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Improvisação teatral e bioenergética: um caminho para a

expressividade teatral

Petras Damião Serafim1


Alvaro Levis de Bittencourt2

Resumo: O presente artigo faz um levantamento teórico dos trabalhos de Alexander e Leslie Lowen e
de Viola Spolin, abordando conceitos, princípios e técnicas. Esta pesquisa ainda analisa, na prática, a
combinação dos exercícios da bioenergética com os jogos teatrais por meio de uma oficina de
improvisação, realizada na Universidade Estadual do Paraná, na cidade de Curitiba, durante cinco
encontros semanais nos meses de maio e junho de 2023 com participantes com e sem experiência
teatral. Busca-se, com este trabalho, apresentar reflexões sobre possibilidades de se desenvolver
uma prática teatral com adultos, utilizando exercícios da bioenergética juntamente com os jogos
teatrais. Os resultados indicaram que a combinação das técnicas de Alexander e Leslie Lowen com a
metodologia de Viola Spolin oferece diversas alternativas em relação à ordem de aplicação,
resultando em maior flexibilidade corporal, melhora na percepção corporal e mais atenção ao
momento presente. Isso, por sua vez, aprimorou a prontidão nas respostas durante a improvisação
teatral, proporcionando uma melhoria na expressividade corporal em cena.

Palavras-chave: Improvisação teatral; Jogos teatrais; Bioenergética; Expressividade teatral.

Theatrical improvisation and bioenergetics: a path to


theatrical expressiveness

Abstract: This article makes a theoretical survey on the works of Alexander and Leslie Lowen and
Viola Spolin, approaching concepts, principles and techniques. This research also analyzes, in
practice, the combination of bioenergetic exercises with theatrical games through an improvisation
workshop, held at the Universidade Estadual do Paraná, in the city of Curitiba, during five weekly
meetings in the months of May and June 2023. In this workshop participated persons with and without
previous experience in theatre. The aim of this paper is to present reflections on the possibilities of
developing a theatrical practice with adults, using bioenergetic exercises combined with theater
games. The results indicated that combining the techniques of Alexander and Leslie Lowen with
methodology of Viola Spolin offers various alternatives regarding the order of application, resulting in
increasing body flexibility, improving body awareness, and heightening attention to the present
moment. This, in turn, enhanced readiness in responses during theatrical improvisation, leading to an
improvement in bodily expressiveness on stage.

Keywords: Theater Improvisation; Theater games; Bioenergetics; Theatrical expressiveness.

Introdução
1 Graduando do curso de Licenciatura em Teatro da FAP/UNESPAR. Bacharel em Ciências
Contábeis pela FECAP. Pós-graduado em Roteiro de Ficção Audiovisual pelo SENAC.
2 Mestre em Performance Teatral pela Monash University - Melbourne/Austrália (2010). Professor do
curso de Licenciatura em Teatro da FAP/UNESPAR, onde ministra disciplinas ligadas à prática
teatral.
2

Este artigo apresenta uma análise teórica e prática dos trabalhos de


Alexander Lowen3 (1910-2008) e Viola Spolin4 (1906-1994). Iniciando com uma
abordagem descritiva da bioenergética desenvolvida por Lowen, com foco
estritamente nos exercícios da técnica, sem a intenção de aprofundar na parte
terapêutica, e dos jogos teatrais de Spolin, expondo assim as origens e principais
conceitos de ambos os estudos. Em seguida, após essa análise teórica, compartilho
minha experiência pessoal, assim como a dos participantes da Oficina de
Improvisação em que atuei como instrutor, a qual incluí tanto os jogos teatrais
quanto os exercícios da bioenergética.
A bioenergética, basicamente, é uma técnica terapêutica que ajuda a
restabelecer o fluxo de energia no corpo, através de exercícios aliados à respiração
e à percepção corporal (Lowen, 1982). Apesar de ser inicialmente pensada como
terapia, os exercícios da bioenergética também são recomendados por Alexander
Lowen e Leslie Lowen5 para serem realizados em “grupos de corpos”, sem ter
objetivos terapêuticos, possibilitando uma vida com mais qualidade ao permitir mais
vitalidade ao corpo (Lowen, 1985).
O meu primeiro contato com a bioenergética foi no ano de 2015 com o livro
“Bioenergética” de Alexander Lowen e, a partir disso, assisti vídeos de Lowen e de
outros instrutores pela internet. Tive uma segunda experiência na disciplina:
“Tópicos especiais I: Epistemologias do corpo” ofertado pelo curso de dança da
FAP/UNESPAR no ano de 2020, ministrada pelo professor André Sarturi 6. Na
disciplina, além da parte teórica, foram trabalhados exercícios para cada um dos
sete segmentos corporais7.
3 Alexander Lowen, fundador da Análise Bioenergética, nasceu em 23 de dezembro de 1910 na
cidade de Nova York. Ficou conhecido como psicoterapeuta corporal, tendo publicado 14 livros,
sendo um deles, “Exercícios de bioenergética: o caminho para uma saúde vibrante”, com a co-autoria
de sua esposa Leslie Lowen. Ele faleceu aos 97 anos em 28 de outubro de 2008 (Miller, 2010).
4 Viola Spolin nasceu em 7 de novembro de 1906, durante a sua vida foi autora e diretora de teatro.
Ela desenvolveu e sistematizou um método de ensino de teatro denominado por ela de theater
games, traduzido para o português como Jogos Teatrais. Faleceu aos 88 anos em 22 de novembro
de 1994 (Vieira, 2020).
5 Rowfreta Leslie Walker (Lowen) casou-se com Alexander Lowen em 1943, um pouco mais de um
ano após se formar no ensino médio (high school), acompanhou-o desde então por 58 anos até o seu
falecimento. Escreveu em co-autoria com o seu esposo o livro: “Exercícios de bioenergética: o
caminho para uma saúde vibrante”. Ela faleceu em 4 de junho de 2002 (Lowen, 2013).
6 André Sarturi é Doutor em Artes da Cena pela UNICAMP. Mestre em Teatro pela UDESC. Possui
Bacharelado em Teatro (2023) e Licenciatura em Filosofia (2002), ambos pela Pontifícia Universidade
Católica do Paraná. Atualmente é professor na FAP/UNESPAR (Sarturi, 2023).
7 Os segmentos ou anéis foram determinados a partir de uma premissa de Wilhelm Reich que divide
o corpo humano em anéis perpendiculares ao eixo céfalo-caudal. Cada segmento corresponde a uma
3

