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5º ano (2019/2020)
Nota introdutória
Estes apontamentos, sobre mudança de comportamentos e técnicas de
influência, são elaborados com o objetivo específico de servirem de texto apoio
para os alunos da Unidade Curricular de Medicina Geral e Familiar que faz
parte do Mestrado Integrado em Medicina da NOVA Medical School /
Faculdade de Ciências Médicas. Não se pretende que o aluno tenha um
conhecimento enciclopédico sobre estes temas, mas que adquira uma
estruturação teórica, relativamente simples, que o ajude a entender a prática da
abordagem centrada no paciente em contraponto com a abordagem clássica e 3
quase única de centrada na doença ou no médico, para além de os ajudar a
compreender a importância da palavra no exercício da medicina.
Compreenderem que a palavra não serve só para transmitir informação mas
que tem muitas outras funções entre as quais a de fazer coisas (How to do
things with words). Declaro que as ideias expressas nestes apontamentos não
são originais, mas adaptadas das obras que menciono como bibliografia
recomendada para quem pretender aprofundar o conhecimento.
Como menciono no texto, existe quase uma centena de teorias sobre a
mudança de comportamentos, mas as que escolhemos, até à data e salvo
melhor opinião, são as que têm demonstrado melhores resultados.
Finalmente uma declaração. Que fique claro que, com o que podem aprender
nesta Unidade Curricular, não ficam capacitados para fazer intervenções
motivações. Isso exige tempo, perseverança, prática reflexiva. Há quem diga:
− Qual a diferença entre uma entrevista vulgar e uma motivacional?
− Dez anos!
Significa isto que esta é uma área que exige estudo e muita prática ao longo da
vida profissional. No fundo não é nada de novo. O aluno sai da Faculdade com
muito estudo e aulas de cirurgia mas não se sente nem está capacitado para
operar. Enfim entendam que estes apontamentos são como sementes
lançadas ao campo na esperança de que mais tarde venham a frutificar.
Mudança de comportamentos em saúde – UC de MGF, 5º ano, 2020/2021
Permeabilidade à Resistência à
influência influência
Nível 1
Sensíveis à persuasão Nível 2 Nível 3
confrontativa Persuasão motivacional Resistentes à
argumentação. Aplicar a
persuasão extrínseca
1Alguns autores recusam a persuasão porque ela pode ser vista como uma forma de
manipulação em que o paciente pode mudar, mas não se sente confortável com essa
mudança, ou pelo menos não a perceciona como uma escolha sua.
Mudança de comportamentos em saúde – UC de MGF, 5º ano, 2020/2021
termos culturais os profissionais da saúde têm mais apetência para mandar
(ordenar) ou dar conselhos que persuadir e muito menos negociar.
A EM foi desenvolvida por Miller e Rollnick (1999) para abordar os doentes
alcoólicos resistentes ao conselho médico. Estes autores tomaram consciência
que quando abordavam os doentes com um estilo confrontativo eles
desenvolviam resistência à mudança que era muito difícil de superar. A maioria
dos profissionais respondia a esta rigidez de posições com “mais do mesmo”.
Veja-se um exemplo de estilo confrontativo na figura 2.
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O Senhor devia de
deixar de fumar
Os estilos comunicacionais da EM
A EM é um encontro entre técnico de saúde e um paciente que visam a
mudança de comportamento deste. Nesta circunstância a EM não deixa de ser
um comportamento (do profissional) que visa levar à mudança de outro
comportamento (o do paciente). O médico perante o doente pode assumir
diferentes estilos comunicacionais que vão desde o dar ordens (diretivo) ao extremo
do companheirismo. Entre estes dois estilos está o de guia (ver figura 4).
No estilo diretivo o médico é o “diretor” que diz o que entende que o doente
deve (tem) de fazer:
− Faça como lhe digo e vai ver que tudo vai correr bem!
