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103-110 (Set – Nov 2017) Brazilian Journal of Surgery and Clinical Research - BJSCR
1. Acadêmicos do 9º período do curso de Enfermagem da Faculdade ÚNICA de Ipatinga MG; 2. Enfermeira, especialista em Urgência, Emergência e
Trauma, docente do curso de Enfermagem da Faculdade ÚNICA de Ipatinga MG; 3. Químico, Mestre em Agroquímica, coordenador do curso de
Engenharia Química, docente dos cursos de Enfermagem, Farmácia, Bioquímica e Engenharia Química da Faculdade ÚNICA de Ipatinga MG.
* Rua Jês nº170, Iguaçu, Ipatinga, Minas Gerais, Brasil. CEP 35162-080. anselmo_amarall@hotmail.com
programas de saúde voltados para a população transexual, mente e emocionalmente por pessoas de sexo oposto; ho-
o serviço de saúde deve conhecer melhor as necessidades mossexualidade, indivíduos que se atraem por pessoas do
desse grupo para criar estratégias mais significantes e mesmo sexo, homens homossexuais (gays) e mulheres
eficazes. homossexuais (lésbicas)3.
Diante disso, propõe- se descrever as manifestações Segundo Silva (2012)4 a orientação sexual abrange
clínicas decorrente do uso o de hormônios sexuais e ainda outras classificações como a bissexualidade,
analisar o impacto na vida do transexual feminino, quando há atração por indivíduos de ambos os sexos,
evidenciando o ponto de vista do indivíduo frente aos seus panssexualidade também denominada como omnissexua-
medos e dificuldades na busca da assistência à saúde lidade, indivíduos que se atrai por pessoas independente
adequada e necessária. de sexo ou orientação sexual, polis sexualidade ou tris se-
xualidade ou a falta de orientação e desejo sexual é defi-
2. MATERIAL E MÉTODOS nida como assexualidade.
A transexualidade é um desacordo do indivíduo com
Foi realizada de uma pesquisa de campo de caráter ex- seu gênero biológico. As pessoas transexuais sentem ne-
ploratória com abordagem qualitativa, realizada com dez cessidade de viver como uma pessoa do sexo oposto. Para
transexuais femininas, residentes na cidade de Ipa- a medicina, o sexo biológico é que determina a identidade
tinga/MG na região do Vale do Aço, de idade entre 18 e sexual de uma pessoa, quando há um desacordo em rela-
40 anos, que fazem o uso de hormônios sexuais. ção a esse contexto é compreendido como um transtorno,
A pesquisa foi realizada aplicando dois questionários, que pode ser tratado cirurgicamente, redesignando o
um socioeconômico adaptado através do questionário So- corpo ao que o sujeito psicologicamente entende ser. Já
cioeconômico ENCCEJA 2013 e um específico que foi para as ciências sociais, a transexualidade é discutida
enviado e aprovado pela Plataforma Brasil. O termo de como valores do universo sociocultural. A partir do ano
Consentimento Livre e Esclarecido foi entregue aos par- de 1993, a transexualidade passou a ser classificada pela
ticipantes, em duas cópias, dos quais receberam uma có- Classificação Internacional de Doenças (CID-10), como
pia e a outra ficou em posse dos pesquisadores. Transtorno de Identidade Sexual5.
Cada participante da pesquisa recebeu um questioná- Terapia hormonal e os efeitos colaterais
rio socioeconômico com 17 questões fechadas de múltipla
escolha e um questionário qualitativo com 10 questões fe- O tratamento endocrinológico através da terapia hor-
chadas pertinentes ao tema abordado na pesquisa. O perí- monal induz o aparecimento de características sexuais se-
odo da distribuição dos questionários e recolhimento dos cundárias, alterações físicas compatíveis com a identifi-
mesmos transcorreu no mês de Maio de 2017. cação de gênero, além de possibilitar o acompanhamento
O material coletado será de uso exclusivo do pesqui- clínico. O tratamento deve ser realizado por toda a vida e
sador, sendo utilizado com a única finalidade de fornecer só é interrompido para realização da cirurgia de redesig-
elementos para a realização deste projeto de pesquisa, e nação sexual. Estabelecer a dose ideal do medicamento de
dos artigos e publicações que dela resultem. Será assegu- forma individualizada é de suma importância para alcan-
rada a confidencialidade dos dados e das informações que çar os efeitos desejados ou alcança–los mais rapida-
possibilitem a identificação dos participantes. A pesquisa mente2.
