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Palavraschave: Controle judicial (políticas públicas). Controle judicial (limites). Controle judicial
(objeto).
Sumário: Parte 1 O controle judicial como instrumento da força normativa da Constituição e das
leis a) Possibilidades b) Limites b.1) Papel subsidiário do Poder Judiciário em matéria de
iniciativas para concretização de direitos b.2) Argumentos doutrinários sobre os limites do
controle judicial b.3) Examinando mais de perto o objeto do controle judicial Parte 2 Alguns
exemplos concretos ou "o que você faria se fosse o gestor público?" a) Possibilidades Política de
prevenção da Aids b) Limites Vagas em creches Conclusão Conjugando possibilidades e
limites
a) Possibilidades
A possibilidade de controle judicial para a garantia do exercício é o que faz das normas de direitos
fundamentais prescrições obrigatórias, no sentido fático. Como se sabe, o direito subjetivo é aquele
dotado de ação para exigir o seu cumprimento. Essa possibilidade, alçada à Corte Suprema do país,
aparelhada dos mecanismos processuais necessários, garante a força normativa de uma
Constituição, de modo que essa supere a condição de mera folha de papel.
A grande inovação do constitucionalismo europeu do pósguerra, que se irradiou para toda sua
área de influência, é a existência desse aparato institucional de garantia de cumprimento, com a
atuação dos Tribunais Constitucionais. Mesmo chegando mais tarde em alguns países, a diretriz
relativa à obrigatoriedade da existência de uma corte independente para o julgamento da matéria
constitucional, assimilada oficialmente pelas instâncias dirigentes da União Européia, levou à
quebra de paradigmas, de que é exemplo eloqüente a decisão sobre a criação da Corte
Constitucional na Inglaterra, pelo Constitutional Reform Act, aprovado no governo trabalhista em
2005.2
Que os tribunais — e os atores da cena jurídica, partes, advogados, Ministério Público, associações
e organizações — se dediquem a explorar ao máximo as fronteiras para a tutela dos direitos
fundamentais no âmbito do processo judicial, é não apenas meritório, mas um eixo importante da
evolução do significado concreto das prescrições jurídicas para os agentes do processo político,
governantes, parlamentares e grupos de interesse. Que a teoria jurídica se debruce sobre esse fato
e procure alargar as fronteiras de aplicação de seus conceitos fundamentais, à luz desse novo
papel, como tem acontecido no direito constitucional mais recente no Brasil, é bastante auspicioso.
b) Limites
No entanto, nos países periféricos, que receberam por inspiração o modelo constitucional da
reconstrução da Europa no pósguerra, a percepção da importância dessa inovação e a abertura de
possibilidades antes inéditas no campo da interpretação constitucional têm ofuscado a consciência
de que a elevação do patamar da cidadania depende mais de alterações estruturais na organização
e no funcionamento do Estado e do sistema econômico do que das decisões do Poder Judiciário,
cujo papel é subsidiário, em matéria de políticas públicas.
A evolução recente do tema revela, a meu ver, uma certa hipertrofia do olhar focado na atuação
judicial para concretização dos direitos, em especial os direitos sociais. E não se dá conta da
insuficiência da prescrição constitucional do catálogo de direitos para as tarefas necessárias à
implementação da igualdade social.
A experiência pósconstitucional mostra que é necessária nova superação, de modo que não nos
limitemos à interpretação jurídica e não nos atenhamos ao direito posto, seja o texto constitucional
sejam a legislação e normas infralegais. Isso não significa, evidentemente, a defesa do direito
alternativo, a interpretação contra lei, mas, ao contrário, a ocupação de vazios existentes nos
espaços tradicionais e legítimos de criação do direito.
O papel da norma e o significado do processo legislativo são temas que, salvo raras exceções, não
vêm sendo contemplados pelo constitucionalismo nacional mais recente. A desproporção entre o
número de trabalhos sobre interpretação constitucional e sobre as condições do exercício do poder
político é bastante elevada e faz pensar. Numa pauta européia de pesquisa em direito público,
talvez se explicasse essa opção, vez que o processo político está relativamente estabilizado e
maduro.
