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IRLAN MASSAI CALAÇA DOS SANTOS

Oficial da Polícia Militar do Estado de Sergipe, pós


graduado em Criminalidade Violenta pela Universidade
Federal de Sergipe, com especialização em: Ações Táticas
Especiais (BOPE-PMAL), Controle de Distúrbios (PRF),
Tiro de Precisão (COT-PF), Explosivos (BOPE-PMBA) e
Contraterrorismo (GIOE-GNR). Autor do livro
"Mentalidade Tática Policial & As Quatro Etapas do
Treinamento de Alto Rendimento"

@FATOR3TREINAMENTO

Cognição e Combate
RODRIGO MENEZES
Agente de Polícia Civil do Estado do Espírito Santo, lotado
há 12 anos na Coordenadoria de Recursos Especiais-CORE.
Graduado em Direito, Mestre em Segurança Pública,
Doutorando em Educação, Operador Tático (CORE-PCES),
Atirador de Precisão Policial (COT-PF),Técnico em
Explosivos (CORE-PCERJ), Autor dos livros: Anotações
sobre a Doutrina Policial - Sniper Policial e Atire Bem -
Fundamentos detalhados do tiro de pistola

@SNIPER.POLICIAL

Cognição e Combate
1
HONESTIDADE COGNITIVA

2
VISÃO E COMBATE

3
PROPRIOCEPÇÃO

4
MEMÓRIA

5
HABILIDADES
6
VIESES COGNITIVOS

7
REAÇÃO / DECISÃO

8
CONTROLE DE IMPULSIVIDADE

9
ESTRESSE E TREINAMENTO

10
BACKLASH
HONESTIDADE COGNITIVA

Cognição é tema chave deste trabalho, associado ao tiro


de combate e todo o percurso que o aprendiz transcorre
para se tornar capaz de se defender com o mínimo
esforço, máxima eficiência e segurança (algo que os
americanos costumam chamar de “regra dos três M”).
Esse procedimento além de requerer tempo extenso,
também demanda franqueza e autocrítica do aluno, para
que etapas não sejam puladas prejudicando diretamente
todo o processo.
A grande verdade é que passamos nas últimas décadas
por uma verdadeira revolução científica no estudo do
cérebro e isso vem causando impacto estrondoso nas
metodologias de treinamento esportivo e atuação
profissional em ambientes com alta carga cognitiva e de
estresse. Infelizmente, ainda é rara a discussão unindo a
neurociência, estudo da cognição e atuação
técnica/tática com armas de fogo (justo o ambiente que
mais precisa desses novos conhecimentos). De certa
forma parece que quem gosta de neurociência fica
longe das armas e quem vive o combate não tem
paciência para ouvir pessoas que vomitam teorias sem
viver nenhuma delas. A proposta desse trabalho é
discutir de maneira simples como os aspectos da ciência
são fundamentais no processo de formação e atuação
daquele que pretende defender sua vida com utilização
da arma de fogo.
Entendemos que cognição, de forma clara e objetiva, é

Cognição e Combate
o fenômeno que acomete o cérebro através da percepção dos
cinco sentidos, assimilando as informações recebidas através
de estímulos do ambiente, para subsequente organização de
tais informações que possam propiciar clareza de raciocínio
e retenção do novo conhecimento a ponto de poder usá-lo
como resposta imediata para soluções de problemas.Em
suma, é a capacidade do cérebro observar, aprender, reter
esse saber e pensar racionalmente quando for exigido. Quem
precisa entender melhor sobre cognição e tomada de decisão
do que alguém que precisará perceber uma agressão letal e
tomar a decisão de utilizar uma arma de fogo, sabendo que
será responsável por cada projétil que sair dela,
independente do seu nível de treinamento ou habilidade
emocional para lidar com o antes, durante e depois do
confronto?
Quando abordamos a autocrítica pedindo para que o
aprendiz seja honesto com ele mesmo, estamos explicitando
que a decisão em portar uma arma de fogo para defesa
engloba muito mais tópicos que ultrapassam o limite do
aprendizado técnico e invade a esfera do risco de morte do
cidadão armado e de quem o acompanha. Tema delicado de
tratar, mas seríamos negligentes com o que pregamos e
acreditamos caso não o mencionássemos.
Neste trabalho buscamos unir dois estudiosos e
pesquisadores do assunto, que fazem dos estandes de tiro,
bem como das operações reais, seus laboratórios de
experimentação, cujas conclusões serão transmitidas nesta
obra.
Importante salientar que não se pretende apregoar verdades
absolutas e/ou fórmulas milagrosas de tiro. São apenas dicas
que funcionaram para alguns e surtiram resultado na prática,
com a devida explicação científica e avaliação crítica da

Cognição e Combate
interação entre o estudo e a práxis. Espera-se sim, que seja
despertada a curiosidade pelo estudo e que o uso da arma de
fogo seja tratado também como uma ciência, que exige
estudo e entendimento complexos com fundamentações
teóricas sedimentadas, que inibem qualquer tipo de
amadorismo. Ser contestador é o primeiro passo do
estudioso, pois assim ele busca aprofundar-se no tema, e sua
desconfiança permite-lhe alcançar a verdade.
Objetivamos atingir os cidadãos que possuem arma de fogo
para sua proteção, da sua família e do seu patrimônio. A
grande maioria das dicas expostas neste livro visam elevar
as habilidades do atirador, para que este possua movimentos
automatizados e íntimos do seu corpo para efetuar tiros
rápidos e agrupados, liberando assim carga cognitiva que
deve estar empenhada na difícil missão de entender o
ambiente em sua volta. Não apenas transmitiremos técnicas
de tiro modernas e dicas atuais, mas também serão
discutidos tipos de treinamento em seco (sem munição real)
ou com utilização de acessórios disponíveis no mercado
nacional, capazes de desenvolver as habilidades complexas
exigidas para o confronto armado.
Da mesma forma, não se deve esquivar do assunto que está
em voga no Brasil: Mentalidade de combate. E assim,
buscamos unir estes pilares que lastreiam um combatente:
Técnica e sede por vitória. Nenhum combatente entra em um
embate imaginando sair derrotado dele, mas jamais se
sentirá satisfeito caso ocorra. Derrota não faz parte dos
planos de nenhum deles. Nesse sentido, busca-se com esta
obra difundir premissas que são capazes de serem
construídas e despertadas no íntimo de cada um. E para
ilustrar bem essa parte introdutória, citamos a frase de um
dos maiores mestres no assunto tiro de pistola, Jeff Cooper:

Cognição e Combate
“A melhor defesa contra um ataque violento é ser mais
violento. Contra-ataque intensamente, parando apenas
no fim, com o agressor no chão, fora da luta.”

A grande questão é que, ao pensar sobre um confronto


armado, dificilmente a gente pensa que pode nem perceber
que esse confronto começou, ou então descobrir na hora H
que, sob estresse, simplesmente você deixa de ouvir direito
ou que o tal “sentido aranha” dos filmes em que as coisas
ficam em câmera lenta realmente existe. Talvez você não
aceite que durante um combate em curta distância não irá
usar o aparelho de pontaria da sua pistola ou que a forma de
posicionar a arma que você acreditava proporcionar alta
velocidade de reação também faz você tomar decisões
erradas em dobro. Esse livro fala sobre tudo isso e muito
mais.
Não existe exatamente uma ordem correta de leitura dessa
obra. Caso queira pular diretamente para um assunto do seu
interesse, fique à vontade. Ela nasceu de discussões um tanto
independentes que foram organizadas apenas por questões
formais. A grande verdade é que todos os assuntos se
relacionam e devem ser estudados de acordo com as suas
prioridades. Boa leitura!

Cognição e Combate
APRENDIZAGEM E AS FUNÇÕES COGNITIVAS

Cognição vem de uma palavra em latim que tem significado


bem próximo de "conhecer", enquanto aprender vem de outra
palavra de mesma origem, com um significado mais próximo
de "tomar posse". Na ótica neurobiológica, a aprendizagem
ocorre quando nosso sistema nervoso "toma posse" de um
estímulo do ambiente e esse estímulo provoca uma mudança
física em nosso sistema nervoso, facilitando a transmissão
desse estímulo em momento posterior. Cognição é meio que
o caminho que existe entre o estímulo e o surgimento de um
"conhecimento". É necessário entender que o processo de
aprendizagem passa pelo caminho das funções cognitivas,
com interação entre o processamento mental e o ambiente
que está inserido. O aprendiz deve absorver o máximo
possível das informações que lhes foram entregues,
interpretá-las elaborando um raciocínio lógico e devolvê-las
ao ambiente como forma de resposta, tomada de decisão.
Talvez pareça que essa discussão teórica não tem tanto
impacto prático na vida de alguém que está interessado em
ser um melhor "combatente", mas a coisa fica bem
interessante quando começamos a prestar atenção nos erros
que podem acontecer na tomada de decisão de um confronto
armado e a relação inequívoca com funções cognitivas como
atenção, percepção e memória. Maior ainda a importância
desses conceitos quando inserimos na receita do combate o
ingrediente que torna tudo mais difícil: o estresse. Ao estudar
sobre como nossa mente funciona, como aprendemos algo e
principalmente como tomamos decisões (de forma
consciente ou não), o treinamento sem dúvida vai para outro
nível.

Cognição e Combate
Não adianta saber atirar, se não se sabe definir em
quem atirar ou quando atirar. Não adianta ser capaz
de engajar uma arma com grande velocidade se não
for capaz de compreender um cenário e identificar o
agressor com a mesma velocidade. Não adianta fazer o
deslocamento mais rápido, com a melhor postura
tática, se não sabe para onde ir. (Calaça, 2021, p. 150)

Todo este processo de aprendizagem com aplicação das


funções cognitivas se tornará obsoleto se não estiverem em
correto funcionamento as quatro premissas exigidas para
este trâmite com eficiência. São elas: capacidade,
necessidade, orientação e operação.
Capacidade: é uma resposta genética relacionada com o
meio externo. Cada indivíduo tem o seu grau de capacidade
inata, mas, da mesma forma, alguns conseguem ativar outro
tipo de capacidade relacionada à sua vontade própria,
respeitando seu limite psicológico e fisiológico.
Necessidade: pode-se dizer que tem relação com a
disposição genética para desenvolver certa valência. Está
relacionada também com a valoração depositada pelo
aprendiz ao conhecimento exposto pelo tutor. Na
andragogia não se aprende o que não se deseja aprender.

“Os adultos escolhem aquilo que irão aprender de


acordo com a necessidade real que possuem ou
percebem.” (Calaça, 2021, p. 21)

Orientação: é a capacidade que já foi processada somada à


necessidade, e será revelada como reposta a estímulos por
meio de movimentos corporais, é o modus operandi.

Cognição e Combate
Operação: é a capacidade cognitiva regendo todo o
processo de aprendizagem de um novo saber. Todo este
processo de aprendizagem com aplicação das funções
cognitivas se tornará obsoleto se não estiverem em correto
funcionamento as quatro premissas exigidas para este
trâmite com eficiência. São elas: capacidade, necessidade,
orientação e operação.

