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Isto não é Filosofia

Isto não é um Curso de História da Filosofia


Prof. Vitor Ferreira Lima
Licenciado em Filosofia (UFRRJ)

Sumário
Introdução ............................................................................................................................... 2
1. Estoicismo .......................................................................................................................... 3
1.1 Ordem cósmica ............................................................................................................ 4
1.2 Exercícios de sabedoria .............................................................................................. 5
1.2.1 Abandonar o passado, e confiar o futuro à providência .................................... 6
1.2.2 Esperar um pouco menos, amar um pouco mais .............................................. 6
1.2.3 Cultivar o não-apego ............................................................................................ 7
1.2.4 Preparar-se para a catástrofe .............................................................................. 7
1. Epicurismo .......................................................................................................................... 9
2.1 O materialismo de Epicuro .......................................................................................... 9
2.2 A carta a Meneceu (sobre a felicidade) ................................................................... 10
2.1.1 Não tema os deuses ........................................................................................... 12
2.2.2 Não se preocupe com a morte .......................................................................... 12
2.2.3 O bem é fácil de obter ........................................................................................ 13
2.2.4 O mal é fácil de suportar .................................................................................... 13
Conclusão ............................................................................................................................. 13
Bibliografia ............................................................................................................................ 13

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Isto não é Filosofia
Isto não é um Curso de História da Filosofia
Prof. Vitor Ferreira Lima
Licenciado em Filosofia (UFRRJ)

Introdução

Estoicismo e Epicurismo (assim como Cinismo e Ceticismo) pertencem ao


chamado período helenístico, que se passa principalmente após a morte de Aristóteles
e de seu famoso estudante: Alexandre, o grande.
Em História, helenismo quer denota a influência da cultura grega em toda a
região do Mediterrâneo Oriental e do Oriente Próximo desde as conquistas de
Alexandre, o grande (332 a.C) até a conquista romana do Egito em 30 a.C, que passa
a marcar a influência de Roma nessa mesma região.
Em Filosofia, trata-se de uma periodização imprecisa que compreende cerca
de 1.000 anos, podendo ser estendida do início do Império Macedônico (332 a.C) até
o início da Filosofia Medieval com Santo Agostinho (354-430 d.C) e Boécio (480-524),
dado que a influência da Filosofia Grega e das escolas fundadas no início do
helenismo permaneceu durante o Império Romano.
As escolas helenísticas de pensamento constituíram, em muitos aspectos, o que
costumamos chamar de filosofias de vida. Isso quer dizer que o objetivo primordial a
que se propuseram foi alcançar um modo sábio de conduzir as circunstâncias
cotidianas, isto é, de dominar a arte de viver. Para utilizar o vocabulário aristotélico que
aprendemos na aula passada, buscavam antes a phrónesis (a virtude da alma
intelectiva com vistas à moderação das paixões), que a sophía (a virtude da alma
intelectiva com vistas à própria intelecção).
A filosofia que não busca medicar alguma paixão da alma é vã, é o que pensava
Epicuro, com quem concordavam, cada um ao seu modo, todos os outros filósofos do
período. A compreensão fundamental de todos esses pensadores é a de que a
felicidade é alcançada via controle das paixões humanas. Concordavam que tais afetos
só são acalmados quando moderados – e não quando incentivados. Assim, o remédio
consiste em um reenquadramento do papel das paixões ou, a depender da escola
analisada, em sua total supressão. Nesse duplo sentido, a felicidade plena não consiste
especificamente, como dizia Aristóteles, em conduzir a vida humana conforme a virtude
da alma com vistas à intelecção pela intelecção (sophía), mas a direcionar-se a práticas
que conduzem à tranquilidade mental, à paz de espírito, à imperturbabilidade da alma,
o que era por eles designado por ataraxia.
Mas em que consiste a diferença primordial entre as opções?
É preciso que você se recorde de que, para Aristóteles, estudar ética é
indissociável de estudar política, justamente porque não é possível avaliar o
comportamento humano fora da consideração da coletividade: “Sem dúvida, o bem
também é desejável quando diz respeito a uma só pessoa, mas é mais belo e mais
divino quando se refere a um povo e às cidades”. (Ética a Nicômaco, A 2, 1.094 b 7-10).
Com a derrocada da polis – empreendida principalmente pelo império
macedônico, com Alexandre à frente –, caíram progressivamente todos os seus valores
cívicos, base de sua estrutura social. Enquanto o cidadão aristotélico não se concebia
fora de sua organização política – afinal, o homem é um animal político –, o homem
helenístico defende que pode bastar a si mesmo como governante soberano de si.