Entre nós, contudo, o processo de elaboração da norma, seja legislativo, em sentido estrito, seja o
que compreende a formação dos projetos de lei e normas infralegais no âmbito do Poder
Executivo, tem merecido pouca atenção sistemática nos estudos do direito público. E esse
conhecimento é necessário quando se deseja passar de um olhar retrospectivo do fenômeno
jurídico a um olhar prospectivo.
A presença dos profissionais jurídicos nos processos de renovação do direito tem se dado, com mais
freqüência, por meio das representações de classe, entidades de magistrados, membros do
Ministério Público ou advogados. A contribuição da ciência jurídica mais qualificada como subsídio
para a elaboração normativa e como caixa de ressonância dos seus efeitos sobre o sistema jurídico
tem se revelado um tanto acanhada. Podese dizer, com certo exagero, em relação ao tema da
efetivação dos direitos sociais, que os juristas se desinteressaram das tarefas de entender, explicar
e orientar — por que não? — a organização do Estado e suas injunções jurídicas, preferindo armar
se para as batalhas judiciais em torno da questão.
Mas é forçoso reconhecer que o período que se segue à promulgação da Constituição de 1988 tem
visto um amadurecimento institucional, esse sim, sem precedentes na história do país. E uma
expressão desse amadurecimento há de se traduzir no enfrentamento mais sistemático do uso dos
meios à disposição do Estado para a implementação da cidadania e dos direitos sociais.
Alguma coisa se tem escrito sobre as limitações do processo judicial para o controle de políticas
públicas.4 Os argumentos encontrados com maior freqüência são de duas grandes ordens, a
primeira, de cunho políticoinstitucional, e a segunda, de cunho econômicofinanceiro, e essas, por
sua vez, se subdividem da seguinte maneira:
Limitações técnicas do Poder Judiciário para apreciação das políticas públicas em toda
sua complexidade;
Discricionariedade administrativa;
Questão da iniciativa das políticas públicas: Poder Executivo (CF, art. 61, §1º, II, a e
b) e Poder Legislativo.
A hipótese de criação de uma estrutura técnica de suporte ao juiz nesse sentido, aventada por
alguns, responderia de forma parcial e provavelmente insatisfatória a esse problema. Isso porque a
lógica da atuação judicial é essencialmente atomizada, baseada nos conflitos explicitados, sejam
eles individuais ou coletivos. A lógica das políticas públicas é, ao contrário, ampla, aglutinadora de
perspectivas e informações, as quais se enfeixam na estratégia de decisão e implementação
finalmente adotada.
Os limites são dados pelos recursos efetivamente existentes e ainda que se trabalhe com a idéia de
produção de déficits pelo Estado que amenizem condições adversas, movimentando a economia em
direção ao crescimento, é fato que também esses recursos são limitados. A superação das
condições que impedem o pleno desenvolvimento é bastante complexa e depende da adoção de
estratégias pactuadas pelas diversas forças políticas, sociais e econômicas de um país, para que se
conjuguem os vários fatores envolvidos no processo. A presença atuante do Poder Judiciário será
um desses fatores, mas é preciso não superestimála e concentrar esforços e atenções em tópicos
que concretamente atuam como obstáculo a esse movimento.
Outro aspecto a considerar, nesse ponto, diz respeito à possibilidade de que a escassez de
recursos, tratada por um ângulo particularizado, desencadeie uma corrida entre direitos, que
concorrerão por recursos escassos, dilema que só pode ser resolvido pela adoção de estratégias
mais gerais, que modulem no tempo as etapas de atendimento dos direitos em seu conjunto,
estabelecendo compromissos do governo, explicitados nos seus planos e leis orçamentárias. Essa é
a razão pela qual recai sobre o Poder Executivo a iniciativa de projetos de lei que criem despesas
diretas ou serviços públicos que suportam a realização das políticas públicas.9
Passei de forma aligeirada pelos argumentos que vêm sendo apontados em decisões judiciais e nos
comentários teóricos, porque me interessa explorar uma outra perspectiva. O que me parece é que
a abordagem das políticas públicas instrumentaliza um outro modo de ação, mais adequado às
demandas de efetivação constitucional, visto que mais apto a combinar, em um único conjunto
cognitivo, várias dimensões que compõem o agir governamental. As políticas públicas são
esquemas de aglutinação de conhecimentos e ações.