Nesta situação o médico dá toda a informação e diz o que deve fazer dando
conselhos ou mesmo ordenando. Este tipo de comportamento médico induz no
doente um comportamento complementar de obediência sem questionamento,
adere à terapêutica e é complacente com ela, ou seja, o médico tem um
comportamento ou atitude de PAI e induz no doente um comportamento de
FILHO. É tipicamente uma relação do “EU Pai” com um “TU Filho”.
No outro extremo temos o companheirismo ou de acompanhante. Escuta o
outro e aceita-o incondicionalmente. Nesta situação o médico diz:
− Confio na sua sabedoria. Estou com a sua escolha. Acompanho-o no
que puder e até onde puder.
Mudança de comportamentos em saúde – UC de MGF, 5º ano, 2020/2021
Este é um tipo de atitude que pode ser adequado no acompanhamento de uma
situação terminal em que terapeuticamente já tudo foi feito, mas que se tem
uma das tarefas mais nobres da medicina que é o estar presente, limitar-se a
ser, testemunhar uma viagem, um momento.
O estilo de guia é um tipo de relação do “EU Adulto” para o “TU Adulto”. O
médico e o doente são peritos, cada um na sua área e assumem colaborar
para um objetivo comum. O comportamento de um condicionará o
comportamento do doutro e vice-versa. Nestas circunstâncias o médico diz:
− Diga-me para onde quer ir que eu dou-lhe os caminhos possíveis para
escolher. 13
O espirito da EM
Quando falamos de EM a primeira pregunta que se coloca é “como se faz?”.
No entanto, mais importante de “o que se faz” é o espirito com o qual “se faz”.
Sem este espirito, a EM é vista como uma forma de persuadir ou manipular as
pessoas de modo a levá-las a fazer o que não querem ou, pelo menos, não
escolheram.
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Mas, então, que dimensões formam ou definem o espirito da EM? De forma
clara, são:
1. Partilha / parceria (partnership);
2. Aceitação;
3. Compaixão; e
4. Evocação.
Cada uma destas dimensões tem um nível experiencial e comportamental que
passamos a descrever.
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1. Partilha /parceria.
A EM não é feita para alguém, mas com alguém. É uma colaboração ativa
entre dois peritos. O terapeuta é um ajudante que tipicamente fala menos do
que o ajudado.
Este espirito envolve:
• Mais exploração que exortação;
• Mais interesse que persuasão ou argumentação;
• Procurar mais relação que imposição.
Metaforicamente, podemos dize que a EM é uma dança em oposição a uma
entrevista médica clássica em que a autoridade médica a transforma numa
luta.
O movimento do terapeuta faz-se com o paciente e não o empurra.
Quando o objetivo é a mudança do paciente, o médico não o consegue fazer
sozinho, porque o paciente tem elementos e informação que são
complementares dos elementos e da informação que o terapeuta possui. O
segredo está em fazer despertar este saber do doente. Ele é o principal
elemento de mudança, sem a sua vontade e determinação, todo o
conhecimento médico será inútil.
Um engano a evitar é o médico assumir o papel de perito e providenciar
respostas para o dilema do doente. Evitar assumir o pressuposto de que tem
resposta para todas as questões do paciente. A verdade é que quando se trata
de escolhas pessoais não tem mesmo quaisquer respostas honestamente
construídas.
O médico passou os vários anos de formação a encher-se de conhecimento,
ficou empanturrado de ciência, e isso criou-lhe a ideia que deve dar resposta
rápida e pronta para qualquer pergunta.
A EM exige que o médico “suspenda” o seu conhecimento e evite o reflexo de
dar conselhos à primeira deixa do paciente. Mal vê o doente em desequilíbrio
apressa-se a “endireita-lo”.
É legítimo que o médico deseje que o doente mude, mas não pode nem deve
encaminhá-lo para a mudança sem tomar em consideração as aspirações dele.
Mudança de comportamentos em saúde – UC de MGF, 5º ano, 2020/2021
A parceria na EM implica um profundo e genuíno interesse e respeito pelo
paciente. Portanto, o primeiro objetivo do terapeuta é compreender o doente,
ver o mundo pelos seus olhos evitando impor-lhe a sua visão de técnico.