não oferecerá nenhum dano ou desconforto aos partici- Após o diagnóstico de transtorno de identidade de gê-
pantes e não será objeto de nenhum benefício, ressarci- nero, a terapia hormonal poderá ser prescrita pelo endo-
mento ou pagamentos aos mesmos. crinologista ou urologista. A maioria dos usuários chega
Os dados coletados foram tabulados através do pro- aos serviços de saúde já tendo feito automedicação com
grama IBM SPSS Statistics. Foi realizada a análise dos algum tipo de hormônio por indicação de outros transexu-
resultados amparados por referências bibliográficas e ar- ais ou através de informações coletadas na internet. No
tigos científicos o que possibilitou atingir os objetivos da caso de mulheres transexuais, a automedicação é comum
pesquisa e definir a conclusão final a partir dos resultados o uso de pílulas anticoncepcionais em grande quantidade,
da pesquisa. geralmente tomadas acreditando que terão um efeito mais
rápido, há também uma grande incidência no uso de hor-
3. DESENVOLVIMENTO mônios indicados para reposição hormonal de mulheres
na menopausa6.
O gênero sexual é definido por feminino ou masculino. Verduguez (2015)7 afirma que adolescentes diagnosti-
Quando falamos de orientação sexual estamos lidando cados com Transtorno de Identidade de Gênero tem o di-
com a atração sexual definida pelo indivíduo por qual gê- reito ao tratamento hormonal para mudança de sexo a par-
nero se sente atraído, física, romântica ou emocional- tir dos 16 anos, após 3 meses de psicoterapia, sendo que,
mente. A orientação sexual pode ser classificada como: a cirurgia de redesignação de sexo só poderá ser realizada
Heterossexualidade, indivíduos que se atraem sexual-
em indivíduos com idade maior que 18 anos após Psico- Mulheres transexuais submetidas à terapia hormonal ba-
terapia pré-operatória por no mínimo 2 anos. seada em estrógeno desenvolvem características mamá-
No processo transexualizador, a terapia hormonal para rias femininas. Pesquisas apontam que a terapia hormonal
mulheres transexuais é realizada atravésda administração com estrogênio e progesterona promove o desenvolvi-
de antiandrogênicos com a finalidade de diminuir as ca- mento do câncer de mama (COSTA et al, 2014).
racterísticas masculinas e o estrogênio, doses adequadas Os hormônios androgênicos produzem estrogênio na
garantem um melhor resultado terapêutico e menores mulher age diretamente por meio dos receptores de andró-
efeitos colaterais. Dos estrogênios os mais prescritos são genos em diferentes tecidos. No tecido mamário a testos-
Estradiol e dos antiandrogênicos, o Acetato de Ciprote- terona exógena pode exercerefeito direto, pela ação dos
rona6. receptores de androgênios e indireto, quando convertida
A via de administração hormonal tem influência em em estrógenos, aumentando o risco de câncer de mama.
aspectos metabólicos, pois a administração oral de estro- Os receptores de estrogênio α e β, progesterona e andro-
gênio difere da não oral quanto à passagem hepática, o gênios estão presentes tanto no tecido mamário normal
que pode representar risco ou benefício dependendo das como nas células do câncer de mama, exercendo papel
características da usuária8. A automedicação é uma prá- importante na evolução dessa neoplasia12.
tica comum, consistindo no consumo de um produto com
Alterações Comportamentais
o objetivo de tratar ou aliviar sintomas ou doenças, pro-
mover a saúde, ou até mesmo com objetivos estéticos in- Com o aumento da carga estrogênio no organismo po-
dependentemente da prescrição profissional. Para tal, po- derá haver variações de humor. O paciente está susceptí-
dem ser utilizados medicamentos industrializados ou re- vel a uma maior facilidade de irritabilidade e a se com-
médios caseiros. Fatores econômicos, políticos e culturais portar de maneira mais agressiva, sintomas característicos
têm contribuído para o crescimento e a difusão da auto- de puberdade e períodos férteis na mulher, quando os ní-
medicação, tornando-a um problema de saúde pública9. veis de hormônios estão elevados no corpo6.
Policetemia Acompanhamento psicológico e psiquiátrico
A policitemia é um transtorno mieloproliferativo
O acompanhamento psicológico que é garantido na
das células hematopoiéticas, caracterizada por uma pro-
política de saúde e assistência a transexual nem sempre é
dução anormal e acentuada de eritrócitos, leucócitos e
aderido pelo indivíduo antes do início da terapia13.
