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RIO DE JANEIRO
2020
O texto apresentado fala da experiência vivida em um projeto do Instituto de
Psicologia, realizado em parceria com o curso de dança. Foi oferecido um espaço de
experimentação artística que possibilitou o trabalho da corporeidade e da expressão.
Pensa-se numa corporeidade intencional, onde o sujeito não detém um corpo, ele é
o corpo: corpo comprometido e dirigido para a situação presente. Através do corpo se dá a
experiência estética, a experiência em estado bruto. A Gestalt-Terapia preconiza o estético, a
dimensão sensível, a forma e o como a experiência acontece.
A percepção estética acontece como um todo, uma totalidade que procura se
organizar de acordo com as condições de campo. O campo é a estrutura básica da experiência
humana que se dá por meio do processo de contato. O sujeito é visto como totalidade que
emerge inseparável do mundo onde ele habita. É um ser relacional. Diante da novidade que se
dá do encontro com o outro, se descentra, há um desequilíbrio, uma desintegração e isso exige
do sujeito um movimento para se integrar novamente. O processo de contato é um movimento
de ajustamento criativo que possibilita a reintegração desse sujeito com o outro, com a
diferença.
O termo ‘ganhar corpo’ pode ser compreendido agora, como esse movimento de
transformação de uma ação automática e dessensibilizada frente ao mundo para uma ação
criadora, nutritiva e significativa; de gestalten estagnadas para uma formação de figura
dinâmica, fluida e vigorosa. Pôde-se observar esse fenômeno acontecer ao longo da oficina.
O tema da conscientização corporal, ponto em comum entre a dança e a
psicologia, era o objetivo afirmado no planejamento da oficina. A primeira atividade proposta
chamava-se “(M)eu Corpo” e o objetivo foi introduzir e facilitar ao aluno a percepção,
atenção e domínio sobre ações do corpo como sendo movimentos do próprio “eu”
(desautomatização das ações). Salientar de forma lúcida sua relação com o ambiente, com os
demais e, principalmente, com suas sensações, através de princípios técnico-expressivos da
linguagem dança.
O processo do trabalho corporal deve ser gradativo, de tal forma que o indivíduo
assimile parte por parte a fim de compreender o todo. Um processo que dura a vida toda e que
permanecerá sempre em aberto. A dança era vista como entretenimento por estes jovens, e a
proposta do projeto exigia uma disposição para se descobrir e conhecer o novo. As
expectativas de aprenderem passos foi surpreendida pelas propostas do projeto – o que causou
certa resistência – que diminuía ao experenciarem e acrescentavam novas percepções aos seus
vocabulários de vida. E o projeto seguiu criando possibilidades para integrar as dimensões
física, mental e psicológica, resultando na ampliação da awareness. Atividades que buscavam
ampliar a presença, a percepção de si no espaço-tempo com o outro, ganhar corpo, foi o fio
condutor deste projeto.
Conclui-se que por mais diferente que os saberes pudessem parecer inicialmente,
tinham grande afinidades ontológicas, compreendendo o ser como capacidade expressiva dada
no mundo por meio da gesticulação corporal e do diálogo com o outro. Afinidade que se
reflete do ponto de vista epistemológico, trazendo, na origem de suas propostas conceituais e
metodológicas, concepções que permitem o diálogo interdisciplinar. A cada ensaio com os
adolescentes percebia-se que na medida em que iam se apropriando do sentido dos
movimentos que estavam produzindo, ganhavam corpo. A cada novo ensaio, uma maior
integração e um trabalho mais significativo. Os movimentos eram mais eles e eles eram mais
os movimentos. Eles e os movimentos erma um unitário de significações e experiências. O
movimento era figura em seus corpos e os gestos não deixavam dúvidas sobre seu próprio
sentido, seu lugar, seu propósito. Isso é awareness. Isso é ganhar corpo, consciência, presença
e corporeidade. É expressão e transformação aplicada.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVIM, Mônica B.; MOLAS, Adriana. A potência política do corpo. Expressão e trans-form-
ação: arte e clinica com crianças e jovens na Mangueira – Curitiba – CRV, 2017.