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Essas diferenças implicam que, para retomar a pergunta anterior, a tese


helenística de base é a de que os caminhos que conduzem à felicidade residem no
homem e não em suas circunstâncias externas. É difícil imaginar Aristóteles
concordando com essa afirmação, sem fazer muitas ressalvas, tantas a ponto de
desfigurar a premissa e torná-la irreconhecível.
Dessa maneira, para ser feliz, em maior ou menor medida, o homem helenístico
não precisa de sociedade politicamente organizada, riquezas, dotes físicos especiais,
deuses, alma imortal etc. O que é necessário é sua razão adequadamente orientada, o
logos que lhe indique o correto caminho, que, como já visto, consiste em cultivar a
ataraxia. A verdadeira felicidade se encontra em reconhecer o que é externo e renunciar
a buscá-lo e habituar-se a não sofrer por não o controlar. A verdadeira felicidade está
em voltar-se para si e para o que depende de si.
Como pode ser observado do que dissemos, verifica-se a predominância dos
estudos sobre a Ética nos sistemas filosóficos da era helenística. Os estudos sobre a
realidade em seu sentido mais abrangente e sobre à possibilidade de conhecê-la
existem, mas em grande medida existem como etapas para fundamentar a pesquisa
propriamente ética. De certo modo, há uma retomada das noções de kósmos e phýsis,
típicas dos pré-socráticos, para, a partir delas, fundamentar as questões relativas ao
éthos, típica de Sócrates e dos pensadores por ele influenciados.

1. Estoicismo

As Escolas filosóficas, helenísticas ou não, frequentemente eram designadas


pelo nome dos lugares em que se estabeleciam. O fundador da escola estoica, Zenão
de Cítio (cerca de 334-262 a.C) ensinava sob arcadas recobertas, em locais que, em
termos arquitetônicos, chamam-se pórticos (em grego, stoa). O nome estoicismo deriva
desse vocábulo. Os ensinamentos do fundador ganharam repercussão e foram
difundidos por meio de seus discípulos.
O primeiro foi Cleantes de Assos (cerca de 331-230 a.C). O segundo foi Crisipo
de Solos (cerca de 280-208 a.C). Juntos com o fundador, formam o que conhecemos
como estoicismo antigo. De seus pensamentos – fora um breve poema, Hino a Zeus,
de Cleanto –, não se conservou muita coisa original. Do que professavam, conhecemos
de maneira indireta o que deles disseram outros autores posteriores – entre eles, Cícero
já no Império Romano, que é considerado um pensador eclético, isto é, que mescla
diferentes influências em seu modo de filosofar.
Em seguida, veio o que se chama de médio estoicismo, com Panécio (cerca
de 180-110 a.C) e Posidônio (135-51 a.C). Essa fase foi marcada pelo que a tradição
chama de ecletismo, isto é, a tendência de mesclar as diferentes doutrinas – platonismo
e aristotelismo incluídos –, o que pareceu ser uma tendência no período helenístico.
Por fim, o estoicismo novo já em Roma. As obras desse período, diferente dos
anteriores são bem conhecidas, sendo estes os principais nomes: Sêneca (cerca de 4
a.C - 64 d.C), Epicteto (cerca de 50-130 d.C) e Marco Aurélio (121-180 d.C). Os livros

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que utilizaremos para mencionar serão principalmente dos estoicos novos, ainda que
fazendo referência aos antigos.

1.1 Ordem cósmica

O estoicismo concebe os estudos filosóficos a partir de três disciplinas


fundamentais: a Física, a Lógica e a Ética. É comum designar essa concepção de modo
metafórico, utilizando uma árvore como comparação:

• Raízes: Física
• Tronco: Lógica
• Frutos: Ética
Há de haver uma relação íntima, portanto, entre a modo correto de conceber o
mundo, o modo correto de pensar a seu respeito e o modo correto de agir conforme
esses pressupostos. Numa expressão conhecida, o homem é um microcosmo que deve
refletir o macrocosmo.
Na essência da tradição grega, apropriada pelo estoicismo, a essência da
realidade é ordem, harmonia e beleza – o que já vimos na aula sobre pré-socráticos
com o nome de kósmos. Para os estoicos, a ordem cósmica pode ser entendida como
um ser vivo, estruturado e animado1. Esse ser é chamado pelos gregos e pelos estoicos
especificamente de divino (theion). Nas palavras de Cícero:
Que Epicuro caçoe tanto quanto quiser [...] não deixa de ser verdade que nada é mais perfeito que
o mundo [...] O mundo é um ser animado, dotado de consciência, inteligência e razão (Sobre a
Natureza dos deuses, I, 425)

A estrutura de tudo o que existe é ordenada, harmônica, bela. Justamente por


esses aspectos, é racional, isto é, funciona conforme o logos. Como já vimos em
Heráclito, esse conceito se refere, concomitantemente, à ordem intrínseca da realidade
e à capacidade racional do homem em apreendê-la. Naquela citação de Cícero, fica
claro como uma ordem lógica – por assim dizer – governa o caos aparente das coisas.
Há uma harmonia cósmica, ainda que haja catástrofes e acidentes, provisórios por
natureza. Essa ordem é racional e, além disso, também é justa e boa, como Menciona
Marco Aurélio:
Tudo o que acontece, acontece justamente; é o que descobrirás se observares as coisas com
exatidão [...] como se alguém vos concedesse vossa parte segundo o que mereceis. (Meditações)