Imagino que se a bioenergética é tão eficaz para ajudar a desbloquear


bloqueios em pacientes com problemas de ordem emocional, os exercícios
bioenergéticos sem objetivos terapêuticos também possam auxiliar atores e atrizes
em cenas em que demandem alguma liberação corporal (e talvez mental) para
interpretação em uma cena.
Em paralelo à bioenergética, no curso de Licenciatura em Teatro, tendo um
contato aprofundado com os jogos teatrais de Viola Spolin, percebo certa
semelhança com as bases da bioenergética, pois assim como a bioenergética tende
a liberação do fluxo energético no corpo humano, os jogos teatrais propõem uma
prática de teatro libertador àquele que o pratica, uma vez que a improvisação nos
jogos teatrais é baseada na experimentação e no não julgamento.
Os jogos teatrais de Viola Spolin podem ser considerados como “um sistema
de improvisações teatrais visando a uma atuação marcada pela espontaneidade e
pelo caráter orgânico” (Pupo, 2005, p. 218). Segundo Spolin, o teatro para ela é
essencialmente uma realidade física:

Quando o ator aprende a comunicar-se diretamente com a platéia através


da linguagem física do palco, seu organismo como um todo é alertado.
Empresta-se ao trabalho e deixa sua expressão física levá-lo para onde
quiser. No teatro de improvisação, por exemplo, onde pouco ou quase
nenhum material de cena, figurino ou cenário são usados, o ator aprende
que a realidade do palco deve ter espaço, textura, profundidade e
substância - isto é, realidade física. É a criação dessa realidade a partir do
nada, por assim dizer, que torna possível dar o primeiro passo, em direção
àquilo que está mais além (Spolin, 2015, p. 15).

A atriz ou o ator deve, com o uso do seu corpo, comunicar algo para a
plateia. Entendo que para isso o/a artista deve ter uma disponibilidade corporal para
conseguir se expressar bem. Isso evidencia a importância de estudar alguma prática
corporal que auxilie e contribua para a expressividade. Acredito que os exercícios da
bioenergética conseguem atingir esse objetivo quando desenvolvidos para essa
função em conjunto com a prática teatral.
Viola Spolin inclusive destaca a importância de ter uma prática corporal que
libere o corpo como forma de otimização da prática teatral:

O ideal seria que todas as oficinas de trabalho de interpretação fossem


acompanhadas por trabalho de corpo regular, dado por um especialista no
campo. Aconselha-se os professores de vanguarda, que também estão

parte do corpo (Oliveira, G. F.; Oliveira, S. M.; Freitas, 2013). Apesar das semelhanças com os sete
chakras das tradições orientais como o Yoga Kundalini, não há registros que Reich as seguiu (Jaques
Neto, E. F.; Kessler, A. S., 2023).
4

investigando os problemas de movimento relacionados com o ambiente.


Eles descobriram que para surgir a graça natural, em oposição ao
movimento artificial, é necessário a liberação do corpo, não o controle
(Spolin, 2015, p. 132).

Assim, como Viola Spolin, acredito que os exercícios da bioenergética, que


possuem certa semelhança com a Yoga e o Tai Chi Chuan (Lowen, 1982), podem
ser capazes de transformar o corpo do ator e da atriz como forma de deixá-lo mais
desbloqueado para o improviso e no futuro para a interpretação de cenas em uma
peça teatral.
Nesta pesquisa, busco encontrar maneiras de conciliar os exercícios da
bioenergética com os jogos teatrais, mediante experimentação prática em uma
oficina de improvisação. Além disso, observo de que forma os exercícios da
bioenergética podem contribuir para a presença do ator (da atriz) em cena de
improvisação.
A população pesquisada foi composta por universitários/as e comunidade
em geral. E os instrumentos de coleta e análise de dados foram a observação e
aplicação de formulários. Neste artigo, serão compartilhados trechos dos relatos
dos/as participantes, e como estratégia para preservar o sigilo de suas identidades,
serão utilizados pseudônimos.
Esta pesquisa realiza, dessa maneira, uma revisão sobre o trabalho de cada
um desses dois autores. Em seguida, apresento a oficina de improvisação, sua
elaboração, seu desenvolvimento durante os encontros e reflexões que emergiram a
partir dela.