A grande inovação que elas trazem é imputar conseqüências, dentro de determinados parâmetros
— ainda não estabilizados e definidos de forma sistemática (e aí está o problema) —, para a inércia
ou a incúria dos governos em implementar as políticas públicas ou medidas necessárias para a
efetivação dos direitos.
Pesquisando as características peculiares das políticas públicas, explicitamse alguns traços, que
podem ser úteis ao aprofundar a compreensão sobre o modo de incidência do controle judicial.
Evoluindo em relação a reflexões que venho empreendendo,10 tomo como ponto de partida da
noção de política pública o processo decisório governamental. As políticas públicas devem ser
compreendidas como arranjos institucionais complexos, expressos em estratégias formalizadas ou
programas de ação governamental, visando coordenar os meios à disposição do Estado e as
atividades privadas, para a realização de objetivos socialmente relevantes e politicamente
determinados, e resultam de processos conformados juridicamente.
Nesse sentido, são próprias da ação governamental, isto é, dos poderes dotados de iniciativa de
ação e, portanto, predominantemente o Poder Executivo, dentro dos marcos legais definidos pelo
Poder Legislativo.
Como arranjos complexos (ou outputs da ação governamental, se não quisermos frisar a forma que
essa externalização da ação assume), agregam elementos políticos, econômicos, sociais,
organizacionais, relativos à gestão pública e legais, numa combinação peculiar que resulta de
processos, juridicamente disciplinados.
As políticas públicas não se confundem com os direitos. Por essa razão, salvo excepcionalmente, a
Constituição não contém políticas públicas, mas direitos, cuja efetivação, especialmente no caso
dos direitos econômicos, sociais e culturais, ditos, elipticamente, sociais, depende das políticas
públicas.
A noção de política pública é útil, para o direito, na medida em que permita compreender, analisar
e tratar fenômenos que a teoria jurídica tradicional não logra fazer, organizando a compreensão,
com base no diálogo interdisciplinar, de fenômenos econômicos, políticos, sociais e da gestão
pública que influenciam na formação de decisões conformadas pelo direito e geram efeitos
jurídicos.
Os direitos sociais não são políticas públicas nem devem ser confundidos com elas. São direitos
fundamentais, cuja satisfação integral requer programas, recursos públicos, os quais, em
circunstâncias de escassez, são alocados segundo a dinâmica política, que combina tempo e
definição de prioridades.
A noção de política pública agrega vantagens analíticas importantes tanto para a compreensão da
atuação do poder público como para a prescrição de modelos de ação. Por essa razão cabe enfatizar
a tônica prospectiva do trabalho com políticas públicas, distinto da atividade jurisdicional típica,
cujo olhar é retrospectivo. As decisões judiciais não se pautam, primordialmente, pelos efeitos que
a jurisprudência, como fonte de direito, irá gerar sobre outros casos não submetidos a julgamento,
mesmo que saibamos que essa circunstância pode se apresentar (e geralmente se apresenta) entre
as considerações do juiz.
Já o controle jurisdicional se dá sob a forma de ações judiciais, cada uma delas expressando um
conflito atomizado. Na dualidade proposta, apresentamse como problemas.
Não por acaso, o processo judicial moderno tem evoluído no sentido de buscar a agregação de
interesses, seja sob a forma dos direitos individuais homogêneos, ou direitos coletivos ou difusos.
Por essa razão, as ações coletivas e as ações cujas decisões têm efeitos contra todos são mais
afeitas ao controle judicial das políticas públicas ou das obrigações de fazer subjacentes a políticas
públicas idealmente concebidas.
Parte 2 Alguns exemplos concretos ou "o que você faria se fosse o gestor público?"
O teste relativo a essa perspectiva, a ser aplicado em cotejo com o controle judicial aqui
examinado, é formularse a pergunta: "o que você faria se fosse o gestor público?"
