja, ouvi um estrondo atrás de mim e virei
o rosto para ver o que era. Parte do teto — que também era o piso do
segundo andar — desabou, justo no lugar em que Freya estava deitada
quando cheguei. Alguns minutos de atraso e eu perderia o amor da minha
vida.
Olhei para a mulher desacordada em meus braços, suada, suja de
sangue e fuligem. Fiquei me perguntando como alguém podia parecer tão
frágil e tão bela ao mesmo tempo. Apenas ela. Freya é única, assim como
toda a sua beleza.
Respirei aliviado agora que Freya, Hati e eu estávamos fora do fogo.
Mesmo sabendo que perdi todas as minhas mercadorias e ferramentas de
trabalho naquela noite, não consegui me sentir mal. Tudo o que me
importava era a recuperação de Freya.

Fiquei sentado na poltrona do quarto de hospital, ao lado da cama


onde Freya estava. Ela não acordou desde que a encontrei na loja, mas os
médicos me garantiram que ela ficaria bem.
Também fui atendido e recebi os cuidados necessários em meus
ferimentos. Meu antebraço e panturrilha estavam com pomada para
queimadura e eu levei 5 pontos no calcanhar graças ao vidro que me cortou.
Agora, eu estava com o pé enfaixado e seria obrigado a usar sapatos leves
por um bom tempo.
Apesar do desconforto que eu sentia em meus machucados, era Freya
quem me preocupava. Os médicos viram o estado em que ela chegou aqui,
viram a lesão em sua testa e depois de fazerem testes constataram que o
sangue em sua boca e unhas não pertencia a ela. Seu corpo indicava sinais
de luta, ou seja, alguém a atacou. Eu só conseguia me perguntar quando iria
descobrir o que realmente aconteceu naquela loja.
O tempo passava e eu não desviava o olhar para longe do rosto de
Freya, queria ver o momento exato em que ela acordaria. Me inclinei para
frente na poltrona e segurei a sua mão. Agora ela já estava limpa, não havia
mais sangue ou fuligem em seu corpo e ela vestia uma camisola de hospital.
Eu estava pensando em chamar o médico para perguntar se não havia
nada de errado com Freya, quando ela abriu os olhos. Meu coração acelerou
e eu a encarei com expectativa enquanto ela piscava e tentava entender
onde se encontrava.
— Que bom que acordou... tive tanto medo de te perder. — Soltei a
sua mão e acariciei a sua bochecha.
Freya encolheu o corpo e deu um tapa na minha mão, afastando-a do
seu rosto.
— S-sven... Tire as mãos de mim! — gritou, desesperada. — Saia
daqui!
Assustei-me ao ver o pânico em seu olhar. Lágrimas começaram a
escorrer pelas suas bochechas e ela se abraçou em um gesto de defesa.
— Sven? — Franzi o cenho. — Sou eu, Bear.
— B-Bear? — ela gaguejou, assustada, e olhou ao seu redor. — Eu...
eu...
— O que houve, Freya? — Levantei da poltrona e me sentei na beira
da cama.
Segurei a sua mão e ela se encolheu outra vez. Seu olhar estava
perdido, olhando fixamente para a frente. Nunca a vi assim.
— Freya? O que aconteceu? — insisti. — Está se sentindo bem? Quer
que eu chame o médico?
— Bear... — balbuciou, ainda assustada. Ela virou o rosto na minha
direção, mas não olhou fixamente para mim. — Eu... eu não estou
enxergando nada!
CAPÍTULO 33

— Tem certeza? — perguntei, alarmado.


— Tenho... — ela choramingou, seu rosto estava com uma expressão
ainda mais assustada.
Balancei minha mão em seu campo de visão, mas Freya pareceu não
notar. Coloquei dois dedos na frente dela.
— Quantos dedos tem aqui?
— Que parte do não estou enxergando você não entendeu? — ela
gritou, em desespero. — Estou cega, Bear!
A notícia me caiu como um baque. Isso me fez questionar ainda mais
sobre o que aconteceu na loja antes do incêndio. O fogo não atingiu o rosto
dela para lhe causar a perda de visão, será que teve a ver com o hematoma
em sua testa? Certamente ela levou uma pancada na cabeça, isso sim podia
lhe trazer sequelas.
— Onde estou, Bear? O que aconteceu?
— Você está no hospital, em segurança. Tirei você do incêndio e te
trouxe para cá.
— Incêndio? — Seu rosto ficou surpreso. Era estranho ver Freya
olhando na minha direção, mas sem que o seu olhar estivesse fixo em mim.
Ela realmente não está enxergando nada. Preciso tranquilizá-la, fazê-la
perceber que está tudo bem e que estarei sempre com ela.
— Não se preocupe, Freya, o perigo já passou. Estou com você agora,
sempre estarei ao seu lado para o que precisar. — Afaguei o seu ombro,
com ternura. — Vou cuidar de você, Freya.
— Porra, cuidar de mim? — ela se exaltou outra vez. — Do jeito que
cuidou quando eu estava morando com você na montanha?
— Fiz o seu tornozelo melhorar, não fiz?
— Mas também foi a causa de eu ter torcido ele!
Perdi o argumento naquela hora. Freya estava certa e isso fez com que
eu me sentisse horrível.
— Me desculpe — foi tudo que eu consegui dizer. — Desculpe pelo
que aconteceu antes e depois do ataque dos lobos naquela tarde. Sinto muito
pelas coisas que eu disse... você não merecia aquilo.
— Não, eu não merecia — Freya cuspiu as palavras com um certo
desprezo. — Sai daqui, Bear!
— O quê? Por quê? — fui pego de surpresa.
— Você gritou comigo até eu sair da cabana semanas atrás! —
esbravejou, seu olhar raivoso encarava o vazio. — Se não fosse pelo seu
surto, eu provavelmente não estaria nessa cama de hospital agora.
— Freya...
— Sai daqui, Bear! — interrompeu-me, furiosa. — É a segunda vez
que suas atitudes me colocam perto da morte, não faz ideia do que eu passei
essa noite e eu não quero passar por nada parecido de novo. Só me deixe
em paz! Ainda preciso processar a ideia de que perdi minha visão. Porra!
— Freya...
— Caralho, Bear, eu mandei você sair! — Freya gritou alto o
suficiente para que qualquer pessoa no hospital pudesse ouvir. — Vai
embora... e chame uma enfermeira, um médico, qualquer coisa.
— O que está acontecendo aqui? — Uma enfermeira entrou no
quarto, alarmada.
— Ela acordou. — Encolhi os ombros, ao ver o pânico estampado no
rosto de Freya. — E não está enxergando nada.
— Como assim? — a enfermeira ficou confusa.
— Não sei, pergunte para ela. — Gesticulei na direção de Freya.
Eu estava irritado, com a cabeça cheia pelos acontecimentos. Quando
vi que Freya estava sendo amparada e examinada pela enfermeira, saí do
quarto, deixando as mulheres sozinhas.
Eu precisava de um tempo para acalmar a mente e digerir o que
estava acontecendo. Não conseguia acreditar que salvei Freya de um
incêndio, que agora ela não estava enxergando e que permanecia com raiva
de mim. Porra.
Suspirei aflito e passei a mão pelo meu cabelo bagunçado. Mesmo
que eu quisesse, não podia permanecer naquele quarto se Freya não
desejasse a minha presença. Ela precisava se recuperar e deixá-la estressada
não ajudaria em nada. Vou sair do hospital para respirar um pouco de ar
fresco e quando eu voltar, imagino que os médicos já tenham os resultados
de todos os exames dela. Talvez, já tenham descoberto de quem era o
sangue que foi encontrado sob as unhas e na boca de Freya e eu finalmente
vou saber que porra aconteceu.

Ao sair do hospital, percebi que já havia amanhecido. O céu estava


cinzento e nublado, um vento frio soprava e o ar cheirava à fumaça.
Algumas cinzas até caíam do céu e ficavam presas nos espaçamentos entre
os paralelepípedos da rua.
Fiquei um tempo na calçada, parado, me perguntando o que eu faria
de agora em diante. Minha cabeça estava um caos, eu não conseguia pensar
em nada que pudesse fazer a não ser esperar que Freya se acalmasse e tentar
falar com ela outra vez.
Olhei ao meu redor e avistei Hati deitado embaixo de um banco que
havia ao lado da porta do hospital. Chamei o cachorro com um assovio. Ele
olhou na minha direção, mas não se levantou. É claro que está esperando
por Freya.
— Vai ficar aí um bom tempo, amigo — sussurrei, para que ninguém
me ouvisse falando com o cachorro. A rua estava deserta, mas ainda assim
preferi tomar cuidado, eu tinha uma reputação de homem ranzinza a zelar.
A única que sabia do meu coração mole era Freya. Para ser sincero,
acho que nem ela sabe tanto assim do meu coração. Não me abri por
completo quando estávamos juntos e agora eu temia que nunca mais tivesse
uma chance de fazer isso. Não sei se a mulher vai me perdoar, falei muita
merda antes dela sair da cabana.
Ao longe, era possível ver um resquício de fumaça subindo no céu, na
direção em que antes ficava a minha loja. Suspirei com aflição e decidi ir
até lá para ver como o local estava.
Caminhei pela rua com as mãos nos bolsos da calça e a cabeça baixa,
não precisei olhar meu reflexo em nenhuma vitrine para saber que a minha
aparência deixava claro que eu era um homem derrotado. Perdi tudo o que
eu tinha: a minha mulher, a minha loja, até o meu cachorro. Eu estava
sozinho outra vez.
O ar de toda Havengreen cheirava à fumaça e havia fuligem
espalhada por todos os cantos, até mesmo na água do chafariz da praça.
Conforme eu avançava pelas ruas, solitário, e perdido em pensamentos, o
medo para ver os estragos causados pelo fogo só aumentava.
Meus olhos arderam quando parei em frente ao que sobrou da minha
loja de esculturas. Toda a estrutura de madeira foi corroída pelo fogo, não
havia nada ali além de algumas colunas e parte da fundação que eram feitas
de pedras. Onde antes era o piso, agora havia uma grande quantidade de
cinzas e pequenos pedaços de madeira em brasa. Não havia mais fogo, mas
o cheiro de fumaça ainda era forte.
Aproximei-me das ruínas em passos hesitantes. A caminhonete de
Freya ainda estava estacionada no mesmo lugar deste ontem à noite. Parei
para ver o que tinha dentro da carroceria e o meu sangue gelou. Vários
pertences de Freya, alguns quadros e até mesmo pequenos eletrodomésticos
estavam guardados em caixas de papelão na traseira do veículo. Porra... ela
estava indo embora da vila?
Pensar que Freya pretendia se mudar rasgou ainda mais o meu peito.
Se ela fosse embora de Havengreen eu jamais a veria. Não queria nem
imaginar a dor que eu sentiria com a sua ausência, eu não iria suportar.
Senti uma mão tocar o meu ombro e isso me fez esquecer a aflição
por um momento. Ao olhar para o lado, vi a Sra. Ludwig me encarando
com pesar.
— Como você está, querido? — ela indagou, visivelmente
preocupada.
Suspirei, encolhendo os ombros, e balancei a cabeça negativamente.
Eu não estava bem. Freya, a loja... era coisa demais para digerir.
Encarei as ruínas à minha frente e tudo que consegui sentir foi
desespero. Não sobrou nada na loja, nem uma única escultura de madeira
ou quadro, tudo foi consumido pelo fogo.
— Não se preocupe, sei que os outros moradores irão ajudá-lo a
reconstruir tudo, se você quiser — a Sra. Ludwig tentou me confortar.
Apenas assenti em silêncio. Mesmo com o cenário de destruição na
minha frente, tudo em que eu conseguia pensar era que eu precisava
encontrar algum jeito de reconquistar Freya. Eu precisava tê-la na minha
vida.
Depois de um tempo, a sra. Ludwig percebeu que eu não estava a fim
de conversar e me deixou sozinho. Ela se aproximou do que um dia foi a
minha loja de esculturas e caminhou ali por um tempo, encarando as ruínas
ao seu redor. Conforme a sra. Ludwig andava, as cinzas do piso se
espalhavam pelos seus pés que estavam calçados por uma sapatilha gasta,
mas ela pareceu não se importar.
Fiquei em silêncio, deixando que a mulher da padaria explorasse as
ruínas por mim. Eu estava evitando ir até lá, pois não sabia ao certo o que
fazer, não tinha a menor vontade de reabrir aquela loja algum dia — não
sem Freya ao meu lado.
Observei a sra. Ludwig à distância, preferindo não me envolver, até
que ela se abaixou e tirou um pedaço de plástico derretido do meio das
cinzas. A mulher levantou o objeto para olhá-lo mais de perto e eu percebi
que se tratava da boca de uma garrafa. Estranhei de imediato, já que não
havia nada parecido com aquilo na loja antes do incêndio.
Não consegui resistir à curiosidade e me aproximei da sra. Ludwig.
As cinzas do chão subiram quando pisei sobre elas e comecei a andar,
mancando levemente pelo corte no meu pé.
— O que é isso? — perguntei à sra. Ludwig, que ainda estava com o
pedaço de garrafa derretida nas mãos. Seu olhar carregava uma sombra de
desconfiança.
— Não pode ser. — Ela me entregou o plástico retorcido e levou as
mãos ao peito.
— O que aconteceu?
— Ontem, enquanto eu assistia ao incêndio, conversei com a esposa
do mecânico... — A mulher fez uma pausa e olhou ao seu redor, estarrecida.
— Ela me contou que há alguns dias viu o Sven da mercearia comprar três
galões de gasolina com o marido dela.
— O quê? — A surpresa em minha voz ficou bem evidente.
— Passamos a madrugada inteira observando o incêndio e
comentando o quão suspeita era aquela situação. — A sra. Ludwig colocou
as mãos na cintura. — No começo, não acreditei muito na desconfiança da
esposa do mecânico, mas agora que encontrei esse pedaço de galão de
gasolina no meio das cinzas, mudei drasticamente de ideia. Não sei nem o
que pensar a respeito...
— Mas eu sei. — Cerrei os punhos e acabei amassando ainda mais o
pedaço de plástico retorcido que sobrou da garrafa. — Freya estava
gritando o nome dele desesperada quando acordou no hospital... Aquele
filho da puta!
— Céus, como Freya está? — perguntou, com preocupação.
A raiva que eu sentia era tanta que eu sequer me dei ao trabalho de
respondê-la. Virei as costas e caminhei em passos enfurecidos para fora das
ruínas, pouco me importava a dor que eu sentia em meu calcanhar, minha
raiva estava servindo como anestesia.
Quando cheguei na calçada, pisei em algo duro que estalou sob a sola
do meu sapato sujo de cinzas. Tirei meu pé para ver o que eu havia
esmagado e avistei o que parecia ser uma dog tag militar caída no chão. Me
abaixei para pegá-la e quando li o nome escrito na placa de identificação o
sangue ferveu em minhas veias.
— Herzog — rosnei o nome, enquanto o lia pela segunda vez.
Eu vou matar o desgraçado!

