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EM BUSCA DA BOA SOCIEDADE (SELENE HERCULANO)

Em busca do desenvolvimento sustentável aborda a evolução do conceito de


sustentabilidade desde a Conferência de Estocolmo em 1972 até a Conferência do Rio de Janeiro
em 1992. A Conferência de Estocolmo foi um marco na conscientização global sobre a degradação
ambiental, impulsionada pela tragédia da baía de Minamata, no Japão. No entanto, o Brasil, em
meio ao seu período de "milagre econômico", priorizou o desenvolvimento acelerado, divergindo
das propostas ambientais predominantes. Na Conferência, o país se opôs a ideias como considerar
os recursos naturais como patrimônio da humanidade e defendeu o direito ao desenvolvimento
dos países em desenvolvimento.
A Conferência resultou na Declaração de Estocolmo e na criação do Programa das Nações
Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), além de destacar a importância da educação ambiental.
No entanto, enfrentou críticas pela falta de medidas concretas, ênfase no crescimento econômico
e participação limitada de países em desenvolvimento.
A década de 1980 trouxe crescentes preocupações com a degradação ambiental e a
pobreza global. Em 1983, a primeira-ministra norueguesa Gro Harlem Brundtland presidiu uma
Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que resultou no Relatório
Brundtland. Esse relatório definiu o desenvolvimento sustentável como aquele que atende às
necessidades do presente sem comprometer as gerações futuras, propondo um equilíbrio entre
desenvolvimento econômico, proteção ambiental e justiça social.
O Relatório criticou o modelo de desenvolvimento convencional, defendeu um novo
modelo que integre dimensões econômica, social e ambiental e identificou prioridades como
combate à pobreza, mudança nos padrões de consumo e produção, proteção ambiental e
cooperação internacional. Ele teve um impacto significativo no debate global sobre
desenvolvimento e meio ambiente, influenciando políticas e ações em todo o mundo.
Apesar de sua importância, o Relatório Brundtland também recebeu críticas pela falta de
operacionalidade, ênfase no crescimento econômico em detrimento da proteção ambiental e da
justiça social. No entanto, seu legado continua a inspirar iniciativas como a Agenda 21 e os
Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), destacando a importância contínua do
desenvolvimento sustentável na busca por uma sociedade equitativa e ambientalmente
responsável
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, também
conhecida como Eco-92 ou Cúpula da Terra, ocorrida no Rio de Janeiro em junho de 1992,
representou um marco histórico na luta pela preservação ambiental e pelo desenvolvimento
sustentável. Com a participação de representantes de 178 países e mais de 100 chefes de Estado, a
conferência reuniu esforços para abordar questões cruciais relacionadas ao meio ambiente e ao
desenvolvimento global.
Antes da Eco-92, tanto o Relatório Brundtland, também conhecido como "Nosso Futuro
Comum", quanto a Agenda 21 surgiram como marcos importantes na busca por um
desenvolvimento sustentável. No entanto, esses documentos apresentaram ambiguidades e
incoerências decorrentes de sua natureza consensual, que visava conciliar diferentes interesses de
diversos países. Uma incoerência fundamental observada foi a naturalização do sistema capitalista
de produção como sinônimo de processo civilizatório, ignorando a crescente pauperização e
exploração dos países do "Terceiro Mundo".
Apesar disso, as soluções propostas limitaram-se a ajustes no sistema, dependendo da boa
vontade de atores poderosos. A motivação para mudança muitas vezes se restringia ao temor de
catástrofes ambientais ou de impactos nos lucros. Após a Eco-92, uma série de conferências
subsequentes foram realizadas para criar consenso e incentivar ações governamentais em
diferentes áreas, como água, população, desenvolvimento social e alimentos.
A Conferência de Kyoto, em 1997, formulou um protocolo para a redução de gases de efeito
estufa pelos países industrializados. Porem, os Estados Unidos se recusaram a assiná-lo,
priorizando sua economia e empregos. Essa recusa foi criticada por muitos, que viram isso como
um erro com consequências graves, exemplificado pelos furacões Katrina e Rita em 2005,