“Os adultos escolhem aquilo que irão aprender de


acordo com a necessidade real que possuem ou
percebem.” (Calaça, 2021, p. 21)

Cognição e Combate
VISÃO E COMBATE
VISÃO EM SITUAÇÃO DE RISCO

Apenas algo em torno de 27% a 32% dos policiais


utilizam o aparelho de pontaria de pistola em algum
momento, considerando aí também os que utilizam
apenas a massa de mira. (Eleuterio, 2020 p. 34)

Em situações críticas, que envolvem risco de morte, a


adrenalina causa a dilatação da pupila, aumentando a entrada
de luz, mas ao mesmo tempo relaxa o músculo ciliar, que
achata o cristalino e prejudica a capacidade de ver objetos
próximos, como o conjunto do aparelho de pontaria da
pistola. Junto com processos psicológicos, isso promove o
estreitamento da percepção do campo visual – 70% de
diminuição, em média, conhecido como Atenção Seletiva –
Visão de túnel. (Wendling, 2018 p.208). Da mesma forma,
perde-se em situação de exposição ao risco a noção de
profundidade, que é dependente da utilização dos dois olhos
em conjunto – visão binocular. Diante deste panorama, o
fechamento de um dos olhos agravaria ainda mais a visão já
comprometida pela elevação dos batimentos cardíacos
oriundos do medo. Então qual o motivo para treinarmos
fechando um dos olhos auxiliando no melhor enquadramento
do alvo com o aparelho de pontaria?
Quando treinamos em longas distâncias e utilizamos o
aparelho de pontaria fechando um dos olhos, visando um tiro
preciso, devemos saber que em situações de estresse elevado
ou risco de morte, não conseguiremos manter esta visada
com apenas um olho aberto, pois corpo e mente estarão em
um estado de hiperatenção, praticamente impedindo fechar
um dos olhos, como reforça Eleuterio, 2020 p. 35:

Cognição e Combate
Também se torna quase impossível o disparo com um
dos olhos fechados, visto que a própria resposta
fisiológica do corpo buscará manter ambos os olhos
abertos.

Treinamos dessa forma, para condicionar nosso corpo e


musculatura com a posição correta de enquadramento da sua
visão com o aparelho de pontaria, de forma que quando for
inserido em uma situação real, seus músculos já conhecem a
posição correta onde a sua pistola ficará posicionada frente
a seus olhos para que aconteçam bons tiros, mesmo com
ambos os olhos abertos, e de forma intuitiva.
O medo promove uma série de reações no corpo humano,
que entra em um extremo estado de alerta e prestamos mais
atenção em tudo que está à nossa volta, buscando assim
processar com mais rapidez as respostas. O corpo libera
adrenalina que proporciona alterações que nos preparam
para enfrentar o perigo iminente que nos causa medo.
Ocorre a reação de luta ou fuga, na qual a natureza de cada
um irá agir dentro dessas duas opções. Ambas aceleram o
coração, para ser enviado mais sangue aos músculos como
forma de nos prepara para lutar ou fugir.

“Quando nosso corpo entra no estado de resposta ao


medo, nós liberamos uma série de neurotransmissores,
substâncias que vão preparar a mente e o corpo para
reagir àquela situação de perigo. Por exemplo, a
adrenalina, que vai energizar o corpo e deixar a gente
num estado de euforia, de uma sensação agradável,
como acontece também no exercício físico. Nós também
liberamos dopamina e endorfina, que ajudam o corpo a

Cognição e Combate
se manter calmo e anestesiado em uma situação de
perigo. A dopamina, em particular, é um
neurotransmissor ligado ao prazer, então muitas
pessoas gostam de se expor a situações de perigo
controladas pra liberar essas substâncias e curtir a
sensação que elas trazem”, Acoverde, 2020

Cognição e Combate
VIAS VISUAIS

É vital para o treinamento e atuação tática que possamos


entender que o que a gente “vê” é na verdade uma
construção que relaciona aspectos fisiológicos e
psicológicos.
Nesse primeiro momento falo sobre as vias visuais,
destacando a magnocelular e parvocelular (existem outras),
que possuem diferenças físicas (no nível dos feixes de
neurônios) que promovem características centrais na maneira
com que reagimos ao mundo.
Isso tem uma grande importância na análise de como propor
cenários no treinamento e também como colocar uma
habilidade à prova. Compreender que certas informações
visuais transitam mais rápido do que outras já é um ótimo
começo para entender qual a relação entre o susto e o
treinamento, reações “reflexas” e “condicionadas”, dentre
outras questões.

“A percepção que temos do mundo, mais


do que uma imagem exata do meio físico
que nos rodeia, é uma construção feita pelo
nosso cérebro.”
Lea Hyvärinen

Cognição e Combate
VÁRIAS VISÕES

O estímulo visual é transmitido para diversas áreas do


cérebro, através de vias paralelas que processam partes
diferentes da informação e em velocidades também
diferentes. Temos a ilusão comum que a visão é formada
por um fenômeno singular, quando na verdade é a soma de
diversos processos fisiológicos e psicológicos. Temos
neurônios que levam a informação sobre cores, outros sobre
contraste, posição. Essas informações viajam em
velocidades diferentes, para locais diferentes e, a depender
do contexto, irão contribuir para uma tomada de decisão
eficaz ou para um erro catastrófico.

Cognição e Combate
VIA MAGNOCELULAR E PARVOCELULAR

Adaptado de "Fisiologia médica de Ganong" 24e. Kim E. Barret,


Susan M. Barman, Scott Boitano e Heddwen L. Brooks.

Cognição e Combate
VIA MAGNOCELULAR E PARVOCELULAR

No nível biológico, se destacam as vias Magnocelular e


Parvocelular, onde a primeira possui velocidade de
transmissão alta e é responsável por transmitir aspectos
espaciais da visão. É a visão do “onde”. Já a parvocelular
possui transmissão mais lenta e é responsável por
comunicar aspectos como cor e diferenças de contraste. É a
visão do “o que”. Existem também as vias Dorsal e Ventral,
associadas de certa forma com as mesmas definições, mas
esse papo já está ficando confuso demais. Precisamos
apenas entender que certas informações irão trafegar de
forma mais rápida do que outras. Isso interfere
drasticamente em como agimos ou reagimos.

Cognição e Combate
VIAS VISUAIS E O SUSTO
Essa diferença de velocidade na transmissão de diferentes
aspectos visuais como posição de um objeto (magnocelular
= + rápido) e definição e contraste (parvocelular= + lento)
explica em parte o motivo de tomarmos “sustos“ ao interagir
repentinamente com objetos que se aproximam rápido.
NO CÉREBRO, NADA É ISOLADO. TUDO É
INTEGRADO!

Adaptado de "A Scientific Approach to REALITY BASED


TRAINING".

Padrões ameaçadores, como um objeto desconhecido que se


aproxima ou se move rapidamente, acionam certos alarmes
comportamentais de preservação, provocando picos de
estresse, que podem logo depois ser refutados ou confirmados
pelo complemento fornecido da via visual mais lenta.

Cognição e Combate
QUAL A RELAÇÃO COM O TREINAMENTO
TÁTICO?

É importante entender esses aspectos fisiológicos para


manipular alguns fatores estressores como distância e
compressão de tempo no treinamento, tornando evidente que
uma mesma habilidade pode ter diferentes performances a
depender de como os estímulos visuais são apresentados. Por
muito tempo atiradores pensaram (muitos ainda pensam) que
seria mais vantajoso treinar em distâncias cada vez maiores,
com objetivo de desafiar as habilidades e aumentar a
confiança. Acontece que treinar com alvos próximos e com
características realistas (alvos fotográficos) provocam
consequências psicológicas que também precisam ser
treinadas.

Cognição e Combate
VISÃO E ESTRESSE

É fácil encontrar materiais didáticos afirmando que, durante


o momento do estresse, o campo visual aumenta e ganhamos
super poderes sensoriais, pois a evolução … blá blá blá. Essa
história tem lógica mas está incompleta.
Ao analisar um pouco mais sobre como se dá a visão em seu
aspecto fisiológico e psicológico começamos a entender
melhor aquilo que tantas vezes é possível observar em
operações, instruções e momentos de agonia da vida.
O estresse muda a percepção, restringe a atenção, muda o
processamento das informações visuais e em geral prejudica
a tomada de decisão no contexto do confronto moderno
(ambiente urbano com ameaças em várias direções). A
melhor ferramenta contra isso ainda é o treinamento
adequado e a experiência prática no ambiente caótico da vida
urbana.
O ESTRESSE “MELHORA“ A VISÃO?

Muita gente faz menção aos efeitos


do estresse de sobrevivência
citando que a adrenalina causa
dilatação da pupila e isso aumenta a
entrada de informação visual. De
acordo com essa breve explicação
parece que sob estresse todo mundo
enxerga melhor.

Cognição e Combate
Ao mesmo tempo que dilata a pupila,
a adrenalina relaxa o músculo ciliar,
que achata o cristalino e prejudica a
capacidade de ver objetos próximos,
tipo o sistema de mira da arma!

Zônula de zinn cristalino Músculo ciliar

Zônula de zinn Cristalino Músculo ciliar


Adaptado de "A Scientific Approach to REALITY BASED
TRAINING".

Cognição e Combate
O PROCESSAMENTO VISUAL OCORRE EM 3
NÍVEIS!

Por mais que “ver” pareça uma tarefa simples, envolve


processos fisiológicos e cognitivos em três níveis De
complexidade, exigindo um trabalho integrado de boa parte
do cérebro e sofrendo bastante com o estresse.

Inferior
Informação visual
que passa pela
retina

Superior
Intermediário
Identificação dos Definição de
objetos. Sofre figura e fundo.
forte influência Dependente do
cognitiva contexto

Cognição e Combate
LOW ROAD
Caminho curto

Fonte: Terry Wollert

HIGH ROAD
Caminho Longo

Fonte: Terry Wollert

Cognição e Combate
DOIS CAMINHOS PARA A
MESMA INFORMAÇÃO

O vídeo (que você pode assistir clicando no ícone acima)


mostra a brilhante atuação de uma policial com
procedimentos bem treinados em nível autônomo. O vídeo
mostra também, de maneira clara, que a informação percorre
dois caminhos no cérebro e os dois provocam reações em
tempos diferentes. Terry Wollert chama esses caminhos de
“Low Road” e “High Road” (Caminho curto e Caminho
longo). Os neurocientistas concordam. O caminho curto leva
o estímulo visual do tálamo para a amígdala cerebral e isso já
provoca uma irradiação de respostas automáticas de
proteção. É o tal do susto inevitável (só pode ser evitado com
antecipação do estímulo) que ocorre principalmente quando
a ameaça é SÚBITA e PRÓXIMA. Enquanto isso ocorre, a
informação está indo também por um caminho mais lento,
que vai no córtex e outras áreas de armazenamento de
memórias e integração para tomada de decisão. O caminho
longo compara o que você viu com o que você conhece, para
definir se era de fato uma ameaça ou não.
Essas informações são importantes para desenhar a instrução,
compreendendo que o susto sempre vai ocorrer se a ameaça
for súbita e próxima. Não tem como treinar respostas táticas
pra esse pequeno lapso de tempo. Mesmo assim, a resposta
treinada surge logo em seguida e ela precisa estar em nível
autônomo. A resposta automática de retração, grito e
tensionamento livrou a policial de levar um tiro (Caminho
curto). De maneira muito bem treinada (aí começa a decisão

Cognição e Combate
através do caminho longo) ela saca a arma e efetua 5 disparos
no tempo total de 3 segundos, mesmo segurando uma
lanterna.
É algo impressionante, ainda mais ao verificar que ela
mantém postura tática, decide parar de atirar, respira e
continua adotando protocolos doutrinários pertinentes para a
situação.