Quando cheguei na mercearia, havia uma placa pendurada na porta


avisando que o estabelecimento estava fechado. Aquilo não me impediu,
tomei impulso para trás e arrombei a porta de madeira com uma única
tentativa.
Entrei no estabelecimento com sangue nos olhos e avistei o filho da
puta atrás do balcão. Sven estava tirando dinheiro da caixa registradora,
com uma mochila de viagem nas costas e ficou surpreso com a minha
invasão.
Foi ele. O idiota tacou fogo na minha loja e agora está fugindo de
Havengreen.
— Vai a algum lugar? — Caminhei até o balcão, completamente
irritado.
Sven sorriu de um jeito debochado, uma parte do seu rosto estava
escondida nas sombras da loja, já que as luzes do lugar estavam apagadas.
— Vou visitar o meu irmão e a minha cunhadinha querida, Darlla —
ele falava de um jeito estranho, como se estivesse com a língua presa ou
machucada. — Se quiser, mando lembranças sua aos dois.
Rosnei para ele, deixando claro a minha irritação. O idiota não faz
ideia que vim aqui desmascará-lo.
— Agora eu sei com quem aquele vira-lata pulguento aprendeu a ser
tão irritado. — Sven riu com deboche outra vez.
Quando ele saiu de trás do balcão e o seu rosto ficou iluminado pela
claridade que entrava através da vitrine, percebi enormes arranhões em sua
bochecha esquerda.
Porra. Um nó se formou em minha garganta e eu apertei a dog tag
que eu trazia em minha mão. Eu conhecia aquelas marcas de unha. Freya
deixava as mesmas linhas avermelhadas em meu peito, costas e braços
depois de uma noite intensa de amor.
Aqueles arranhões no rosto do Herzog pareciam mais irregulares e
profundos, como se feitos em um momento de desespero, mas ainda eram
familiares. O tamanho, o formato... Porra, Freya fez isso nele. Isso explica
o sangue que estava embaixo das unhas dela. Disseram que era o sangue
de outra pessoa e agora eu sei de quem é. Filho da puta!
Não pensei duas vezes antes de ir para cima de Sven e o segurar pela
gola da blusa, minha força era tanta que quase levantei o homem do chão.
Ele segurou o meu braço, tentando se soltar, mas não teve sucesso.
— O que você fez com a Freya?! — gritei enfurecido, e o sacudi. —
Por que ela arranhou o seu rosto? Fala!
Sven não respondeu, apenas sorriu do mesmo jeito debochado. Perdi
a linha e dei um soco em sua boca, sem soltar a gola da blusa dele. A raiva
e o desespero que senti ao imaginar o que levou Freya a atacá-lo daquele
jeito estavam me consumindo.
— Você tocou nela, seu filho da puta? — A ideia me deixou em
pânico.
Sven cuspiu sangue no chão e riu outra vez, havia um brilho maléfico
em seu olhar. Isso me embrulhou o estômago e fez mais raiva brotar em
meu peito.
Eu rosnei e deixei de segurar a gola da blusa dele para apertar o seu
pescoço. Sven ofegou em busca de fôlego, enquanto lutava para se soltar.
— Desgraçado! — Dei um soco nele com a mão livre. — Você só sai
daqui no carro da funerária!
Soltei o pescoço de Sven e o empurrei para trás. Ele bateu contra a
geladeira de frios e tentou se levantar, mas o peso da mochila em suas
costas o atrapalhou.
Não deixei Sven se recompor, fui para cima dele e dei mais um soco
em seu rosto.
— V-você enlouqueceu?! — Sven gaguejou, com dor, e cuspiu mais
sangue da sua boca cortada.
— Eu enlouqueci? — Joguei a dog tag em cima dele. — Fui eu que
incendiei a sua loja porque estava com ciúmes, seu cuzão?
Soquei o desgraçado outra vez, acertando bem no meio do seu nariz,
pude sentir o seu osso se quebrando e ele urrou de dor. Aquele som me
encheu de satisfação e eu segui descontando a minha raiva no idiota.
— Isso é por ficar de olho da minha mulher! — Dei-lhe um soco no
olho direito. — E isso é pelo que fez ontem à noite na minha loja e pelo que
quer que tenha feito com a Freya!
Reuni toda a força que eu tinha e acertei um chute em sua virilha.
Sven gritou com agonia e levou as mãos até o local atingido, ficando
completamente vulnerável ao meu ataque.
Não deixei ele se levantar, aquilo não era hora para uma luta limpa,
era hora de acertar as contas, e eu pretendia fazer o desgraçado pagar por
tudo que ele e a sua família fizeram comigo.
Eu puxava Sven pela gola da blusa e o trazia para perto de mim
apenas para acertá-lo com outro soco e ver a que distância o seu corpo iria
cair. Perdi o controle. Tudo que eu conseguia pensar era em bater em Sven
até que ele parasse de respirar, até que ele sentisse dor o suficiente para
pagar por tudo o que ele fez. Pelas provocações, pelo incêndio e,
principalmente, por Freya.
Enquanto eu descontava a minha raiva no homem caído, dois clientes
entraram na loja e tentaram me tirar de cima de Sven, mas eu os empurrei
para longe e continuei batendo no filho da puta.
— Vamos chamar a polícia! — um dos clientes que derrubei disse,
enquanto se levantava do chão.
Ignorei os homens quando eles saíram da loja correndo. Deixe que
chamem a polícia, assim eu aproveito e conto tudo o que sei. Sven vai
pagar pelo que ele fez.
À essa altura, Herzog sentia tanta dor que não tinha mais forças para
bloquear os meus ataques e agora estava simplesmente apanhando,
convulsionando o seu corpo a cada chute ou soco que recebia. Sangue
escorria pelo canto da sua boca e o seu rosto estava começando a inchar,
ficando irreconhecível. Ele estava perto de desmaiar, mas isso ainda não me
parou. Cada soco que eu dava, eu sentia a raiva se esvaindo do meu corpo e
eu pretendia ficar ali até me sentir calmo como um mestre zen.
Reuni uma nova quantidade de força em minha mão e quando eu ia
acertar outro soco no rosto do infeliz, uma mão forte me segurou. Olhei
para o lado e vi um policial de farda tentando me puxar para longe, no calor
do momento, empurrei o homem para o lado e soquei o outro que também
correu na minha direção, fazendo ele cair sobre uma prateleira.
Nada e nem ninguém poderia me impedir de ter a minha vingança.
Sven iria pagar pelo que fez com Freya e eu não me importava se tivesse
que matá-lo com minhas próprias mãos. Cada dia que eu passar na cadeia
valerá à pena se eu souber que livrei o mundo desse desgraçado. Filho da
puta!
— Bear! Saia de cima dele ou eu terei que usar a força bruta — o
delegado Müller gritou atrás de mim. Não me dei ao trabalho de virar para
encará-lo.
Um sorriso debochado curvou a minha boca. Como se ele e seu grupo
de policiais franzinos fossem capazes de me tirar daqui.
Acertei outro soco em Sven. Os olhos dele tremeram e se fecharam.
Sorri com satisfação e me preparei para atingi-lo novamente, mas senti uma
dor aguda nas costas. Um estranho formigamento se espalhou pelo meu
corpo e eu cerrei os dentes.
Olhei para trás e vi que um dos policiais havia me atingido com um
taser de choque. Meus músculos ficaram rígidos e, de repente, eu já não
conseguia me mover. Espasmos involuntários começaram a tomar conta do
meu corpo e eu fui ficando tonto até que a minha visão escureceu. Senti
uma dor ainda maior quando atingi o chão e perdi a consciência.
CAPÍTULO 34

— Quantos dedos tem aqui? — o médico indagou, sinalizando com a


mão na minha frente.
— Sete? — chutei, insegura.
A minha visão estava voltando, mas eu não conseguia enxergar nada
além de borrões e silhuetas distorcidas. Ainda assim, era melhor que a
escuridão com que me deparei quando abri os olhos.
O médico suspirou.
— Ao menos está enxergando alguma coisa, não está? — perguntou a
enfermeira.
— De um jeito muito precário, mas estou.
— É apenas uma cegueira temporária — constatou o médico.
Ele jogou uma luz forte no meu olho e todo o meu campo de visão
ficou esbranquiçado. Eu gemi com desconforto.
— Sua visão deve voltar por completo nas próximas horas. Vou
receitar um colírio para ajudar na recuperação.
Eu apenas assenti.
— O que me fez ficar assim? — indaguei, aflita. Eu não tinha noção
do que aconteceu depois do ataque de Sven, mas Bear mencionou um
incêndio e o meu cabelo cheirava à fumaça.
— Alguma coisa te atingiu na cabeça e causou um pequeno trauma —
o homem respondeu.
Eu assenti, embora estivesse confusa, não sabia o que tinha
acontecido comigo depois que desmaiei. Porra, não sabia nem mesmo se
Sven me violou de alguma forma enquanto eu estava inconsciente. A ideia
me apavorava.
Eu já não me sentia mais tão desesperada quanto estava quando
acordei, aquele pânico incontrolável passou depois que a enfermeira me
trouxe um remédio. Agora, eu até me sentia mal pelas coisas que falei com
Bear. Eu ainda estava magoada com ele e uma parte de mim sabia que o que
eu disse era verdade, se Bear não tivesse me tratado daquela forma rude, eu
não estaria no hospital nesse momento porque eu não teria saído da cabana
às pressas, não teria decidido ir embora da cidade, não estaria na loja
sozinha àquela hora da noite e Sven não teria me atacado.
Encolhi-me na cama involuntariamente ao lembrar do que vivenciei.
Mesmo que os médicos tivessem limpado o meu corpo, eu ainda podia
sentir o gosto do sangue dele em minha boca. Meu estômago ficou
embrulhado e eu senti vontade de vomitar. Respirei fundo por um tempo até
que a sensação de náusea passasse.
Eu preciso contar sobre as ações de Sven para alguém..., mas quem?
Pensei em Bear, mas eu sabia que ele não voltaria aqui tão cedo depois da
forma que eu o expulsei.
— Doutor, aqui estão os resultados dos exames da paciente — disse
uma voz feminina, vinda de um lado distante do quarto. Não me dei ao
trabalho de procurar pela mulher que disse isso, pois sabia que não teria
sucesso para enxergá-la.
Ouvi passos indo embora e passos se aproximando da cama onde eu
estava. A silhueta de jaleco branco do médico que me atendia ficou em meu
campo de visão e eu percebi que ele estava segurando o que parecia ser uma
pasta azul nas mãos.
— Bom, senhorita Larsen, tirando a lesão que sofreu na cabeça e a
fumaça que respirou durante o incêndio, está tudo em ordem com o seu
corpo — o médico disse. — Terá que ficar alguns dias aqui em observação,
mas está fora de perigo. Bear agiu rápido em entrar na loja e tirá-la de lá
antes que o fogo se alastrasse mais. A atitude dele salvou a sua vida.
Fiquei em choque.
— Que fogo? Bear entrou no meio do fogo para me salvar? — tentei
entender.
— Sim. Havengreen inteira viu o ato heroico dele. Você tem sorte em
tê-lo como parceiro.
Eu revirei os olhos. Parece que a notícia da minha separação ainda
não chegou aos ouvidos do médico — ou a sra. Ludwig resolveu ficar
quieta pela primeira vez na vida e não espalhou a fofoca por aí. Talvez, ela
tenha entendido que o assunto era delicado e teve o bom senso de não o
compartilhar com os outros.
— Você realmente não viu nada? — O médico indagou, me tirando
dos meus pensamentos. — A loja estava pegando fogo e quase desabando
quando Bear entrou para salvá-la. Você estava lá dentro, devia saber.
— Eu... provavelmente eu desmaiei antes do incêndio começar —
murmurei, atordoada pelas informações recentes. — Tinha outra pessoa lá
comigo. Ele me atacou.
— Eu desconfiei. Encontramos sangue que não era seu embaixo das
suas unhas e também no seu rosto e em sua boca. O que aconteceu naquela
loja, senhorita Larsen? Posso chamar um representante da polícia, se quiser
prestar depoimento.
Encolhi-me outra vez. Eu queria entregar Sven, mas estava com medo
de não acreditarem em mim. Encontraram DNA dele no meu corpo e isso
seria prova o suficiente para a acusação, mas até algumas horas atrás eu não
sabia do que Sven era capaz. Fiquei com medo que ele pudesse ter alguma
carta na manga e que o entregar fizesse ele me prejudicar novamente em um
futuro próximo.
— O que os exames dizem? — perguntei, depois de um tempo. —
Meu corpo foi... violado?
O médico ficou em silêncio e isso me deixou ainda mais aflita.
— Não encontramos nada que pudesse indicar algo desse tipo — ele
respondeu depois de um tempo. Eu não podia ver o seu rosto com nitidez,
mas percebi em sua voz que ele estava um tanto preocupado. — Você viu a
pessoa que te atacou?
Engoli em seco.
— Quero falar com o delegado Müller — disparei, antes que o
homem fizesse mais perguntas.
— Certo... vou mandar chamá-lo — o médico concordou, sem hesitar.
— Mas antes de eu sair, tem mais uma coisa que preciso dizer.
— Pode falar — suspirei.
— Você está grávida.
— O quê?! — exaltei-me. — Por favor, me diga que está brincando.
O médico riu.
— É o que diz em um dos seus exames. Parece que você e Bear terão
uma criança nos próximos meses.
Meu coração começou a bater rapidamente e eu senti uma tremedeira
de nervosismo se espalhar pelo meu corpo. Grávida? Não pode ser... essa é
uma péssima hora!
Suspirei, e esfreguei as têmporas.
— Vou deixá-la sozinha para processar a notícia. — O médico saiu do
meu campo de visão. — E também vou chamar o delegado.
Eu fiquei em silêncio e lutei para controlar as emoções até que ouvi a
porta se fechar. Quando senti que estava sozinha no quarto, tudo veio à
tona, a gravidez, o jeito que tratei Bear quando acordei depois que ele me
salvou de morrer em um incêndio, os momentos de terror que passei com
Sven... Era coisa demais para processar de uma só vez.
Minha cabeça doía e eu sentia vontade de chorar. Eu não sabia o que
fazer. Estou esperando um filho do Bear? Porra, como as coisas ficarão
agora? Eu não sabia mais se devia manter o plano de me mudar para bem
longe de Havengreen ou se devia continuar na vila para que a criança
crescesse próxima ao pai. Que merda! Eu realmente não esperava por isso.