2. Aceitação
A aceitação implica reconhecer o doente e o que ele traz consigo. Esta atitude
é muito mais que tolerância. Na tolerância não se interfere no trajeto do outro,
mas não o aceita.
A aceitação é um conceito que vem do modelo de comunicação terapêutica de
Carl Rogers e que se define com quatro componentes: a) respeito positivo ou 15
valorização absoluta; b) estabelecer empatia; c) favorecer a autonomia; e d)
confirmar. Segundo este autor, basta alguém reunir estas condições para logo
obter efeito terapêutico.
a) Respeito positivo
O respeito positivo é a aceitação incondicional do outro que é visto como uma
pessoa de confiança, que é como é, com a sua individualidade e o seu valor.
Esta é uma das condições básicas do modelo de Cal Rogers. Basta alguém se
sentir como pessoa aceite para deixar de estar presa à imobilidade. Cada um
tem um potencial de auro-realização ou auto-atualização que tendencialmente
se exprime, desde que não tenha obstáculos que se lhe oponham. Nestas
condições, o papel do terapeuta é precisamente o de afastar os obstáculos que
se opõem à auto-atualização.
b) Empatia
A empatia é o interesse genuíno em conhecer o outro, compreender a sua
visão do mundo. Conseguir ter a visão do mundo que o outro tem.
Não confundir com simpatia, o sentimento de pena e de camaradagem.
Não é a identificação com o outro nem o “já passei por isso logo, sei muito bem
o que se passa consigo”. Empatia é a capacidade de entender o quadro de
referência do outro e que vale a pena conhecê-lo. É ver o mundo “como se”
fosse o outro sem esquecer o “como se”. De uma forma mais explícita, empatia
envolve dois momentos, compreender o outro e ele sentir que está a ser
compreendido. Nesta circunstância é possível ter efeito terapêutico no doente.
O oposto de empatia é a imposição da vontade ou da perspetiva do médico na
convicção que a ideia do doente é totalmente irrelevante.
c) Apoiar a autonomia
A aceitação passa por respeitar a autonomia do outro e ajudar a construi-la. No
dizer de Carl Rogers, oferecer ao outro a possibilidade de ser livre e de fazer
as suas escolhas. Em termos transacionais, o Eu Adulto considera o outro
igualmente como Adulto.
O contrário de apoiar a autonomia é forçar o que queremos, controlar ou
coagir.
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Dizer a alguém que “tem de” ou “deve de” ou “não pode” evoca uma resposta
de defesa por parte desse alguém que é própria de quem defende a sua
individualidade e se coloca numa posição de defender o status quo para vincar
o seu direito a escolher. Pelo contrário, salientar que é o paciente quem faz as
suas escolhas reduz as defesas e liberta-o para a mudança. Esta atitude
também liberta o médico de se sentir responsável pela mudança do paciente.
No fundo é renunciar a um poder que, na realidade, nunca teve.
d) Confirmação
A aceitação implica confirmar o outro como pessoa procurando conhecer as
suas forças e os seus esforços.
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O contrário da confirmação (a desconfirmação) é procurar os defeitos e os
erros do outro. É, fundamentalmente, procurar o que está errado no outro e
oferecer-lhe (ou impor) o conserto.
3. Compaixão
Por compaixão entende-se a atitude de promover o bem-estar do outro dando
prioridade às suas necessidades. Assim, tudo o que há a fazer é no interesse
predominante do doente e nunca no do médico. Portanto, pressupõe uma
constante autoconsciência, auto questionando-se com o que pretende com
qualquer ação que se proponha fazer, seja essa ação de natureza
comunicacional ou outra.
4. Evocação
Na consulta clássica o modelo predominante baseia-se no princípio que o
doente tem uma falha (de conhecimento ou de comportamento) e, portanto,
todo o esforço do terapeuta vai no sentido de colmatar essa deficiência. Ora o
espirito da EM baseia-se no princípio oposto. Acredita que as pessoas têm, em
si, todos os recursos para resolverem o problema e o papel do terapeuta é
ajudar o doente a evocar esses recursos. O lema é:
“… tem o que precisa, juntos vamos encontrar a solução!”.