Bioenergética

A Análise Bioenergética ou Psicologia Bioenergética (Hermida, 2012) pode


ser considerada como uma forma de terapia que analisa o paciente por meio da
expressividade do seu corpo. O trabalho terapêutico é realizado através do corpo e
da mente, pois ambos, para essa terapia, têm funcionamentos idênticos. Nessa
equação, corpo e mente, também entra a energia do corpo, ou vitalidade do
organismo, quanto mais vitalidade (ou energia) o indivíduo possui, mais ativo ele é.
As tensões e rigidez crônicas fazem com que se perca a energia do corpo,
consequentemente diminuem a sua vitalidade. É natural que o corpo fique rígido ao
5

longo da vida, e perca vitalidade, porém, a terapia corporal busca resolver a rigidez
desencadeada por causas emocionais (Lowen, 1985).
A expressividade do indivíduo pode ser afetada por tensões crônicas, as
quais podem persistir mesmo após a pressão originária que causou a rigidez já ter
cessado, restringindo, dessa maneira, a sua mobilidade. Conforme Alexander e
Leslie Lowen:

Tais tensões perturbam a saúde emocional reduzindo a energia do


indivíduo, restringindo a sua mobilidade (ação espontânea e natural e
movimento da musculatura) e limitando sua autoexpressão. Torna-se
necessário, portanto, aliviá-las, a fim de que a pessoa recupere a vitalidade
plena e o bem-estar emocional. (1985, p. 10) (sic)

A seguir, farei uma breve explanação sobre alguns conceitos da


Bioenergética abordados por Alexander e Leslie Lowen (1985): vibração, grounding,
respiração e auto expressão. Esses princípios são essenciais para o entendimento
da metodologia dos exercícios da Bioenergética. Antes esclareço que esta pesquisa
não visa se aprofundar no trabalho dos fundamentos da Análise da Bioenergética,
tendo em vista que o objetivo é utilizar as técnicas práticas sem adentrar no campo
da análise psicológica, assim, transcrevo as palavras de Alexander e Leslie Lowen:

(...) esteja você ou não em terapia, a execução regular destes exercícios o


ajudará a aumentar significativamente sua vitalidade e capacidade de
alcançar o prazer, assim como a ganhar mais autoconhecimento - com tudo
que esse termo implica. Isso acontecerá por meio de: 1) aumento do estado
vibratório do seu corpo; 2) grounding das pernas e do corpo; 3)
aprofundamento da respiração; 4) amplificação da autoconsciência; 5)
ampliação da autoexpressão. Eles também podem melhorar a aparência,
intensificar a sexualidade e promover a autoconfiança. (1985, p. 11)

Assim, entende-se que os exercícios da Bioenergética são possíveis de


serem aplicados sem fins terapêuticos, embora se recomende terapias quando se
busca resolver problemas de ordem emocional.
Vibração “é o elemento chave da vitalidade” (Lowen, 1985, p. 15). Esse
conceito de vibração trazido por Alexander e Leslie Lowen (1985) sustenta que um
corpo em pleno funcionamento é um corpo que vibra por completo, circulando em
todo organismo um fluxo energético, que pode ser traduzido como um corpo cheio
de vitalidade. Porém, pondera-se que quando o corpo está com algum bloqueio,
essas vibrações são mais abruptas, indicando que há alguma tensão crônica em
alguma parte da nossa musculatura corporal. Também ressalta que mesmo a
6

vibração abrupta é preferível que vibração nenhuma, visto que a vibração é uma
qualidade da vitalidade.
O grounding é um princípio da Bioenergética que busca trazer ao indivíduo
uma conexão com as suas partes inferiores (parte mais animal do homem,
relacionada à sexualidade) e o todo do seu corpo enraizado com o chão. Trata-se
também de estar em contato com o momento presente, com a sua realidade, com
consciência corporal em relação ao solo (Lowen, 1985).

Estar grounded é outra maneira de dizer que o indivíduo está com os pés no
chão. O termo também pode significar que ele sabe onde está e, portanto,
sabe quem é. Ao adquirir o grounding, ele assume uma posição, ou seja, é
“alguém”. Num sentido mais amplo, o grounding representa o contato do ser
com as realidades básicas de sua existência. Ele está firmemente plantado
na terra, identificado com o seu corpo, ciente da sua sexualidade e
orientado para o prazer. Essas características faltam àquele que está
“suspenso no ar” ou na cabeça, em vez de em cima dos próprios pés.
(Lowen, 1985, p. 21)

Na Bioenergética, a respiração é um meio pelo qual os exercícios


bioenergéticos vão atingir uma intensidade maior a fim de que ocorram desbloqueios
corporais necessários para que o indivíduo possa ter mais vitalidade. Assim, a
recomendação geral é que, ao se fazer os exercícios da Bioenergética, os façam
com uma consciência respiratória, isso é, fazer com que se respire mais
profundamente, por todo o corpo, “todos os músculos estão envolvidos de alguma
forma” no processo respiratório. (Lowen, 1985, p. 32).
A expressividade está contida na noção do indivíduo ser consciente das
suas sensações e sentimentos. Somente com a percepção da sua realidade que o
indivíduo conseguirá se expressar. Assim, como forma de atingir esse
autoconhecimento, faz-se necessário que durante os exercícios da bioenergética, o
praticante perceba o seu corpo, essa é uma forma pela qual a prática corporal
auxilia o indivíduo a se conhecer e consequentemente possibilita se expressar sobre
aquilo que é sentido (Lowen, 1985).
Os exercícios da bioenergética são variados e cada um tem um propósito a
ser trabalhado. Alexander e Leslie Lowen (1985) dividem os exercícios em:
exercícios-padrão, exercícios expressivos, trabalho com o banco de bioenergética,
exercícios sexuais e técnicas de massagem.
Nos denominados exercícios-padrão, que foram utilizados para a prática na
oficina de improvisação, a orientação de Alexander e Leslie Lowen (1985) é de
iniciar pelos exercícios com as pernas e com os pés, reconhecidos como de
7