LOW ROAD
Caminho Curto

Percepção do “susto”
Ocorre de forma automática
Pouco influenciado pelo treinamento
Grande atuação da amígdala
Movimentos de proteção

HIGH ROAD
Caminho Longo

Identificacão real da ameaça


Resposta treinada
Influência do córtex
Movimentos de Proteção / ataque ou fuga
Integração entre racional e emocional

Cognição e Combate
PROPRIOCEPÇÃO
O QUE É PROPRIOCEPÇÃO?

Antes de ler esse capítulo faça um exercício simples: Com


os olhos fechados, leve seu dedo indicador até a ponta do
seu nariz. Conseguiu?
O que permite que tenhamos a capacidade de fazer isso é
justamente a propriocepção, que no frigir dos ovos significa
“a percepção de nós mesmos”. Algumas células nervosas
possuem a missão específica de informar sobre a posição de
cada articulação e músculo, para que tenhamos uma
referência espacial de nós mesmos. Isso permite que a gente
perceba nosso peso, a forma como seguramos um objeto e a
maneira como realizamos qualquer movimento. A
aprendizagem proprioceptiva é implícita, mas se destaca na
habilidade em atividades esportivas em geral.
A teoria das inteligências múltiplas proposta pelo psicólogo
Howard Gardner apresenta a “inteligência corporal-
cinestésica”, caracterizando a importância dessa capacidade
para a vida em geral (cinestesia é outro nome para
propriocepção).

MAS POR QUE FALAR DISSO EM UM LIVRO


SOBRE COMBATE?

Ao longo do treinamento em diversas doutrinas, escolas de


atuação tática e metodologias de ensino por todo o Brasil e
fora dele, percebemos que muitas práticas acabavam sendo
abandonadas pela incompatibilidade do que era visto na
teoria com o que era possível fazer sob estresse.
O exemplo campeão é a utilização do aparelho de pontaria
das armas curtas, que se mostra inexistente nos confrontos

Cognição e Combate
armados em distâncias curtas. Enquanto o ensino tradicional
se preocupa em corrigir a pontaria apenas através do
alinhamento do sistema de mira, esse tempo seria muito
melhor investido se treinássemos a capacidade
proprioceptiva do engajamento da arma.
Calma, não estamos falando que não devemos usar aparelho
de pontaria no treino. Estamos apenas pontuando que é
melhor basear a aprendizagem na garantia de uma postura
sólida e com pouca variação de aspectos previsíveis da
execução do disparo, pois isso tem muito mais transferência
para a tarefa-critério do que conferir alinhamento de alça e
maça.

PROPRIOCEPÇÃO, DEDO INDEXADOR E


TIRO DE COMBATE

A propriocepção já foi muito bem explanada em capítulo


anterior e já é sabido que se resume a percepção de nós
mesmos. Com o decurso do tempo e o empenho físico em
determinada prática com destreza, permite que
identifiquemos nossas dificuldades e habilidades ao praticar
movimentos que exijam ações motoras coordenadas um
pouco mais apuradas. Ao longo da vida dominamos a
referência espacial sobre nós mesmos, e somos capazes de
calçar um sapato em pé sem focar visualmente nisso, ou
levar a mão exatamente no ponto onde há uma coceira nas
costas. Enquanto o passar dos anos e as atividades
cotidianas ajudam a propriocepção, outras precisam ser
provocadas e treinadas para serem incutidas nesse processo.
No tiro de combate, é ela que auxilia nas medidas exatas das
diferentes forças aplicadas pelos músculos para cada mão na
empunhadura, por exemplo. Assim como da coordenação

Cognição e Combate
específica das fibras musculares para uma boa realização
das habilidades desejadas. Ter referências espaciais também
se mostra importante no treinamento de tiro de combate.
Sabemos que um tiro instintivo que visa salvaguardar a sua
vida ou de outrem, não utilizará o aparelho de pontaria da
arma, e sim executará todos os movimentos já sedimentados
responsáveis pelos fundamentos do tiro com maestria,
porém de forma rápida.
E por que treinamos utilizando o aparelho de pontaria da
pistola? Justamente para que este movimento e referencial
espacial seja apresentado para o atirador, de modo que com
práticas exaustivas, seja inserido no rol das atividades
proprioceptivas do seu cotidiano. Quando o atirador e todo o
seu corpo conhecem exatamente o local espacial a frente da
sua visão onde sua arma realizará um bom tiro, e treina
sempre buscando consolidar a posição dos músculos e
articulações, ele precisa utilizar o aparelho de pontaria para
consolidar esse processo e efetuar bons e precisos tiros.
Essa é a grande importância de aprender cada fundamento
de forma detalhada, entendendo sua contextualização e
aplicabilidade, para empregá-los de forma satisfatória.
Sedimentar cada habilidade motora nova, tornando todo
movimento automatizado, requer prática, pois não há outra
maneira de criar intimidade com os fundamentos do tiro a
não ser praticando de forma lenta e suave, objetivando
alcançar que sejam empregados com fluidez e naturalidade.
E assim ressaltamos a importância do dedo indexador da
mão de apoio que se posiciona ao completar a empunhadura
com a mão do tiro. Saber que seu dedo polegar da mão
reativa encontra-se sempre paralelo ao cano da arma,
apontando para a mesma direção, traduz que se seu dedo
indexador, está apontado para onde deseja atingir, aumenta-

Cognição e Combate
se as chances desse tiro ser preciso. É o que buscamos no
tiro de combate instintivo, movimentos coordenados já
dominados pelo corpo sendo aplicados com precisão e uma
velocidade capaz de sanar a crise. Aqui juntamos os três
elementos citados: propriocepção; dedo indexador; tiro de
combate, pois treinando o tiro de pistola com o dedo
indexador sempre paralelo ao cano, e utilizando do aparelho
de pontaria para confirmar que o tiro foi preciso e o dedo
apontador estava direcionado para o lugar certo, estamos
inserindo estes dados na nossa propriocepção, pois
saberemos exatamente o ponto onde nossa arma deverá estar
à frente da nossa visão e com o dedo polegar da mão reativa
apontado para o alvo. O resultado prático disso, de um
treinamento sério e continuado, com correções sobre os
fundamentos do tiro e criação de uma nova memoria
motora, é o tiro de combate. Neste não haverá tempo hábil
para visadas ou ajustes finos, e por isso insistimos em
treinar de forma lenta e suave, fazendo todos os movimentos
corretos até o tiro impactar exatamente onde deseja. De
forma gradativa após dominar todos os fundamentos e já
alcançar um nível de tiros precisos consistentes, será dado
mais um passo, e sem pressa, imprimir velocidade nos
movimentos, mas sem perder a precisão.
Para atingir habilidade motora que o certifique que em uma
situação de estresse elevado e risco morte presente será
capaz de executar o tiro de combate, com velocidade e
precisão, não se recomenda negligenciar as fases de
aprendizagem. Primeiro aprenda a fazer isso certo, depois
aprenda a fazer isso rápido.

Cognição e Combate
MEMÓRIA
MEMÓRIA MOTORA

A memória motora está diretamente ligada ao


processamento de informação, pois é o corolário do
armazenamento dos resultados desta atividade. Entender os
tipos e saber diferenciá-lo é importante para saber como
reter melhor uma nova informação, ou uma aprender uma
nova habilidade. Há três tipos de memória relacionados ao
controle de movimentos, armazenamento sensorial de curto
prazo: Mantém a informação por um breve tempo, após
receber a informação visual ou acústica e processá-la,
consegue-se executar movimentos coordenados mesmo com
sua atenção já voltada para outra coisa ou situação. Estudos
relataram que esta informação não dura mais que 1 segundo
(Sperling, 1960), um exemplo prático é o cidadão armado e
em movimento identifica um alvo que deseja acertar, após
localizar este alvo, inicia seu processo de movimentação
para sacar e apresentar sua arma, não exigindo dele que
fique com sua atenção voltada para o alvo, pois este já foi
armazenado de forma suficiente para onde você apresentará
a arma enquadrando-o no seu aparelho de pontaria; memória
de curto prazo, também conhecida como memória de
trabalho, é mais duradoura que a sensorial de curto prazo,
mas da mesma forma poderá ser esquecida se não receber
atenção continuada. É o exemplo de você aprender uma
habilidade nova, como exemplo, sanar uma pane de dupla
alimentação, atingir uma boa performance, mas caso não
ofereça continuidade praticando esta nova habilidade, ela
será esquecida; memória de longo prazo, são informações
recebidas e executadas por várias vezes e longos períodos
durante a vida, tornando-se habilidade que serão aprendidas
e sedimentadas, e não esquecidas. Para atingir tal memória

Cognição e Combate
para uma nova habilidade, o cidadão necessitar manter
a prática, transformando os movimentos corporais
novos em memórias motoras, as quais quando
precisarem ser executadas, serão de forma
automatizada. É o caso do cidadão armado ver e
identificar uma ameaça e iniciar um movimento de
sacar sua arma instintivamente, ao mesmo tempo que
utiliza sua atenção cognitiva para outras demandas,
pois este movimento coordenado já é uma memória
motora. Há evidências de que esta retenção da
aprendizagem motora pode ser quase perfeita e
perdurar por anos, ou até décadas, a depender da
prática continuada.