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Essa ideia dará origem outras tantas a ela assemelhadas.
1. Animismo (do latim anima, alma): termo geral que designa as doutrinas que afirmam que todas
as formas identificáveis de natureza possuem uma alma e se comportam como um organismo
vivo.
2. Hilozoísmo (do grego hylè, matéria, e zoon, animal): doutrina de que toda a composição do
universo é viva, sendo o próprio kósmos um organismo integrado, com características animadas,
sensíveis e conscientes.
3. Panteísmo (do grego pan, tudo, e théos, Deus): doutrina que identifica deus à totalidade das
coisas que há, de modo que todas as partes perceptíveis fazem parte de um todo divino
integrado.

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1.2 Exercícios de sabedoria

Os estoicos, de fato, derivam uma ética a partir da física – vale dizer, da


maneira como concebem a phýsis, a totalidade das coisas que há. Em outras palavras,
os estoicos entendem como devemos nos comportar com base no modo como se
estrutura o kósmos. Nas palavras de Cícero:
Aquele que viver de acordo com a natureza deve partir da visão de conjunto do mundo e da
providência. Não é possível emitir juízos verdadeiros sobre os bens e sobre os males sem
conhecer todo o sistema da natureza e da vida dos deuses, nem saber se a natureza humana está
ou não de acordo com a natureza universal. E não se pode ver, sem a física, que importância (e
ela é imensa) têm as antigas máximas dos sábios: “Obedece às circunstâncias!”, “Segue Deus!”,
“Conhece-te a ti mesmo!”, “Nada em excesso!” etc. Somente o conhecimento dessa ciência pode
nos ensinar o que pode a natureza na prática da justiça, na conservação de nossas amizades e
de nossos apegos... (Cícero, Dos fins dos bens e dos males, III, 73)

Tal visão é oposta e pode chegar a ser ofensiva à visão atual de que é a vontade
dos homens, em contraposição à força da natureza, que deve predominar quando
precisamos estabelecer as reflexões éticas. É amplamente aceita a tese de que a
natureza não é boa em si mesma. Tendemos a pensar que fenômenos naturais não são
bons, nem maus – simplesmente não escolhem acontecer e todo o dano que causam e
todo o benefício que trazem são fatos, não valores.
Diferentemente, o que está em jogo aqui é um aspecto moral na realidade. Dessa
maneira, é bom aquilo que está conforme a ordem cósmica, independentemente da
vontade humana. O bom e o mau se constituem a despeito de agradar os homens. O
dever-ser – o correto moralmente – não está dissociado do ser – da totalidade das coisas
tais quais são.
Contrariando Aristóteles, o conhecimento que vale a pena ser buscado passa a
ser encarado não mais como algo completamente desinteressado, mas com vistas a
alcançar um critério para guiar a vida humana. As escolas da época preocupavam-se
menos com os conceitos e mais com exercícios práticos de sabedoria – diferentemente
do que ocorre hoje. Tais práticas estão presentes, direta ou indiretamente, em
pensadores e movimentos diversos: de Lucrécio a Nietzsche, com similaridades
inclusive com o budismo tibetano.
Diz Marco Aurélio:
Assim como os cirurgiões têm sempre à mão as lancetas e bisturis para as súbitas urgências de
sua arte, também tu deves ter os teus princípios sempre prontos para a compreensão das coisas,
tanto as humanas quanto as divinas, nunca esquecendo, mesmo na mais trivial da ações, como
as duas estão tão intimamente ligadas. Porque nada de humano pode ser feito com acerto sem
referência ao divino, e reciprocamente. (Meditações, III, 13)

É preciso, dada a analogia estabelecida por Marco Aurélio com o médico e o


bisturi, ser humano, mas ser humano profissional. Isso implica ter as ferramentas à
mão quando surgirem os problemas inevitáveis da vida. Eis algumas delas.

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1.2.1 Abandonar o passado, e confiar o futuro à providência

O apego ao passado e a preocupação com o futuro são os dois males que


impedem o homem de alcançar a plenitude. Tanto os impedem de aproveitar o que
acontece, quanto de agir para que aconteça algo que planejam. Nas palavras de Marco
Aurélio:
Tudo o que desejas alcançar por um longo desvio, podes tê-lo desde já, se não o recusares a ti
mesmo. Basta abandonar todo o passado, confiar o futuro à providência e dirigir a ação
presente para a piedade e a justiça; para a piedade, para a amar a parte que a natureza te
atribui; pois ela a produziu para ti, e tu para ela; para a justiça, para dizer a verdade livremente e
sem desvio e para agir segundo a lei e segundo o valor. (Meditações, XII)

É necessário aprender a se libertar desses pesos. Ainda Marco Aurélio:


Que a imagem de tua vida inteira não te perturbe jamais. Não sonhes com todas as coisas
dolorosas que provavelmente te aconteceram, mas, a cada momento presente, pergunta: o que
há de insuportável e de irreversível neste acontecimento? Lembra-te, então, de que não é nem o
passado, nem o futuro, mas o presente que pesa sobre ti. (Meditações, XIII, 36)

Nesse ensinamento está presente tanto o conselho de evitar a nostalgia, que


pode paralisar, quanto a esperança, que pode angustiar.