Eu ainda estava perdida em pensamentos, me perguntando o que eu


faria daquele dia em diante, quando a porta do quarto se abriu. Minha visão
já estava boa o suficiente para que eu conseguisse reconhecer o rosto do
delegado Müller. Ele entrou no quarto, me encarando com preocupação.
— Como está se sentindo, Freya? — indagou em um tom sério,
enquanto se sentava na poltrona ao lado da cama. — O médico me passou
um relatório do estado em que você chegou aqui e eu já mandei o sangue
encontrado embaixo das suas unhas para análise no laboratório da polícia.
Eu juro que vou encontrar quem fez isso com você.
— Foi o Sven — disparei, sem conseguir manter aquilo dentro de
mim por mais tempo. — Ele me atacou.
O delegado arregalou os olhos.
— O Sven Herzog? Da mercearia? — A incredulidade em sua voz
estava evidente e eu comecei a me perguntar se fiz bem em contar aquilo.
— O que aconteceu ontem à noite, Freya? Você se lembra de todos os
detalhes, de como o incêndio começou? Está bem para falar?
Engoli em seco.
— Por favor, preciso de qualquer coisa que você souber. — Ele tirou
um bloco de anotações e uma caneta de dentro do bolso interno do seu
casaco de polícia.
Eu respirei fundo e tentei reunir coragem. Sven precisava pagar pelo
que fez ontem à noite, eu não conseguiria me sentir segura se soubesse que
ele estava andando livremente pelas ruas.
— Não vi o incêndio começar, Sven me atingiu com alguma coisa na
cabeça e eu desmaiei — admiti.
O delegado Müller anotou alguma coisa em seu bloco de papel.
— Um minuto, Freya. — Ele fez sinal para que eu esperasse e tirou
do casaco um pequeno gravador.
Observei ele colocar o aparelho sobre o braço da poltrona e confesso
que fiquei admirada com a postura profissional que ele tinha. Müller era um
fofoqueiro assumido, mas felizmente sabia fazer o seu trabalho de homem
da lei quando era necessário.
O delegado gesticulou para que eu prosseguisse com a declaração e
eu assenti.
— B-bom, como eu disse, Sven me acertou na cabeça e eu não vi o
fogo começar. Fiquei sabendo sobre o incêndio apenas quando acordei aqui
no hospital.
O homem assentiu.
— Então me conte o que aconteceu antes do incêndio, entre você e o
Sven. Como ele te atacou e por quê?
Engoli em seco. Depois de um grande tempo em silêncio reunindo
coragem, acabei contando toda a história de terror que vivenciei na noite
passada. Precisei fazer algumas pausas durante o relato para me acalmar e o
delegado Müller me confortava como podia.
Eu não economizei detalhes, contei tudo. Desde a rixa que Sven tinha
com Bear, até o momento em que ele entrou na loja com más intenções e
tentou me estuprar. Relatei como fiz para me livrar dele, que mordi sua
língua e arranhei o seu rosto antes de ser atingida na cabeça e desmaiar.
Foi a primeira vez que vi o Müller ouvindo uma história com a
atenção e seriedade de um profissional, eu senti que realmente podia confiar
nele e que ele faria justiça. Os atos de Sven não ficariam impunes e isso me
trouxe um grande alívio.
— Sinto muito pelo que você passou, Freya. — Ele afagou o meu
ombro e me ofereceu outro lenço de papel.
Sequei as lágrimas que escorriam pelos meus olhos e enxuguei o
nariz.
— Eu dou a minha palavra que Sven terá o que merece. Ele nunca
mais vai chegar perto de você outra vez.
— O-obrigada. — Direcionei-lhe um sorriso fraco.
— Por acaso você contou algo sobre o ataque para o Bear? — aquela
pergunta me pegou de surpresa.
Pensei por um tempo e balancei a cabeça negativamente.
— Não contei nada, eu acordei em pânico e acabei expulsando o Bear
desse quarto. Por quê?
Müller suspirou e coçou o maxilar que exibia uma barba por fazer.
Fiquei momentaneamente feliz por saber que a minha visão já estava boa o
suficiente para que eu percebesse esses detalhes, à essa altura, eu só
enxergava embaçado as coisas que estavam distantes.
— Bear quase matou o Sven hoje cedo — a resposta dele me deixou
boquiaberta. — Ainda não sei o motivo da briga, deixei os dois sob custódia
na delegacia e vim para cá assim que recebi o chamado do hospital.
— Não deixe Sven sair daquela delegacia, por favor — implorei.
— Vou fazer justiça, Freya. Agora descanse, você passou por muita
coisa. — Ele afagou o meu ombro.
Concordei em silêncio.
Eu estava atordoada pela notícia de que Bear surrou Sven até quase
matá-lo, mas também me senti agradecida por isso. Seja lá qual tenha sido o
motivo da briga, saber que Sven apanhou e sentiu dor me trouxe um certo
alívio, era bom saber que a vida já estava o castigando por seus atos.
— Delegado Müller, só por curiosidade, como o Bear está? —
indaguei, fazendo o possível para parecer desinteressada. — Você disse que
eles brigaram...
— Meus policiais precisaram acertá-lo com um taser de choque para
tirá-lo de cima do Sven — o delegado riu —, mas agora ele está bem, está
melhor que o outro desgraçado, pelo menos. Parece que os anos que o
Herzog passou no exército não serviram de nada quando ele teve que
enfrentar o seu lenhador furioso.
— Ele não é mais o meu lenhador... sabe que não estamos mais juntos
— dizer aquelas palavras me causou mais dor do que eu podia imaginar.
— Vocês irão se acertar, eu sei disso. — Ele afagou meu ombro
novamente e se levantou da poltrona. — Agora, se me der licença, eu tenho
um criminoso para prender. Fique bem.
— Obrigada, delegado Müller. — Sorri em agradecimento.
Ele acenou com a cabeça e saiu do quarto, me deixando sozinha.
Eu me sentia aliviada por saber que Sven seria preso, mas não
conseguia deixar de me perguntar qual teria sido o motivo da briga entre ele
e Bear. Será que Bear descobriu o que Sven tentou fazer comigo?
Acariciei a minha barriga e fiquei perdida em pensamentos. Quando
Bear fosse liberado da delegacia ele provavelmente viria até aqui e eu teria
que pensar se lhe daria a notícia de que ele seria pai ou se manteria o plano
de ir embora de Havengreen sem deixar que Bear soubesse da existência
desse bebê.
Não sei se daria certo criar um filho com aquele homem surtado, no
entanto, eu também não tinha certeza se me sairia bem criando uma criança
sozinha. É claro que eu poderia recorrer ao auxílio da minha mãe com
alguns conselhos, mas não seria a mesma coisa do que ter o pai do meu
filho presente.
Talvez fosse apenas uma consequência de tudo o que eu passei, mas
agora, mais do que nunca, eu queria Bear ao meu lado — não o Bear idiota
e autoritário que me expulsou da montanha, eu queria o Bear gentil, valente
e protetor que cuidou de mim em sua casa na montanha e entrou no meio do
fogo para me salvar. Era esse Bear que eu queria ter ao meu lado, mas uma
parte de mim tinha medo de voltar para ele e me deparar com o seu lado
histérico e ciumento outra vez. Acho que nesse momento, será melhor que
eu fique sozinha até colocar a cabeça em ordem, a última coisa que eu
preciso é de mais motivos para me estressar.