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Neste espirito o objetivo é conhecer os pontos fortes e os recursos em vez de
se focar nos defeitos, nos obstáculos, nas deficiências.
As pessoas têm boas razões para fazer o que estão a fazer e o médico deve
procurar conhecê-las. O resultado esperado e desejado com este tipo de
intervenção é que a pessoa resolva a sua ambivalência e assim prossiga a sua
mudança sem precisar do terapeuta.
O espirito de evocação está em linha com o conceito de ambivalência. Quem
está ambivalente tem argumentos a favor e argumentos contra a mudança. A
tarefa do terapeuta é evocar e fortalecer os argumentos para a mudança.
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Partilha ou parceria
Aceitação
Compaixão
O método da EM
Em termos metodológicos, a EM baseia-se em quatro processos que Rollnick
enumera no gerúndio (engaging, focusing, evoking e planning) e que em
português optamos por usar os infinitivos: estabelecer a relação ou relacionar,
focar, evocar e planear.
1. Relacionar
Relacionar é estabelecer uma relação de ajuda e de trabalho. Esta é uma
condição importante em muitas outras situações, mas na EM, assume-se como
o alicerce do método, sendo um pré-requisito a que se adicionam os outros
processos. Nada deve começar sem que uma relação se tenha iniciado.
A relação deve ser estabelecida desde o início do encontro e mantida e
cuidada ao longo de toda a consulta. O sucesso dos restantes processos
depende da qualidade da relação estabelecida.
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Os anglo-saxónicos chamam ao estabelecer a relação de “engagement” que
traduzido à letra seria “noivado”. Ora noivado implica confiança absoluta,
acreditar em si e no outro. Gostar de estar com o outro e tudo fazer pela
felicidade do outro. O noivado é simbolicamente marcado por um anel (anel é o
que liga) e que se designa especificamente de aliança.
A preocupação em estabelecer uma relação terapêutica assenta nas suas
vantagens, a saber:
− Estabelecimento de uma confiança mutuamente respeitada;
− Acordar quais os objetivos do tratamento;
− Tarefas mutuamente negociadas, em colaboração, para alcançar os 18
objetivos comuns.
Existe uma multiplicidade de erros ou armadilhas que se opõem ao
estabelecimento de uma relação terapêutica. A tentação da avaliação será um
deles. Por vezes o profissional sente que não se pode ajudar se não houver um
conhecimento em profundidade do paciente. O profissional, neste caso, vê-se
obrigado a colocar uma série de questões a que o doente se vê obrigado a
responder sem, contudo, entender qual o interesse para a evolução do seu
problema
2. Focar
A focagem diz respeito à concentração da atenção numa agenda partilhada.
Por agenda entende-se o assunto que vai ser tratado, o motivo pelo qual o
doente está na consulta. A agenda é partilhada porque ela é tão clara paro o
médico quanto o é para o doente.
A focagem é o processo de manter a direção da conversação centrada na
mudança. É através da focagem que se clarifica a direção e o horizonte para
“onde” se pretende mudar.
3. Evocar
Mantendo uma das dimensões do espirito da EM, a evocação é o processo de
fazer explicitar as razões intimas, próprias do doente, para aumentar a sua
motivação para a mudança. Portanto, é levar o doente a elencar as suas
razões que determinam a sua motivação par a sua mudança. Estamos no
método centrado no paciente em que tudo é dele e a função do médico é
ajudá-lo a evidenciar as suas forças e os seus recursos para a mudança.
O médico foi treinado na abordagem didática de perito: avalia o problema, faz o
diagnóstico, i.e., identifica onde está a avaria, educa, ou melhor, dá a solução
para resolver a avaria. Portanto, o médico dá o diagnóstico e o tratamento.