1.2.2 Esperar um pouco menos, amar um pouco mais

A esperança implica que algo falta, portanto incentiva que sintamos uma tensão
insaciada. A sensação de falta de saciedade aponta para a infelicidade, dado que
felicidade é plenitude. O perigo da esperança, então, é a de adiar a felicidade de modo
indefinido, seja em prol de um paraíso aqui ou além.
É conhecida a fábula de La Fontaine (1621-1695) da Leiteira e o balde de leite.
Uma moça, chamada Perrette, voltava do campo com um balde de leite cheio. Enquanto
caminhava, imaginava o futuro e não só: ansiava por ele. Tudo o que produziria com o
leite, as riquezas que a partir dele seriam produzidas. Ela poderia comprar ovos. Dos
ovos, nasceriam pintinhos. Os pintinhos seriam vendidos para a compra de um vestido
novo. Nesses pensamentos distraída, deixou o balde cair e perdeu todo o leite que
derramou no chão. A lição estoica é a de que, por mais que o futuro seja ansiado, é o
presente que importa. Sendo o presente que importa, também não adianta chorar pelo
leite derramado.
A vida boa é a vida sem esperanças, sem apegos e, assim, sem temores: a vida
em reconciliação com a realidade tal qual ela é. Como diz Epicteto:
É preciso conciliar nossa vontade com os acontecimentos de tal maneira que nenhum
acontecimento ocorra contra nossa conveniência, e que também não haja nenhuma acontecimento que
ocorra quando não o desejamos. A vantagem para aqueles que estão assim prevenidos é de não falhar em
seus desejos, de não se deparar com o que detestam, de viver interiormente uma vida sem dificuldade,
sem temor e sem perturbação [...] (Entretiens, II, Discurso II, XVI, 45-47)

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Embora tais considerações pareçam absurdas2, tal doutrina pode ser


interpretada também como uma tentativa de adequação da vontade humana aos
desígnios do kósmos, da phýsis, do lógos. Pode ser que se trate de um
reenquadramento do conceito de liberdade, que não significaria mais fazer aquilo que
se quer, mas identificar-se com aquilo que acontece. Tanto Espinosa, quanto Nietzsche
parecem ter pensado algo semelhante. Este, por exemplo, lança mão do conceito de
amor fati, o amor ao real tal qual ele é.

1.2.3 Cultivar o não-apego

Uma vez que a única dimensão da vida é o presente (passado é nostalgia; futuro
é esperança) e que o presente não é garantia de nada possuir (dado que nada está
assegurado), é sábio habituar-se ao não-apego. Novamente Epicteto:
O primeiro e principal exercício, o que conduz de imediato às portas do bem, consiste, quando
uma coisa nos prende, em considerar que ela não é daquelas que não nos podem ser tiradas; que
ela é como uma panela, ou uma taça de cristal, que quando se quebra não nos perturba porque
lembramos o que ela é. O mesmo acontece aqui: se abraças um filho, um irmão ou um amigo, não
te abandones sem reservas à imaginação... Lembra-te que amas um mortal, um ser que não é
absolutamente tu mesmo. Ele te foi concedido para o momento, mas não para sempre, nem sem
que te possa ser tomado... que mal existe em murmurar entre dentes, enquanto se abraça o filho:
“Amanhã ele morrerá?” (Entretiens, III, 84 ss.)

Tais conselhos podem parecer pregar a indiferença perante a vida e a falta de


compaixão. De fato, muitos o acusaram exatamente de defender essas duas ideias.
Ainda assim, é possível interpretá-lo por outra via: a de que é preciso se preparar para
a impermanência das coisas (conceito, inclusive, muito usado no budismo tibetano e
que pode também ser encontrado na interpretação platônica de Heráclito no pantha
rhei, tudo flui). Nada é estável, tudo muda, tudo passa. Não compreender essa verdade
fundamental é submeter-se novamente às amarras da nostalgia e da esperança. É
preciso amar o presente e nada desejar além dele, nem lamentar o que quer que tenha
ficado no passado.