CAPÍTULO 35

Eu estava sentado na sala de interrogatório, com as mãos algemadas


na mesa e sob a supervisão de um policial. Ao meu lado estava Sven, o
filho da puta sequer usava algemas e parecia entediado com a espera.
A única coisa que me trouxe satisfação naquele momento foi ver os
ferimentos causados pela minha agressão. O rosto de Sven estava tão
inchado que ele mal conseguia manter os olhos abertos, sua boca parecia ter
dobrado de tamanho e um dos lados de seu nariz estava com um algodão
para impedir que sangue escorresse do osso quebrado. Quando chegamos
aqui, deram alguns remédios para que ele conseguisse se manter acordado,
mas o idiota ainda parecia atordoado pela surra.
Fazia mais de uma hora que o delegado Müller tinha nos deixado ali
para atender um chamado no hospital. A cada segundo que passava eu
ficava mais inquieto. Eu precisava sair dali, precisava voltar para Freya e
saber como ela estava. Tentei mexer as minhas mãos, mas as algemas presas
na barra de ferro da mesa limitaram os meus movimentos.
— Por que eu tenho que ficar algemado quando foi ele que incendiou
a minha loja e quase matou a minha mulher? — resmunguei, e sacudi as
algemas novamente.
— Porque é você quem estava descontrolado e quase desfigurou o
rosto dele — o policial respondeu, entediado por ter que ficar ali de olho em
nós dois.
Eu bufei com raiva.
Naquele momento, a porta da sala se abriu e o delegado Müller
entrou. Ele estava com uma expressão descontente no rosto quando olhou
na minha direção. Porra, só falta me considerarem culpado e soltarem o
filho da puta que está ao meu lado. E daí se eu bati no Sven? Ele mereceu.
Müller caminhou até a mesa em que estávamos e parou ao lado de
Sven. Ele puxou as mãos do homem e o algemou.
— O que está acontecendo? — Sven resmungou, confuso. Sua fala
ainda estava estranha e limitada.
— Sven Herzog, você está preso — Müller declarou, em um tom
sério.
Não consegui me conter e dei uma risada — eu teria batido palmas se
minhas mãos não estivessem algemadas na mesa.
— Ei, você está cometendo um erro! — Herzog protestou, enquanto
encarava suas mãos algemadas.
— Erro? — O delegado segurou o queixo de Sven e forçou para que
ele abrisse a boca.
Finalmente, pude ver o motivo da sua fala estranha: Sven estava com
um rasgo arroxeado na língua que ainda sangrava e parecia profundo.
— Que porra é essa? — Franzi o cenho, sentindo um certo nervoso ao
ver aquele machucado.
— É apenas uma das provas do crime que ele cometeu — Müller
disse, irritado.
O delegado soltou o queixo de Sven, respirou fundo e deu um tapa em
sua cara. Arregalei os olhos diante da cena que presenciei. Isso está ficando
cada vez melhor.
Sven gemeu com desconforto. Se o seu rosto não estivesse tão
inchado, sei que ele estaria com uma expressão furiosa naquele momento.
— Isso é agressão policial! Você vai se foder quando eu falar com o
meu advogado — Sven ameaçou.
— A única pessoa que vai se foder aqui é você, Herzog — Müller
cuspiu aquelas palavras com desprezo e colocou as mãos sobre a mesa,
adotando uma postura intimidatória. — Vou garantir que seja mandado para
uma prisão de segurança máxima, a pior do país. Acha que lá eles vão pegar
leve com você?
Sven calou a boca e seus ombros ficaram tensos. Acho que o idiota
finalmente percebeu que as coisas estavam se complicando para o seu lado.
Aproveitei o momento para dizer as minhas acusações, o que eu
pudesse fazer para aumentar a pena do filho da puta eu faria com prazer.
— Encontrei outra prova também — comecei — a placa de
identificação militar dele estava caída em frente à minha loja hoje de
manhã.
— Por isso você fez aquela cena lá na mercearia? — Müller tentou
entender.
Concordei com a cabeça e segui com minhas acusações:
— Também fiquei sabendo que ele fez uma compra suspeita de
gasolina nos últimos dias.
— Não se pode mais comprar gasolina por aqui sem parecer suspeito?
— Sven tentou se defender.
— Quando não se tem um carro, isso é suspeito sim — respondi, com
ironia. — Afinal de contas, para que uma pessoa que não tem nenhum
veículo, precisaria de três galões de gasolina?
Sven bufou com raiva.
— Para começar um incêndio — o delegado respondeu a minha
pergunta.
Eu assenti com uma enorme satisfação.
Embora minhas mãos ainda estivessem algemadas na mesa, eu me
sentia feliz por saber que o cerco estava se fechando ao redor de Sven. Ele
vai pagar pelo que fez com Freya e com a minha loja.
— Eu não vou dizer mais nada sem a presença do meu advogado —
Sven declarou, com a voz azeda.
O delegado Müller cruzou os braços diante do peito.
— Se quer um conselho, nem gaste dinheiro com advogados... você é
um caso perdido, Herzog. — Müller voltou sua atenção para o policial que
estava de pé em um canto da sala. — Pode levar ele daqui.
O policial assentiu e foi até Sven, ele segurou no braço dele e o fez se
levantar da cadeira.
— Para onde estão me levando? — Sven protestou, enquanto era
levado para fora da sala. Ele sacudiu o braço, tentando se livrar do aperto
do policial, porém, não teve muito sucesso.
— Para a cela. Vai ficar lá até ser transferido para a penitenciária —
Müller respondeu, em um tom sério.
Arqueei as sobrancelhas com surpresa. Só espero que ele não decida
me prender também.
Quando o policial saiu da sala com Sven, o delegado fechou a porta e
me encarou. Me remexi na cadeira impaciente.
Müller veio até mim e pegou uma chave que estava pendurada no seu
cinto, fiquei surpreso quando ele destrancou minhas algemas e minhas mãos
ficaram livres. Esfreguei meus pulsos doloridos e notei que as juntas dos
meus dedos estavam vermelhas por causa dos socos que dei em Sven.
— Bear, eu tenho uma coisa séria para te contar. — Müller puxou a
cadeira que havia do outro lado da mesa e se sentou.
— Vai me prender também? — Arqueei uma sobrancelha.
— Embora você mereça uma punição pelo ato de agressão que
cometeu, vou deixar passar — comentou, com a voz baixa. — Se você não
tivesse surrado o Sven, acho que eu mesmo teria feito isso.
Fiquei surpreso com a postura de Müller. Ele saiu da delegacia horas
atrás, furioso pela baderna que eu causei na mercearia, e agora que voltou
estava passando pano para o que eu fiz? Alguma coisa aconteceu...
— O que você sabe que eu não sei, Müller? — falei, sem rodeios. —
Descobriu alguma coisa sobre o Sven, não foi?
O homem na minha frente suspirou e esfregou as sobrancelhas.
— Me ligaram do hospital mais cedo dizendo que a Freya queria falar
comigo. Fui até lá e colhi o depoimento dela.
Meu peito se apertou.
— Você falou com a Freya? — Inclinei-me para frente na cadeira. —
Como ela está?
— Estava assustada, mas os médicos me disseram que ela ficaria
bem.
— Ela realmente está cega? — indaguei com preocupação. — Antes
de me expulsar, a Freya disse que não estava enxergando nada.
Müller arregalou os olhos, parecendo surpreso com a pergunta.
— Quando eu entrei no quarto ela estava enxergando perfeitamente
— respondeu, pensativo. — Freya estava bem, apesar do que aconteceu.
Senti-me aliviado por saber que o que Freya teve não passou de uma
cegueira temporária. Ela estava bem agora, mas eu ainda queria saber o que
aconteceu para que a minha mulher ficasse naquele estado.
Adotei uma postura mais séria e encarei o delegado.
— A Freya te contou o que aconteceu na noite passada? — eu quis
saber. — Ela viu como o incêndio começou?
Embora houvesse uma sombra de hesitação no olhar do delegado, ele
respondeu:
— Freya me disse que estava na loja, separando algumas coisas para
levar embora quando Sven entrou. — Meu sangue ferveu naquele momento
e eu fechei os punhos com força. — Ela me disse que ele a atacou e...
tentou estuprá-la. Isso foi antes do incêndio começar.
O quê? Minha raiva assumiu o controle do meu corpo e eu fiquei de
pé. Eu podia sentir meu coração bombeando rápido, o sangue correndo em
minhas veias com a carga de adrenalina que a fúria me proporcionou...
— Eu vou matar aquele filho da puta! — gritei, enfurecido.
O delegado arregalou os olhos com a minha mudança de humor
repentina. Ele fez sinal para que eu me sentasse, mas eu ignorei. Deixei
Müller para trás e saí da sala em passos largos, sedento para encontrar Sven.
Eu vou terminar o que comecei na mercearia.
Quando cheguei na área central da delegacia, onde os outros policiais
trabalhavam, olhei ao meu redor, desesperado para encontrar o homem que
levou Sven até a cela. Meu peito subia e descia com rapidez e eu tinha
certeza que a expressão em meu rosto deixava claro o quanto eu estava
furioso.
Um policial franzino passou na minha frente e eu o segurei pelos
ombros, fazendo com que ele prestasse atenção em mim.
— Onde está o homem que saiu da sala de interrogatório? —
perguntei, de um jeito rude e impaciente.
— Eu não sei, não vi quem saiu dali, acabei de chegar da patrulha.
— Tenho certeza que alguém o viu! — Saí do controle e sacudi o
policial. — Onde ficam as celas?
A recepcionista se assustou e apontou para uma porta que ficava no
canto esquerdo. Eu soltei o policial e caminhei apressadamente até lá,
ignorando os avisos que recebi sobre aquela ser uma área restrita para
funcionários e detentos.
— Segurem ele! — o delegado Müller gritou, assim que entrei no
corredor das celas.
Os policiais que estavam parados ali correram até mim, na tentativa
de me fazer recuar, mas eu me mantive firme. Empurrei com força o
primeiro que se aproximou, fazendo ele desequilibrar e bater com as costas
na parede. Soquei o segundo homem de farda e ele ficou atordoado pelo
golpe.
Eu estava prestes a bater no terceiro policial quando senti uma dor
aguda na base da minha coluna. Eu rosnei, irritado, e meu corpo inteiro
começou a ficar tenso. Pequenos espasmos tomaram conta dos meus
músculos e minhas pernas cederam, me fazendo cair no chão.
— Prendam ele... — Foi a última coisa que ouvi o delegado Müller
dizer antes de tudo ficar escuro.

Ao abrir os olhos, vi um teto cinza e mal iluminado acima de mim. Eu


estava deitado em uma superfície dura e desconfortável que fazia as minhas
costas doerem. Não precisei de muito esforço para saber que fui preso.
Aquela não era a primeira vez que eu ficava atrás das grades, o
delegado Müller já me prendeu por desacato algumas vezes e eu já virei
muitas noites aqui nessa cadeia. Eu sabia que ele sequer colocava as
acusações na minha ficha, o homem fazia aquilo apenas para me dar um
susto com a esperança de que eu fosse pensar duas vezes antes de
desrespeitá-lo, mas nunca adiantava. Normalmente, eu passava a noite aqui
e era liberado pela manhã com o Müller me aconselhando a procurar um
psicólogo para tratar o meu temperamento explosivo.
Eu podia simplesmente continuar com a bunda naquela cama dura de
cimento, esperando as horas passarem até que alguém viesse me soltar, mas
a inquietação que eu sentia dentro de mim não me deixou pensar direito.
Quando percebi eu estava de pé, com as mãos nas grades da cela, gritando
para que me soltassem.
Não demorou muito até o delegado Müller aparecer. Ele cruzou os
braços diante do peito e me encarou com um olhar impassível.
— Fique quieto, Bear. Sven terá o que merece e eu já me assegurei
disso — o homem resmungou. — A amostra do sangue que estava no corpo
de Freya pertencia a ele e isso confirmou a agressão, temos provas
suficientes para deixá-lo preso por um bom tempo. Sven sairá da cadeia
direto para um asilo ou para o cemitério.
Aquilo não foi o suficiente para me acalmar. Pensar naquele filho da
puta encostando em Freya me deixou com tanta raiva que se fosse
fisicamente possível eu teria amassado as grades da cela e sairia de lá para
ir atrás dele.
— Não é o suficiente, Müller. Eu quero que ele sofra! — rosnei,
furioso. Apertei as grades da cela com tanta força que eu pude sentir o
sangue latejar na palma das minhas mãos.
O delegado suspirou, parecendo entediado.
— Você sabe que ele merece pagar pelo que tentou fazer com a Freya
— tentei convencer o homem a entender o meu lado.
— Por mais que eu queira, não vou arriscar o meu cargo abrindo essa
cela para que você saia descontrolado por essa delegacia. A surra que você
deu nele já foi o suficiente.
— Não foi! Eu quero matar aquele desgraçado por tentar tocar na
minha mulher — rosnei, e balancei as grades, na esperança de que elas
iriam se soltar.
Müller deu alguns passos para trás.
— Sven já foi transferido para uma penitenciária que fica há milhas
daqui.
— Porra! — Bati nas grades e me afastei.
Comecei a andar de um lado para o outro na cela, ciente de que o
olhar do delegado ainda estava sobre mim. Eu me sentia inquieto, furioso e
aflito. Freya... Eu preciso saber como ela está.
Aproximei-me novamente das grades da cela e encarei Müller.
— Eu tenho que ver a Freya — pedi. — Ela deve estar no hospital,
sozinha, com medo... Porra, eu preciso ficar com ela.
— Você não vai a lugar nenhum até se acalmar. — Ele não se deixou
dobrar. — A Freya não vai gostar de falar com você nesse estado.
Eu bufei com raiva.
— Me deixe sair, Müller! — gritei, e sacudi as grades.
O delegado revirou os olhos e saiu andando pelo corredor, me
ignorando completamente. Porra!
Eu sabia que Müller só me deixaria sair da cela depois que a minha
raiva cessasse, mas era essa a parte que me preocupava, eu estava tão
inquieto e perturbado com os últimos acontecimentos que a última coisa
que eu conseguia pensar era em me acalmar. Tudo o que eu queria era
arrancar a cabeça de Sven. Sim... arrancar a cabeça dele e fazer as pazes
com Freya. Talvez, seja melhor sentar a bunda naquela cama de pedra e
tentar ficar quieto para ser liberado logo.
CAPÍTULO 36

Depois de passar dois dias internada, eu finalmente tive alta. Minha


visão voltou ao normal, mas eu ainda sentia pontadas na cabeça devido às
pancadas que levei. O médico receitou alguns analgésicos e vitaminas e
recomendou que eu ficasse descansando em casa pelos próximos dias.
Nesse tempo que estive internada, Bear não voltou nenhuma vez para
me visitar. Confesso que fiquei chateada com a ausência dele. Quando o
expulsei do quarto eu mal conseguia enxergar e o filho da puta nem se
preocupou em retornar ao hospital ao menos para perguntar como eu estava.
Talvez, tenha desistido de tentar falar comigo e voltou para a montanha.
Do jeito que Bear era volátil e orgulhoso, eu não descartava aquela
hipótese.
Engoli a mágoa que eu sentia quando saí pela porta da frente do
hospital, era de manhã e, como sempre, o tempo estava frio e nublado.
Fiquei um tempo parada observando a rua vazia enquanto pensava no que
fazer.
O delegado Müller não voltou para falar comigo desde que dei o meu
depoimento para ele, mas a sra. Ludwig passou no hospital para me visitar
algumas vezes, ela me informou que Sven tinha sido preso e que não
causaria mais problemas.
Saber que eu não veria mais Sven me trouxe uma grande paz
enquanto eu estava internada, mas agora que saí do hospital outras
preocupações começaram a me atingir. Eu não conseguia deixar de me
questionar sobre o que eu faria com a criança que crescia dentro de mim.
Devo continuar morando em Havengreen ou será melhor voltar para Oslo?
Tantas perguntas não respondidas já estavam fazendo a minha cabeça doer.
Eu me sentia cansada — por mais que tivesse passado os últimos dias
descansando.
Senti que o melhor a ser feito naquele momento de incerteza seria ir
para casa e ficar em repouso. Suspirei e comecei a andar pela calçada, em
direção à rua que levava até a praça. Ouvi um latido familiar atrás de mim e
sorri, era Hati.
Virei o rosto para trás e vi o cachorro correndo até mim, eu me
abaixei com cuidado para fazer carinho nele e depositei um beijo em sua
cabeça. Percebi que em um canto da varanda do hospital havia uma tigela
com água e outra com ração. Me pergunto se Hati passou os últimos dias
aqui me esperando. Provavelmente sim.
— Vamos para casa, amiguinho.
Afaguei o cachorro uma última vez e me levantei. Fiz o possível para
ignorar a tontura que senti com aquele movimento e respirei fundo,
apoiando-me na parede do hospital apenas para manter o equilíbrio. Quando
a tontura passou, voltei a andar rumo à minha casa e Hati me seguiu sem
hesitar enquanto balançava a cauda com alegria.
Ao chegar em casa, quase tropecei nas caixas de papelão que estavam
na entrada da sala. Tudo estava empacotado e pronto para a mudança, meus
móveis estavam cobertos com lençóis para não acumularem poeira e
minhas roupas dentro da minha bolsa de viagens.
Sentindo-me completamente exausta, fui até a pequena sala de estar,
puxei o lençol que cobria o sofá e me sentei ali, massageando as têmporas.
Eu precisava pensar se iria desempacotar tudo ou se tiraria um cochilo e
depois sairia da vila.
Comecei a me perguntar se a minha caminhonete ainda estava
estacionada em frente à loja de Bear. Merda, eu soube que tudo foi
consumido pelo fogo e que não restou nada do estabelecimento. Quando saí
do hospital, não passei lá para ver a tragédia de perto, vim direto para casa,
no entanto, eu sabia que mais cedo ou mais tarde precisaria ir até lá para
buscar a minha caminhonete e as coisas que estavam dentro dela. Por sorte,
Havengreen era um lugar tranquilo onde todos se conheciam, não havia
ladrões aqui e o único homem desequilibrado da vila foi preso, então, eu
tinha certeza que os meus pertences estavam intocados no mesmo lugar em
que os deixei.
Hati veio até mim e subiu no sofá, deitando no assento ao lado de
onde eu estava. Deixei minha mão descansar sobre ele, afagando o seu pelo
macio, e fechei os olhos. Minha cabeça doía, apesar dos analgésicos que
tomei antes de vir para casa.