grounding. Depois, pelos outros exercícios, de outras áreas do corpo. Ainda nos
exercícios-padrão, Lowen (1985) divide esses exercícios entre: exercícios de
focalização e orientação, exercícios de aquecimento, exercícios em pé, trabalho com
quadril e pelve, realizado com braços e ombros, exercícios para fazer sentado e
finalmente exercícios para fazer deitado.
Por fim, Alexander e Leslie Lowen (1985) orientam que a prática dos
exercícios da bioenergética deve ser realizada respeitando o limite do corpo de cada
praticante. Salientam que além dos exercícios de bioenergética serem importantes,
não substituem uma vida saudável, que deverá ser buscada para um corpo com
mais vitalidade. Assim, juntamente aos exercícios de bioenergética, o/a praticante
deve procurar uma alimentação saudável, qualidade do sono, prazer laboral e
afetividades benéficas.

Jogos Teatrais

Os jogos teatrais de Viola Spolin estão atrelados à própria origem das


palavras play e games. Enquanto a palavra “play” leva para o sentido da liberdade,
espontaneidade, a palavra “games” vai ao encontro do sentido de regras a serem
combinadas e respeitadas em comum acordo pelos participantes (Pupo, 2005, p.
218).
A improvisação deve ser jogada por um conjunto de pessoas com um
objetivo em comum a ser alcançado. Mesmo quando a proposta de cena envolve
apenas um jogador por vez, a plateia 8 permanece atenta às ações. Cada integrante
tem sua liberdade individual para, dentro das regras, fazer sua contribuição em prol
do grupo. Uma das formas de manter um ambiente propício ao estímulo da
espontaneidade individual é em uma atmosfera em que não haja julgamento sobre o
que é certo ou errado, nem da parte do professor nem dos alunos, o importante é o
processo de experimentação e observação dos integrantes. Logo, a competição
deve ser substituída pela participação (Spolin, 2015).
Um ponto a destacar na teoria da Viola Spolin (2015) é que a técnica teatral,
compreendida por ela como uma maneira de comunicação, está em contínuo
8 Para Viola Spolin (2015), a plateia é parte importante da prática dos jogos teatrais, uma vez que a
cena realizada é direcionada para ela, então, durante os improvisos a plateia deve ficar atenta para
ao final de cada parte poder ajudar na avaliação.
8

movimento, construída pelo/a artista, ao longo do seu processo de criação, atrelado


sempre a um determinado tempo e territorialidade. Assim, o teatro não deve ser
pensado como algo rígido e padronizado, pelo contrário, é o oposto disso, uma vez
que permite inúmeras possibilidades para uma cena.
Quando o ator ou a atriz entende a lógica do teatro como algo aberto a uma
variabilidade de ações em uma cena, isso, ao longo do tempo, possibilitará ao ator
ou à atriz a estar preparado/a tecnicamente. Ainda pensando o teatro como técnica,
a observação do cotidiano é uma ótima forma de otimizar a criatividade para o ator
ou a atriz:

Quando o aluno vê as pessoas e as maneiras como elas se comportam


quando juntas, quando vê a cor do céu, ouve os sons no ar, sente o chão
sob seus pés e o vento em sua face, ele adquire uma visão mais ampla de
seu mundo pessoal e seu desenvolvimento como ator é acelerado. O
mundo fornece o material para o teatro, e o crescimento artístico
desenvolve-se par e passo com o nosso reconhecimento e percepção do
mundo e de nós mesmos dentro dele (Spolin, 2015, p. 13).

A preocupação com a denominada “fisicalização” na atuação do/a artista é


outra característica nos jogos teatrais, isto significa, comunicar fisicamente, por meio
do corpo, aquilo que deve ser transmitido para a plateia. Dessa forma, o ator ou a
atriz não deve se preocupar em verbalizar, mas sim mostrar em ações e reações
corporais o que está acontecendo externa e internamente na cena sem necessidade
de contar ou verbalizar as situações vivenciadas no palco. Mesmo na improvisação,
em que não há objetos, cenários e figurinos, o/a artista deve fisicamente mostrar a
situação para a plateia, de forma que ela consiga compreender o que acontece no
palco:

Fisicalizar, para Viola Spolin, é transformar em concreto o imaginário, é


transpor para o corpo o que está no campo subjetivo, corporificar a “verdade
cênica” orgânica, intuitiva de Stanislavski. Ao exercitar a fisicalização em
cena, os educandos/jogadores trabalham a verdade cênica no jogo e
descobrem a capacidade expressiva de seus corpos sem a utilização de
qualquer adereço de apoio (figurino, elemento cênico etc.) (Ramaldes;
Camargo, 2017, p. 158).

Na fisicalização e no estar presente na cena em ação, o/a aluno/a deve


atuar num sentido de experienciar a cena, pois isso será base para a sua própria
formação como artista, pois como explica Spolin (2015, p. 20) pela sua técnica: “o
aluno reúne suas próprias informações e dados a partir de uma experiência direta”.
Antes de introduzir os exercícios, o sistema de jogos teatrais traz algumas
orientações de trabalhos para serem seguidas, com três indicações principais que
9