considerados por alguns como crises resultantes da negligência ambiental.
Além de conscientizar a comunidade internacional sobre a importância do desenvolvimento
sustentável, a conferência promoveu a cooperação internacional e inspirou a criação de políticas e
ações em prol do desenvolvimento sustentável em diferentes países. No entanto, enfrentou
limitações significativas, como a falta de implementação da Agenda 21 por muitos países, a
escassez de recursos financeiros e a participação limitada da sociedade civil, dificultando a
construção de um modelo de desenvolvimento sustentável mais inclusivo e participativo.
O termo "sustentabilidade" refere-se à capacidade dos ecossistemas de se manterem
estáveis e em equilíbrio dinâmico, dependendo da interdependência, complementaridade,
reciclagem de materiais e energia, bem como da complexidade e diversidade das formas vivas. No
entanto, no contexto do capitalismo, o conceito de sustentabilidade entra em contradição com o
conceito de "crescimento", que se baseia na expansão, uniformidade, homogeneização e
desigualdade, características que confrontam a estabilidade e os ciclos naturais. Ambientalistas
têm criticado a reinterpretação da sustentabilidade como uma defesa do expansionismo do
mercado e do lucro, argumentando que o chamado "ecocapitalismo" disfarça a verdadeira causa
da crise ecológica.
As esquerdas terceiro-mundistas temem que o discurso do ecocapitalismo, ao apropriar-se
da bandeira dos ecologistas, seja um disfarce para novas formas de colonialismo, explorando os
recursos naturais e humanos dos países em desenvolvimento em nome da "sustentabilidade",
perpetuando assim as desigualdades globais. O conceito de "desenvolvimento sustentável"
também é objeto de diferentes interpretações, com uma visão radical que busca igualdade, justiça
social, preservação da diversidade cultural, autodeterminação e integridade ecológica de forma
integrada, contrastando com uma visão conservadora que se limita ao "crescimento sustentável",
conciliando expansão econômica com proteção ambiental.
A Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Rio-92) gerou
grande expectativa entre os ecossocialistas, esperando-se que representasse a síntese dialética
entre justiça social e preservação ambiental, transcendendo o capitalismo e o socialismo em prol
de uma nova ética global. Para ambientalistas brasileiros, o desenvolvimento sustentável implica
na determinação de novas prioridades pela sociedade, com ênfase nos interesses sociais coletivos,
em uma nova ética do comportamento humano e em mudanças-chave na estrutura de produção e
consumo.
A noção de "sociedade sustentável" emerge como alternativa ao "desenvolvimento
sustentável", buscando criar um novo sistema social em harmonia com o meio ambiente, inspirado
no conceito de "Estado Estacionário". José Lutzenberger alerta para a escolha crucial entre
sustentabilidade e um caminho suicida, enfatizando que a política desenvolvimentista e os
modelos econômicos tradicionais são insustentáveis e ameaçam a civilização.
O paradigma neoclássico, que prega a substitutibilidade dos recursos naturais por
tecnologia, falhou em prever as consequências da exploração desenfreada da natureza,
negligenciando a interdependência entre humanos e natureza. Diante da crise ecológica, é
necessária uma nova ciência ecológica que integre a compreensão do meio ambiente em todas as
áreas do conhecimento, seja transdisciplinar e participativa.
A crítica ambientalista estende-se à ciência moderna e à sua visão antropocêntrica, que
concebe a natureza como um objeto a ser dominado, separando a humanidade do mundo natural
e removendo sua dimensão sagrada e espiritual. Diante disso, surgem movimentos como o
ecologismo social, que critica tanto o capitalismo quanto o comunismo, defendendo a
descentralização, não-consumo, ativismo, pacifismo, distribuição do trabalho e da riqueza, e uma
ética de valorização da vida, da natureza e da justiça social.
No Brasil, o movimento ambientalista também está intrinsecamente ligado às questões
sociais, criticando o modelo de desenvolvimento gerador de miséria e desigualdade. Apesar de
não ser um movimento de massa, tem ressonância na sociedade devido à influência de seus
militantes como formadores de opinião e multiplicadores de informação.