Acabei adormecendo e quando acordei já passava do meio dia. Eu


estava com fome e, apesar das horas que passei dormindo, minha testa
ainda latejava. Gemi com desconforto e me levantei do sofá, o mundo ao
meu redor girou e eu precisei me sentar outra vez. Que merda.
Depois que a tontura passou, respirei fundo e fui até o banheiro. Fiz
uma careta quando encarei o meu reflexo no espelho. Havia um curativo em
minha testa, mas a pele ao redor dele estava roxa e inchada. Não tive
coragem de tirar a gaze para ver o que havia embaixo dela, com certeza era
um machucado feio. Ficou evidente que Sven não me acertou na cabeça
apenas uma vez. Acho que tive sorte de desmaiar na primeira pancada e
estar inconsciente para não sentir as dores das outras que vieram a seguir.
Ainda bem que o filho da puta foi preso.
Lavei o rosto na pia, tomando cuidado para não molhar a minha testa,
e o enxuguei na toalha de mão que estava pendurada em um gancho na
parede.
Passei um tempo olhando para o meu reflexo no espelho, perdida em
pensamentos. Eu estava horrível. Meu cabelo estava ressecado e ainda
cheirava à fumaça, voltei para casa com as mesmas roupas que eu usei no
dia do incêndio e elas estavam sujas com fuligem — meu suéter até tinha
algumas gotas de sangue seco. Eu precisava tomar um banho e vestir
alguma coisa limpa, só então iria providenciar algo para saciar a minha
fome.
Coloquei minha banheira para encher e enquanto eu me despia,
recordei dos momentos em que eu estava na cabana de Bear. Lembrei da
vez que ele me carregou até o banheiro para que eu tomasse banho e de
como eu estava louca para sentir o toque daquele homem, para sentir os
nossos corpos se unindo.
Toquei meus seios distraidamente e me recordei do jeito que Bear me
beijou naquele banheiro apertado, de como massageou o meu corpo
enquanto me banhava. Suspirei com a lembrança e apertei meu mamilo
esquerdo, minha intimidade doeu e eu gemi baixinho. Ok... isso precisa
parar!
Forcei-me a afastar aquelas lembranças da mente. Acabou. Por mais
que tenha sido uma época boa, ela não iria mais voltar, Bear e eu não
estávamos mais juntos. Porra, não estamos mais juntos, mas agora eu estou
esperando um filho dele. Uma lágrima escorreu dos meus olhos e eu
respirei fundo para tentar conter o choro.
A raiva e a mágoa pelas coisas que aconteceram não me deixavam
admitir, mas, no fundo, eu estava com saudade do Bear. Com saudade do
meu ursinho. Ao mesmo tempo que eu queria socá-lo eu também sentia
vontade de abraçá-lo e não o soltar nunca mais.
Eu precisava lembrar que Bear não teve um pingo de consideração
por mim e não voltou mais ao hospital para ver como eu estava. Isso devia
ser motivo o suficiente para que eu abandonasse qualquer sentimento
afetivo que eu ainda tinha por ele, mas por mais que eu quisesse, eu não
conseguia odiá-lo completamente. Não consigo odiá-lo e eu me odeio por
isso!!

Eu estava sentada na mesa da cozinha, comendo uma omelete que fiz


às pressas depois que saí do banho. Meu corpo estava enrolado no meu
roupão felpudo lilás e uma toalha branca cobria o meu cabelo molhado.
Hati ainda dormia no sofá da sala e eu deixei uma nota na porta da geladeira
para me lembrar de comprar ração para ele, já que estava claro que o
cachorro ficaria morando aqui comigo.
Minha cabeça ainda doía e eu estava com a intenção de terminar o
almoço, tomar mais alguns analgésicos e passar o resto da tarde dormindo.
Não havia nada que eu pudesse fazer além de esperar que o meu corpo
curasse o ferimento em minha testa.
Decidi que ficaria em Havengreen por enquanto, vivendo um dia após
o outro e fazendo o possível para manter a cabeça no lugar. Depois que eu
estivesse completamente recuperada, eu pensaria com calma no que faria a
respeito da gravidez. Tudo que eu queria agora era terminar a minha
omelete, tomar os remédios para aliviar a dor que eu sentia e ir dormir.
Quando eu estava prestes a colocar o último pedaço de omelete na
boca, a campainha tocou. Suspirei, entediada. Não estou nem um pouco a
fim de conversar com alguém nesse momento, mas e se for a sra. Ludwig
com a cesta de bolinhos que ela prometeu me dar quando eu saísse do
hospital?
Com cuidado, levantei da cadeira para atender à porta. Enquanto eu
caminhava até lá, a campainha tocou outra vez.
— Já estou indo! — gritei, mas percebi que foi uma péssima ideia. A
minha cabeça doeu ainda mais com o volume alto da minha voz. Droga.
Ignorei o desconforto que eu sentia em minha cabeça e girei a
maçaneta. Quando abri a porta, tive quase certeza que meu coração parou
de bater por um segundo. Não era a sra. Ludwig, era o Bear!
Apesar da minha surpresa, fiz o possível para manter uma postura
rígida. Cruzei os braços diante do peito e franzi o cenho para o homem
diante de mim. Bear estava tão desarrumado que parecia até um mendigo,
seu cabelo e barba estavam despenteados, sua roupa amarrotada e as juntas
dos seus dedos estavam feridas, como se ele tivesse socado a parede ou... a
cara de alguém. O delegado Müller disse que Bear deu uma surra em Sven,
será que foi isso que machucou seus dedos?
O homem na minha porta estava boquiaberto, me encarando de cima
a baixo sem ao menos disfarçar. Me senti um pouco exposta e fechei a parte
de cima do roupão, onde era possível ver um pouco do colo dos meus seios.
O vento frio que soprava me fez ficar arrepiada e os meus mamilos
endurecidos deixaram claro que eu não estava usando nada por baixo do
roupão. Bear percebeu isso. Ele encarou o contorno dos meus mamilos sob
o tecido, mas logo se concentrou em olhar nos meus olhos.
— O que você quer? — indaguei, mal humorada.
Bear suspirou e apoiou uma mão na parede do lado de fora, ao lado da
porta.
Não me dei ao trabalho de sair, permanecei dentro de casa, com os
braços cruzados diante do peito e na frente da porta, sem deixar espaço para
ele entrar.
— O delegado Müller acabou de me soltar — sua voz estava baixa e
estranhamente contida. — Eu passei os últimos dias sob custódia na
delegacia.
Arregalei os olhos com aquela informação.
Por isso você não voltou para me visitar no hospital? Eu pensei em
perguntar, mas me calei, não queria parecer desesperada e também não
queria que ele soubesse que fiquei magoada por não receber mais visitas.
— Eu saí da delegacia e fui direto para o hospital — ele prosseguiu
—, mas quando cheguei lá, o médico me disse que você recebeu alta pela
manhã.
Eu apenas concordei em silêncio.
Bear me analisou por um tempo e franziu o cenho, ele parecia
desconfiado com alguma coisa.
— Como está se sentindo? — Encarou-me de cima a baixo outra vez.
— Melhor do que eu estava quando acordei no hospital.
Bear se aproximou de mim e eu dei um passo para trás, eu não queria
fazer aquilo intencionalmente, foi apenas um reflexo do meu corpo. Minha
atitude fez Bear ficar onde estava, ele encolheu os ombros e uma sombra de
culpa pairou em seus olhos cinzentos.
— Freya, eu... eu sinto muito. Por tudo o que eu fiz. — Bear passou a
mão pelos cabelos e eu percebi que ele estava nervoso, aquele era um gesto
que ele fazia quando queria disfarçar a inquietação. — Me desculpe por não
ter ido visitá-la, o Müller me prendeu e...
— Porra! — gemi, quando senti uma pontada na testa.
Bear parou de falar e me encarou com confusão — provavelmente,
pensou que o palavrão foi para ele.
Toquei levemente o curativo e suspirei. Estava difícil me concentrar
naquela conversa, minha cabeça doía mais a cada minuto que eu passava de
pé. Bear e eu tínhamos muito o que discutir e isso levaria tempo, mas agora
eu só queria deitar e dormir. Eu não estava com saúde para falar sobre as
coisas que aconteceram ou sobre o nosso futuro, queria estar pensando com
coerência quando essa conversa acontecesse.
— Bear, não estou me sentindo muito bem — confessei. — Podemos
continuar essa conversa outra hora? Eu preciso dormir.
Ele ficou em silêncio e suspirou.
Decidi que não ficaria esperando até que ele resolvesse me responder,
então lhe dei um aceno de despedida e empurrei a porta. Antes que eu
pudesse fechá-la, Bear segurou a madeira e a abriu novamente. Eu o encarei
com uma expressão irritada.
— O médico me contou que você está grávida — disparou, em um
tom sério.
Meu queixo caiu e eu arregalei os olhos. Fiquei estarrecida, sem saber
o que responder. Não pensei que Bear pudesse receber a notícia dessa
forma. Que merda!
— Por que não falou nada? Você não pretendia me contar?
Eu suspirei e toquei o meu ventre. Fui pega de surpresa quando Bear
colocou sua mão sobre a minha.
— Não tem que ser assim, Freya. — Seus olhos encontraram os meus.
— Me deixe entrar, me deixe cuidar de você. Quero que as coisas voltem a
ser como eram antes de...
— Antes de você me expulsar da cabana? — quando percebi, as
palavras de acusação saíram da minha boca. — Ou antes de você começar a
ter suas crises de ciúme?
Bear ficou em silêncio.
Empurrei a mão dele para longe, a mágoa estava começando a me
afetar.
— Eu ainda estou com raiva, Bear. Tenho tentado superar, de verdade,
mas as coisas que você me disse ficam se repetindo na minha cabeça dia
após dia... — Respirei fundo, meus olhos começaram a arder com lágrimas,
mas eu me recusava a chorar na frente dele. — Eu não quero criar um filho
com um homem que tem surtos de raiva por qualquer coisa.
— Não foi por qualquer coisa e você sabe disso — Bear retrucou. —
No fim, eu realmente estava certo sobre o filho da puta do Herzog.
— Eu não quero falar sobre isso, Bear...
— O delegado me contou sobre o que aconteceu. Ele realmente não
tocou em você, Freya? Tem certeza? — Bear passou a mão pelo cabelo
outra vez. — Porque se ele te tocou, eu vou caçar aquele idiota até os
confins do mundo...
— Fique calmo, está bem. — Repousei minha mão em seu braço.
Bear relaxou visivelmente e o seu bíceps estremeceu com o meu toque. —
O Sven me beijou, mas eu mordi a língua dele com força e ele desistiu.
— Vi o estrago que você fez no filho da puta. — Um sorriso
orgulhoso curvou a sua boca e ele me deu um soquinho de leve no ombro.
Eu queria prosseguir com a conversa, queria mesmo, mas a minha
cabeça doeu outra vez e eu fechei os olhos. Fui obrigada a me recostar no
batente da porta por alguns segundos para não ser atingida por outra onda
de tontura.
Bear percebeu o meu desconforto e tocou o meu ombro com uma
certa hesitação.
— Está tudo bem, Freya? — indagou, preocupado.
— Você... você pode voltar outra hora? — pedi. — Estou cansada e
quero dormir, preciso de um tempo sozinha.
— Me deixe entrar, eu vou cuidar de você. — Ao perceber que eu
hesitei, ele insistiu. — Freya, por favor.
— Bear, eu quero ficar sozinha agora — enquanto eu falava, minha
cabeça doía e latejava. — Vá embora. Conversamos depois.
Ele me encarou com uma expressão triste e eu tive quase certeza de
que vi uma lágrima brilhar no canto do seu olho direito.
Bear ficou um bom tempo em silêncio e então concordou com a
cabeça. Ele não se despediu, nem mesmo me deu um aceno, apenas virou as
costas e foi embora.