Passarei a examinar dois casos concretos, objeto tanto de processos judiciais como de medidas
governamentais, em que a diferença de perspectivas se faz muito nítida e, assim, útil para
conhecimento das peculiaridades do processo judicial que se pretende estudar.
Ao cabo de sucessivas decisões judiciais concessivas dos pleitos, firmouse jurisprudência favorável
ao fornecimento de medicamentos. O Supremo Tribunal Federal, pela relatoria sempre lúcida do
Medicamentos para Pacientes com AIDS. Pacientes com HIV/AIDS. Pessoas destituídas
de recursos financeiros. Direito à vida e à saúde. Fornecimento gratuito de
medicamentos. Dever constitucional do Estado (CF, arts. 5º, caput, e 196). Precedentes
(STF).
Se nos detivermos na análise do objeto da ação, veremos que a questão posta em julgamento era,
como não poderia deixar de ser, tópica, versando sobre o direito à obtenção de medicamentos
fornecidos pela rede pública de saúde, e, nesse sentido, mais restrita que o que veio a se
consubstanciar no Programa de AIDS do Ministério da Saúde, esse sim, a política pública na
acepção mais precisa da expressão.
Com base no relato oficial, o papel das ações judiciais é relativizado, em vista da disposição
legislativa e da existência de um conjunto de medidas, de ordem administrativa, tipicamente
caracterizadas como serviço público, a cargo de diversos entes governamentais. Mais importante,
esse conjunto de iniciativas se orienta segundo uma estratégia, cuja efetivação depende de
racionalidade, coerência, além da apreensão fiel dos elementos históricos e organizacionais
envolvidos na formulação e implementação da política. Isso permite entender de que forma o
controle judicial atua sobre elemento ou parte da política ou ainda se ele opera como fator de
pressão pela formulação da política pública.
Uma decisão paradigmática do Supremo Tribunal Federal, mais uma vez sob a relatoria corajosa do
Ministro Celso de Mello, nos oferece oportunidade de explorar o problema dos limites da decisão
judicial em matéria de políticas públicas.
A decisão tem a maior importância, no sentido de afirmar o caráter obrigatório dos direitos
referidos na Constituição. O argumento da fundamentalidade nesse caso é preponderante, pois o
caso trata da educação infantil, compelindo o Município a ofertar vagas em creches e préescolas,
de modo a assegurar a formação e proteção das crianças de idade mais tenra. A decisão dá corpo a
algo que é consenso entre pedagogos, o caráter determinante da educação nos primeiros anos de
vida em relação às possibilidades de evolução pessoal e social do indivíduo.
As conseqüências imediatas que se pode projetar para a oferta de educação infantil no Município de
Santo André são a ampliação da oferta, com a construção de creches e a alocação da estrutura e
pessoal necessários ao cumprimento da decisão.
No entanto, caso exista, de fato, limitação econômica e se trate de invocação leal da reserva do
possível, um possível "efeito colateral" poderá ser a retirada de recursos de outro programa para o
atendimento desse, com as formalizações pertinentes nos termos da legislação orçamentária, se
necessário. Há um risco, portanto, de exacerbação da concorrência entre direitos, privilegiandose
aqueles que lograram ultrapassar o filtro de seletividade da atuação do Ministério Público.
No plano das possibilidades, devese considerar o aprendizado institucional que deve advir dessa
decisão, de modo que o Ministério Público do Estado de São Paulo passe a intentar outras ações
semelhantes, em face de outros Municípios, com o efeito global de aumento real da oferta da
educação infantil, pelo menos no Estado de São Paulo.
No entanto, pareceme que o argumento mais importante, no plano dos limites, é o que se refere à
escala, sendo bastante elucidativo o diagnóstico contido no Plano Nacional de Educação, aprovado
pela Lei nº 10.172, de 2001, em relação aos antecedentes da carência de vagas na educação
infantil.