Esta abordagem funciona na medicina de situações agudas. O doente parte a
tíbia, o médico faz o diagnóstico, coloca a tala gessada, faz 4 a 6 semanas de
repouso, o médico retira a tala e o problema está resolvido. O médico contou
com a colaboração da natureza regeneradora (vis medicatrix naturae) e ao
doente apenas foi exigido que não a contrariasse. Outra situação aguda:
doente com odinofagia, médico diagnostica amigdalite eritemato-pultácea,
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prescreve antibiótico durante 7 dias e, mais uma vez, ao doente foi-lhe pedido
muito pouco. Contudo, quando se trata de mudança de comportamentos
pessoais o processo é a longo prazo.
Nesta condição há que ajudar o doente a evocar os seus argumentos a favor
da mudança, inibir o reflexo de endireitar e desenvolver o processo
colaborativo estimulando a motivação do próprio doente para a mudança
positiva.
Chegámos então à definição de EM na perspetiva de como se faz.
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A EM é uma colaboração, um estilo de comunicação orientada para um
objetivo com atenção particular para as falas de mudança. Tem como
objetivo o fortalecimento da motivação pessoal para um compromisso
com o objetivo específico, através de elicitar e explorar os motivos
próprios para a mudança numa atmosfera de aceitação e compaixão.
4. Planear
Como todas as tarefas, o êxito de uma mudança depende do cuidado tido no
seu planeamento.
No espirito da EM o planeamento é feito com o doente. Muitas vezes o doente
não procura conselho, mas quem o ajude a pensar e planear. Nestas
circunstâncias o papel do terapeuta é o de estar presente, escutar
reflexivamente o doente enquanto este fala consigo próprio sobre a mudança.
Como médicos, quando falamos de plano, pensamos em plano de tratamento,
no entanto, é preciso estar consciente que um plano de mudança é algo mais
complexo. O tratamento pode ser apenas uma parte da mudança e muitas
vezes está em questão uma mudança sem tratamento. Um plano de mudança
é mais complexo que pode incluir quando, o quê, como, com quem faz a
“saída” do comportamento indesejado e entrada noutro desejado.
A propósito do desenho do plano, transcrevo a afirmação de Miller e Rollnick:
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Quadro I. Autoquestionamento do médico segundo o processo da EM
Relacionar:
− Como é que esta pessoa se sente ao falar comigo?
− Qual é a ajuda e apoio que estou a oferecer?
− Será que compreendo as perspetivas e as preocupações desta pessoa?
− Como é que eu me sinto com esta pessoa? Estou à vontade?
− Estamos numa relação de colaboração?
Focar:
− Quais são os objetivos do doente?
− Será que tenho aspirações de mudança diferente para esta pessoa?
− Estamos a trabalhar em conjunto para um objetivo comum? 20
− Vamos no mesmo caminho ou estamos em direções diferentes?
− Para mim é claro para onde vamos?
− Estamos a “dançar” ou estamos numa luta?
Evocar:
− Quais são os motivos desta pessoa para a mudança?
− A relutância é mais consequência da falta de confiança ou de não atribuir importância
à mudança?
− Que falas de mudança ouço?
− Estou a empurrar demasiado ou ser muito rápido numa dada direção?
− Não estou a conseguir controlar o reflexo de endireitar impelindo-me para a
argumentação a favor da mudança?
Planear:
− Qual deve ser o próximo passo em direção à mudança?
− O que pode ajudar esta pessoa a dar o passo seguinte?
− Estou a fazer evocar ou a prescrever o plano?
− Estou a dar informação ou conselho a pedido ou com a permissão da pessoa?
− Mantenho o sentido de curiosidade do que poderá funcionar melhor para este doente?
Habilidades comunicacionais da EM
Os processos da EM exigem habilidades comunicacionais que não lhe são
específicas, mas são fundamentais. Estas habilidades são ferramentas
comportamentais que permitem pôr em prática os processos da EM que, por
sua vez, resultam do espirito próprio da EM.
São técnicas comunicacionais importantes para a EM: 1) perguntas abertas; 2)
confirmar; 3) escuta reflexiva; 4) resumir; e 5) informar e aconselhar.