estão presentes nos seus jogos, são elas: o ponto de concentração, a instrução e a
avaliação. O ponto de concentração é uma poderosa ferramenta que faz com que o
educando experiencie a cena ao mesmo tempo em que se concentra em algo
específico a fim de atingir objetivo do jogo.
Cada jogo propõe um determinado foco de atenção que deve ser observado,
assim, ao alterar o exercício, o foco também vai mudando de jogo em jogo e o
jogador vai aflorando a sua sensibilidade e experimentando novos desafios. Essas
fixações estipuladas pelo ponto de concentração visam ajudar o jogador a executar
a verdade cênica e também contribui, principalmente ao iniciante, a desviar o seu
foco, que muitas vezes focaliza no medo de estar em cena e de se expor perante o
público, para fixar a atenção em si mesmo, no corpo, nos objetos ao redor ou nas
ações.
Quando Viola Spolin ensina que a instrução é “um comando a ser
obedecido” (2015, p.26). Esse comando acontece durante o jogo, após as
explicações do exercício. Essa instrução deve ser pontual e deve ajudar o/a
jogador/a a retornar a atenção no ponto de concentração e, desse modo, fazer com
que o/a artista permaneça no estado presente, com sua ação, com seu grupo ou
consigo mesmo. A avaliação de Spolin é o momento em que compete a plateia, nela
incluso/a, o/a instrutor/a ou professor/a, em fazer observações pontuais e objetivas
sobre o que foi realizado naquela cena em específica, sem comparar com outra
cena, ou avaliar o desempenho. Deve-se observar se os jogadores/as conseguiram
se comunicar bem e se houve o entendimento da cena.
Outros apontamentos são mencionados por Viola Spolin (2015), como o de
um bom ambiente de trabalho proporcionando uma boa atmosfera durante a
atividade. Além disso, é essencial ter os três elementos dramáticos bem definidos: o
lugar/ (“onde”), os personagens/ (“quem”) e a situação/ a ação/ (“o quê”). Esses
elementos devem ser trabalhados, inicialmente, de maneira separada e depois,
conforme o nível for avançando, em conjunto a fim de que se possam identificá-los
juntos em uma cena. É isso que se espera de um bom aproveitamento do teatro
improvisacional.
Os exercícios dos jogos teatrais são bem numerosos e divididos por partes a
serem trabalhadas sem a necessidade de ser seguida em ordem rígida. Viola Spolin
(2015, p. 46-47) precavidamente orienta uma ordenação antes de iniciar cada
atividade: “1. Introdução dos Exercícios; 2. Ponto de Concentração; 3. Instrução; 4.
10

Exemplo; 5. Avaliação; 6. Ponto de Observação.” Ainda recomenda alguns


exercícios que denomina de “orientação” ou de “jogos introdutórios”, em que o
jogador iniciante vai ter o seu primeiro contato com a dinâmica do improviso teatral.
Finalizando os jogos teatrais, não posso deixar de destacar que um dos
elementos centrais é o corpo do/a artista em ação sendo trabalhado a cada
improviso com o objetivo de despertar sua criatividade. Isso é válido também aos
atores ou às atrizes mais experientes, ou como bem coloca Spolin (2015, p.35): “Os
atores no teatro improvisacional (...) necessitam de treinamento constante para se
manterem alerta e ágeis e para encontrarem material novo.”.

A Oficina

A Oficina de Improvisação - Jogos Teatrais contou com 5 aulas semanais


com 2 horas cada, que ocorreram consecutivamente aos sábados na parte da
manhã, das 9 às 11 horas, a partir do dia 06 de maio e encerraram em 03 de junho
de 2023. A oficina aconteceu no campus Curitiba II da FAP/UNESPAR, na sede
Artes da Cena, conhecido também como sede TELAB 9, em um dos estúdios do
complexo.
A Oficina contou com um total de 15 participantes, compostos
majoritariamente por quem já tinha experiência10 com a prática teatral. Ainda, três
participantes informaram conhecer os exercícios da Bioenergética de Alexander
Lowen e Leslie Lowen, enquanto doze desconheciam.
Em média, a presença11 foi de 9 alunos por aula. A assiduidade dos
participantes variou de uma (1) a quatro (4) presenças durante a oficina.
A idade média foi de 30 anos, sendo que a mais nova tinha 18 anos e a
maior idade foi de 57 anos. A predominância foi de mulheres com doze
participantes, enquanto que teve apenas três participantes do sexo masculino.

9 TELAB é a abreviação do Teatro Laboratório que fica localizado na Rua dos Funcionários, 1758 -
Cabral - Curitiba - PR. Além de contar com o teatro, o complexo ainda contém 8 estúdios para aulas,
ensaios e criação cênicas.
10 Dos quinze (15) inscritos, nove (9) informaram já ter algum tipo de experiência teatral e seis (6)
informaram não ter experiência com a prática teatral.
11 No primeiro dia de aula teve 12 presenças; na segunda aula teve 11 presenças; na terceira aula
teve 6 presenças; na quarta aula teve 8 presenças; e na quinta e última aula teve 10 presenças.
11