Cognição e Combate
MEMÓRIA DE LONGO PRAZO NÃO
DECLARATIVA

Aprendizagem Vias reflexas/


não associativa Estriado ventral

Implícita Priming Neocórtex

Aprendizagem
associativa

Procedimentos Estriado dorsal


motores e cerebelo

Respostas Amígdala
emocionais

Adaptado do livro "Neurociências", de Ana


Cristina Rego (2017)

Cognição e Combate
MEMÓRIA DE LONGO PRAZO NÃO
DECLARATIVA (IMPLÍCITA)

Apesar de existir também a memória imediata (sensorial) e


de curto prazo (memória de trabalho), é na memória de
longo prazo que teremos as informações armazenadas de
maneira duradoura para utilização posterior. Por esse motivo
ela também traz indagações pertinentes para o treinamento
tático.
Na memória de longo prazo temos também a declarativa,
dividida entre episódica e semântica, papo para outro
momento.
Observem que, segundo essa classificação (que não muda
muito em outros livros) existem vários tipos de memória de
longo prazo, com utilização de diferentes estruturas
cerebrais, mas que constantemente citamos no mundo do
treinamento tático: “reflexo”, “resposta emocional”,
“procedimento motor”.
O problema é que são processos distintos, em áreas distintas
da nossa mente, mas que estão se cruzando o tempo todo
para gerar nossos comportamentos.

Aí vem a grande questão: Como treinar para alinhar uma


resposta de procedimento motor com uma ação de
sobrevivência?

Como buscar aspectos da aprendizagem não associativa


(habituação, sensibilização) que ajudem para uma resposta
emocional devidamente equilibrada com os procedimentos
motores?

Cognição e Combate
Eu também não sei, mas tenho concordado com alguns
princípios desenvolvidos pelas pessoas mais sérias do
mundo do treinamento:

Treinamento simples (simples não quer dizer fácil)


Contextualizado (na fase de simulação)
Com utilização de fatores estressores
Treinamento variado
Treinamento continuado (nunca acaba! Você nunca
está totalmente pronto)

Cognição e Combate
PECADOS DA MEMÓRIA
Adaptado de Daniel Schacter

1 DISTRAÇÃO

Resulta da falta de atenção à atividade em si. Quando


realizamos atividades de maneira desatenta, a codificação
da informação na memória também fica com falhas.
Quando falamos em provocadores de distração, o celular
parece ser o inimigo número um.

2 BLOQUEIO

É uma falta temporária de acesso à informação. Como


quando tentamos lembrar de algo e ficamos com a
sensação de que a palavra está "na ponta da língua". Junto
com a distração, representam as chamadas falhas de
omissão, pois não conseguimos acessar a informação
quando precisamos dela.

3 ERRO DE ATRIBUIÇÃO

É a associação incorreta de uma memória com uma


situação. Isso provoca um reconhecimento falso.
Muito comum em depoimentos onde a testemunha
viveu uma situação muito complexa e intensa e depois
precisa lembrar de detalhes do ocorrido. Pode acabar
"lembrando" de algo que não aconteceu.

Cognição e Combate
4 SUGESTIBILIDADE

É a tendência que a memória possui de ser alterada cada


vez que é acionada, por estímulos externos no momento da
evocação. A forma de questionar uma testemunha, por
exemplo, pode auxiliar nesse processo de alteração da
memória. Algumas pesquisas já foram conduzidas
mostrando ser possível implantar memórias falsas em
pessoas mentalmente saudáveis.

5 VIÉS OU FILTRO

São distorções inconscientes da memória, que possuem


relação com os conhecimentos gerais e crenças do
indivíduo. Na hora de recordar de algo, as pessoas
frequentemente preenchem as lacunas de informação com
conceitos e crenças que possuem na atualidade. Isso
merece destaque ao analisar informações prestadas por
terceiros.

6 PERSISTÊNCIA

São as memórias obsessivas. Aquelas que mesmo quando


não queremos nossa mente faz questão de evocar. Esse
tipo de situação tem relação com o nível de carga
emocional do episódio vivido. Memórias persistentes
podem ser incapacitantes, funcionalmente.

Cognição e Combate
HABILIDADES
HABILIDADES

Guthrie (1952) definiu habilidade como “a capacidade de


atingir algum resultado final com o máximo de certeza e um
mínimo dispêndio de energia ou tempo e energia” (p. 136).
Trazendo este conceito para o tiro de combate, traduzimos
bem com a máxima bem conhecida no âmbito operacional
policial, na qual o operador promove as suas escolhas e
executa-as pautado pela teoria “3M”, mínimo esforço;
máxima segurança; máxima eficiência. Possuir determinada
habilidade e ser considerado habilidoso com arma de fogo,
significa constância, ser eficiente constantemente. Efetuar
tiros precisos, sem pressa e de forma pausada, é
completamente diferente de acertar o alvo com tiros rápidos
e agrupados. Ser considerado habilidoso, representa errar
pouco, é ter muito mais chances de acerto do que de erro,
devido à consolidação da habilidade motora, sem a
expectativa de influências causais. Quando se fala do
mínimo esforço, trata-se da minimização e conservação de
energia, aplicando-a para o que se apresenta como
necessário, evitando movimentações desnecessárias que
podem levar o atirador à fadiga. Quando a habilidade é
aprendida de forma satisfatória, tornando alguns
movimentos corporais instintivos e automatizados, o atirador
não precisa nem focar a atenção nestas habilidades quando
precisar utilizá-las, liberando seu processo cognitivo para
outras características em que se envolveu. Exemplo: Ao se
envolver em uma situação que precise sacar sua arma para
se defender, se este dominar todos os fundamentos do tiro e
movimentos corporais como um atirador habilidoso, não
gastará seu processo cognitivo nisso, podendo utilizá-lo para
uma leitura detalhada do ambiente e ter percepções

Cognição e Combate
situacionais que possam salvar sua vida, como identificação
de outros agressores, procura por abrigos ou uma rota de
fuga aparente. Atiradores habilidosos conseguem executar
movimentos com sua arma com menor esforço. Outro ponto
procurado com frequência por atiradores iniciantes é a
rapidez, a execução de movimentos com eficiência e
velocidade. Mas para se atingir tal estágio deve-se visar a
prática sempre buscando melhorar, que é diferente de
repetição, no qual o atirador não melhora a cada repetição, e
sim repete o que havia feito.
Quando se pratica buscando evoluir sempre, tendo um gasto
energético apenas quando necessário, torna cada vez mais os
movimentos automatizados e intuitivos, com ações
desnecessárias sendo descartadas e evitadas, resultando em
movimentos coordenados mais rápidos devido aos ajustes ao
longo do processo. Um exemplo prático disso, ao sacar sua
arma e apresentá-la, ao longo da apresentação o atirador
manteve-se ajustando sua empunhadura, aumentando o
tempo para o primeiro tiro, uma vez que, se este tivesse
aprendido corretamente todos os fundamentos para aplicá-
los impecavelmente, respeitando o tempo de aprendizagem e
todo o seu processo, sacaria sua arma já com uma primeira
empunhadura bem feita, levando a arma para a mão de apoio
que estaria aguardando-a para firmar a empunhadura
completa, sem ajustes desnecessários, encurtando o tempo
do primeiro disparo e utilizando seu processo cognitivo e
atenção para outras coisas também importantes em um
combate armado. Tornar estes movimentos naturais e
intuitivos diminui o tempo de defesa armada. Não se deve
aumentar a velocidade sem ter o domínio de todos os
movimentos necessários, pois caso assim o faça, estará
aumentando o gasto de energia para alcançar tal ligeireza,

Cognição e Combate
não sendo uma habilidade nem um movimento natural, no
qual seu corpo dominaria perfeitamente todos o percurso
exigido para efetuar o tiro, otimizando o tempo de resposta e
equilibrando as atenções necessárias em uma situação face
uma ameaça. E assim resume-se a teoria “3M”, pois quando
efetuamos movimentos sedimentados que nos tornam
habilidosos, estamos maximizando a certeza do alcance do
objetivo e não contando apenas com o fator sorte;
movimentos automatizados equilibram a atenção do atirador
permitindo-o aplicá-la em outras demandas também
importantes, representando a minimização dos custos físicos
e mentais da performance; e quando buscamos o máximo de
eficiência, com a execução dos movimentos necessários para
atingir o objetivo, já dominando o caminho que deve ser
percorrido, estaremos da mesma forma minimizando o tempo
utilizado.
Para que seja obtido o resultado de defesa desejado, o
atirador precisa realizar de forma harmoniosa a combinação
de processos mentais e motores de forma interativa, no qual a
capacidade perceptível junto com os fatores sensoriais serão
os responsáveis pela tomada de decisão correta,
determinantes para o bom desfecho da crise.
Assim, seja qual for a decisão escolhida, o atirador
dependerá da qualidade dos movimentos, pois mesmo com a
percepção correta do perigo e escolha adequada de reações, o
atirador provavelmente não conseguirá atingir sua defesa
caso titubeie na execução das ações.

Cognição e Combate
ESTÁGIOS DE APRENDIZAGEM

Paul Fittz, conhecido por desenvolver um modelo de


movimento humano, a Lei de Fittz, baseado em movimentos
rápidos e direcionados, que se tornou um dos modelos de
movimento humano mais bem sucedido e estudado. Era
psicólogo e foi também tenente-coronel na Força Aérea dos
Estados Unidos, e durante sua estada nas Forças Armadas
ficou conhecido pelas suas melhorias na segurança da
aviação. Como professor na Universidade de Ohio, fundou o
laboratório de Pesquisa em Psicologia da Aviação, após a
segunda grande guerra, em 1949.
Em 1964 desenvolveu três estágios de aprendizagem, com
foco nos componentes perceptuais-motores e ênfase no
processo cognitivo, aplicado no primeiro estágio, que
entendia como a principal premissa do aprendizado. Este
modelo de aprendizagem foi bastante utilizado no meio
esportivo, e ousaremos fazer uma analogia no âmbito do tiro
de combate.
Estágio cognitivo: Deve haver uma sinergia entre professor
e aprendiz, no qual deve dissipar toda a sua atenção para o
novo conhecimento que está sendo transmitido e que pode
vir a tornar-se uma nova habilidade. O aluno nesse estágio
deve entender toda a fundamentação do assunto lecionado,
assim como contextualização e aplicabilidade dele. Este
entendimento é essencial para a melhor retenção e
assimilação do novo saber. Dúvidas devem ser sanadas e
questionamentos desconfiados precisam ser indagados para
uma melhor compreensão do tema. Os facilitadores devem
utilizar de metodologia simples, se fazendo entender o
tempo todo, com linhas de explanação conexas e coesas,
seguindo uma lógica prática e utilizando o recurso da ação