Deitei para dormir durante a tarde e quando eu abri os olhos, o relógio


do meu celular marcava 08:30h do dia seguinte. Levei um susto. Eu
apaguei de verdade ontem.
Graças às longas horas de descanso, eu já não me sentia mais tão
cansada e a dor em minha cabeça diminuiu consideravelmente. Sentei na
cama e passei alguns minutos em silêncio, criando coragem para levantar.
Hati dormia no tapete do meu quarto, em frente à lareira onde só havia
madeira em brasa.
Depois de fazer a minha higiene matinal, vesti um conjunto quente e
confortável de moletom e fui até a cozinha buscar algo para comer. Hati
percebeu que eu já estava acordada e me seguiu.
Lembrei que naquele horário o cãozinho costumava fazer suas
necessidades, então fui até a entrada da casa e abri a porta para que ele
pudesse sair. Fiquei recostada na parede da varanda, observando Hati à
distância, ele fez xixi em um poste na praça e então voltou para dentro de
casa. Afaguei sua cabeça quando ele passou por mim e fechei a porta.
Fiz ovos com bacon e me sentei na mesa para comer. Enquanto eu
saboreava meu café da manhã, não consegui deixar de pensar em Bear e no
jeito triste que ele me olhou antes de ir embora. O coitado estava tentando
se redimir e eu não cedia.
Ontem, por mais que eu quisesse ouvir o que ele tinha a dizer, meu
cansaço falou mais alto e eu o mandei embora, agora, eu queria que Bear
voltasse aqui para que continuássemos a nossa conversa. Talvez,
pudéssemos chegar a algum entendimento, ou talvez teríamos outra
discussão já que ele sabe da minha gravidez... Droga. Pensar naquilo me
causou um nervosismo tão grande que a minha fome desapareceu.
Um nó se formou em minha garganta e eu não consegui comer mais
nada. Acabei dando o que sobrou dos ovos com bacon para Hati, que estava
na cozinha me fazendo companhia. Imaginei que Bear devia estar irritado
porque o seu cachorro preferia ficar aqui comigo do que na montanha com
ele, mas tanto faz. O coitado do cãozinho também não deve ter aguentado
as crises de histeria do seu dono.
CAPÍTULO 37

Eu estava impaciente e aflito, andava de um lado para o outro no meu


quarto desde que cheguei em casa ontem à tarde. O cômodo estava
bagunçado há semanas e eu nem me dei ao trabalho de organizá-lo, tinha
coisas maiores com o que me preocupar.
Não conseguia pensar em nada que não fosse Freya. Saber que ela
estava grávida, que estava esperando um filho meu, me desequilibrou
completamente. Eu precisava ficar ao lado dela, não só pela criança que
viria nos próximos meses, mas também porque eu não estava mais
suportando essa maldita distância entre nós. Eu não queria deixá-la, mas
estava com medo dela decidir me abandonar. Não posso esquecer que Freya
pretendia sair da vila antes de ficar presa no incêndio, me pergunto se ela
mudou de ideia quanto a isso ou se ainda pensa em deixar Havengreen.
O que ela me disse quando estava no hospital também não saía da
minha cabeça, suas palavras ficaram ecoando em minha mente enquanto eu
estive preso e isso me enlouqueceu ainda mais. Freya estava certa, os meus
surtos de raiva e ciúmes a deixavam em perigo. Foi assim quando a
encontrei pela primeira vez na montanha e depois quando a expulsei da
cabana. Porra, não houve um dia em que eu não tenha me arrependido
dessa maldita decisão. Se não fosse por mim, Freya não teria passado pelo
que passou com Sven, ela estaria segura, na cabana da montanha, comigo.
Tirei do bolso da minha calça um papel amassado e o desdobrei para
que pudesse ler as informações contidas nele. Era o panfleto do psicólogo
que atendia no hospital de Havengreen, Müller me entregou quando me
tirou da cela e me aconselhou a procurar ajuda profissional para tratar
minhas mágoas do passado.
Eu odiava essas coisas. Não me sentia bem com a ideia de sentar em
um sofá e contar sobre os meus traumas do passado para alguém
desconhecido, mas talvez fosse preciso. Eu queria mudar, queria ser bom
para Freya, e talvez, fazer tratamento para lidar com os meus surtos, fosse a
melhor opção.
Eu não queria ser o mesmo homem ignorante, não queria mais fazer
Freya sofrer. Eu queria cuidar dela, protegê-la, amá-la... queria ser
exatamente o homem que ela esperava que eu seria quando me conheceu.
Sem raiva, sem medos internos, apenas um homem amoroso, como o Bear
do livro que ela leu.
Não posso deixar que ela vá embora, não posso perder o amor da
minha vida. Já está mais do que na hora de consertar a merda que eu fiz.
Guardei o papel do psicólogo no bolso da calça e tomei a minha
decisão. Eu iria descer a montanha para marcar uma consulta e recuperar
Freya. Preciso ter aquela mulher de volta na minha vida.

