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A ESPETACULARIZAÇÃO DO CRIME PELA MÍDIA E O IMPACTO NO ESTADO DEMOCRÁTICO DE

DIREITO.

“Sem crime e tragédia, audiência do programa televisivo Hoje em Dia cai pela metade”.

O crime, em todas as suas formas, sempre representou algo que despertava interesse e que,
portanto, atraía as atenções dos mais diversos segmentos da sociedade. O jornalista e sociólogo
Muniz Sodré explica que os meios de comunicação constituem o lugar primordial de construção da
realidade ou de moldagem ideológica do mundo a partir da retórica tecnoburocrática de inspiração
gerencial”. Sob esse viés, com o advento da imprensa, no Brasil, a receptividade de conteúdos pela
população se deu de modo padronizado, caracterizada pela estereotipação do criminoso, pela
ampliação do sofrimento das vítimas e pela sua finalidade principal: atrair espectadores e possibilitar
uma moldagem ideológica de interesse. Dessa forma, pode-se observar que a população foi
transformada em plateia passiva e as grandes questões sociais, ou pelo menos, as que vendem mais,
como o crime, em imagens a serem consumidas.

Hodiernamente, é notória a existência de casos criminais, como o caso Susana Von Richthofen, que
foram transformados em verdadeiros espetáculos, com a presença de filmes, séries e entrevistas
que, além de colocarem a tragédia alheia em um verdadeiro palco nacional, trazem consigo a
possibilidade de “afeição” pelo crime, pois ao ter acesso a obra ficcional, o telespectador tem a
possibilidade de interpretação, a qual por meio da análise acerca das motivações e das circunstâncias
que levaram a ocorrência do delito, pode compreendê-lo sob uma óptica que não condiz com a
conjectura que, de fato, ocorreu. Com efeito, é razoável observar que essa glamourização, ao
contrário de esclarecer e auxiliar o debate democrático, propicia a transformação dos cidadãos em
juízes, sobretudo medíocres, os quais disputam entre si a supremacia da opinião pública, esta que
passa a influenciar diretamente o cenário jurídico nacional, dificultando uma análise técnica e
objetiva acerca do crime em questão.

Além disso, essa influência do campo social, ou seja, onde a mídia está inserida, corrobora para
ampliar a parcialidade daqueles que utilizam a norma para fazer a justiça, haja vista que o
sensacionalismo sobre os fatos, a psicologia social e a influência da imprensa sob as massas
interferem nas reflexões dos juristas, no Devido Processo Legal e até mesmo na sentença do
condenado. Observa-se assim, uma disputa interna e externa, em que a seara jurídica busca aplicar
sua autonomia e a mídia, que figura no campo externo, aplica técnicas para influenciar o seu
comportamento.

É necessário, portanto, que a imprensa, como formadora de opinião, que muitas das vezes se
respalda no sensacionalismo, tenha a consciência de noticiar os fatos de forma imparcial de modo
que cada telespectador, e até mesmo o magistrado, consiga formar seu próprio juízo de valor do
caso, pois somente com o exercício da responsabilidade midiática será possível esclarecer e auxiliar o
debate popular e aplicar as diretrizes do Estado Democrático de Direito.

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