1.2.4 Preparar-se para a catástrofe

O tempo passará. O corpo se tornará mais fraco. Teremos algumas decepções


na vida. Seremos traídos. Cometerão injustiças conosco. Ficaremos doentes.
Eventualmente, cairemos na ruína financeira. Morreremos. Os males da vida

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Por vezes, o estoicismo é acusado de quietismo e fatalismo. Quietismo é uma prática espiritual cujas
origens remontam ao séc. XVII, na figura do religioso espanhol Miguel de Molinos. Segundo essa doutrina,
o fiel alcançaria a Deus mediante a oração contemplativa, de modo que, uma vez nesse estado de
quietude, a mente humana se inativaria e já não teria vontade própria, abrindo caminho para somente
Deus nela operar. A doutrina foi considerada herética pelo Papa Inocêncio XI. Fatalismo é uma concepção
filosófica que remonta ao período greco-romano de que os acontecimentos passam de modo irrevogável,
de acordo com uma ordem cósmica. Ambos, quietismo e fatalismo, são termos usados de modo
pejorativo, sendo atribuídos a quem aceita de modo passivo os acontecimentos, não acreditando que
pode exercer algum papel em sua modificação.

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acontecerão. Por que não estar preparado quando os acontecimentos inevitáveis da


vida vierem?
Diz Epicteto:
Que estejam diante dos teus olhos, a cada dia, a morte, o exílio e todas as coisas que se afiguram
terríveis, sobretudo a morte. Assim, jamais ponderarás coisas abjetas, nem aspirarás à coisa
alguma excessivamente (Encheirídion, III, 21)

Marco Aurélio também disse algo semelhante: “é preciso realizar cada ação da
vida como se fosse a última” (Meditações, II, 5, 2). É preciso se despojar do apego ao
passado, ao futuro e às posses do presente. Viver cada ação como se fosse a última
implica ter a consciência de que o momento passará, não voltará e que, portanto, deve
ser fruído enquanto dura. Há momentos de plenitude na vida, em que nos reconciliamos
com o mundo. Você imagina o melhor exemplo que se lhe enquadra. Mergulhar no mar.
Correr no campo. Trilhar pela floresta. Pular de paraquedas. Escutar a canção preferida.
Quando há esses momentos de harmonia entre nós e o mundo, parece haver uma
dilatação do presente, cuja serenidade não é rompida, nem pelo que passou, nem pelo
que virá. Com a habilidade de permanecer no presente, seja ele qual for, quando o
desastre acontecer, estaremos preparados.
Muita associação confusa acontece com essa noção e a de carpe diem
(aproveite o dia), que remonta ao poeta – e não filósofo – Quintus Horacius Flacus (65
a.C – 8 a.C), mais conhecido como Horácio. Sua lira é associada ao verso “carpe diem,
quam minimum crédula postero” (goza o dia, confie o mínimo possível no futuro). Trata-
se do verso 11, do Livro 1 de suas Odes. No contexto da frase, o poeta tenta dissuadir
um interlocutor, Leuconoe, de fornecer crédito a astrólogos e mestres da adivinhação.
Seria vão tentar adivinhar o futuro, restando apenas aproveitar o presente, que é o que
se pode controlar. O penúltimo verso do livro é “Nunc est bibendum” (agora é a hora de
brindar!). O contexto, portanto, é de festa.
O verso, porém, também é associado à morte, a única certeza do homem. Como
viver em face da morte? A partir da consciência de que cada minuto pode ser o último.
Logo, deve-se aproveitar cada instante da vida presente. Nesse sentido, o verso do
poeta latino se transformou nas mãos de outro, desta vez renascentista: Robert Herrick
(1591-1674), no poema To The Virgins, To Make Much of Time, especialmente neste
trecho:
Gather ye rosebuds while ye may,

Old times is still a-flying:

And this same flower that smiles to-day

To-morrow will be dying

(Reúnam os seus botões de rosa enquanto podem,

Tempos antigos continuam correndo:

E esta mesma flor que hoje sorri

Amanhã morrerá)

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Uma simbologia que se apresenta é de que as jovens precisam aproveitar a


juventude enquanto é tempo, já que a morte é certa. Por mais que a expressão carpe
diem não esteja contida no poema, sua semântica é comumente a ele associada.
A expressam também foi popularizada pelo filme Sociedade dos Poetas Mortos,
querendo denotar algo como “Torne sua vida extraordinária enquanto é tempo”.
Na internet, a frase ganhou força, muito em decorrência de justificar um impulso
juvenil e desregrado para cometer excessos – seja em bebidas alcoólicas, seja com
práticas não recomendadas a suas idades. Nada mais longe do ideal estoico.