A tarde chegou e eu estava entediada, sentada no sofá da sala


assistindo TV e comendo chocolate. Hati estava deitado no assento ao meu
lado e eu afagava a sua cabeça com uma mão, enquanto segurava um
bombom na outra.
Eu não estava com ânimo para ler alguma coisa e o meu material de
pintura aparentemente foi consumido pelas chamas, então, só me restava
assistir à maratona de programas de confeiteiros que estava passando na TV
a cabo.
Já estava escurecendo quando ouvi a campainha tocar. Olhei no meu
celular e vi que passava das 18:30h. Reprimi um bocejo e forcei minhas
pernas a se levantarem para ver quem estava chamando, Hati veio logo atrás
de mim.
Quando abri a porta, fiquei surpresa ao me deparar com Bear de pé na
minha varanda. Diferente de ontem, agora ele estava perfumado, com o
cabelo penteado, a barba aparada e... porra... estava com uma caixa de
bombons na mão.
Arregalei os olhos, sem conseguir desviar minha atenção para longe
do doce que ele segurava. Bear veio conversar, isso está claro. Seria uma
boa ideia deixá-lo entrar?
— Freya. — Ele me direcionou um sorriso hesitante.
— O-olá... — gaguejei, desconcertada.
Hati passou pelo espaço que havia entre o meu corpo e a porta e foi
cheirar o seu antigo dono. Ele balançou a cauda e pulou em Bear que sorriu
e afagou a cabeça do cachorro.
— Como você está, Freya? — Sua mão ainda acariciava Hati, que
estava de pé nas patas traseiras e apoiado na cintura dele.
— Melhor do que eu estava ontem... obrigada.
— Podemos conversar agora? — Em seu olhar havia uma sombra de
insegurança.
Fiquei em silêncio enquanto refletia se devia convidá-lo para entrar
ou não.
Haviam algumas crianças brincando na praça e os pais as vigiavam
sentados nos bancos de madeira ou na beira do chafariz. Não deixei passar
despercebido que alguns curiosos já olhavam na direção da minha casa,
certamente observando a movimentação na varanda. Melhor deixar que ele
entre, assim não terei que me preocupar com os olhares alheios.
Respirei fundo e abri espaço para que Bear pudesse passar. Ele
hesitou.
— Vamos conversar aqui dentro — reforcei o convite.
Bear ficou surpreso, mas concordou e entrou na casa. Hati veio logo
atrás e eu fechei a porta depressa, deixando os olhares curiosos lá fora.
Ao me virar, vi Bear colocando a caixa de bombons sobre a mesa da
cozinha, ele olhou para uma cadeira e pareceu um pouco sem jeito.
— Ah... quer se sentar? — indaguei, puxando uma cadeira da mesa.
Ele negou com a cabeça.
— Não, Freya. Eu estou bem, obrigado.
Concordei e decidi que também ficaria de pé.
— Então... sobre o que você queria conversar? — tentei encorajá-lo.
Bear se recostou na parede da cozinha e cruzou os braços diante do
peito.
— Acho que sobre tudo. — Ele me olhou nos olhos. — Sobre o que
aconteceu entre nós, sobre a sua gravidez e o que faremos daqui para
frente...
Esfreguei as têmporas, tomando cuidado para não tirar o curativo que
ainda estava em minha testa. Felizmente, a minha cabeça já não doía
quando eu estava sob o efeito dos analgésicos.
Muito bem... Chegou a hora de colocar as cartas na mesa e
resolvermos a situação como os dois adultos que somos.
— Estou ouvindo, Bear. — Arqueei uma sobrancelha, esperando que
o homem entendesse que eu queria ouvir tudo o que ele tinha a dizer.
Bear suspirou e, apesar do tecido grosso da jaqueta jeans que ele
usava, eu percebi o seu corpo relaxando.
— Quero me desculpar por todas as minhas atitudes que te fizeram
sofrer desde que nos conhecemos — suas palavras diretas me pegaram de
surpresa. — Serei um homem melhor daqui para frente, eu prometo.
Franzi o cenho para ele. Eu aceitava o seu pedido de desculpas, mas
não podia acreditar em suas promessas de mudança sem ver os resultados.
— Eu pretendia passar aqui mais cedo, mas estava no hospital...
— Você se feriu? — Não consegui disfarçar a preocupação na minha
voz.
Bear negou com a cabeça.
— Não... — ele pensou por alguns instantes — bom, exceto pela
queimadura no meu antebraço e o corte no meu pé direito.
— O quê? — Encarei-o de cima a baixo. Bear não aparentava estar
machucado, mas talvez suas roupas estivessem cobrindo os ferimentos.
— Eu estou bem, não se preocupe — tentou me acalmar. — Me feri
no dia do incêndio, mas os ferimentos já estão cicatrizando.
Meu coração se apertou e eu me aproximei alguns passos.
— Você se machucou quando entrou na loja para me salvar?
Bear hesitou em responder, mas depois de um tempo confirmou a
minha suposição.
Eu não soube o que responder, apenas fiquei em silêncio digerindo a
gravidade do perigo que ele enfrentou. Se algo desse errado, Bear poderia
ter morrido tentando salvar a minha vida.
— Obrigada — sussurrei, passando por cima do restante de raiva que
eu ainda sentia. — Obrigada por me tirar do fogo, Bear. O que você fez foi
perigoso..., mas também foi o maior ato de amor que alguém já fez por
mim.
— E eu faria de novo, sem hesitar. — Bear disse aquilo olhando no
fundo dos meus olhos. — Eu enfrentaria até o fogo do inferno para salvar a
sua vida.
Suas palavras me deixaram sem resposta outra vez. Sem saber o que
responder, eu apenas lhe direcionei um sorriso agradecido.
— Sabe o que eu fui fazer no hospital? — Bear mudou de assunto. —
Eu estava no psicólogo, fiz a minha primeira consulta hoje.
Fiquei confusa com a informação que recebi.
— Vou começar a fazer terapia, Freya — ele explicou a situação. —
Quero ser um homem melhor para você, sem raiva reprimida ou traumas do
passado.
— Oh, isso é... bom. É muito bom. — Eu estava surpresa.
Se Bear procurou ajuda profissional, esse é um grande sinal de que
ele realmente está disposto a mudar.
— Eu não aguento mais ficar sem você, Freya. — Bear se afastou da
parede e veio até mim. — Preciso de você na minha vida e estou disposto a
fazer o que for para te ter de volta. Por favor, me dê mais uma chance. —
Ele segurou as minhas mãos e eu não recuei.
Também me sentia da mesma forma, eu não aguentava mais ficar
longe dele. A saudade, a solidão... elas rasgavam o meu peito. Eu não
queria mais lutar contra esses sentimentos.
Talvez, a chave para a minha felicidade estivesse em dar uma última
chance para Bear. Ele realmente parecia decidido a ser um novo homem e
eu queria apoiá-lo, queria estar ao seu lado nessa nova jornada.
— Passei a tarde conversando com o terapeuta e já me sinto mais
aliviado, sei que posso mudar, Freya. — Ele suspirou. — Vou provar isso
para você... vou te contar o que fez o meu mundo virar de ponta-cabeça, o
que me transformou no filho da puta amargurado que tanto te fez sofrer.
Arregalei os olhos, surpresa. Honestamente, uma parte de mim já
havia perdido as esperanças de descobrir sobre o acontecimento, no passado
de Bear, que o magoou, estava óbvio que o temperamento explosivo dele
não era apenas culpa do seu tio autoritário e abusivo.
— Se estiver pronto para me contar, eu estou pronta para ouvir —
falei, em um tom amigável.
Bear assentiu e o aperto das suas mãos nas minhas, aumentou.
— Você sabe que o meu tio não era uma boa pessoa — começou, um
tanto hesitante. — Quando ele morreu eu me senti aliviado, fiquei até mais
disposto a viver a vida. Passei a sair para relaxar depois de fechar a loja, me
enturmei com os outros moradores e até encontrei uma namorada... ela era a
filha mais velha do mecânico.
Eu apenas balançava a cabeça em afirmativa, mostrando que estava
prestando atenção no que Bear dizia.
— O meu relacionamento ia bem, eu estava feliz e a pedi em
casamento quando completamos um ano de namoro. — Suspirou. — Mas
então, depois de uma semana que estávamos noivos, ela fugiu com o irmão
mais velho do Sven que tinha acabado de se formar em direito. Os dois
foram morar em outra cidade.
— Lamento que tenha passado por isso, Bear. — Afaguei o seu braço.
— Eu nunca entendi porque ela fez aquilo comigo, por que aceitou
casar se não me amava. Acreditei que a Darlla realmente gostava de mim e
quando ela me deixou eu me senti enganado, traído. — Seu olhar estava
distante e perdido enquanto ele falava. — A minha mente, que já não era
muito boa, ficou ainda pior. Eu me tornei um homem amargurado, parei de
confiar nas pessoas, fiquei cansado do mundo... então resolvi me isolar na
montanha. Eu queria ficar longe dos outros para não sofrer mais, não
conseguia confiar nas pessoas. Fiquei assim por cinco anos, até que você
apareceu na minha vida. Quando você chegou, Freya, eu resolvi que daria
outra chance para o amor. Tudo foi perfeito por um tempo, mas eu tinha
muitas questões internas não resolvidas. Quando eu soube que você tinha
amizade com o irmão do homem que me fez sofrer no passado eu fiquei
com medo.
— Medo? — balbuciei.
— Temi que a situação pudesse se repetir. Eu não queria sofrer de
novo. Fiquei com medo de perder o que eu tinha de mais importante na
vida: você. — Bear envolveu meu rosto com as suas mãos e acariciou a
minha bochecha com o polegar. — Você é o meu mundo, Freya. A dor de te
perder para sempre, de perceber que você não me ama, seria insuportável.
Posso parecer um cara forte por fora, mas por dentro eu não sou. Não quero
te perder, Freya. Eu te amo e quero passar a minha vida inteira ao seu lado
— uma das suas mãos tocou o meu ventre — e ao lado dessa criança que
você carrega.
Lágrimas arderam em meus olhos quando Bear terminou de falar. Eu
sabia o quão difícil tinha sido para ele desabafar tudo aquilo, mas me sentia
grata por ele finalmente ter tido coragem para se expressar.
Bear se ajoelhou na minha frente e me abraçou pela cintura, fui pega
de surpresa pelo seu gesto.
Ele levantou parte do suéter de moletom que eu usava e depositou um
beijo demorado em minha barriga. Meu corpo inteiro se arrepiou quando
senti o calor dos seus lábios e o roçar da sua barba em minha pele.
— Me desculpe por ser um idiota, Freya — Bear implorou, sem tirar
sua boca da minha pele, e me deu outro beijo. — Me perdoe por gritar com
você e por todas as coisas que te magoaram. — Ele me beijou outra vez. —
Eu juro que serei o melhor homem do mundo de hoje em diante.
Não consegui me controlar por mais tempo. Comecei a chorar ali
mesmo, enquanto Bear me abraçava e beijava o meu ventre prometendo que
jamais me faria sofrer. Suas palavras tocaram no fundo da minha alma, foi
impossível não me comover com elas.
Enquanto eu sentia as lágrimas descerem pelo meu rosto, acariciei o
topo da cabeça de Bear em um gesto terno. Meus dedos brincaram por um
tempo com seus fios de cabelo dourados e eu percebi o quando senti falta
de tocá-los.
— Eu te perdoo, Bear — falei aquelas palavras com a voz oscilando
pelo choro. — Te darei outra chance, mas será a última.
Bear afastou seu rosto da minha barriga e ficou de pé em um
movimento rápido. Ele me encarou com um brilho de esperança no olhar e
sorriu.
— Não vou te decepcionar, Freya. — Bear segurou meu rosto com
ambas as mãos. — Eu prometo!
Sorri ao vê-lo feliz daquela maneira.
— É bom mesmo. — Estendi a mão para tocar o seu rosto e acariciei
os fios da sua barba. — Porque eu também não conseguiria viver sem você.
Bear sorriu e puxou o meu rosto para perto, só tive tempo de fechar os
olhos antes do beijo acontecer. Nossos lábios se encontraram e eu suspirei
profundamente. Como senti falta dele... de nós. É bom saber que estamos
juntos de novo.
Coloquei meus braços ao redor do pescoço de Bear e deixei que ele
guiasse o beijo, me provocando com a sua língua que se mexia de um jeito
lento e sensual no interior da minha boca. Como senti falta desse beijo.
Bear segurou em minha cintura e me puxou para mais perto, colando meu
corpo ao seu. Minutos se passaram e o beijo começou a esquentar.
Suas mãos exploravam o meu corpo, tocando cada curva. Elas
deslizavam pela lateral da minha cintura até a altura das minhas coxas,
apertavam a minha bunda, então subiam novamente pela cintura e se
apossavam dos meus seios. Um gemido me escapava toda vez que Bear me
apertava e ele sorria contra a minha boca ao ouvir o som de satisfação que
saía da minha garganta.
Eu me sentia quente e excitada, a calcinha que eu usava já estava
molhada com a umidade que seus beijos e carícias me provocavam, a minha
boceta doía e meus mamilos estavam sensíveis. Eu queria sexo e queria
agora!
Tomada pela luxúria, segurei a jaqueta de Bear e a empurrei para trás,
tentando tirá-la do seu corpo sem separar os nossos lábios. Bear percebeu o
que eu estava tentando fazer e sorriu contra a minha boca antes de me
ajudar a tirar sua jaqueta. O tecido jeans caiu no chão da cozinha e eu
aproveitei para puxar a barra da camisa que ele usava para cima. Bear
ergueu os braços e afastou sua boca da minha por poucos segundos, apenas
para que a roupa passasse pelo seu pescoço.
Quando ele já estava sem camisa, eu não hesitei em deixar minhas
mãos explorarem aquele peitoral firme e musculoso. Seu coração estava tão
acelerado que eu podia sentir os batimentos com um simples toque. Mordi o
lábio inferior de Bear para finalizar o beijo e afastei as nossas bocas. Eu
estava eufórica, sedenta para sentir a sua pele, para inspirar o seu cheiro
excitante e masculino.
Sentindo a minha boceta doer, enterrei o rosto em seu tórax e
depositei beijos demorados ao longo dos seus músculos. Deixei minha
língua deslizar em sua pele quente e ele gemeu, suas mãos permaneciam ao
redor da minha cintura, me segurando com firmeza. Fui espalhando uma
trilha de beijos e lambidas ao longo do seu peito e fiquei na ponta dos pés
para conseguir alcançar o seu pescoço. Mordisquei a pele da região e a
chupei.
Na intenção de facilitar as coisas, Bear se abaixou um pouco para que
o seu corpo ficasse na mesma altura do meu. Eu puxei o cabelo dele para o
lado e lambi o seu pescoço até a altura do ouvido. Sua pele inteira se
arrepiou e eu mordisquei o lóbulo da sua orelha.
— Porra! — ele gemeu com os dentes cerrados. — Quer fazer sexo
de reconciliação?
Afastei o meu rosto para encará-lo. Um sorriso malicioso curvava os
lábios de Bear e seus olhos cinzentos estavam escuros como grafite. Ele
estava tão excitado quanto eu.
Sorri de um jeito travesso e lhe direcionei um olhar malicioso.
— Isso responde à sua pergunta, ursinho? — Com minha mão direita,
apertei o volume da sua ereção que estava roçando em minha barriga.
Bear semicerrou os olhos.
— Vou te mostrar quem é o ursinho, Freya. — Ele me pegou no colo
e caminhou pela casa em passos apressados.
Um gritinho de surpresa escapou da minha garganta quando fui
jogada de costas no colchão da cama. Eu acomodei minha cabeça no
travesseiro e observei Bear tirar os seus sapatos, depois a calça e a cueca,
ficando completamente nu na minha frente. Sorri com a visão. Como eu
estava com saudade de admirar o corpo desse homem!
Quando Bear subiu na cama, notei que em uma parte do seu antebraço
esquerdo havia uma bolha de queimadura e o seu pé direito estava
enfaixado. Pensei em perguntar como estavam os seus ferimentos, mas
decidi não desviar o foco daquele momento para outro assunto. Bear não
parecia estar sentindo dor, então presumi que estava tudo bem. Na verdade,
ele está bem demais... Olhei para o meio das suas pernas e mordi os lábios.
Seu pau estava duro e pronto para entrar em mim.
Bear me encarou com um sorriso lascivo e segurou a barra da minha
calça de moletom. Ele a deslizou pelas minhas pernas até tirá-la
completamente do meu corpo e a jogou em um canto do quarto. Antes de
tirar minha calcinha, ele fez uma pausa e analisou o meu rosto.
— Você já está se sentindo bem para fazer isso, Freya? — sua voz
rouca ganhou um tom de preocupação.
Concordei imediatamente. Minha cabeça só não estava doendo
porque eu tomei alguns analgésicos depois do almoço, mas decidi não
contar para Bear que eu estava sob efeito dos remédios, não queria que ele
se preocupasse a ponto de interromper a nossa brincadeira. Nesse momento,
tudo que eu precisava era de uma boa transa selvagem com o meu lenhador
fortão, eu poderia lidar com as dores de cabeça depois.
— Estou bem, eu juro — falei, quando percebi que Bear não iria
prosseguir enquanto não ouvisse a minha confirmação.
— Se sentir alguma dor, me avise — pediu com seriedade.
Assenti e levei minhas mãos até a lateral da minha calcinha, estava
tão excitada que eu mesma pretendia me livrar daquela roupa íntima.
Ao perceber o que eu iria fazer, Bear segurou as minhas mãos e me
impediu de prosseguir.
— Sou eu quem vai tirar a sua roupa, Freya. — Ele segurou a lateral
da minha calcinha. — Fique quieta enquanto eu lhe dou prazer.
Antes que eu pudesse responder, Bear puxou o tecido que segurava e
a minha calcinha se rasgou com tanta facilidade que até parecia feita de
papel. Ele pegou um pedaço dos retalhos, encostou no nariz e inspirou
profundamente. Seus olhos se fecharam enquanto ele se deliciava com o
meu cheiro.
Eu deixei uma risada escapar. À essa altura, já havia me acostumado
com o fato de que Bear gostava de cheirar minhas calcinhas. Ele é idêntico
ao Bear de Desire&Seduction... Será que depois de tudo finalmente teremos
o nosso final feliz?
Quando Bear abriu os olhos, encarou o tecido da minha calcinha e
depois sorriu para mim.
— Estava com saudade do seu cheiro — confessou, com a voz rouca
de tesão.
Suas mãos espalharam as minhas pernas até que elas estivessem
abertas o suficiente e ele se acomodou entre elas. Bear depositou um beijo
na minha virilha e foi descendo até sua boca tocar a minha intimidade.
Gemi quando senti a sua língua quente e macia entrar pela abertura da
minha fenda e deslizar por toda aquela área sensível, passando lentamente
pelo clitóris e depois indo até a entrada do meu canal.
Bear apertou as minhas coxas quando começou a me chupar com
vontade, ele parecia sedento para provar cada gota da minha excitação. Sua
boca sugou o meu clitóris com força e eu gritei, agarrando os cabelos do
topo da sua cabeça.
Ele percebeu que aquilo me agradou e permaneceu me chupando de
um jeito lento e gostoso. Quando senti que meu orgasmo estava próximo,
fechei minhas pernas ao redor do seu rosto e aumentei o aperto das minhas
mãos em seu cabelo.
— Não pare agora, Bear — implorei, em um gemido. — Por favor...
não pare...
Bear aumentou o aperto em minhas coxas e começou a me chupar
com mais intensidade. Sua língua brincava com o meu clitóris de um jeito
tão gostoso que me fazia gritar, ofegar, e implorar diversas vezes para que
ele continuasse o que estava fazendo.
Não demorou muito até o êxtase chegar e o meu corpo inteiro ser
tomado por espasmos de prazer. Estremeci contra a boca de Bear,
inclinando o meu quadril para mais perto do seu rosto, para que ele pudesse
beber cada gota da minha umidade. Quando Bear se deu por satisfeito, ele
depositou um beijo em cada uma das minhas coxas e eu sorri com a
sensação da sua barba roçando em minha pele.
Bear ergueu o rosto e voltou a sua atenção para o restante do meu
corpo, se deitando sobre mim. Ele puxou o meu suéter de moletom para
cima até que meus seios ficaram expostos e enterrou sua boca ali, sugando
um mamilo e depois o outro. Sua língua brincava com a minha pele sensível
enquanto eu me contorcia de prazer embaixo do seu corpo. Ele sorria contra
a minha pele cada vez que eu gemia o seu nome ou puxava o seu cabelo,
enlouquecida de prazer.
— Não estou aguentando mais, Freya... — murmurou, com o rosto
enterrado nos meus seios. — Vou entrar em você agora.
— Sou toda sua, Bear — ofeguei, ansiosa para senti-lo dentro de
mim.
Bear não hesitou por mais tempo, ele pressionou a ponta do seu pau
na minha entrada e me penetrou com força. Eu gemi e o homem resfolegou
com prazer, seu rosto estava enterrado entre os meus seios.
Minhas mãos agarraram as suas costas quando ele começou a mover
seu quadril, entrando e saindo do meu corpo com rapidez. Meus olhos se
reviravam de prazer e eu gemia a cada investida, a cada estocada do seu pau
dentro de mim. Céus, como senti falta disso.
Bear ergueu seu rosto para me encarar e eu pude ver suas inúmeras
feições de prazer enquanto ele entrava com força em mim. Era tão bom
sentir o seu membro me preenchendo, reivindicando cada centímetro da
minha boceta, enquanto nossos olhares se encontravam. Nada jamais
poderia superar aquilo.
Nenhum homem na face da Terra se igualaria a Bear e eu me sentia
sortuda por tê-lo em minha vida. Ele tem seus defeitos, sim, mas que tipo de
ser humano não tem defeitos? Isso só me indicava que ele era real, de carne
e osso, e que aquilo que eu estava vivendo não era um sonho. Bear estava
ali comigo, o meu Bear. Ele estava me levando à loucura, como sempre, me
fazendo a mulher mais satisfeita e feliz do mundo.
Entrelacei minhas pernas em sua cintura para que minha boceta
ficasse totalmente exposta às suas investidas e cada centímetro do seu pau
pudesse entrar em mim. Uma das suas mãos estava apoiada no colchão
enquanto a outra se mantinha nos meus seios, alternando entre apertar o
esquerdo e o direito. Às vezes, ele me dava tapinhas nos mamilos que me
provocavam uma dor completamente prazerosa.
Cada vez que Bear me penetrava eu enterrava as unhas em suas costas
e um gemido de prazer saída da minha garganta. Todos os meus sentidos
estavam concentrados naquele momento, no seu toque, no seu cheiro, na
sua respiração ofegante, no som que os nossos corpos faziam quando se
encontravam... Eu estava perto de gozar e Bear também.
Suas investidas ficavam cada vez mais fortes e os seus músculos se
tensionavam sempre que o seu pau entrava em mim. Quando senti a onda
do orgasmo varrer o meu corpo, gritei o nome dele e a minha boceta se
contraiu enquanto eu estremecia em êxtase.
Bear deixou de se segurar e também gozou. Um gemido rouco saiu da
sua garganta e eu senti o seu líquido quente se espalhar pelo meu canal.
Suas investidas cessaram e ele fechou os olhos, apoiando as duas mãos no
colchão enquanto aproveitava a sua libertação.
Quando Bear saiu do meu corpo e se deitou ao meu lado, eu senti uma
pequena quantidade do seu sêmen escorrer para fora de mim. Virei meu
rosto para encarar o homem deitado na cama. Ele estava suado, ofegante,
exausto e com alguns fios de cabelo grudados em seu rosto. Em outras
palavras, Bear estava gostoso pra caralho!
Eu também estava suada, ofegante e podia sentir os batimentos
acelerados do meu coração. Nas últimas semanas eu achei que nunca mais
me sentiria assim. Que bom que reatamos, porque eu jamais me sentiria
satisfeita desse jeito transando com outro homem.
Enquanto eu aguardava a minha respiração voltar ao normal, Bear me
puxou para perto do seu corpo. Eu apoiei meu rosto em seu peito suado e
ele beijou o topo da minha cabeça enquanto sua mão acariciava as minhas
costas de um jeito terno e suave.
Abracei-o e um sorriso apaixonado curvou a minha boca, eu me
sentia a mulher mais feliz do mundo estando nos braços dele. Não me
restavam dúvidas que Bear seria o homem perfeito para mim e um pai
maravilhoso para a criança que estava em meu ventre. Eu sabia que
seríamos felizes, de agora em diante, sem mais preocupações ou
desavenças. Teríamos um final feliz digno dos livros de romance.
EPÍLOGO