Cognição e Combate
modelo, na qual o instrutor de tiro executa toda a
movimentação corporal que deseja que o aprendiz alcance
para total assimilação daquela técnica nova que está sendo
ensinada. Tão importante como convencer por palavras e
explanações, o exemplo executado pelo instrutor da forma
correta de aplicação e execução dos movimentos são de
extrema importância.
Nesse estágio inicial o atirador deverá focar sua atenção no
entendimento teórico e justificativas para a aplicabilidade
daquela habilidade nova que lhe está sendo apresentada.
Executar os movimentos de forma suave, lento e com fluidez
é uma grande dica de trilhar com atenção todo o caminho que
sempre seu corpo percorrerá para atingir o objetivo
desejado com maestria.A rapidez vem com a prática, e não
pular etapas é obrigatório para uma boa aprendizagem.
Estágio associativo ou de fixação: Também conhecido
como estágio motor, nesta fase o atirador busca organizar os
movimentos coordenados que o tiro exige para organizar
mentalmente os padrões de movimentos que lhe levarão a
uma eficácia maior nestas ações. Para atos que exijam mais
velocidade, o atirador em fase de aprendizagem deve
construir seu programa motor que te levará para a rapidez
desejada com eficiência sem prejuízo na movimentação.
Iniciando com movimentos lentos e respostas simples, a
performance vai melhorar de forma constante na medida que
vai praticando sempre buscando melhorar e sedimentar tais
movimentos coordenados, poucas e genéricas respostas para
as exigências da situação de perigo evitaram movimentos
inconsistentes.Quando o atirador atingir movimentos
consistentes com fluidez e automaticidade, isto diminuirá
custos de energia, e permitirá ao atirador ter sua atenção
cognitiva em outros pontos.Esta fase da aprendizagem dura

Cognição e Combate
muito mais tempo que a primeira, e cada atirador alcança o
platô com variações de período, uns com mais facilidade que
outros. O objetivo específico deste estágio é que os
movimentos corporais coordenados sejam executados com
suavidade e sem pressa visando fazer certo primeiro.
Estágio autônomo: Aqui o atirador atingiu o nível desejado
de aprendizagem, após passar um longo período no estágio
anterior com prática exaustiva, ele já consegue acelerar o
processamento de informação no ambiente em que possa
ocorrer um ataque armado a sua pessoa, e responder de
forma automatizada como respostas já organizadas e que
demandam menos tempo de resposta, ou seja, neste nível o
atirador já executa movimentos rápidos e automatizados. Por
já possuir suas respostas programadas e que serão
executadas com automaticidade, o atirador no seu
treinamento ou mesmo em uma situação de ameaça armada
real, diminui sua atenção para os movimentos reativos, por
já ter sua programação motora bem definida, podendo
utilizar sua capacidade cognitiva para atividades simultâneas
e tomadas de decisão mais estratégicas. Em uma situação de
crise real envolvendo ataque e defesa armada, o atirador
consegue ter uma percepção ambiental mais apurado após o
sinal visual do perigo eminente, executando sua defesa
instintivamente como resposta
motora já processada, sendo capaz de ter sua atenção
cognitiva em busca por abrigos, rota de fuga, procura por
novas ameaças, execução de recargas, dentre outras
atividades. As melhorias neste estágio são lentas, mas a
prática dever ser uma constante para evitar regressões.

Cognição e Combate
Fitts & Posner
ESTÁGIOS DA APRENDIZAGEM
MOTORA

COGNITIVO ASSOCIATIVO AUTÔNOMO

ALTA DEMANDA ERROS MENOS BAIXA DEMANDA


COGNITIVA FREQUENTES COGNITIVA

JÁ É CAPAZ DE CONSEGUE FAZER +


GRANDE QUANTIDADE DETECTAR ALGUNS DE UMA ATIVIDADE
DE ERROS ERROS DURANTE A TAREFA SIMULTANEAMENTE

VARIAÇÕES GRANDES CONSEGUE DETECTAR OS


MENORES VARIAÇÕES
PRÓPRIOS ERROS E
DE PERFORMANCE DE PERFORMANCE
CORRIGIR

INÍCIO DA HABILIDADE
REFINAMENTO
APRENDIZAGEM AUTOMÁTICA

Dentro da etapa de desenvolvimento da habilidade ou


programa motor, é necessário entender que o objetivo final
do treinamento deve ser a realização da habilidade com o
mínimo de erro e de demanda cognitiva. Durante a atuação
operacional teremos quase sempre um ambiente incerto e a
necessidade de focar nossa atividade cognitiva nos detalhes
que tornam as ocorrências algo único.

Mas que detalhes são esses?

Cognição e Combate
Ex: quem é o agressor? Qual medida de uso da força é mais
eficiente? Qual o enquadramento legal da minha ação?
Como devo aplicar meu efetivo para achar esse fugitivo? O
abordado pode não ser quem pensamos que ele é?
Os pesquisadores Fitts e Posner identificaram que as
pessoas tendem a passar por estágios de aprendizagem que
envolvem as mesmas características. É importante destacar
que as habilidades em fase inicial causam grande demanda
cognitiva (não dá para fazer sem se concentrar em cada
detalhe) e grande variação de performance (como no tiro,
onde o aluno acerta um disparo bem no centro e logo em
seguida atira fora do alvo). Com o treinamento adequado é
esperado que as habilidades demandem cada vez menos do
nosso cognitivo consciente, se estabeleçam como memória
procedimental e sejam executadas de forma autônoma
(muito comum observar essa evolução quando aprendemos
a dirigir).
Com relação à atuação tática, não é admissível que
gastemos nossa capacidade cognitiva para garantir que
estamos apontando a arma para local seguro, que estamos
com a empunhadura correta ou como devemos posicionar a
algema para não demorar muito na prisão de um infrator.
Conhecer as características desses estágios de aprendizagem
é importante para que os instrutores possam identificar as
necessidades de treinamento com maior facilidade e
desenvolver exercícios mais adequados para os seus alunos.

E como eu consigo saber em qual


estágio estou?

Cognição e Combate
Dica prática:

Para avaliar se determinada habilidade está mais próxima do


estágio cognitivo, associativo ou autônomo, peça para que o
aluno reproduza a habilidade enquanto você entrega para ele
outra demanda cognitiva, ex: peça que faça uma recarga
tática em deslocamento e mostre números variados com a
mão para que ele diga em voz alta o número mostrado.
Quem está mais próximo do estágio cognitivo em uma
habilidade não consegue fazer isso de forma fluida.

Cognição e Combate
VIESES COGNITIVOS
VIESES COGNITIVOS

Muita gente comenta que o cérebro humano é como um


super computador, com uma capacidade de processamento
de informações que as máquinas ainda vão demorar muito
para conseguir igualar. A parte que ninguém fala é que o
cérebro consegue esse rendimento tão grande na base de
muita trapaça! Isso mesmo. Nossa mente vive procurando
formas de economizar energia, criando atalhos eficientes
para o reconhecimento de padrões, aumentando assim a
velocidade para tomada de decisões e chances de
sobrevivência em um mundo dinâmico. o problema é que
isso tem um custo, relacionado com a chance de erro nesses
atalhos da mente. Amos Tversky e Daniel Kahneman
introduziram a expressão na década de 80, definindo "viés
cognitivo" como uma tendência sistemática ao erro na
interpretação de uma informação.
Viés em inglês se chama “bias” e esse é um termo muito
presente nas literaturas sobre treinamento policial, uma vez
que a tomada de decisão é extremamente impactante na
nossa atividade e essas decisões quase sempre são em
ambiente estressante e com enorme compressão de tempo.
Um detalhe super importante sobre os vieses é que eles
ocorrem de maneira inconsciente, ou seja, isso significa que
uma série de fatores influenciam nossa tomada de decisão
sem que a gente se dê conta disso. Depois que o assunto
começou a ser amplamente estudado, mais de uma centena
deles já foi catalogado em estudos pelo mundo, com alguns
deles causando certo alvoroço por exemplo no meio
jurídico, quando uma série de estudos mostrou que o fator
que mais importava para definir a pena de alguém em um
julgamento nos Estados Unidos era se o magistrado já tinha

Cognição e Combate
almoçado ou não. A fome provocava o endurecimento das
penas aplicadas. Entender esse assunto é muito importante
para que possamos discutir e separar, por exemplo, o que é
uma ação policial discriminatória e o que é uma decisão
tomada sob efeito de um viés cognitivo não consciente!
Importante também para entender qual nível de precisão de
tomada de decisão podemos exigir dos profissionais de
segurança pública e das pessoas em geral.
Confundir uma furadeira com uma metralhadora talvez
pareça um erro absurdo quando você está visitando uma
obra em andamento na sua casa,
mas quando você está no meio de uma progressão em
ambiente hostil, com baixa luminosidade, sob estresse e com
a expectativa de que pode ser baleado a qualquer momento,
sua mente é capaz de fazer você ver e ouvir a metralhadora.
Elegemos alguns dos principais vieses cognitivos que se
relacionam diretamente com questões que podem ser a
diferença entre vencer um confronto armado ou provocar
uma tragédia.

Cognição e Combate
VIÉS DE CONFIRMAÇÃO

Talvez esse seja o viés cognitivo que mais causa prejuízo na


atualidade. É um fato amplamente verificado na psicologia
social de que temos a tendência em analisar qualquer
informação de forma que ela concorde com a nossa opinião
já existente, nossas crenças ou expectativas. Não é à toa que
grupos políticos rivais assistem o mesmo debate a tiram
conclusões opostas das mesmas falas e argumentos. Em
virtude disso procuramos apenas estudos científicos que
corroboram nossa opinião sobre certo tema e analisamos o
que está na nossa frente de maneira seletiva. Na atividade
policial ou tomada de decisão de um possível confronto
armado isso é potencialmente perigoso, em virtude do
elevado custo do erro de interpretação. Esse custo é medido
em vidas. Muitas vezes os “sinais” que interpretamos como
ameaçadores podem ser baseados em expectativas que já
tínhamos anteriormente e nosso processo de verificação
pode estar sendo guiado pelo que Amy Herman chama de
“visão desejosa” em seu livro “Inteligência Visual”. Peter
Wason foi o psicólogo cognitivo que criou a expressão na
década de 60, mas esse fenômeno é observado desde a
Grécia antiga até os dias atuais, nas discussões sobre vacina
do corona vírus. Nas tentativas de explicar o motivo desse
fenômeno, cada área do conhecimento puxa a sardinha para
o seu lado, com argumentos evolucionistas, genéticos, ou da
influência cultural no comportamento.
No fim das contas o fato é que a gente sempre gosta de estar
certo e odeia estar errado, então tudo que representa esse
esforço de precisar aprender algo, mudar de opinião ou de
mentalidade será visto com muita desconfiança, insegurança
e críticas.

Cognição e Combate
VIÉS DE ANCORAGEM

Na lista dos vieses cognitivos, a Ancoragem talvez seja o


efeito mais presente na realidade da atividade policial, e com
potenciais muito nocivos para todos os envolvidos.
De maneira resumida, a Ancoragem é a influência que uma
informação ou percepção inicial provoca na maneira que
iremos interpretar informações posteriores. Quando alguém
fala que determinada rua é perigosa, tudo que você passar a
ver nessa rua irá parecer mais suspeito, pois você está
ancorado na premissa anunciada e toma ela como base para
analisar as informações posteriores.
Em geral, a ancoragem é importante para sobrevivência por
acelerar o processo de tomada de decisão e mudar níveis de
alerta, mas como ocorre de maneira subconsciente também
representa um risco se levarmos em consideração que a
informação ancorada pode estar errada. Exemplo clássico
são as ocorrências passadas no sistema de rádio da polícia,
onde é fácil alguém confundir um nome, número de placa,
bem como também algum criminoso pode ligar e passar
intencionalmente informações erradas para prejudicar outra
pessoa. Um carro prata na verdade pode ser preto, uma
ocorrência passada como simples pode ser altamente
complexa e arriscada, ou o contrário.
Para não virar refém desse viés cognitivo, exercite a
desconfiança , considerando de forma antecipada que certas
informações podem não ser reais e valorizando sua
capacidade perceptiva independentemente do histórico
apresentado.