Como forma de planejamento para a Oficina, foram realizados planos de


aula contendo dois blocos: um somente com exercícios de bioenergética e outro de
jogos teatrais. Como prática metodológica, foi proposto nas duas primeiras e na
última aula iniciar com os exercícios de Alexander Lowen e Leslie Lowen já como
forma de preparação corporal para os jogos teatrais, nesses dias não houve
alongamento corporal, pois os exercícios da bioenergética já deveriam cumprir essa
função. No terceiro e quarto dia, foram planejados, logo no início das atividades,
quinze minutos de alongamento corporal precedido aos jogos teatrais. Na terceira
aula, os exercícios da bioenergética foram pensados para serem realizados no meio
da aula, entre dois blocos de jogos teatrais. Já na quarta aula, os exercícios da
bioenergética ficaram na última parte da aula.
Por serem aulas voltadas para público geral, sem necessidade de ter
experiência com a prática teatral ou familiaridade com os exercícios de Alexander
Lowen e Leslie Lowen, tanto os exercícios da bioenergética quanto os da Viola
Spolin foram os recomendados para iniciantes. Ainda foram selecionados os
exercícios que não exigissem o uso de materiais específicos, como cadeiras
especiais ou colchonetes.
Para a Oficina, foram utilizados em um dos estúdios do TELAB: uma mesa,
uma cadeira, um cubo e um aparelho de som, o que foi suficiente para a prática dos
jogos teatrais e a série de exercícios da bioenergética.
Os exercícios da bioenergética planejados para as cinco aulas foram uma
única sequência em que se buscasse abranger todos os sete segmentos corporais,
trabalhando assim de forma global o corpo das/dos praticantes da oficina. Apesar de
trabalhar todos os segmentos, o maior tempo despendido foi com exercícios que
envolvessem o grounding. Alexander Lowen (1982), explica que esses tipos de
exercícios, além de trazer para o momento presente e aumentar a percepção
corporal, principalmente da parte inferior do corpo (pernas e pés), também
pressupõem uma relação energética entre os pés e o chão, o que significa dar mais
sustentação e vitalidade para a/o praticante.
Um dos exercícios de bioenergética em que três integrantes disseram sentir
algum incômodo foi o do segmento ocular. Cito a resposta de Ruth, após o primeiro
dia de aula, ao questionário12 que acompanhou o andamento da oficina:

12 Para cada aula foi realizado um questionário com perguntas relacionadas às atividades realizadas
na Oficina.
12

Após os exercícios não senti nenhuma dor, apenas durante. Os meus olhos
ficaram desconfortáveis pelo movimento de olhar para as extremidades,
mas talvez tenha sido por eu me esforçar demais para ir o mais longe que
conseguia. Depois que o exercício acabou, em poucos segundos já não
sentia nenhum desconforto.

Após esse e mais outros dois depoimentos no mesmo sentido, achei


prudente optar pela redução da duração desse exercício pela metade do tempo nas
outras aulas, o que observei ser eficiente, já que não houve mais apontamentos nas
outras aulas.
Quanto aos jogos teatrais, segui a recomendação de Viola Spolin (2015),
nas primeiras aulas iniciei com os jogos introdutórios de orientação que visam
despertar a sensibilidade do grupo. Depois passei para os jogos, principalmente pelo
“onde”, que determina a relação do/a jogador/a com o espaço. Durante as aulas,
pude observar que foram bem assimilados pelos iniciantes, como também foram
bem aproveitados pelos que já conheciam os exercícios.
No início da oficina, foi sugerido que as/os participantes praticassem a
“respiração pela boca” nos exercícios de bioenergética para aprofundar a entrada de
ar no corpo. Embora não seja a forma correta de respirar, isso proporciona mais
profundidade ao exercício, trazendo mais ar para trabalhar as regiões do corpo.
Alguns participantes questionaram isso, mas expliquei que, em casos específicos
como este, não traria problemas à saúde. Comparei com situações em esportes de
alto rendimento, onde a respiração pela boca é comum. Deixei-os livres para
escolher entre respirar pela boca ou de forma tradicional, e após a primeira aula, a
maioria optou por seguir a instrução, sem mais questionamentos.
Para iniciar a oficina, visando estabelecer um ambiente seguro e propício
para o trabalho corporal e criativo das/os participantes, orientei-as/os a colaborarem
a fim de manter uma atmosfera em que fosse possível criar, sem julgamentos,
formando um grupo que estivesse aberto ao teatro improvisacional. Não houve
nenhum incidente de desrespeito, pelo contrário, foram criadas cenas de improvisos
sem muita inibição.
Esse estudo tem como um dos objetivos analisar o desempenho criativo e
corporal do grupo durante as aulas. Isso foi facilmente observado de várias
maneiras, por mim e pelos próprios participantes através de relatos como o de Elisa,
após a última aula: “Por nunca ter tido contato com teatro anteriormente, percebi que
fui me soltando ao longo das aulas. Por outro lado, fui aumentando minha
13

autocrítica, então sempre após os jogos eu achava que poderia e deveria ter feito
melhor.” Ao observar o desempenho de Elisa pude notar que ela estava mais
presente nas situações propostas pelos improvisos, com uma perceptível evolução.
Acredito que, se a oficina tivesse prosseguimento, a cobrança por resultado talvez
pudesse ter diminuído.
Nessa pesquisa verifiquei os efeitos benéficos da aplicação de duas técnicas
distintas em uma mesma aula. Na minha visão, foi como um catalisador, pois
enquanto os exercícios da bioenergética alongam bastante todo o corpo e já ajudam
no foco, os jogos teatrais ajudam na desinibição e na criatividade. Logo na segunda
aula, um/a dos integrantes notou que esquecera completamente do celular, o que foi
apoiado/a por outros/as. Para mim, isso são pequenas coisas, mas que mostram o
poder dessas duas técnicas em conjunto.

No começo eu estava tensa, mas durante os exercícios fiquei soltinha, e nas


improvisações pude usar desse relaxamento a meu favor, ainda um pouco
tensa mas isso é de mim mesmo, o meu corpo vive tenso, porém ajudou
principalmente me deixando menos tensa mentalmente, e isso facilitou na
hora de improvisar.