Confirmandose o diagnóstico do PNE, uma resposta satisfatória ao problema teria que assumir a
mesma escala do Fundef. E de fato, expirandose a Emenda nº 14, foi aprovada, por iniciativa do
Poder Executivo, a Emenda Constitucional nº 53, que instituiu o Fundo Nacional da Educação
Básica (Fundeb). O art. 8º, §§1º a 3º, da Lei nº 11.494, de 2007, que regulamenta o Fundeb,
considerando a inexistência de vagas disponíveis na rede pública de educação infantil, prevê a
possibilidade de oferta de vagas em regime de convênio com creches (crianças de até 3 anos) ou
escolas de educação infantil (4 ou 5 anos),13 comunitárias ou filantrópicas, sem fins lucrativos,
observados os requisitos pertinentes. A medida resultou de intensos debates no Legislativo, mas
parece ter se revelado acertada, como estratégia, conforme dados do censo da educação básica,
que apontam o crescimento de matrículas nas creches da rede pública, no território nacional, da
ordem de 13,7%, entre 2006 e 2007 (Diário Oficial da União, 14 nov. 2007).
O que se demonstra, portanto, é que há uma diferença significativa de escala entre o resultado de
uma política pública bemsucedida e o de um conjunto de ações judicialmente igualmente bem
sucedidas para exigir o cumprimento de prestações voltadas à efetivação de direitos sociais.
Evidentemente, não se trata de abordagens excludentes, mas complementares. Mas a
peculiaridade de cada uma há de ser reconhecida, se pretendemos alimentar a pesquisa teórica
com demandas jurídicas reais.
Seria conservadora, se não retrógrada, uma leitura que atribuísse caráter absoluto aos limites,
preservando a esfera de atuação de poderes deslegitimados, em vista do descaso na efetivação dos
direitos constitucionais. Uma visita aos presídios brasileiros seria suficiente para convencer quem
duvidasse que a implantação da constituição ainda é uma tarefa por se fazer e que deve envolver
não só os poderes responsáveis pela formulação de políticas públicas ainda inexistentes, Poderes
Executivos e Legislativos das várias esferas federativas, como também, intensamente, o Poder
Judiciário, além da imprensa, a sociedade civil organizada e a comunidade internacional, cada um
em seu papel.14
A consideração sobre os limites da atuação judicial visa chamar a atenção para o que me parece
um desvio da rota mais importante para a implementação dos direitos, em especial os direitos
sociais, nas preocupações do constitucionalismo mais avançado.
De um lado, considero perigosa a tônica preponderante do controle, que tende a tornar mais
robusto o nãofazer do que o fazer do poder público. Essa tônica reforça a oposição entre a
Administração Pública, responsável pela outorga de prestações, e os cidadãos.
A caixa de ferramentas dos juristas para a elaboração das políticas públicas tem, neste momento,
pouco mais que alguns apetrechos enferrujados e peças gastas pelo uso.
Sempre me pareceu que esse é um debate fora do lugar. O controle judicial das políticas públicas é
possível, mas limitado. Do ponto de vista estrito, tratase do controle judicial dos atos e processos
jurídicos que compõem a política. Do ponto de vista amplo, tratase de um controle de omissões,
quando não há ato ou processo que leve a resultado compatível com o objetivo constitucional.
Nesse sentido, a elaboração teórica em torno da noção de política pública deveria anteciparse e se
voltar ao estudo das características jurídicas dos atos e processos e, a partir daí, dos modelos
jurídicos, que configuram políticas públicas.
Isso exigirá a construção de um acervo de modelos, possivelmente, por temas, isto é, em matéria
de saúde, educação, assistência social, posteriormente examinandose as políticas públicas
voltadas à infraestrutura. E esses modelos se valerão de determinados instrumentos, e aí, sim,
teremos vasto material de trabalho para estudos de direito ainda mais transformadores.
Muito me alegra a oportunidade dessa homenagem ao Prof. Fabio Konder Comparato. A escolha do
tema foi natural, não apenas porque se trata do assunto que venho pesquisando nos últimos anos,
mas porque a inspiração para o assunto teve origem nas aulas do Prof. Comparato, nas disciplinas
Direitos Fundamentais e Direito do Desenvolvimento, que cursei durante o doutorado, quando se
abriu, para mim, uma importante chave de conexão entre o pensar e o fazer jurídicos, síntese que
representa a marca mais forte do aprendizado com o Prof. Comparato. Ao mestre, com carinho.
declaração de incompatibilidade das leis. Novel espécie de judicial review?. Revista de Direito do
Estado, Rio de Janeiro, n. 5, p. 267288, jan.mar. 2007.