plaquetas. O tipo de policitemia que reflete a temática
Ao indivíduo transexual é indicado o acompanha-
abordada neste trabalho se associa com o uso de drogas e
mento psicológico e psiquiátrico para a realização do di-
está diretamente ligada a progressão real do número de
agnóstico de transtorno de identidade de gênero, o diag-
hemácias sendo o nível de eritropoietina usado para o di-
nóstico é de grande importância para o seguimento do tra-
agnóstico diferencial. Classificada com a trombocitemia
tamento, pois o paciente deve ter certeza sobre a decisão
essencial e a mielofibrose com metaplasia mielóide como
da realização de modificações corporais, em especial no
a terceira doença mieloproliferativa clássica BCR/ABL-
que se refere à cirurgia de redesignação sexual, dado seu
negativa, se caracteriza por ser adquirida e não congênita
caráter irreversível. A partir da avaliação e diagnóstico es-
como a outra opção possível para a policitemia secundária
pecializado, os pacientes são encaminhados para atendi-
e costuma estar associado ao aumento da síntese de eri-
mento psicológico em grupo ou individual, e também para
tropoietina devido ou não à hipóxia, um dos reflexos da
acompanhamento psiquiátrico durante todo o tratamento
administração exógena de drogas, como os preparados an-
hormonal até a realização da possível cirurgia14.
drógenos ou a própria eritropoietina (MACEDO, et al
A transexualidade pode acarretar diversos problemas
2015).
psicológicos ao indivíduo, pois é carregada pelo trauma
Na policitemia secundária adquirida, os exames la-
do não reconhecimento, da exclusão social e por dificul-
boratoriais iniciais devem incluir a medida da saturação
dades vividas em relação à problemas familiares e de re-
de hemoglobina-oxigênio arterial. Na ausência de um es-
lacionamentos sexuais e afetivos. Esta experiência pode
tado hipóxico central, exames devem ser revisados para
ser um intenso sofrimento psicológico, que muitas vezes
excluir a possibilidade de estenose da artéria renal O uso
vem acompanhada de tentativas de suicídio, depressão,
de hormônios causa um aumento no número de células
transtornos alimentares e angústia, provocadas não ape-
vermelhas no sangue e o aumento da viscosidade que
nas pelo conflito de não pertencimento ao sexo biológico
pode causar coágulos sanguíneos, trombose e trombose
como também pelas inúmeras consequências sociais, éti-
venosa profunda (MACEDO, et al 2015).
cas, jurídicas e culturais intrínsecas a esta condição 4.
Câncer O acompanhamento psicológico no processo de tran-
Os hormônios esteroides como estrogênio e progeste- sexualização é de grande importância pois permite explo-
rona são responsáveis pelo desenvolvimento mamário. rar e elaborar os aspectos psicoemocionais da história de
vida do sujeito, no seu contexto familiar, social, profissi- São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Fortaleza, Goiâ-
onal e religioso. Possibilitar-lhe uma reflexão sobre sua nia, Minas Gerais, Rio Grande do Sul, Bahia, Rio Grande
condição atual e futura, das perdas e ganhos com o trata- do Norte e em Brasília há assistência aos transexuais, to-
mento; ajudar na auto estima baixa, nas angústias e difi- dos pautadas nas regras e regulamentações inseridas pelo
culdades; aliviar a transfobia internalizada, sentimento de sistema de saúde, baseadas na literatura médica13.
medo, solidão, ansiedade e depressão pela sua transexua-
lidade; aliviar o estresse na saúde mental e no seu desen- 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
volvimento humano7.
Cirurgias de redesignação sexual
A cirurgia de redesignação sexual em mulheres tran-
sexuais utiliza-se como tática cirúrgica a retirada ou des-
membramento do pênis, retirada parcial do escroto, or-
quiectomia bilateral, uretroplastia, construção da neova-
gina, neoclitoroplastia e neovulvoplastia. Para as modifi-
cações dos caracteres sexuais secundários, utiliza-se ma-
moplastia, cricotireoplastia, cirurgia de cordas vocais, ci-
rurgia feminilizante de face e contorno corporal e realiza-
ção de depilação definitiva. As cirurgias de modificação
de caracteres sexuais secundários não são aplicáveis a to-
dos os indivíduos, isso vai depender diretamente do resul-
tado individual da hormonioterapia feminilizante15.
Por se tratar de cirurgias de grande porte e que detém
caráter irreversível, algumas considerações são necessá-
rias. O transexual deve ser esclarecido de todas as conse-
quências estéticas e funcionais desses procedimentos, Figura 1. Faixa Etária
além dos possíveis riscos. É de grande valia promover o
contato prévio com os médicos e com outros transexuais
que passaram por esse processo, isso irá ajudar na tomada
de decisão em relação à efetivação da cirurgia. Além disso,
é importante avaliar os motivos a que se dá a opção pela
transformação corporal, já que a população transsexual é
um grupo de grande vulnerabilidade social, a cirurgia de
redesignação sexual pode ser uma tábua de salvação, vista
como a única possibilidade de inclusão social15.