1. Epicurismo

Epicuro, o fundador do epicurismo, nasceu na ilha de Samos em 340 a.C, mas


era filho de pais atenienses. Segundo se conta, por volta de 35 anos de idade, fixa-se
em Atenas, adquire um terreno cercado por jardins e estabelece sua Escola, então
conhecida pela tradição como Jardim de Epicuro. Enquanto na casa habitavam os
mestres (o fundador e seus discípulos), no amplo jardim, acampando em barracas e
cultivando hortaliças, instalavam-se os novos discípulos vindos das mais distantes
regiões.
Mesmo após a morte de seu fundador, o epicurismo sobreviveu por cerca de 7
séculos no mundo greco-romano. Estabelece-se em Roma em meados do século II a.C,
tendo como principal continuador o filósofo romano Lucrécio, principalmente no poema
A natureza das coisas. Por volta do séc. III d.C, Diógenes Laércio, um comentador da
vida dos filósofos, registrava ainda haver epicuristas em sua época. Pierre Gassendi,
já no séc. XVII, também se considerava discípulo de tal Escola.
Consta que Epicuro escreveu muito (centenas de rolos de papiro). Contudo,
chegaram até nós poucos materiais: três cartas dirigidas a amigos ou discípulos e duas
coleções de máximas ou sentenças. As primeiras são destinadas a discípulos ilustres:
Carta a Pítocles, Carta a Heródoto e Carta a Meneceu. Sobre esta, falaremos na última
seção deste capítulo.

2.1 O materialismo de Epicuro

Entre os epicuristas, a filosofia é concebida como uma atividade urgente. O ser


humano é infeliz porque não compreende adequadamente – e só aceita o que dizem –
sobre a morte, os deuses e o sofrimento. A filosofia seria o medicamento que se deve
tomar o mais rápido possível. As primeiras linhas da Carta a Meneceu assim começam:
Que ninguém hesite em se dedicar à filosofia enquanto jovem, nem se canse de fazê-lo depois de
velho, porque ninguém jamais é demasiado jovem ou demasiado velho para alcançar a saúde do
espírito. Quem afirma que a hora de se dedicar à filosofia ainda não chegou, ou que ela já passou,
é como se dissesse que ainda não chegou ou que já passou a hora de ser feliz.

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A mensagem é que a filosofia conduz à verdadeira natureza das coisas e, uma


vez de posse dessa compreensão, o homem teria plenas condições de trilhar o caminho
rumo à felicidade.
O conhecimento da verdadeira natureza das coisas conduz à física. E uma
exposição breve sobre as concepções epicuristas sobre essa questão encontram-se na
Carta a Heródoto. Os epicuristas adotaram a física dos atomistas, herdeiros de
Demócrito. Assim como os pré-socráticos, Epicuro estabelece como princípios da
realidade as partículas indivisíveis, os átomos, e o vazio – trata-se, por assim dizer, de
uma concepção materialista de mundo.
Como tudo é composto das mesmas substâncias essenciais, não há diferenças
entre o ser humano e a natureza. Analogamente aos atomistas, os epicuristas
sustentam que a alma é material.
Diz Epicuro sobre o assunto:
Aqueles que afirmam que a alma é incorpórea falam para não dizer nada, pois, se o fosse, seria
incapaz de padecer ou de atuar sobre qualquer outra coisa. (Carta a Heródoto, 67)

Sobre a mesma questão, Lucrécio completa:


A alma está contida na totalidade do corpo; ela é seu guardião, pois assegura sua salvação; raízes
comuns os unem mutuamente, e não pode separá-los sem destruí-los. (Da natureza das coisas,
III.323)

Dada a materialidade da alma, é preciso entender a phýsis para, a partir dela,


entender como viver bem. No entanto, ainda que entenda que tudo seja formado de
átomos e vazio, na sua descrição materialista da realidade pressupõe a vontade
humana e a liberdade individual, incluindo em seu sistema a sociedade e a
consciência moral.
[...] Que nega o destino, apresentado por alguns como o senhor de tudo, já que as coisas
acontecem ou por necessidade, ou por acaso, ou por vontade nossa; e que a necessidade é
incoercível; o acaso, instável; enquanto nossa vontade é livre, razão pela qual nos acompanham
a censura e o louvor? Mais vale aceitar o mito dos deuses, do que ser escravo do destino dos
naturalistas: o mito pelo menos nos oferece a esperança do perdão dos deuses por meio das
homenagens que lhes prestamos, ao passo que o destino é uma necessidade inexorável. (Carta
a Meneceu)

2.2 A carta a Meneceu (sobre a felicidade)

Esta crítica, de certo modo, explica porque a carta abre da maneira que expomos
na seção anterior:
Quem aconselha o jovem a viver bem e o velho a morrer bem não passa de um tolo, não só pelo
que a vida tem de agradável para ambos, mas também porque se deve ter exatamente o mesmo
cuidado em honestamente viver e em honestamente morrer. Mas pior ainda é aquele que diz: bom
seria não ter nascido, mas, uma vez nascido, transpor o mais depressa possível as portas do
Hades. Se ele diz isso com plena convicção, por que não se vai desta vida? Pois é livre para fazê-
lo, se for esse realmente seu desejo; mas se o disse por brincadeira, foi um frívolo em falar de
coisas que brincadeira não admitem. (Carta a Meneceu)