3 Vejase, nesse sentido, a esclarecedora retrospectiva traçada por Ana Paula de Barcellos em "O
direito constitucional em 2006" (Revista de Direito do Estado, Rio de Janeiro, n. 5, p. 324, jan.
mar. 2007).
4 APPIO, Eduardo. Controle judicial de políticas públicas no Brasil. Curitiba: Juruá, 2005; COSTA,
Flavio Dino de Castro e. A função realizadora do Poder Judiciário e as políticas públicas no Brasil.
Revista do TRF1a. Região, p. 2747; VALLE, Vanice Lírio do. Dever constitucional de enunciação de
políticas públicas e autovinculação: caminhos possíveis de controle jurisdicional. Mimeografado;
PIOVESAN, Flavia. Justiciabilidade dos direitos sociais e econômicos no Brasil: desafio e
7 TEIXEIRA, José Elaeres Marques. A doutrina das questões políticas no Supremo Tribunal Federal.
8
É o caso das ações judiciais para o fornecimento de medicamentos, que deixarei de comentar
neste estudo, tendo em vista a grande quantidade de material já produzido sobre o tema. A
possível existência de beneficiários privados não carentes, em parcela significativa dessas ações,
está sendo trabalhada por Fernanda Terrazas e Virgílio Afonso da Silva em estudo, cujos dados
preliminares foram apresentados no II Congresso de Direitos Sociais, de iniciativa da Procuradoria
Geral do Município do Rio de Janeiro, naquela cidade, em novembro de 2007.
9 Tratei desses pontos em "O conceito de política pública em direito" (In: BUCCI, Maria Paula
Dallari (Org.). Políticas públicas: reflexões sobre o conceito jurídico. São Paulo: Saraiva, 2006. p.
150, especialmente p. 36).
10 Em "O conceito de política pública em direito" (ob. cit.), formulei a seguinte proposição: "Política
Como tipo ideal, a política pública deve visar a realização de objetivos definidos, expressando a
seleção de prioridades, a reserva de meios necessários à sua consecução e o intervalo de tempo
em que se espera o atingimento dos resultados."
11 Ob. cit.
12 E x t r a í d o d a p á g i n a e l e t r ô n i c a d o M i n i s t é r i o d a S a ú d e s o b r e o P r o g r a m a d e A i d s ,
§2º A padronização de terapias deverá ser revista e republicada anualmente, ou sempre que se
fizer necessário, para se adequar ao conhecimento científico atualizado e à disponibilidade de
novos medicamentos no mercado.
Art. 2º As despesas decorrentes da implementação desta Lei serão financiadas com recursos do
orçamento da Seguridade Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios,
conforme regulamento. (...)
14
Cabe referir, mais uma vez, a resenha de Ana Paula de Barcellos: "O contraste da realidade com
as pretensões normativas da Carta de 1988 se mostrou tão chocante em determinados momentos
que pareceu veicular, afora muitas outras mensagens, uma provocação debochada dirigida aos
juristas. É certo, porém, que a constrangedora impotência do instrumental jurídico tradicional para
levar a cabo as pretensões de determinadas disposições constitucionais, que se tornou evidente,
acabou por fomentar a busca por soluções diversas. Os eventos que talvez ilustrem com maior
dramaticidade esse confronto são aqueles que envolveram (e continuam a envolver) a violência,
sobretudo urbana, e o sistema penitenciário brasileiro" (Ob. cit, p. 8).
Conforme a NBR 6023:2002 da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto
científico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma:
BUCCI, Maria Paula Dallari. Controle judicial de políticas públicas: possibilidades e limites. Fórum
Administrativo Direito Público FA, Belo Horizonte, ano 9, n. 103, set. 2009. Disponível em:
<http://www.bidforum.com.br/bid/PDI0006.aspx?pdiCntd=62501>. Acesso em: 17 jun. 2013.