OS PARADIGMAS NEOLIBERAL E AMBIENTAL NA CONSTRUÇÃO DA CIDADE CONTEPORANEA:


TRAMAS E TENDÊNCIAS DO DISCURSO HEGEMONICO DA SUSTENTABILIDADE NA EUROPA E NO
BRASIL (FERNANDO PINTO RIBEIRO)

O significado da globalização neoliberal aborda a ascensão e os impactos do neoliberalismo


como ideologia dominante durante a era da globalização do capitalismo. De acordo com Octavio
Ianni, o neoliberalismo não apenas se desenvolve como parte da globalização, mas também molda
uma nova forma de globalização que se estende às esferas políticas e culturais.
O neoliberalismo surge como uma resposta à crise do modelo fordista de produção e ao
declínio do Estado de Bem-Estar Social. Com a crescente interdependência entre países, avanços
tecnológicos e formação de grandes corporações transnacionais, o neoliberalismo se estabelece
como uma ideologia que promove a primazia do mercado sobre o Estado. Ele propõe a
desregulamentação dos mercados, privatização de serviços públicos e a redução da intervenção
estatal na economia.
Essa ideologia ganha força nos Estados Unidos e na Grã-Bretanha na década de 1970, em resposta
à crise do modelo fordista. A ideia de que a livre concorrência e a abertura à livre empresa
levariam ao crescimento econômico e à criação de empregos dominou o discurso político. Líderes
como Margaret Thatcher defendiam políticas neoliberais que enfatizavam a competição individual
em detrimento do coletivo.
O mercado financeiro desempenha um papel central nesse contexto, tornando-se o
epicentro da globalização neoliberal. A desregulamentação dos mercados financeiros permite a
mobilidade do capital em escala global, levando a um aumento da especulação financeira e da
concentração de riqueza nas mãos de poucos.
Apesar dos problemas causados pela especulação financeira e pela desigualdade
econômica, o neoliberalismo continua a ser defendido como o único caminho para o
desenvolvimento sustentável. O ambientalismo emerge como um movimento crítico, destacando
as contradições entre o crescimento econômico ilimitado e os limites finitos do planeta.
“O paradigma ambiental na globalização neoliberal: da condição crítica ao protagonismo de
mercado” explora a evolução do pensamento ambiental desde a década de 1970 até os dias atuais,
destacando como a temática ambiental se tornou central nas discussões sobre desenvolvimento e
sociedade. Ele aborda a transição política e econômica que coincidiu com o fortalecimento da
ideologia neoliberal, influenciando a maneira como a questão ambiental foi abordada e
incorporada pelos atores políticos e pela governança internacional.
Inicialmente, o texto destaca que não há uma demarcação cronológica precisa do
surgimento da temática ambiental, mas a década de 1970 foi crucial para seu fortalecimento,
especialmente após a Conferência de Estocolmo em 1972. A partir desse ponto, o discurso
ambiental passou a questionar o paradigma de desenvolvimento predominante, que priorizava o
crescimento econômico irrestrito sem considerar os impactos ambientais e sociais.
Durante os séculos XVIII e XIX, as revoluções industriais na Europa trouxeram uma nova
consciência ambiental, à medida que as transformações sociais e econômicas causadas pela
industrialização geraram preocupações com a degradação do meio ambiente e a qualidade de vida
das populações urbanas.
A partir da década de 1960, o discurso ambiental começou a ganhar mais destaque,
especialmente durante a contracultura, mas ainda não havia um movimento ambiental
institucionalizado. Foi somente na década de 1970, com a realização da Conferência de Estocolmo
e a crescente conscientização sobre a crise ecológica, que a questão ambiental passou a ser
discutida em nível político e científico.
Autores como Ignacy Sachs contribuíram para a formulação do conceito de