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Para Epicuro, não há idade para dedicar-se à filosofia, porque filosofar para ele
implica buscar a vida boa – prática que deve se estender por toda a vida –, e a vida boa
é aquela dedicada ao prazer (hedoné). Porém, pouco se entende o que prazer significa
para o filósofo.
A melhor maneira de entender prazer para Epicuro é concebê-lo duplamente
como saúde do corpo (aponia) e tranquilidade do espírito (ataraxia),
indissociavelmente. Em outras palavras menos precisas: ausência de dor e ausência de
ansiedade.
Quando, então, dizemos que o fim último é o prazer, não nos referimos aos prazeres dos
intemperantes ou aos que consistem no gozo dos sentidos, como acreditam certas pessoas que
ignoram o nosso pensamento, ou não concordam com ele, ou o interpretam erroneamente, mas
ao prazer que é a ausência de sofrimentos físicos e de perturbações da alma. (Carta a
Meneceu)

Nesse sentido, prazer não é algo que deva ser buscado indiscriminadamente.
Proceder assim, inclusive, conduz à dor – o corpo adoece depois de uma ressaca, o
espírito se sente vazio depois de uma festa quando todos os supostos amigos se vão.
A dor, por sua vez, nem sempre deve ser evitada, já que pode resultar em prazer –
exercitar-se pode causar desconforto, mas conduz à saúde do corpo; falar sobre
assuntos que causam sofrimento no momento pode fazer com que os compreendamos
e alcancemos a tranquilidade do espírito. No epicurismo, o prazer é necessariamente
comedido e é buscado na medida exata da satisfação – princípio da qualidade sobre
a quantidade.
O hedonismo epicurista não defende que se beba e se coma
indiscriminadamente. Não defende que se busque a glória a todo custo. Não defende
que as riquezas materiais sejam perseguidas. Todas elas, consideradas em si mesmas,
causam prazer, mas prazer efêmero que, por definição, fenece e acarreta a sensação
de incompletude e de ansiedade. Dada a sua visão materialista de mundo, o filósofo
concede que a vida humana implica sentir prazeres e que, em decorrência dessa
premissa, “praticamos toda escolha e toda recusa [...] de acordo com a distinção entre
prazer e dor”, porém “nem por isso escolhemos qualquer prazer”, ressalta Epicuro. Há,
em suma, uma hierarquia dos prazeres, que pode ser colocada na seguinte tabela:

Hierarquia dos prazeres para Epicuro


Necessários Não necessários
Naturais Comida, bebida, abrigo Refinamentos
Frutos da opinião falsa sobre o
Não naturais Inexistentes por definição
mundo

Os desejos naturais e necessários são aqueles que livram o corpo da dor. Os


desejos naturais e não necessários são aqueles que surgem da vontade de refinar os
prazeres do corpo. Os desejos não naturais e não necessários são os que nascem de
uma opinião falsa sobre o mundo – inveja, raiva, exasperação etc. Os desejos não
naturais e necessários, por definição, não existem, dado que não sendo natural, não há
como ser necessário.

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Isto não é Filosofia
Isto não é um Curso de História da Filosofia
Prof. Vitor Ferreira Lima
Licenciado em Filosofia (UFRRJ)

Saber hierarquizar os prazeres significa não perder de vista qual a sua função
na construção da vida boa. Para Epicuro:
O conhecimento seguro dos desejos leva a direcionar toda escolha e toda recusa para a saúde do
corpo e para a serenidade da vida feliz: em razão desse fim, praticamos todas as nossas ações,
para nos afastarmos da dor e do medo. (Carta a Meneceu)

Com base na concepção materialista de mundo, na aceitação da sensação


de prazer como guia para a vida humana e no entendimento de que os prazeres
devem ser hierarquizados, a tradição epicurista romana legou uma espécie de fórmula
medicamentosa para lidar com os principais causadores do desprazer – isto é, da
negação da saúde do corpo (aponia) e da tranquilidade do espírito (ataraxia): o
tetraphármakon.
Trata-se do modo como Diógenes Laércio, em sua obra Vidas e doutrinas dos
filósofos ilustres, sumariza os ensinamentos de Epicuro. Trata-se de uma metáfora de
uma receita conhecida de quatro drogas (tetraphármakon) da Roma Antiga, utilizadas
para se referir aos remédios que curam a alma. São eles os seguintes.