Cognição e Combate
EFEITO HALO

Em 1920, o psicólogo Behaviorista Thorndike escreveu


sobre o efeito Halo, que seria a interferência que uma
observação inicial exerce na avaliação de outras questões
que não necessariamente possuem relação de causa/efeito
com o que foi visto anteriormente.
Goffman já tinha escrito algo semelhante ao falar sobre o
poder do estigma, que nos leva a atribuir características
Morais específicas para pessoas com certas características
físicas. Pessoas comunicativas tendem a ser interpretadas
como mais confiáveis, pessoas bonitas fisicamente são
consideradas moralmente da mesma forma.

Qual a relação disso com o confronto armado?

É necessário entender que enquanto nos esforçamos para


perceber a intenção violenta, o criminoso também se esforça
todos os dias para enganar nossa percepção e conseguir o
que quer com o mínimo de esforço e o máximo de segurança
para ele. Faz sentido que o marginal perceba que certas
características de vestuário e comportamento afastam a
fundada suspeita de policiais e possíveis vítimas, logo, ele
buscará adotar esses padrões para passar despercebido.
Tem se tornado cada vez mais comum criminosos
realizarem assalto vestidos de motoboy, de entregador de
delivery, ou qualquer outro disfarce que reduza suas chances
de ser abordado por uma guarnição de serviço. ou
denunciado por um cidadão. O indivíduo atento a essas
dinâmicas criminosas pode basear sua fundada suspeita em
padrões mais complexos de comportamento, considerando a
influência do efeito Halo na sua percepção. Evidentemente,

Cognição e Combate
isso demanda maior consciência situacional e
observação ativa. Isso também é muito importante
para quem não é Policial e possivelmente já criticou
alguma intervenção pelo fato de estarem justamente
quebrando esse viés cognitivo (do efeito halo), ao
abordar motoboys, entregadores, carros de luxo,
homens de terno e Bíblia embaixo do braço, mulheres
com carrinho de bebê.

Cognição e Combate
Principais motivos para o cérebro trapacear!
G R U P O S D E V I E S E S
C O G N I T I V O S

1 2
4 3
1 Muita 2 Pouco
informação significado
O cérebro adota uma O cérebro atribui
estratégia para ignorar significado de formas
estímulos em detrimento diversas.
de outros.

4 O que lembrar? 3 Necessidade de


ação rápida
O cérebro atua para O cérebro atua para
anular falhas na diminuir o tempo de
memória. tomada de decisão.

Cognição e Combate
REAÇÃO / DECISÃO
TEMPO REATIVO

Em uma definição simples, tempo de resposta denomina o


período que começa quando o estímulo é primeiramente
apresentado e termina quando a resposta do movimento
ocorre. O tempo de reação está intimamente ligado ao
processamento de informação, que é como esta é
apresentada para o cidadão que a processa e responde com
um movimento habilidoso. O processamento de informação
passa por três fases, que são: identificação do estímulo, que
consiste em um estágio sensorial que faz uma análise sobre
o que está sendo apresentado aos receptores sensoriais,
sendo a visão o mais comum, mas podendo ser também pela
audição, toque, cinestesia e olfato; fase da seleção da
resposta, após a primeira fase fornecer informações
suficientes que farão o cidadão selecionar uma resposta,
exigindo um processo de transição que exige uma entrada
sensorial (identificação do estímulo) resultando em uma
saída com movimentos habilidosos; e a fase de programação
do movimento, que inicia seu processamento após receber a
decisão da resposta que será executada definido na fase
anterior, com a principal atribuição de organizar o sistema
motor para fazer o movimento desejado. Na prática,
podemos citar como exemplo em um treinamento de tiro
visando treinar cognição do atirador, ao colocá-lo de costas
para alvos múltiplos e com diversas formas geométricas
desenhadas, assim como cores, números e letras, após o
instrutor soar um silvo longo do apito indicando atenção,
grita uma figura geométrica e um número que será alvos que
o atirador deve acertar, ao final do silvo curto o atirador
deverá fazer um giro estacionário, identificar quais são os
alvos com esta figura geométrica e número mencionados

Cognição e Combate
pelo instrutor, sacar sua arma (velada ou ostensiva) e efetuar
uma certa quantidade de tiro em cada alvo desses. O atirador
no exemplo apresentado navegou pelas três fases de
processamento de informação, fase de identificação do
estímulo auditivo, pois de costas para o alvo precisou ouvir
o silvo do apito para iniciar o exercício, e em seguida visual,
procurando e identificando as imagens cantadas pelo
instrutor, e na sequência selecionou a resposta para esta
situação que se encontrava, no caso um treinamento
cognitivo, decidiu sacar sua arma, e por fim, programou-se
para efetuar os tiros, executando movimentos motores para
que isto ocorresse. Pode-se dizer que este processo todo é
conhecido como tempo de resposta, no qual divide-se em
tempo de reação e tempo de movimento. O tempo de reação
seria iniciado com o silvo do apito até o atirador iniciar os
movimentos corporais habilidosos para responder a este
estímulo e o tempo de movimento, quando o atirador
finaliza o tempo de reação, decidindo qual resposta irá
entregar até o final dos movimentos corporais, neste caso
prático exemplificado, ao final dos tiros propriamente ditos.

Cognição e Combate
REAGIR X DECIDIR

O processo cognitivo da reação é mais curto que o da


decisão. Isso deve ser levado em conta no planejamento de
instrução e seus efeitos no mundo real. A reação simples trata
basicamente da resposta a um estímulo esperado e que possui
uma única resposta possível, então já estamos preparados
para fazer algo e só esperamos o estímulo que libera para a
ação. Não existe tomada de decisão a ser feita nem
considerações ou avaliações. (Ex: nadador esperando a
largada). Quando temos mais de uma opção de resposta,
obrigatoriamente teremos que escolher entre uma das
alternativas e só depois agir. Esse tempo varia de acordo com
o número de opções, expectativa, capacidade de antecipação,
experiências passadas, entre outros. (Ex: ouvir um disparo e
ver duas pessoas armadas e precisar decidir contra quem
reagir). Se você treina para reagir, você atira antes mas atira
sem decidir. Você irá condicionar certos estímulos à resposta
de ataque. Se você treina para decidir, você será mais lento
mas irá discriminar melhor sobre como agir. Qual é a forma
certa de treinar? As duas estão certas, pois existem vantagens
e desvantagens em cada escolha. Treinando pra reagir você é
mais rápido mas tem + chance de erro (errar a interpretação
do estímulo). Se você treina para decidir você pode ser lento
demais para ser efetivo mas tem menor chance de erro na
tomada de decisão. Qual a virtude do operador de alto
rendimento, nesse sentido?
Ele tem maior capacidade de antecipação, reconhecendo os
elementos que corroboram para uma tomada de decisão +
rápida, eliminando alternativas de acordo com sua elevada
consciência situacional promovida através do treino e
experiência.

Cognição e Combate
CONTROLE DE
IMPULSIVIDADE
CONTROLE DE IMPULSIVIDADE

Essa é uma capacidade cognitiva muito relacionada com a


tomada de decisão em caráter de urgência.
Muitas vezes a mente entende que a ação precisa ser tão
rápida que não dá tempo nem de avaliar qual seria a melhor
opção de fato, e o que acontece é que a gente percebe o erro
enquanto ainda está agindo, mas não consegue evitar o
início do movimento. Isso é uma bobagem quando se trata
de um passe errado no futebol, mas toma uma magnitude
bem diferente quando é a realização de um disparo “no
susto”, por exemplo, em virtude da expectativa por estar em
um contexto de alto risco e querer ter a resposta de
sobrevivência mais breve possível.
Essa capacidade tem relação forte ainda com o ambiente
volátil em que atuamos, onde é possível e frequente que um
cenário mude rapidamente, fazendo com que você precise
abortar a ação que estava planejada e sendo preparada para
execução. (Ex: o marginal dispara contra você, mas na hora
de reagir uma criança entra na linha de tiro entre você e o
agressor). Outro exemplo é a confusão entre estímulos (ex:
no curso de tiro de precisão treinávamos muito reagindo ao
apito, mas em um momento orientavam que era para
disparar apenas ao som de outro disparo, e aí sopravam o
apito só para causar confusão. Muitos atiram por conta do
controle de impulsividade fragilizado).

CONDUTA CONTROLADA

Essencialmente o ser humano enseja ter as suas condutas


controladas pela sua mente, de modo que não ocorra nada
que seu cérebro não tenha ordenado. É a capacidade de

Cognição e Combate
controlar os sensório-motores que impedem o
comportamento impulsivo. Entendemos que para construir
funções cognitivas responsáveis por este domínio, é
fundamental obedecer a todo o processo de aprendizagem,
respeitando todas as etapas ofertadas, e sobretudo praticando
a honestidade cognitiva. A função de entrada cognitiva
requer o máximo de atenção ao que está sendo exposto, para
assim, adquirir lastro suficiente para na função de elaboração
- fase decisional, conseguir processar as informações
identificando corretamente os estímulos, selecionando a
resposta com um tempo exequível e programar com
automaticidade os movimentos que serão executados.
Todo esse processo que o atirador deve percorrer pode ser
falho ou incompleto, e corriqueiramente na função de
elaboração desprover do foco atencional e perceptivo
desejado para a função de saída entregar a resposta desejada.

A impulsividade é um padrão comportamental


caracterizado por várias manifestações como a
produção de respostas rápidas sem uma reflexão
adequada e erros devido ao baixo foco atencional e
perceptivo na tarefa em questão. (Lage, 2010)

Nesse sentido, podemos citar três tipos de impulsividade.


Impulsividade por falta de atenção: o individuo que busca
aprender técnicas do tiro de combate para autodefesa, por
possuir deficiências na sua capacidade de concentração, é
incapaz de absorver o conhecimento que está sendo
transmitido, resultando em comportamentos inadequados e
indesejáveis, não acompanhando as fases da aprendizagem.
A prática dos exercícios é desconexa, e fogem da
contextualização de aplicabilidade real; Impulsividade

Cognição e Combate
motora: É o tipo mais comum de ser encontrado em linhas de
tiro. O atirador que almeja adquirir novas técnicas de
combate armado, não digere as informações expostas e
negligência a identificação dos estímulos apresentados,
selecionando a resposta errônea a ser entregue, não
condizendo com o que era desejado no treinamento ou
processo de aprendizagem de alguma habilidade nova.Não
há nexo de causalidade entre o estímulo apresentado e a
resposta escolhida, e geralmente age por empolgação;
Impulsividade por falta de planejamento: O atirador aprendiz
concentrasse-se na performance momentânea, como a
execução de movimentos rápidos com um tempo baixo,
desviando-se do verdadeiro proposito de aprender e absorver
corretamente a técnica, e realmente adquirir uma nova
habilidade motora. Aqui o aprendiz engana a si próprio em
proveito de uma performance momentânea legal.