1. Perguntas abertas
Se a EM se baseia no ato de colocar a pessoa a refletir sobre a mudança, a
emitir falas de mudança, então o melhor instrumento para a por a refletir são as
perguntas abertas. Só as perguntas abertas dão oportunidade à pessoa de
elaborar os seus conteúdos, de refletir sobre os seus recursos e as suas forças
para a mudança.
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2. Confirmar
Se a EM se baseia nos recursos, forças e esforços do paciente para chegar à
mudança, então é imprescindível torná-los evidentes e destacados, isto é, a
confirmação da pessoa.
O médico deve respeitar e honrar a pessoa que o procura como tendo valor
intrínseco, capaz de crescer, desenvolver, de mudar, bem como tendo vontade
de ser capaz de decidir o que fazer. Esta atitude pressupõe da parte do médico
que confie e acredite que o paciente é possível de mudar.
O médico procura conhecer e valorizar os esforços feitos, os recursos que tem, 21
as capacidades, os desejos e as intenções que vão no sentido da mudança. É
a procura do “positivo” e “positivar”. O oposto da confirmação é o “deita
abaixo”, é fazer sentir a pessoa como incompetente, incapaz, uma criança,
incapaz de fazer bem seja o que for.
Ora, fazer com que uma pessoa se sinta mal não ajuda à mudança e favorece
a resistência.
3. Escuta reflexiva
A escuta reflexiva ou ativa implica escutar o que a pessoa diz tendo em
atenção que vai ter de lhe devolver o que entendeu. É funcionar como espelho
da narrativa. Esta devolução da narrativa tem consequências práticas como:
− Permite o aprofundamento do entendimento pela clarificação do que não
foi bem entendido;
− Dá oportunidade ao narrador ouvir o que disse, seja os seus
pensamentos, seja as suas ideias, e isto permite ponderar e refletir
sobre a adequação do seu raciocínio;
− Incentiva a pessoa a continuar a falar, refletir, explorar e reconfigurar a
sua história e o seu mundo.
A escuta reflexiva pode-se traduzir como comportamento de parafraseamento,
embora este já possa juntar ao que foi dito, uma interpretação de que foi dito e,
por isso, também se possa designar de escuta reflexiva complexa em oposição
à escuta reflexiva simples em que é a repetição do que foi dito.
4. Resumir
O resumo permite fazer o ponto da situação e impõe-se sempre que estejamos
numa transição de fase da entrevista.
Põe em comum o que já foi adquirido até ao momento de passar à fase
seguinte, que pode ser a apresentação ou discussão de um plano determinado
pelo que se obteve até ao momento.
5. Informar e aconselhar
Informar e dar conselhos é o que o médico mais está preparado para fazer, o
problema é que o paciente não está preparado para os receber.
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A transferência de informação deve obedecer a alguns princípios:
− Não tratar ou ver o paciente como um recetáculo passivo à espera de
ser cheio de informação. É preciso compreender a perspetiva da pessoa
e as suas necessidades. O médico não dá a informação porque a tem
disponível, mas porque o paciente precisa dela. O médico tem a tarefa
de ajudar o paciente a chegar às suas próprias conclusões acerca da
relevância da informação que lhe é disponibilizada.
− Procurar dar informação quando ela é solicitada pelo paciente ou, pelo
menos, quando explicitamente lhe concede a permissão para o informar.
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Perguntas abertas
Confirmar
Escuta reflexiva
Resumir
Informar e aconselhar
30
A ambivalência é o constructo central da EM.
Um dos princípios da EM é levar o doente a emitir falas de mudança, i.e., levar
o doente a argumentar a favor da mudança e isto exige, por parte do médico, a
inibição do reflexo de endireitar, conduzindo o doente a verbalizar as suas
razões para a mudança em vez de ser o médico a enunciá-las e muito menos a
dizer como fazer. O reflexo de endireitar baseia-se na crença do médico de que
tem de convencer ou persuadir o doente par a mudança supostamente no
sentido certo. Isto obedece ao princípio que as pessoas valorizam mais aquilo
que as próprias dizem ou se ouvem dizer.