Esse foi o relato de Elza na 2ª aula, assim como ela, outras/os participantes
deram falas parecidas sobre a possibilidade de se utilizar os exercícios da
bioenergética em aulas de teatro. Além do foco, os exercícios de Lowen possibilitam
uma percepção corporal, fazendo com que a/o artista esteja mais presente em cena.
Durante a aplicação prática deste trabalho fui instigado pelo meu orientador
a arriscar outras possibilidades de sequências, ao invés de fazer os exercícios de
Lowen somente no início, fui aconselhado a testar outras alternativas. Então, mesmo
cético quanto aos resultados, já que imaginava os exercícios da bioenergética
somente como uma preparação para os jogos teatrais, optei por seguir essa
orientação. O que enriqueceu muito esse trabalho, pois as possibilidades podem ser
outras. Pode-se começar com a improvisação teatral e terminar com a os exercícios
de Lowen, utilizando-os como uma forma de relaxamento. Ou então, pode começar
com as atividades de improvisos, fazer os exercícios bioenergéticos e depois
retomar a improvisação, isso pode ser válido quando percebe a turma dispersa,
precisando de mais prontidão para improvisar.
Na terceira aula, por exemplo, fizemos o “sanduíche”, entre as duas partes
de improvisos, teve uma sessão de exercícios bioenergéticos. Pude notar que, na
segunda parte, os improvisos fluíram de maneira mais natural, o que de certa forma
14

evidencia o potencial da prática teatral em conjunto com uma abordagem corporal


focada. Isso também foi percebido pelos próprios praticantes, entre eles destaco o
depoimento de Rogério:

O primeiro exercício de improviso fluiu muito bem, mas senti que não estava
tão solto e preparado. Senti diferença na segunda parte da aula. Eu estava
muito mais solto, focado e integrado mentalmente na dinâmica de improviso
e no ambiente teatral. Eu consegui entrar melhor no personagem e na troca
com a minha parceira de cena.

Houve mais relatos nesse mesmo sentido. Léa descreve:

[Na primeira parte do improviso] parece que você não está conectada com
seu corpo, só vai... não desliga do ambiente externo. [Na segunda parte de
improviso] senti diferença na disposição de movimentar o corpo e na
conexão com o lugar e com os colegas para fazer as dinâmicas.

Esses testemunhos e outros na mesma direção, instiga-me a pensar que os


exercícios corporais da bioenergética podem influir positivamente, trazendo mais
presença para a improvisação. Entretanto, Milton, um dos participantes da oficina,
disse o contrário: “Não senti diferença [entre a primeira parte de improvisos e a
segunda]. Posso dizer que considerando o primeiro dia e hoje me senti mais à
vontade, mais solto na hora da improvisação”. Considero esse relato como um
aprendizado, pois permite reconhecer que cada indivíduo possui uma perspectiva
única. Na minha análise como instrutor, pude constatar que todos estavam atentos
nas duas sessões de improvisos, porém na segunda, estavam mais soltos, à
vontade de uma forma geral. Acredito que pode ser influência dos exercícios da
bioenergética.
Fiquei ainda mais surpreso quando, na quarta aula, a ordem das técnicas foi
invertida, começando com os jogos teatrais e depois os exercícios de bioenergética.
Os jogos teatrais aconteceram, após um alongamento comum e depois de um
exercício de concentração de Yoshi Oida13. Seja pela aplicação dessa atividade ou
não, os jogadores estavam bem atentos e os improvisos aconteceram naturalmente.
Entretanto, faço uma observação minha a respeito de um dos participantes, Milton,
que não esteve presente no alongamento, nem no exercício do Yoshi Oida, ele
inicialmente hesitou um pouco no primeiro exercício de improvisação, algo que não

13 O exercício é descrito por Yoshi Oida (2007, p. 54) da seguinte forma: “Sempre peço a um grupo
de atores que se sentem em círculo, feche os olhos e bata palmas juntos, tentando fazer isso em
uníssono. Sem ninguém “puxando”, sem um ritmo predeterminado. Sempre, uma vez que todos
estejam juntos, as palmas irão imperceptivelmente ganhar aceleração até que se atinja o clímax.
Então haverá novamente diminuição do ritmo (porém não tão lento quanto no início) e, mais uma vez,
aceleração, até que cheguem num segundo clímax e assim por diante”.
15

aconteceu nas aulas anteriores, porém após algum incentivo meu e do grupo, ele se
permitiu a improvisar, ele também notou a diferença:

Acredito que estava um pouco tenso e com dificuldade para realizar os


jogos no primeiro momento. Os jogos de escolher um lugar foi bem
interessante e desafiador, estimula a criatividade e exige de você uma
atenção aguçada para dar continuidade a cena e a improvisação.

Sobre como ele sentiu o corpo ao fazer os exercícios da bioenergética na


segunda parte da aula, Milton respondeu:

Hoje eu senti uma diferença enorme, os exercícios [da bioenergética] me


deram uma sensação de bem estar e alívio, me senti mais solto e leve já
que antes me encontrava mais tenso, houve uma conexão e percepção do
corpo, uma busca pelo equilíbrio, controle da respiração o que provocou
relaxamento e bem estar.

Com base na minha observação e pelos depoimentos de Milton consigo


compreender o impacto que uma atividade como um alongamento combinado com
um exercício de atenção podem causar nos jogos teatrais, proporcionando mais
relaxamento e foco para esta prática. Entendo que os exercícios de Lowen
desempenham essa função.
Na quarta aula, a maioria das/os participantes parecia estar mais à vontade
entre elas/es e mais seguros para se expor em uma cena de improviso. Como pode
ser observado na foto a seguir, durante a realização de um jogo de improviso 14, nota-
se não apenas a troca de interações entre eles, mas também a expressividade em
uma cena construída naquele momento, sem a prévia combinação de ações.