Impulsividade por falta de atenção, ou impulsividade


atencional (emissão de comportamentos inadequados,
descontextualizados devido a déficits na capacidade de
atenção sustentada), a impulsividade motora (emissão
de comportamentos de rompante, sem um julgamento
prévio ou motivados pelo “calor” do momento) e a
impulsividade por falta de planejamento (dificuldades
observadas na tomada de decisões, caracterizadas pelo
foco nas recompensas momentâneas em detrimento das
consequências de longo prazo. (PATTON;
STANFORD; BARRAT, 1995)

Cognição e Combate
Atos impulsivos que não percorrem todo o processamento
desejado para a tomada de decisão pautada na completa
identificação dos estímulos apresentados e eficiente seleção
de resposta, explicitam toda a falta de planejamento e
capacidade cognitiva na função de entrada que reverberam
em uma fase de elaboração equivocada, com respostas
selecionadas e tomadas de decisão indesejáveis, resultados
falhos. Porém, no momento que atos impulsivos apresentam
respostas positivas, com resultados desejáveis,
caracterizando um desempenho satisfatórios, há uma
tendência para que se esquivem do termo “impulsivo”, e
passem a adotar toda a ação como exemplar, regida por
espontaneidade e automaticidade, rapidez e coragem
(DICKMAN, 1993)
Porém, indivíduos mais ou menos impulsivos podem ter
comportamento motor diferente, influenciando diretamente
na tomada de decisão. Como já foi explicado anteriormente,
a quantidade de respostas em forma de protocolos que
possuímos, irá interferir no tempo de resposta, uma vez que
quanto mais protocolos existirem para a mesma resposta,
maior será o tempo de resposta.
Quando o atirador é impulsivo e possui diversos protocolos
que podem ser aplicados como resposta, abrindo-se um
leque com diferentes escolhas possíveis, o comportamento
impulsivo influenciará negativamente na tomada de decisão,
tornando-os suscetíveis a respostas inadequadas, displicentes
no processamento cognitivo de informação – função de
entrada. Quando o atirador possui poucos e simples
protocolos disponíveis como resposta para sua tomada de
decisão, ser impulsivo ainda poderá influenciar
negativamente na tomada de decisão, mas por não possuir
tantas opções protocoladas, diminui-se essa chance de erro.

Cognição e Combate
A consistência da resposta é ligada à quantidade de
protocolos diferentes disponíveis para a tomada de decisão.
Muitos protocolos significam processos inconsistente, e para
o atirador impulsivo aumenta-se a chance de erros; processos
consistentes sintetiza protocolos suficientes para a tomada de
decisão, assim os atiradores impulsivos diante de poucos
protocolos tendem a diminuir o tempo de resposta, sem
resultado indesejável.
Por outro lado, atiradores menos impulsivos conseguem
entregar uma resposta mais consciente e sólida, com
diminuição das chances de erro. Estes respeitam todo o
processo de elaboração da resposta que será entregue,
controlando o processo de decisão sendo fidedigno à
identificação do estímulo – seleção de resposta –
programação do movimento. Já os mais impulsivos podem
cair no erro do processamento automatizado na função de
elaboração. Ou seja, no momento decisório, talvez a mais
importante das funções cognitivas, agem de forma
inconscientes, com redes associativas que ligam estímulos
perceptíveis às respostas automáticas, esquivando-se do
processo de elaboração e tomada de decisão consciente.
Assim reforça Richetin e Richardson (2008):

Os sujeitos menos impulsivos apresentam


processamento explicito, caracterizado por processos
controlados, reflexivos e conscientes. Nesse perfil de
processamento, assume-se que o comportamento está
associado a um processo de decisão. Por outro lado, os
sujeitos mais impulsivos apresentam processamento
implícito, caracterizado por processos automáticos,
inconscientes e intuitivos. O processamento implícito
está associado a uma ampla ativação automática de
redes associativas.

Cognição e Combate
Dominar todo o processo decisório é o que se espera de um
atirador preparado. A falha cognitiva provocada por um
déficit momentâneo de atenção no processo de elaboração
da resposta desejada, influenciando inteiramente no tempo
de tomada de decisão, pode resultar em uma ação impulsiva
do atirador que busca combater para sobreviver, e optou pela
resposta indesejada.Capacidade cognitiva de combate refere-
se a manutenção da atenção durante todo o processo de
aprendizagem e decisional, ser provocado e perceber
estímulos sensoriais que despertam o instinto primitivo de
sobrevivência requerendo que toda a sua atenção cognitiva
esteja canalizada para a tomada de decisão rápida e
eficiente, pois subentende-se que o atirador que se envolveu
em um combate armado já alcançou níveis de adestramento
que o permitirão executar toda a movimentação corporal que
o levará até o disparo com total automaticidade e fluidez,
não utilizando da sua atenção visual para isso, nem
permitindo atos impulsivos inconscientes.

Cognição e Combate
ESTRESSE E TREINAMENTO
VOU NA DIREÇÃO DA ONDA?

Na minha carreira relâmpago de surfista, depois de


incontáveis vacas (quando a gente cai da prancha e a onda
cai por cima da gente) percebi algo interessante com relação
ao ato de furar uma onda (furar a onda é quando você não irá
surfar ela mas não quer que ela arrebente em cima de você,
então você passa através dela antes que ela te engula): O
interessante é que com o tempo você cria a capacidade de
saber exatamente o tempo para começar a remar e poder
furar com facilidade. Se demorar demais não dá mais tempo
e ela arrebenta em cima de você.
Quando você cria essa noção a onda grande já não assusta
tanto pois você sabe o que precisa fazer e quando fazer,
deixando o resultado um tanto previsível. Quando o resultado
positivo é previsível os mecanismos de alarme do corpo já
não atuam com tanta intensidade. Quando não possuímos
experiência com o mar tendemos para as mesmas respostas
que usamos em terra para evitar perigo, tipo remar para longe
da onda ou ficar parado sem saber o que fazer. A falta de
ação nesse meio te coloca em perigo, a ação de fuga boa
parte das vezes também. Apesar do complexo cálculo
matemático para definir o momento da quebra da onda e o
tempo de remada para chegar a tempo de passar ileso por ela,
com a experiência conseguimos fazer isso com tranquilidade
e passamos a captar a “janela de oportunidade” como num
passe de mágica. É importante lembrar que essa habilidade
vem após muitos caldos e maus momentos na água.

Os sujeitos menos impulsivos apresentam processamento


explicito, caracterizado por processos controlados,
reflexivos e conscientes. Nesse perfil de processamento,

Cognição e Combate
assume-se que o comportamento está associado a um
processo de decisão. Por outro lado, os sujeitos mais
impulsivos apresentam processamento implícito,
caracterizado por processos automáticos, inconscientes e
intuitivos. O processamento implícito está associado a
uma ampla ativação automática de redes associativas.

COMO TREINAR ALGO QUE SERÁ USADO


SOB ESTRESSE?

Muito se discute sobre como treinar habilidades que serão


requisitadas sob estresse. Alguns confundem o recurso de
ensino com a metodologia em si e acabamos tendo várias
formas de ensinar, pouca metodologia de fato e eficiência
questionável nas formações, mesmo utilizando de boas
estruturas para treino.
A literatura especializada sobre treinamento traz três fases
que devem ser seguidas em praticamente todas as
metodologias já desenvolvidas sobre treinamento tático.
Os livros desde a década de 80 já mostram que é vital
ensinar primeiro o que é o estresse e como ele atua nos
indivíduos. Depois, cada um vai abordar suas formas
específicas de treinar. Então, se você estiver na dúvida sobre
como montar a ementa para sua instrução, utilize essa
estrutura básica: Falar sobre o estresse, treinar habilidades
sem estresse, depois com estresse e por último colocar o
aluno em simulações onde ele deva tomar decisões sozinho.

Cognição e Combate
STRESS EXPOSURE TRAINING-SET

Na tradução é algo como “Treinamento de exposição ao


estresse”. A sigla não remete simplesmente ao “Treinamento
com estresse” , mas lança o olhar para uma metodologia
simplesmente inexistente até então. Começou a ser
desenvolvida na década de 80 nos EUA, principalmente nos
setores de pesquisa sobre treinamento da marinha. Até então
era de conhecimento de todos que o estresse diminuía a
performance e causava consequências negativas para a
saúde. Praticamente toda a pesquisa estava focada em
entender melhor esse lance da saúde e quase ninguém
querendo entender como treinar para ser melhor mesmo sob
estresse.
O mundo do treinamento militar e policial sempre buscou
formas de preparar seus integrantes de forma eficiente para
esse cenário, mas nunca tinham parado pra pensar de forma
metodológica em como fazer. Não estamos dizendo que todo
mundo estava fazendo tudo errado. Diversas práticas sempre
se mostraram eficientes, mas quando as formas de conflito
evoluíram para ambientes cada vez mais ambíguos,
combates aproximados e batalhas assimétricas, as falhas do
treinamento foram causando problemas maiores e
requerendo mudanças mais impactantes na forma de treinar.
A solução foi o desenvolvimento de programas de pesquisa
para entender melhor o impacto do estresse na performance
motora e cognitiva e a partir disso poder estruturar
metodologias de capacitação mais eficientes. Algo que ficou
bastante nítido foi que a performance operacional era
resultado da interação contínua entre processos cognitivos,
motores, bem como também do gerenciamento emocional e
atitudinal. Em outras palavras, foi possível perceber que

Cognição e Combate
saber atirar no centro do alvo em um estande de tiro era
totalmente diferente de usar a arma de fogo no combate, mas
que a solução para esse problema poderia ter caminhos
muito diferentes para pessoas diferentes. Algumas pessoas
não desenvolvem a habilidade necessária para ter sucesso no
ambiente operacional e por esse motivo não possuem
confiança para agir. Outras pessoas possuem a habilidade
mas não conseguem perceber o momento de utilizar.
Existem também as que não desenvolvem o perfil atitudinal
de, sob estresse, fazer o que é preciso para vencer.
A proposta do treinamento de exposição ao estresse está em
justamente garantir que todas as etapas para o
desenvolvimento de uma competência (conhecimento,
habilidade e atitude) estejam de acordo com os requisitos da
atividade operacional, encarando os alunos como recursos
preciosos que precisam estar aptos para sobreviver e cumprir
a missão, não para fazer uma prova de aptidão no final do
treinamento.
Da mesma forma que muitas instituições continuam errando
na maneira de encarar a capacitação, vários atiradores
também se enganam ao considerar isoladamente critérios de
habilidade motora como sinônimo da capacidade em vencer
um confronto.

