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10 textos acadêmicos sobre comunicação e infância

Por Renata Othon*

As pesquisas sobre as crianças e a infância foram, por muito tempo, marcadas pelo
viés desenvolvimentista da psicologia e das ciências biológicas. Compreender a criança
significava enxergá-la como parte de uma fase natural pela qual todos os sujeitos transitam
nos anos iniciais da vida. Isto é, a criança era encarada como alguém que aprenderia de forma
passiva e desenvolveria a racionalidade, integrando-se à sociedade.
Transformações epistemológicas, políticas e sociais contribuíram para que uma
concepção cultural do sentimento de infância fosse evidenciada e para que as crianças fossem
vistas como sujeitos que participam ativamente da sociedade. Nesse sentido, para além de
uma fase universal, a infância foi entendida como uma categoria social que opera em razão de
especificidades históricas e culturais.
Dentre elas, destacam-se o processo de escolarização; a luta pelos direitos infantis; as
mudanças no estilo de vida e na estrutura familiar; a inclusão das crianças no mercado
consumidor; e os processos comunicacionais desses jovens, potencializados e ampliados pelas
tecnologias de informação e comunicação.
Nesse sentido, as lógicas midiáticas e a cultura do consumo têm ocupado um espaço
cada vez mais significativo nos processos de socialização das crianças – tanto oferecendo-lhes
recursos, referências e narrativas que são incorporados à construção de suas subjetividades,
quanto possibilitando que construam suas próprias culturas e as visibilizem.
Os 10 textos acadêmicos listados abaixo abordam as nuances da relação entre crianças
e mídias, entendida de forma cada vez mais complexa e multidisciplinar. Das representações
aos efeitos; das produções materiais às produções simbólicas; dos meios às mediações; das
mediações aos meios. Ainda que alguns deles tenham sido publicados há certo tempo,
representam marcos teóricos e metodológicos no âmbito da pesquisa sobre infância e
comunicação, e indicam possíveis caminhos a serem percorridos.
Pensados sob distintas perspectivas, esses estudos e seus respectivos pesquisadores
têm um propósito em comum: colaborar para a construção e manutenção de um espaço
democrático e seguro no qual as crianças possam expressar suas culturas e ampliar sua
participação na sociedade.

1 – E-book “Infâncias, Juventudes e Debates Emergentes em Comunicação”, organizado


por Brenda Guedes e Bárbara Janiques.
(https://www.pimentacultural.com/infancias-juventudes-debates)
Lançada em 2020, a coletânea reúne pesquisadores de Infância e Mídia, reforçando a presença
daqueles já consolidados no campo e revelando novos nomes. Os 14 capítulos que compõem a
obra são divididos em cinco eixos, cujas investigações contemplam políticas e práticas de
regulação; publicidade e consumos infantis; representações em pauta; práticas
contemporâneas de sociabilidade; e cidadania e literacias midiáticas.

2 – “Infância e mídia: breve revisão de um campo em disputa”, de Renata Tomaz.


https://periodicos.uff.br/contracampo/article/view/17592/pdf
Para identificar as principais perspectivas sobre as quais se tem entendido as narrativas da
infância, a pesquisadora faz um levantamento da produção acadêmica brasileira dos últimos
10 anos. Alinhados com os Childhood Studies, a maior parte dos estudos abandona
parcialmente a concepção dos efeitos negativos da mídia sobre as crianças e busca
compreender como as crianças produzem suas próprias culturas, sociabilidades e visões de
mundo no espaço midiático.

3 – “Múltiplas faces da infância na contemporaneidade: consumos, práticas e


pertencimentos na cultura digital”, de Monica Fantin.
https://periodicoscientificos.ufmt.br/ojs/index.php/educacaopublica/article/download/
3836/2617
Em diálogo com o campo da Educação, a autora problematiza algumas questões vinculadas ao
consumo digital das crianças. Dentre elas, a pesquisa com e sobre crianças; a ideia de crianças
enquanto prosumers (consumidores-produtores); os imperativos da chamada “Geração
Digital”; as novas práticas culturais e lúdicas que emergem da cultura digital; e os desafios da
educação diante desses novos cenários.