Eu estava na cozinha da minha casa dando mingau para Bjorn, o


nosso filho de dois anos. Meu bebê estava sentado em uma cadeirinha de
comer que Bear construiu especialmente para ele e tomava o mingau na
mamadeira, a segurando por conta própria. Eu me pegava sorrindo toda vez
que via o meu filhinho ter uma nova evolução. Primeiro ele aprendeu a
andar, depois a falar suas primeiras palavras e agora já segurava a
mamadeira sozinho, sem precisar do meu auxílio.
Bjorn era a mistura perfeita de Bear e eu. Ele tinha os olhos cinzas e o
mesmo tom de cabelo dourado do pai, mas seus fios eram cacheados
exatamente como o meu cabelo, quando eu era criança. Sua pele era um
pouco mais clara que a minha e os traços do seu rosto eram idênticos aos de
Bear.
Se passou três anos desde que o lenhador ranzinza e eu nos
conhecemos. Tanta coisa aconteceu... Bear e eu nos casamos e ele
realmente honrou a promessa de que seria um homem melhor. Ele seguiu à
risca o tratamento com o terapeuta e as partes nebulosas da sua
personalidade desapareceram por completo, fiquei muito orgulhosa da sua
evolução. Não tínhamos mais discussões e resolvíamos todos os nossos
conflitos com um diálogo civilizado que causaria inveja em qualquer casal.
Bear deixou de ser um cabeça dura e acabou se abrindo mais para a
tecnologia. Agora ele até tinha um celular e gostava de passar as noites
assistindo séries — a sua favorita, até o momento, era Game of Thrones.
Quando tinha algum lançamento de filme interessante, ele mesmo sugeria
que fôssemos até o cinema da outra cidade para assistir. E por incrível que
pareça, Bear também acabou por ficar viciado em coisas de super-heróis.
Não me surpreendi quando ele me disse que o Thor era o seu vingador
preferido.
Também conseguimos reconstruir a loja com a ajuda de alguns
moradores que fizeram uma arrecadação para ajudar nas obras. Bear ainda
trabalhava como lenhador e fazia esculturas de madeira, eu ainda pintava e
agora também era mãe do garotinho mais lindo do mundo. As coisas
estavam boas em nossa vida. Até conseguimos dinheiro para comprar um
carro novo que ficou de uso exclusivo para os nossos passeios em família.
Bear aposentou de vez a sua caminhonete velha e passou a fazer as entregas
de lenhas com a minha.
Por causa de Bjorn e da minha segunda gestação que já estava para
completar 24 semanas, eu não podia subir a montanha. Há dois meses eu
não visitava a cabana e só poderia ir até lá depois que a minha filhinha
nascesse. Assim que eu me recuperasse do parto, eu deixaria as crianças sob
os cuidados da sra. Ludwig e passaria um fim de semana a sós com Bear lá
na montanha, como uma pequena segunda lua de mel. Até lá, eu teria que
ficar aqui na vila, alternando entre a minha casa e a loja.
Bear saiu cedo de manhã dizendo que precisava entregar lenha e até
agora não voltou. Eu estava aflita, pois hoje era o nosso aniversário de
casamento. Ele nunca se esqueceu e nos últimos anos sempre me acordou
com uma surpresa encantadora. Mas hoje? Ele mal me deu um beijo de bom
dia.
Assim que acordou, Bear saiu pela porta da frente na velocidade de
um raio e Hati o seguiu alvoroçado sem olhar para trás. Eu decidi que não
abriria a loja, pois não sabia que horas Bear iria voltar. Fiquei em casa,
assistindo programas infantis com Bjorn a manhã inteira, e nada do papai
urso aparecer.
Agora era hora do almoço e eu estava esperando que o meu filho
terminasse o seu mingau. Depois eu colocaria o garotinho para dormir e me
sentaria na sala para comer o macarrão de forno que eu fiz.
Bjorn estava nas últimas goladas da mamadeira quando a porta da
casa se abriu e Bear entrou acompanhado de Hati. Eu olhei para o meu
marido e franzi o cenho, deixando claro que fiquei aborrecida com a sua
saída rápida e sem explicações no início da manhã.
— Papa! — Bjorn exclamou, animado, assim que avistou o homem.
Bear deu um sorriso e acenou para o filho, enquanto fechava a porta
da casa.
Cruzei os braços diante do peito e me recostei na pia. Eu não
pretendia cobrá-lo sobre a data esquecida, apenas ficaria em silêncio até que
ele percebesse o erro. Porra, comprei um baita presente caro e é assim que
ele me retribui? Se Bear não me der nada até a meia noite de hoje, eu vou
jogar aquele Macbook no fogo da lareira!
— Freya, eu tenho uma surpresa para você — Bear anunciou quando
o seu olhar encontrou o meu.
A pequena irritação que eu sentia sumiu.
— Sério? O que é? — Arqueei uma sobrancelha, curiosa.
Meu marido sorriu e tirou um envelope branco de dentro do bolso da
sua jaqueta jeans, ele veio até mim e me entregou o papel.
— Feliz aniversário de casamento. — Bear me deu um selinho e me
encarou com entusiasmo. — Abra o envelope.
Eu sorri e fiz o que ele pediu.
Quando abri o envelope, tirei os papeis que estavam lá dentro e fiquei
confusa ao ver passagens de avião para Nova York. Franzi o cenho e
quando olhei outros dois papeis menores, vi que eram ingressos. Li as
informações com atenção e o meu coração disparou. Porra! Não eram
ingressos comuns, eram ingressos para uma sessão de autógrafos que
aconteceria no próximo mês de ninguém mais, ninguém menos, que L. M.
Mayer, a autora de Desire&Seduction! Não acredito!
— Puta que pariu, Bear! Eu não acredito! — gritei eufórica, e o puxei
para um abraço, eu teria pulado em seu colo se não fosse o tamanho da
minha barriga.
Meu marido gargalhou e entrelaçou os braços ao redor da minha
cintura.
Há cerca de um ano, L. M. Mayer saiu do anonimato e revelou o seu
rosto para o mundo. No entanto, ir em uma sessão de autógrafos dela era
um sonho distante para mim... bom, até agora. Devo ter deixado esse desejo
escapar enquanto divagava com Bear durante alguma conversa e ele me
ouviu. Céus, eu tenho o melhor marido do mundo!
— Foi por isso que saiu correndo hoje de manhã? — perguntei,
emocionada, lágrimas queriam sair dos meus olhos.
Bear assentiu com um sorriso. Eu o puxei para outro abraço e fiquei
na ponta dos pés para beijar a sua boca.
— Não consigo acreditar! — falei, animada. — Você é o marido
perfeito, Bear... Esse é o melhor presente que você poderia me dar!
— Eu sempre farei de tudo para ver você feliz. — Ele segurou o meu
queixo, sua outra mão ainda descansava na minha cintura. — Mesmo que
para isso eu tenha que pegar um avião e cruzar o oceano para ir em uma
sessão de autógrafos em outro continente.
Dei um tapinha em seu peito.
— Você adorou os livros dela. Eu sei o que você anda lendo toda
madrugada depois que eu vou dormir — acusei-o, com uma certa diversão.
Bear ergueu as mãos em sinal de derrota. Meu ursinho não queria
admitir, mas nos últimos anos ele acabou virando um leitor assíduo de
romances eróticos.
Fiquei na ponta dos pés e puxei seu rosto para perto do meu. Bear me
beijou apaixonadamente e eu senti meu coração se aquecer — assim como
acontecia em todas as vezes que nos beijávamos.
A partir de hoje, eu contaria os dias para a sessão de autógrafos em
Nova York. Mal podia esperar para contar pessoalmente à L. M. Mayer
sobre essa grande coincidência que aconteceu na minha vida.
Porra, eu sou uma mulher de sorte! Afinal de contas, que leitora
consegue encontrar um homem exatamente igual ao seu personagem
favorito e ainda se casar com ele? Estou mais que satisfeita com o meu
final feliz ao lado do lenhador gostosão e da família que estamos
construindo.

Fim.
Faz um tempo que eu queria escrever um romance com um boy
solitário que se isolou do mundo, assombrado pelas memórias do passado,
bruto por fora e mole por dentro. Eu também queria muito escrever algo
com uma vibe meio nórdica, um boy que parecia um viking... e foi assim
que surgiu o Bear! Não pude recusar quando a A. E. Gabriel me fez a
proposta de escrever histórias sobre homens da montanha, eu simplesmente
me joguei de cabeça na ideia! Muito obrigada pela oportunidade, Dri.
Foi maravilhoso passar tardes em Havengreen na companhia de Bear
e Freya, desenvolvendo o relacionamento deles e fazendo Bear superar seu
medo de abrir o coração para outra pessoa. Me diverti demais com a
história e esses dois personagens sempre estarão em meu coração.
Muito obrigada a você que leu esse livro até aqui. Te convido a
conhecer minhas outras histórias, caso você ainda não as conheça. Sei que
vai adorar!
Bruna Catein é uma escorpiana apaixonada por livros, videogames e chocolate. Nascida em
03/11/2000, ela cresceu em uma pequena área rural no interior do Rio de Janeiro e possui um carinho
muito grande pela natureza.
Bruna entrou no mundo literário em 2013 escrevendo fanfics e contos. Em maio de 2020 ela
resolveu se arriscar e escrever o seu primeiro romance intitulado “Desire – A Ilha do Desejo” que foi
lançado inicialmente no Wattpad e alcançou milhares de leituras logo nos primeiros meses. Hoje,
Bruna Catein é uma autora Best-Seller da Amazon e seus livros possuem milhões de leituras online.
Se você se apaixonou por Bear, eu te convido a dar uma passadinha no Alasca e conhecer Bocca
Hell, o lar do nosso outro Moutain Men: Kane. O quase quarentão gostoso de olhos glaciais vai
derreter o gelo da montanha na companhia da Hadassa, mais conhecida como a autora de romances
eróticos mundialmente famosa L. M. Mayer.

SINOPSE:
Hadassa Price era uma autora Best-Seller aos vinte e cinco anos. Escondida atrás de um pseudônimo
chamado L. M. Mayer, ela é mundialmente conhecida por seus livros eróticos que sempre estão em
alta no Twitter e Tiktok. Por trás da bilionária escritora existe Dass, uma solitária amante de um bom
vinho que, desde pequena, teve problemas consigo mesma, o que a fez se esconder atrás do seu alter
ego da promiscuidade: L. M. Mayer.
Com o fim da sua temporada de sucesso, Hadassa precisa entregar o último título mais aguardado por
seus fãs, antes que ela acabe.
Sem inspiração e diante dos feriados acalorados de Ações de Graças, alugar uma casa em uma
montanha isolada parece ser uma ótima ideia, mas, ao contrário do que pensa, ela não ficará sozinha
durante o rígido inverno de Bocca Hell, no Alasca.
Afinal, Dass vai ficar diante do seu próximo título de sucesso.
Treze anos mais velho, Kane Walker é um solteirão ricaço que vive isolado e, jamais, esperava
encontrar em sua cabana uma linda mulher cheia de curvas. Embora o primeiro encontro de ambos
não tenha sido nada amigável, Kane e Dass precisam se entender até que a neve fique baixa o
suficiente para que saiam.
Eles não esperavam, entretanto, que as coisas esquentassem tanto entre eles, fazendo a montanha
gelada pegar fogo.
Mas nada é tão simples assim, afinal ambos são de mundos diferentes. O bruto homem da montanha
sempre foi possessivo e ciumento sobre tudo o que lhe pertence e, com a jovem escritora, não será
diferente.
Dass não sabe, mas Kane não vai deixá-la ir.
Tudo sobre Dass desperta coisas que Kane jamais sentiu. O destino é capaz de conhecer desejos que
nós mesmos nem sabemos que existem, mas, talvez, isso não seja suficiente para mantê-los juntos.
Kane está disposto a passar por cima de qualquer coisa que cruze o seu caminho.

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(Livro único)

Desejada por um CEO


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