Cognição e Combate
AS 5 PRINCIPAIS
CONSEQUÊNCIAS DO ESTRESSE

"THE BIG FIVE"


Segundo Driskell

Segundo Terry Wollert, os efeitos do estresse são


Fisiológicos, emocionais, cognitivos e sociais. Para
exemplificar ele cita o estudo de Driskell, juntamente com
outros pesquisadores, para falar sobre as cinco grande
consequências do estresse na perspectiva da tomada de
decisão e de uma abordagem baseada na resolução de
problemas. Um dos grande problemas da atividade policial é
que o estado de hipervigilância (constante expectativa do
perigo) provoca esses efeitos não apenas no momento de
uma ocorrência crítica, mas durante boa parte do serviço e
até fora dele, interferindo em aspectos da convivência social.
Você tem percebido o impacto do estresse em seu cotidiano?

Cognição e Combate
1 REDUÇÃO DA ATENÇÃO
Apesar do estresse elevar os níveis de alerta, ele também
promove redução do campo de percepção, dificultando a
obtenção de informação do ambiente e promovendo uma
tomada de decisão mais rígida e inconsequente.

2 AUMENTO DA DEMANDA COGNITIVA


O ambiente estressor geralmente envolve um aumento na
carga de atividades, que demanda maior capacidade
cognitiva para lidar com estímulos novos ou sob compressão
de tempo.

3 AUMENTO DA FRUSTRAÇÃO
O estresse causa elevação dos pensamentos e emoções
negativas, que transferem parte da atenção da situação real
para expectativas emocionais sobre o resultado da
performance.

4 AUMENTO DO MEDO E ANSIEDADE


A avaliação do risco potencial da ameaça por si só causa
redução de performance, consequências fisiológicas e
aumento do estresse subjetivo.

5 AUMENTO DO PREJUIZO SOCIAL


Sob estresse, as pessoas possuem comportamento mais
agressivo, individualista, menor capacidade de “ler” pistas
interpessoais e consequentemente menor nível de cooperação.

Cognição e Combate
“O momento de maior vulnerabilidade da tropa é
o instante imediatamente após a vitória“
Napoleão Bonaparte

BACKLASH
BACKLASH

Sempre falamos sobre como o corpo mobiliza recursos para


lutar, através dos mecanismos biológicos do estresse, mas
pouco falamos dos processos de retorno para a condição de
homeostase (normalidade).
A atuação do Sistema nervoso parassimpático tem o papel de
fazer o corpo voltar para a “calmaria”, uma vez que a
condição de vigilância representa um custo muito alto de
energia para o corpo e é tóxico para o bom funcionamento
fisiológico. Não é por acaso que policiais vivem em média
uma década menos que pessoas com profissões menos
estressantes. Algumas vezes essa condição de estresse é tão
intensa ou duradoura que o efeito do retorno é drástico de
maneira proporcional, provocando quase um “desligamento”
emergencial do sistema. Vários combatentes relatam um
grande cansaço, sonolência ou náusea após situações
emocionalmente intensas e/ou perigosas. É comum também
algumas pessoas terem contato com indivíduos que passaram
por situação emocional intensa muito recente e apresentam
estranha racionalidade e “controle” da situação, parecendo
que não passaram por algo tão grave assim. Nesses casos é
muito provável que o corpo ainda não tenha iniciado o
processo de retorno e o que vemos ali é uma pessoa que
ainda irá sofrer o Backlash.
Vale sempre lembrar que os efeitos negativos e positivos do
estresse variam de indivíduo pra indivíduo por conta do
processo subjetivo de percepção e avaliação da ameaça. Não
podemos cair na armadilha do “policial herói” que é
“preparado pra tudo”. Os números de suicídios e
afastamentos psicológicos entre policiais prova claramente o
fardo que é a farda!

Cognição e Combate
ESTRESSE COMO DESAFIO

A primeira vez que usei um caixa eletrônico para sacar


dinheiro foi um momento constrangedor, estressante e, só
depois, engraçado.
Eu deveria ter uns 12 anos e fui usar pela primeira vez o
cartão do Banco do Brasil para sacar dinheiro que meu pai
tinha transferido pra mim.
Já existia o uso das letras como recurso de segurança, mas
quando elas apareceram na tela eu achei confuso e não
consegui deduzir que precisava apertar o botão
correspondente ao trio de letras em que cada uma das letras
da minha senha estava. Eu tentei algo no desespero. Deu
erro. As pessoas estavam na fila atrás de mim pois só havia
um caixa eletrônico no local. A simples presença das pessoas
me deixou ainda mais nervoso e acabei decidindo não sacar
mais o dinheiro. Quando saí, relatei a situação para um
amigo mais velho que me aguardava e ele deu risada da
minha cara e explicou como aquele recurso de segurança
funcionava.
Era super simples… eu apenas NÃO SABIA e não tinha
repertório cognitivo ainda para DEDUZIR.
Munido da capacidade de solucionar o que antes era um
problema, fui super tranquilo sacar o dinheiro e deu tudo
certo.
Moral da história: eu senti efeitos do estresse pelo simples
fato de lidar com um problema para o qual eu não entendia
ser competente para resolver. Esses efeitos influenciaram
minha tomada de decisão (desisti de sacar) e apesar de saber
que o problema não era uma ameaça para minha integridade
física, o desafio que se mostrava maior que minhas
capacidades gerava algum tipo de prejuízo social (vergonha)

Cognição e Combate
e por isso o estresse.
A tomada de decisão em uma ocorrência policial que requer
uma simples análise jurídica pode ser uma grande tormenta
para quem não tem esse conhecimento, bem como o uso de
equipamentos específicos em situação real pode ser um
grande fator estressor quando o treinamento ocorreu apenas
no campo conceitual ou de prática limitada. É vital entender
que o treinamento adequado reduz o estresse (até certo
ponto) na medida em que desenvolve a competência e
consequentemente a confiança do indivíduo, que passa a
estar apto para resolver os problemas que enfrenta e está
seguro disso.

Cognição e Combate
TREINAMENTO VS. ESTRESSE

Abordagem de mitigação
Visa trabalhar o treinamento com objetivo de reduzir
níveis de ansiedade e efeitos negativos do estresse na
performance. Técnicas de coping e modelos de realidade
simulada são aconselháveis.

Abordagem congruente

Visa orientar o treinamento a partir de procedimentos


parecidos com as respostas inatas ou comuns sob
estresse, diminuindo a carga horária de treino para
utilização efetiva da técnica ou procedimento.

Superaprendizagem

Utiliza a repetição como princípio que possibilita


desenvolver competência inconsciente de determinada
habilidade para que seja reproduzida sob estresse. Exige
maior carga horária de treinamento.

Cognição e Combate
TREINAMENTO VS. ESTRESSE

É muito comum que instrutores do mundo tático apresentem


uma técnica como sendo mais eficiente pelo fato do
movimento ser parecido com o que já faríamos de maneira
instintiva. Comum também que outros instrutores (ou até os
mesmos do primeiro caso) ensinem técnicas que , apesar de
um tanto mais complexas, possuem grande efetividade e por
isso devem ser treinadas até a exaustão para atingir nível
autônomo. Existem também os que preferem apostar em um
modelo de treinamento que reduza o nível de estresse no
momento crucial e permita maior performance.

Quem está certo?

A verdade é que todos podem estar certo ou errados. A típica


resposta para essa pergunta seria: DEPENDE.
Superaprendizagem não combina com baixa carga horária,
assim como mitigação do estresse depende quase sempre de
uma estrutura de treinamento difícil de replicar em larga
escala. O modelo de movimentos congruentes com o
estresse é ótimo mas muitas vezes não se aplica ao uso de
armas e outros equipamentos do combate moderno.
É necessário mesclar as três abordagens para um treinamento
focado nos objetivos e adequado para carga horária e ementa
proposta.
Na prática: Não adianta ensinar várias formas de sanar as
várias panes de armamento com apenas 4 horas de treino.
Será difícil desenvolver a confiança para mitigar o estresse.
Fará mais sentido ensinar apenas um procedimento (tapa
golpe) e repetir maior número de vezes.

Cognição e Combate
Na prática 2: A transição de arma mais efetiva para o
combate é soltar a arma longa e pegar a curta, pois ela é
congruente com o estresse. Já para fazer busca pessoal ou
transpor um muro, seria melhor a transição do arqueiro, que
demanda mais treino, porém será utilizada em situação
menos estressora. Já a transição que visa “mochilar” a arma
longa com duas alças é inviável analisando a baixa
aplicabilidade tática e maior carga horária necessária de
treinamento. O interessante dessa técnica da mochila é que
ela viralizou recentemente sendo reproduzida por uma atleta
olímpica de tiro, mostrando como a abordagem do
treinamento é relativa, pois no caso dela existe
disponibilidade para intensa carga de repetição.

Cognição e Combate
A VELOCIDADE DO

CONFRONTO

JÁ ESTÁ DEFINIDA!
PRECISAMOS ACEITAR ISSO

O confronto não irá ocorrer na velocidade compatível com o


nível da nossa habilidade. Não é à toa que Kenneth Murray
colocou no título do seu livro: “Treinando na velocidade da
vida”. Essa velocidade já está definida e será guiada pelo
nível de urgência da situação. Isso está baseado
principalmente em distância e nossa percepção sobre o nível
da ameaça.
A grande questão sobre o treinamento é se a gente vai ter
tempo de treinar o bastante para ser eficiente nessa
velocidade que já foi determinada.
Começamos treinando devagar simplesmente para
desenvolver a velocidade em ritmo sintonizado com a
efetividade. Se você ficou confortável com a lentidão, você
começou a se enganar. Muita gente não descobre fricções
(dificuldades) simples e óbvias do próprio equipamento
simplesmente por não terem treinado nem uma única vez na
velocidade que certamente essa habilidade será demandada
em uma luta pela vida (Coldres ruins, por exemplo).
Tudo bem que o treinamento promove tempos menores de
resposta e você poderia me dizer que quando eu treino essa
velocidade muda. A velocidade “definida” que nos referimos
trata da mobilização de energia do seu corpo para lutar ou
fugir. Essa mobilização vai ocorrer na intensidade da
situação e não do seu treinamento.
Já pensou sobre os efeitos de passar 10 anos treinando
xadrez no modo fácil, mas com objetivo de jogar um
campeonato no modo Hard em algum momento da vida e
que você não sabe quando será?

Cognição e Combate
A eficácia de um programa de
treinamento deveria ser medida não pela
velocidade de aquisição de uma tarefa
durante o treinamento ou pelo nível de
performance alcançado no final do
treinamento, mas, em vez disso, pelo
desempenho dos aprendizes nas tarefas
pós-treinamento e nas situações do mundo
real que são alvo do treinamento

Druckman e Bjork, 1991, p. 47

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