4 – “Repensando a Criança-consumidora: Novas Práticas, Novos Paradigmas”, de David


Buckingham.
http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/viewFile/311/pdf_1
Neste artigo, David Buckingham – autor do livro “Crescer na era das mídias eletrônicas” e de
outras obras na área – discorre sobre o papel das crianças na sociedade de consumo,
enquadrando-as como consumidoras; como aquelas que influenciam as compras dos adultos; e
como um mercado do futuro. O pesquisador busca ir além das noções dicotômicas que tratam
as crianças ora como vulneráveis e impactadas, ora como consumidoras críticas e conscientes,
para compreender o fenômeno de maneira ampla e sistêmica.
5 – “Infância capitalizada nos processos comunicacionais em rede: estudo exploratório
sobre o consumo midiático de crianças entre 10 e 12 anos”, de Renata Othon e Maria
das Graças Pinto Coelho.
https://periodicos.uff.br/midiaecotidiano/article/view/38421/23443
Junto a minha orientadora, neste artigo apresentei os resultados preliminares da minha
pesquisa de doutorado, que buscou relacionar a emergência das culturas infantis na
contemporaneidade às práticas comunicacionais das crianças nas redes sociais na internet. Os
resultados foram obtidos a partir da pesquisa exploratória, realizada em uma escola pública
municipal em Natal/RN, na qual participaram crianças entre 10 e 12 anos.

6 – “Meninas no YouTube: participação, celebrização e cultura do consumo”, de Lidia


Marôpo e Nut Pereira.
http://www.repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/51905/1/2018_capliv_lsbmaropo.pdf
Com um recorte temático bastante atual e relevante, os autores analisam canais de youtubers
mirins com grande popularidade no Brasil. Ao longo do estudo, identificam suas principais
práticas de produção e divulgação de conteúdo, levando em consideração a cultura de
consumo, as estratégias de celebrização e os papeis de gêneros imbricados na infância e nos
processos midiáticos.

7 – “A participação das crianças no jornalismo infantojuvenil português e brasileiro”,


de Juliana Doretto.
https://revistaseletronicas.pucrs.br/ojs/index.php/revistafamecos/article/view/27327/16246
Neste trabalho, que parte de sua tese de doutorado, Juliana Doretto aborda as formas de
participação de crianças brasileiras e portuguesas de 09 a 16 anos de idade no jornalismo
infantil. Dentre as conclusões, aponta dois aspectos centrais para que as crianças se sintam
motivadas a acompanhar os veículos infantis: a mediação adulta e os temas abordados pela
publicação.

8 – “Kids Online na Europa e no Brasil. Desafios para a pesquisa comparada sobre as


práticas de crianças e adolescentes na Internet”, de Cristina Ponte.
http://revistacmc.espm.br/index.php/revistacmc/article/download/310/pdf
Neste texto, a pesquisadora portuguesa discorre sobre os enquadramentos teóricos e
metodológicos da pesquisa EU Kids Online. Desde 2006, o projeto tem investigado a relação
entre crianças e adolescentes com a internet em âmbito europeu, bem como tem possibilitado
a consolidação de uma rede de investigadores de diferentes países – incluindo o Brasil.

//Bônus: Para visualização de dados brasileiros, indico a pesquisa TIC Kids Online Brasil,
realizada desde 2012 pelo CETIC.br/NIC.br, que tem como objetivo gerar evidências sobre o
uso da internet por crianças e adolescentes. Anualmente, são publicados indicadores e
relatórios sobre hábitos, oportunidades e riscos relacionados à participação on-line de jovens
entre 09 e 17 anos.
Link: https://cetic.br/pesquisa/kids-online/

9 – “Children and young people’s rights in the digital age: An emerging agenda”, de Sonia
Livingstone e Amanda Third.
https://journals.sagepub.com/doi/abs/10.1177/1461444816686318
Os direitos digitais das crianças se tornaram uma pauta relevante e desafiadora dentro dos
estudos sobre infância e comunicação. Neste artigo, as pesquisadoras apresentam desafios e
articulações desse campo, que busca balancear a proteção das crianças na rede, ao mesmo
tempo que procura maximizar suas oportunidades e benefícios.

10 – “Autoria e autorização: questões éticas na pesquisa com crianças”, de Sonia


Kramer.
https://www.scielo.br/pdf/cp/n116/14398.pdf
Fazer pesquisa sobre e com crianças requer uma série de práticas e posturas éticas que devem
ser consideradas independentemente do campo disciplinar. Em vista disso, finalizo a lista com
este artigo, no qual a pesquisadora evidencia aspectos como a utilização das imagens das
crianças; a forma como elas serão nomeadas (nomes verdadeiros ou fictícios); e os impactos
sociais da publicização dos estudos.

//Bônus: E-book “Comunicação e Infância: processos em perspectiva”, organizado por


Alessandra Alcântara e Brenda Guedes.
Link: https://www.pimentacultural.com/comunicacao-e-infancia
*Mestre e Doutora em Estudos da Mídia pela UFRN, com período sanduíche na Universidade
NOVA de Lisboa (PDSE/CAPES). Formada em Jornalismo (UFRN) e em Publicidade e
Propaganda (UnP). Coordenadora acadêmica e professora no Instituto Brasileiro de Ensino,
Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).

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