2.1.1 Não tema os deuses

Em primeiro lugar, considerando a divindade como um ente imortal e bem-aventurado, como


sugere a percepção comum de divindade, não atribuas a ela nada que seja incompatível com a
sua imortalidade, nem inadequado à sua bem-aventurança; pensa a respeito dela tudo que for
capaz de conservar-lhe felicidade e imortalidade. Os deuses de fato existem e é evidente o
conhecimento que temos deles; já a imagem que deles faz a maioria das pessoas, essa não existe:
as pessoas não costumam preservar a noção que têm dos deuses. Ímpio não é quem rejeita os
deuses em que a maioria crê, mas sim quem atribui aos deuses os falsos juízos dessa maioria.
Com efeito, os juízos do povo a respeito dos deuses não se baseiam em noções inatas, mas em
opiniões falsas. Daí a crença de que eles causam os maiores malefícios aos maus e os maiores
benefícios aos bons. Irmanados pelas suas próprias virtudes, eles só aceitam a convivência com
os seus semelhantes e consideram estranho tudo que seja diferente deles. (Carta a Meneceu)

2.2.2 Não se preocupe com a morte

Acostuma-te à ideia de que a morte para nós não é nada, visto que todo bem e todo mal residem
nas sensações, e a morte é justamente a privação das sensações. A consciência clara de que a
morte não significa nada para nós proporciona a fruição da vida efêmera, sem querer acrescentar-
lhe tempo infinito e eliminando o desejo de imortalidade. Não existe nada de terrível na vida para
quem está perfeitamente convencido de que não há nada de terrível em deixar de viver. É tolo,
portanto, quem diz ter medo da morte, não porque a chegada desta lhe trará sofrimento, mas
porque o aflige a própria espera: aquilo que não nos perturba quando presente não deveria afligir-
nos enquanto está sendo esperado. Então o mais terrível de todos os males, a morte, não significa
nada para nós, justamente porque, quando estamos vivos, é a morte que não está presente; ao
contrário, quando a morte está presente, nós é que não estamos. A morte, portanto, não é nada,
nem para os vivos, nem para os mortos, já que para aqueles ela não existe, ao passo que estes
não estão mais aqui. E, no entanto, a maioria das pessoas ora foge da morte como se fosse o
maior dos males, ora a deseja como descanso dos males da vida. O sábio, porém, nem desdenha
viver, nem teme deixar de viver; para ele, viver não é um fardo e não viver não é um mal. (Carta a
Meneceu)

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2.2.3 O bem é fácil de obter

Consideramos ainda a autossuficiência um grande bem; não que devamos nos satisfazer com
pouco, mas para nos contentarmos com esse pouco caso não tenhamos o muito, honestamente
convencidos de que desfrutam melhor a abundância os que menos dependem dela; tudo o que é
natural é fácil de conseguir; difícil é tudo o que é inútil. Os alimentos mais simples proporcionam o
mesmo prazer que as iguarias mais requintadas, desde que se remova a dor provocada pela falta:
pão e água produzem o prazer mais profundo quando ingeridos por quem deles necessita.
Habituar-se às coisas simples, a um modo de vida não luxuoso, portanto, não só é conveniente
para a saúde, como ainda proporciona ao homem os meios para enfrentar corajosamente as
adversidades da vida: nos períodos em que conseguimos levar uma existência rica, predispõe o
nosso ânimo para melhor aproveitá-la, e nos prepara para enfrentar sem temor as vicissitudes da
sorte. (Carta a Meneceu)

2.2.4 O mal é fácil de suportar

Na tua opinião, será que pode existir alguém mais feliz do que o sábio, que tem um juízo reverente
acerca dos deuses, que se comporta de modo absolutamente indiferente perante a morte, que
bem compreende a finalidade da natureza, que discerne que o bem supremo está nas coisas
simples e fáceis de obter, e que o mal supremo ou dura pouco, ou só nos causa sofrimentos
leves? (Carta a Meneceu)

Conclusão
Estoicismo e Epicurismo são duas escolas filosóficas helenistas que mais se
assemelham que se distanciam. Ambas adotam como prevalência de suas
preocupações a ética, por mais que proponham que ela derive de uma física, isto é, de
uma concepção de kósmos e de phýsis, dos quais o homem faria parte e com que
deveria buscar se harmonizar. Ambas almejam fazer com que o homem alcance a
eudaimonia (felicidade). Entretanto, não mais como Aristóteles propunha, no contexto
da pólis. Esse universo, primeiro, desfeito pelo Império Macedônico e, posteriormente,
pelo Império Romano, faz com que as preocupações sejam muito mais locais e, em
alguns casos, individuais e não mais coletivas.

Bibliografia

CORDERO, Néstor Luis. A invenção da Filosofia: uma introdução à Filosofia Antiga.


Tradução: Eduardo Wolf. São Paulo: Odysseus Editora, 2011.
EPICURO. Carta sobre a felicidade (a Meneceu). Tradução e apresentação de Álvaro
Lorencini e Enzo Del Carratore. São Paulo: Editora UNESP, 2002.
FERRY, Luc. Aprender a viver. Tradução de Vera Lucia dos reis. Rio de Janeiro:
Objetiva, 2007.
MARCONDES, Danilo. Iniciação à História da Filosofia: dos pré-socráticos a
Wittgenstein. 2ª ed. rev. ampl. Rio de Janeiro: Zahar, 2017.
REALE, Giovanni. Estoicismo, ceticismo e ecletismo (História da Filosofia Grega e
Romana, v. 6). Tradução de Marcelo Perine. 2ª ed. São Paulo: Edições Loyola, 2015.

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