Foto 1: Aula 4. Exercício Viola Spolin. Registro em 27/05/2023.


(Estúdio 5 - TELAB FAP/UNESPAR - Curitiba/PR)

14 Neste jogo, proposto por Spolin (2015), a/o primeira/o jogador/a deve realizar ações
estabelecendo uma relação de lugar onde ela/e está (elevador, sala de estar, floresta etc) sem revelar
às/aos outras/os participantes que devem atuar “dentro” do mesmo lugar.
16

Fonte: Acervo pessoal.

Ainda sobre a análise desse penúltimo dia, tive um inesperado relato da


participante Elisa “Me sinto bem, acho melhor fazer [os exercícios de bioenergética]
somente no fim”. Sobre começar pelos jogos teatrais, ela respondeu: “Achei mais
dinâmico.”. Trago essa opinião dela, pois entendo que se pode pensar em utilizar os
exercícios corporais da bioenergética como um relaxamento ao fim dos jogos
teatrais. Uma sugestão válida, que merece ser considerada.
Um aspecto considerado, nesta oficina, foi a expressividade corporal 15. De
modo geral, ao longo das cinco aulas, pude perceber que houve evolução nesse
quesito. Além de mim, as/os próprias/os participantes identificaram mudanças
durante a oficina, de acordo com Milton: “Durante os encontros foi possível perceber
o quão transformador e desafiador a improvisação pode ser. A cada momento, a
cada atividade você é impulsionado a criar, a inventar e reinventar histórias,
narrativas, imagens, sons.”.
Rogério conseguiu perceber melhora na sua espontaneidade na última aula:
“Acredito que meu desempenho foi muito bom, sinto que fui me compreendendo
mais como improvisador a cada aula e me soltei muito na atividade do último dia de
mudança de emoções.” Ainda, Denise, outra participante, relata a importância de ter
15Spolin (2015, p. 14) introduz o conceito de “expressão física” que considera ser uma preocupação
digna de incentivo, pois “o relacionamento físico e sensorial com a forma de arte abre as portas para
o insight”. Lowen (1982, p. 228) traz o conceito de “auto-expressividade” que para ele “é uma
qualidade inerente a todos os seres humanos” e “descreve as atividades livres, naturais e
espontâneas do corpo.”.
17

os exercícios da bioenergética junto aos jogos teatrais de improviso: “Gostei da


maneira que usou a bioenergética junto a improvisação, mas ainda assim senti falta
dela [bioenergética] em mais momentos porque ela me concentrava bastante, meu
corpo ficava mais disposto e isso ajuda muito na cena.”.
Com base nos depoimentos recebidos e nas minhas observações ao longo
das cinco aulas, acredito que consegui encontrar formas de integrar os exercícios de
bioenergética aos jogos teatrais, além de promover reflexões sobre como as práticas
de Alexander e Leslie Lowen contribuem para a improvisação teatral.

Considerações Finais

Neste trabalho, apresentei, inicialmente, conceitos e princípios da


bioenergética de Alexander Lowen e, em seguida, dos jogos teatrais de Viola Spolin.
Após a explanação das bases teóricas, destaquei os pontos mais relevantes da
parte prática da pesquisa, com observações pessoais e depoimentos das/os
participantes da Oficina de Improvisação - Jogos Teatrais.
Com este estudo busquei relacionar, ao longo de cinco aulas de
improvisação, os exercícios de Lowen, que é uma prática corporal que visa a
expressão pessoal ao desbloquear tensões corporais, com os jogos de Spolin, que
estimulam a criatividade e a expressividade.
A partir da oficina, observei ser viável integrar os jogos teatrais aos
exercícios bioenergéticos em uma aula de teatro improvisacional. Além disso, foi
evidenciada a versatilidade dos exercícios da bioenergética, podendo ser aplicados
em diferentes momentos durante a aula de teatro. Eles podem ser introduzidos no
início para promover o alongamento e a concentração antes dos jogos teatrais.
Também podem ser inseridos no meio da aula para ajudar as/os praticantes a se
reconectarem com o momento presente, especialmente se estiverem demonstrando
hesitações e/ou distrações. Alternativamente, podem ser planejados para o final da
aula como um relaxamento final, para aliviar as tensões que possam ter sido
provocadas durante as cenas de improvisação.
Os exercícios da bioenergética revelaram-se eficientes para o alongamento
corporal, uma vez que promovem a flexibilidade do corpo; para ampliar a
consciência corporal, já que eles exigem essa observação; e para proporcionar
18

maior atenção ao momento presente, pois trabalham fisicamente os limites do corpo


por meio da sua flexibilidade e vibrações. Esses atributos, por sua vez, colaboraram
para a prática dos jogos teatrais, proporcionando prontidão nas respostas durante a
improvisação teatral.
Houve, ao longo das aulas, um aprimoramento na expressividade corporal
dos participantes da oficina, observada de forma geral. Essa melhora pode ser
creditada à combinação dos jogos teatrais com os exercícios da bioenergética.
Ambas as práticas visam à expressão, sendo que os jogos teatrais são focados na
expressividade teatral para comunicar algo ao espectador, enquanto os exercícios
da bioenergética concentram-se na expressão do indivíduo na vida cotidiana.
Acredito que essa união tenha gerado uma sinergia, propiciando uma maior
presença em cena, desinibição e criatividade.
Para concluir, essa pesquisa demonstra que a integração dos exercícios
bioenergéticos com os jogos teatrais pode enriquecer significativamente a
experiência da improvisação teatral, promovendo um ambiente propício para o
desenvolvimento artístico de atrizes e atores.

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