O sistema único de saúde (sus) e o transsexua-
lismo
O SUS sugere o processo transexualizador como um
caráter de promoção à saúde, em nível de atenção primá-
ria e secundária, valorizando uma melhor condição de
vida, tendo a saúde como foco principal, dando aos indi-
víduos uma maior liberdade de escolha. Por outro lado, as
condições de submissão a cirurgia de mudança de sexo
estão para quem se encaixar nos pré-requisitos que a me-
dicina pauta, seguindo as diretrizes da medicina em rela- Figura 2. Escolaridade.
ção ao “tratamento” da transexualidade garantindoque os
indivíduos que se enquadres nesses pré-requisitos consi- Segundo Verduguez (2015)7, a terapia hormonal é in-
gam uma qualidade de vida positiva16. dicada legalmente ao indivíduo transexual a partir dos 16
Ou seja, o Processo Transexulizador foi criado a fim anos de idade. Dos entrevistados 100% são maiores de 18
de regulamentar as cirurgias não apenas no SUS, como anos conforme demonstrado na Figura 1.
também no que atinge toda a esfera de cuidado com a sa- Fatores socioeconômicos, políticos e culturais têm
úde de uma maneira geral, pois os hospitais que atuam contribuído para o crescimento e a difusão da automedi-
com a cirurgia ainda são poucos. Apenas os Estados de cação, tornando-a um problema de saúde pública9. Dos
ais?
% do To-
10,0% 80,0% 90,0%
Figura 3. Via de administração. tal
Tabela 1. Faz uso de terapia hormonal? * Há quanto tempo faz o uso de Tota Conta-
hormônios sexuais? 2 8 10
gem
Há quanto tempo faz o uso de
hormônios sexuais? Total % do To-
20,0% 80,0% 100,0%
mais tal
2à4 4a6 6a8 de 8
anos anos anos anos Observou-se que 100% dos entrevistados fazem uso
Faz Si Con- de terapia hormonal, sendo que 80% fazem uso a mais de
uso m ta- 2 3 2 3 10
de gem 4 anos, conforme descrito na tabela 1. Sabe-se que após o
tera- % do início da terapia, o indivíduo não poderá interrompe-la
pia Total para manter os efeitos da feminização. As exposições por
hor- 20,0% 30,0% 20,0% 30,0% 100,0% tempo prolongado aos hormônios podem desencadear
mo-
nal? efeitos colaterais, por isso é importante o acompanha-
Total Con- mento médico para a regulação da dosagem6. A ausência
ta- 2 3 2 3 10 da busca de acompanhamento é confirmada pela tabela 2,
gem onde 80% dos indivíduos não tem acompanhamento mé-
% do dico para o uso de hormônios e apenas 10% foram acom-
20,0% 30,0% 20,0% 30,0% 100,0%
Total
panhados antes de iniciar o uso da terapia hormonal. O
acompanhamento psicológico no processo de transexua-
Horn et al, (2015)8 afirma que a via de administração hor-
lização é de grande importância, pois permite explorar e
monal tem influência no metabolismo, pois a administra-
elaborar os aspectos psicoemocionais da história de vida
ção oral de estrogênio difere da não oral quanto à passa-
do sujeito, no seu contexto familiar, social, profissional e
gem hepática, o que pode representar risco ou benefício
religioso7.
dependendo das características da usuária. A escolha da
O acompanhamento psicológico e medico que é ga-
via de administração pode estar relacionada a fatores só-
rantido na política de saúde e assistência a transexual nem
cios econômicos e ao conhecimento empírico, pois não
sempre é aderido pelo indivíduo antes do início da tera-
há existe relatos na literatura que a via de administração
pia13.
do hormônio influencia no resultado esperado no pro-
Conforme demonstrado na TABELA 3, 70% dos en-
cesso de transexualização. Conforme observado na Fi-
trevistados receberam orientação sobre os efeitos colate-
gura 3, 60% dos entrevistados optam pela via de admi-
rais do uso de hormônios durante a transexualização, po-
nistração intramuscular, pois acreditam ser uma via de
rém somente 20% deles fazem o acompanhamento mé-
maior confiabilidade, conforme relatado na entrevista.
dico para a hormonioterapia.
Tabela 2.Você teve acompanhamento psicológico antes do início da te-
O estigma e a falta de orientação direcionada aos tran-
rapia hormonal? *Você faz acompanhamento médico para o uso de hor- sexuais, dificulta a aderência dos indivíduos à programas
mônios sexuais?
% do Não Total
40,0% 50,0% 90,0%
Total Você recebe assis- Sim Conta-
1 1
Total Conta- tência do serviço gem
5 5 10
gem de saúde da rede % do
10,0% 10,0%
pública de saúde Total
% do
50,0% 50,0% 100,0% para pessoas tran- Não Conta-
Total
sexuais? 9 9
gem