ecodesenvolvimento, que enfatizava a integração entre aspectos sociais, ambientais e econômicos.
A sustentabilidade passou a ser vista como um objetivo a ser alcançado através da redefinição dos
padrões de produção e consumo, bem como da promoção da equidade social e da preservação
ambiental.
O texto discute também a necessidade de repensar os indicadores de desenvolvimento
econômico, substituindo o Produto Nacional Bruto (PNB) por medidas mais abrangentes que
considerem aspectos sociais e ambientais. Destaca-se a importância de limitar o crescimento
econômico e promover uma transição para uma economia sustentável, o que requer uma
mudança fundamental nos padrões de produção e consumo.
Ao longo das décadas, o movimento ambiental cresceu em influência e complexidade,
influenciando políticas e práticas em nível global. Organizações não governamentais, conferências
internacionais e acordos ambientais desempenharam um papel crucial na promoção da
sustentabilidade e na regulação das atividades humanas.
Enquanto a racionalidade neoliberal enfoca o curto prazo, visando resultados imediatos e
lucros rápidos, a racionalidade ambiental adota uma perspectiva de longo prazo, considerando os
impactos das ações atuais nas gerações futuras e na sustentabilidade do planeta. Essa diferença de
horizonte temporal reflete-se nas políticas e práticas adotadas por cada uma dessas abordagens.
No âmbito político, as duas racionalidades também se confrontam. Enquanto a
racionalidade neoliberal muitas vezes busca enfraquecer o papel do Estado e promover a
desregulamentação em prol do livre mercado, a racionalidade ambiental defende a necessidade de
intervenção estatal para proteger o meio ambiente e regular as atividades econômicas de forma
sustentável. Essa tensão entre o mercado e o Estado tem sido objeto de debates e conflitos em
todo o mundo, especialmente em relação a questões como mudanças climáticas, conservação da
biodiversidade e gestão de recursos naturais.
No contexto da globalização neoliberal, a lógica do mercado muitas vezes entra em conflito
com os princípios da sustentabilidade ambiental. A busca incessante por crescimento econômico e
lucro pode levar a práticas predatórias de exploração dos recursos naturais, degradação do meio
ambiente e desigualdade social. Por outro lado, o movimento ambientalista tem procurado
conscientizar a sociedade sobre os impactos negativos dessa lógica e promover alternativas
baseadas na preservação ambiental, equidade social e desenvolvimento sustentável.
No entanto, apesar das divergências entre as duas abordagens, também há espaço para a
convergência e a cooperação. Muitos defensores da sustentabilidade reconhecem a importância
do mercado e da iniciativa privada na promoção do desenvolvimento sustentável, desde que isso
seja feito de forma responsável e compatível com os limites ecológicos do planeta. Da mesma
forma, alguns setores do empresariado têm demonstrado interesse em adotar práticas mais
sustentáveis em suas operações, não apenas por uma questão de responsabilidade social, mas
também por uma questão de sobrevivência a longo prazo.
Nesse sentido, a busca por soluções para os desafios ambientais e econômicos do século
XXI exige uma abordagem integrada que leve em consideração tanto os aspectos ambientais
quanto os econômicos. Isso requer um novo paradigma de desenvolvimento que seja capaz de
conciliar o crescimento econômico com a proteção do meio ambiente e a promoção da justiça
social. Esse paradigma, por sua vez, deve ser fundamentado em princípios de sustentabilidade,
equidade e solidariedade, e requer a colaboração de governos, empresas, organizações da
sociedade civil e cidadãos em todos os níveis.

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